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Religião não traz qualidade de vida

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Faltando pouco mais de 2 anos para o próximo Censo, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou uma síntese dos Censos entre 1940 e 2000.
Nesta análise, o órgão confirmou o que todos nós sabemos: que o Brasil mudou, enormemente, nas últimas décadas. Especialmente, nos últimos 20 anos, vários indicadores sociais foram alterados, dentre os quais os percentuais relativos à religiosidade do brasileiro. É sobre isso que vamos falar aqui.

Tabela: Religiões declaradas nos censos do Brasil
em 1980, 1991 e 2000 (população residente)

Religião 1980 1991 2000
Católicos 89,2% 83,3% 73,8%
Evangélicos 6,6% 9,0% 15,4%
Espíritas 0,7% 1,1% 1,3%
Afro-brasileiros 0,6% 0,4% 0,3%
Outras religiões 1,3% 1,4% 1,8%
Sem religião 1,6% 4,8% 7,4%

Comparando os últimos três Censos, percebemos uma nítida diminuição dos católicos
nominais. Essa queda do catolicismo representa que o Brasil não tem mais um pensamento
religioso único. E se levarmos em consideração que apenas 18% dos brasileiros são católicos
praticantes, então concluímos que o catolicismo, em termos práticos, não é mais predominante.
Temos uma sociedade secular, e laica, onde o cidadão comum é cada vez menos
apegado a crendices, mitos e tabus religiosos.

Nossa proposta é desfazer mais alguns mitos:

1. Mostrar que essa mudança tende a se consolidar e até se ampliar;
2. Mostrar que a religião em si, não muda a qualidade de vida do indivíduo, ou seja,

seus indicadores sociais (escolaridade, renda, etc…).
O conteúdo deste texto foi escrito sem qualquer preconceito. Nosso intuito é
simplesmente mostrar a verdade, através da realidade dos fatos e estatísticas. Não tomamos
partido por religião nenhuma, portanto esta é uma análise de caráter imparcial.

A demarcação do espaço religioso.

Os brasileiros vivem, predominantemente, nas áreas urbanas, perfazendo 81,19% do
total. O Brasil, há algumas décadas, deixou de ser aquele país rural, patriarcal e autoritário. Um
país onde o analfabetismo predominava em muitas regiões, onde as pessoas eram presas a
preconceitos mesquinhos, e se mantinham presas a padrões pré-estabelecidos. Um país opressor
para a maioria da população, certamente.

Dentro desse contexto, a religião era, talvez, a única esperança que o indivíduo tinha de
vidas melhores, se não aqui, pelo menos em outras dimensões. Porém, isso tinha um preço: o
servilismo religioso, se não integral, pelo menos parcial. As pessoas tinham suas vidas pautadas
por valores religiosos. Contudo, como a maioria desconhecia os aspectos teológicos de sua
religião, pois a maioria mal sabia ler e escrever, esses valores acabaram se tornando mitos e
tabus.

Ora, existem três maneiras de um indivíduo constituir o seu código de ética: através do
pensamento racional, através de dogmas religiosos, ou através de tabus e mitos. E a maioria
formula a sua versão do que seria a sua verdade através de tabus e mitos. É aquela “verdade”
que não tem explicação lógica, apenas “é assim, porque sim !”

Mas, a partir dos anos 60, nossa sociedade experimentou grandes mudanças nos
campos: social, político, econômico, ideológico e religioso. A partir de 1988, com a volta a
normalidade democrática e todas as suas implicações, essas mudanças se tornaram irreversíveis.
E uma boa parte desse povo que aceitara tudo, até então, passou a ser cada vez mais crítico.
Porém, há vários “Brasis” dentro do Brasil. E, é claro que essas mudanças são mais
acentuadas nas regiões metropolitanas das grandes cidades. Pois, nesses lugares, as pessoas são quase que “forçadas” a mudar, às vezes, até para garantirem a sua subsistência.

Na “cidade grande”, o homem do campo se vê, constantemente, questionado sobre os
“por quês” da vida. Ele se depara com uma diversidade de pensamentos, comportamentos,
atitudes, e religiosidades que até então desconhecia. E ele se depara com a desigualdade em
todas as sua nuances.

A percepção desse “novo” mundo pode fazer-lhe se tornar um nostálgico pessimista, ou
seja, alguém que não aceita as mudanças. Ou pode gerar nele o desejo de também mudar. É
nesta perspectiva que devemos analisar a mudança da maneira como o brasileiro encara a
religião.

Os católicos nominais são 71,39% nas áreas urbanas, e 82,96% nas áreas rurais,
segundo o último Censo do IBGE. A redução do catolicismo se dá, especialmente, na periferia
das grandes cidades, onde as igrejas pentecostais disputam, ferozmente, os fieis desgarrados do
catolicismo. Estão obtendo sucesso, e até prestígio, junto às populações desses lugares.
É no meio urbano que encontramos a maior diversidade religiosa, pois aí estão:

  • 97,5% dos espíritas assumidos;
  • 96,82% dos umbandistas e candomblecistas assumidos;
  • 86,83% dos evangélicos
  • 91,6% das outras religiões minoritárias;
  • 87,22% das pessoas que não tem religião.

Isso, só confirma a nossa tese anterior. As grandes mudanças sociais ocorreram,
sobretudo, nas áreas urbanas, e justamente por isso é que há mais diversidade religiosa e
ideológica nessas áreas.

Um dado importante é que na população entre 15 e 64 anos, 73,7% são católicos
nominais, porém a maior parte dos não-católicos se situa nessa fase etária. Na população, entre
15 e 64 anos, estão:

  • 62,77% dos evangélicos;
  • 75,26% dos espíritas assumidos;
  • 64,72% dos sem-religião.

Além disso, entre os jovens de 5 e 9 anos, 27,69% não nasceram em famílias católicas,
e entre os de 10 e 24 anos, 26,3% não nasceram em família católicas.
Isso prova que as mudanças ocorridas na religiosidade do povo brasileiro vieram para
ficar.

O catolicismo precisa, urgentemente, rever as suas práticas, se quiser continuar a ser a
maior religião.

A escolaridade dos fiéis.

O desenvolvimento de um religiosidade, e o exercício da fé, independem da classe
social e da escolaridade. A capacidade de acreditar em algo está dentro de cada pessoa, e de
uma forma geral, as pessoas continuam a acreditar em Deus.

Porém, quanto menor a condição sócio-cultural, mais suscetível a pessoa está as
crendices e dogmas irracionais. Quanto menor o grau de instrução de um povo, quanto menor o
acesso a uma cidadania plena, maior será o fundamentalismo religioso, como uma válvula de
escape para os problemas cotidianos.

Ao analisarmos o indicador escolaridade (“anos de estudo”), percebemos que não
existem mudanças significativas entre as religiões, especialmente entre católicos e evangélicos.
Tomamos por base dois aspectos:

  • A quantidade de analfabetos dentro de cada religião;
  • A quantidade de fiéis com 15 ou mais anos de estudo, dentro de cada religião.

Analfabetos dentre os fiéis de cada religião (Censo/IBGE 2000):

  • 16,38% dos católicos são analfabetos;
  • 11,99% dos evangélicos são analfabetos,
    (15,31% dos pentecostais, 8,67% dos não-pentecostais);
  • 3,29% dos espíritas são analfabetos;
  • 8,51% dos umbandistas e candomblecistas são analfabetos.

Fiéis com 15 ou mais anos de estudo, em cada religião (Censo/IBGE 2000):

  • 4,94% dos católicos;
  • 3,08% dos evangélicos,

(1,5% dos pentecostais, 6,42% dos não-pentecostais);

  • 21,11% dos espíritas;
  • 7,15% dos umbandistas e candomblecistas.

* Ter 15 ou mais anos de estudo formal, significa ter acesso ao nível superior (completo
ou incompleto). Apenas, uma pequena parcela da população brasileira (4,9% do total) consegue
chegar a esse nível. Poderíamos dizer que, de certa forma, esses brasileiros pertencem a alguma
elite (mesmo que não se considerem como tal).

Analisando os dois conjuntos de dados, concluímos que os espíritas são os mais bem
posicionados nesse quesito. Eles têm o menor percentual de fiéis no analfabetismo, e o maior
percentual entre os mais letrados. Os evangélicos pentecostais são os que tem os piores índices,
pois apenas 1,5% deles chegam a esse nível. Porém entre os analfabetos, os pentecostais são
superados pelos católicos que tem o maior índice.

Os católicos são sempre a maioria numérica em qualquer quesito, porém quando se
mede o percentual de católicos nas classes mais altas, se verifica que apenas uma minoria, entre
eles, é que se constituem como uma elite. Ou seja, não foi o catolicismo que fez com que o
individuo estivesse na elite.

Outro dado interessante é que umbandistas e candomblecistas quando se assumem,
apresentam escolaridade acima da média. Eles têm menos fiéis analfabetos que católicos e
evangélicos, e mais fiéis no nível superior, embora sejam uma minoria numérica.

Apenas 4,9% de brasileiros têm 15 anos ou mais de instrução. Nesse grupo, as religiões
se representam da seguinte maneira:

  • 74,0% são católicos;
  • 9,33% são evangélicos
  • 6,72% são espíritas;
  • 0,53% são umbandistas ou candomblecistas;
  • 2,66% são de outras religiões;
  • 6,65% não tem religião;
  • 0,11% indefinido.

Os católicos, numericamente, são a maioria nesse quesito. Porém, só chega a esse nível
uma pequena minoria de católicos, pois esses 74% de brasileiros, com 15 ou mais anos de
estudo, correspondem a apenas 4,94% de todos os brasileiros católicos.
E eles são a maioria entre os analfabetos.

É interessante notar que nesse grupo, temos 2,66% de brasileiros que professam outras
religiões, o que mostra que quanto maior o acesso a informação, maior se torna a diversidade
religiosa.

Poder aquisitivo dos fiéis.

Nesse quesito, consideramos o extrato social mais favorecido, ou seja, aquele que tem
rendimento mensal acima de 30 salários mínimos. Esse grupo representa 1,5% da população
economicamente ativa, e com mais de 10 anos de idade.

Percentagem de fiéis de cada religião que chegam a esse nível (Censo/IBGE 2000):

  • 1,44% dos católicos;
  •  0,84% dos evangélicos,

(0,47% dos pentecostais, 1,51% dos não-pentecostais).

  • 4,41% dos espíritas;
  • 1,37% dos umbandistas e candomblecistas;
  • 2,58% dos fiéis de outras religiões;
  • 1,59% dos sem-religião.

O percentual de fiéis, em cada religião, que são empregadores é:

  • 2,94% dos católicos;
  • 2,32% dos evangélicos

(1,7% dos pentecostais, e 3,53% dos não-pentecostais);

  • 6,53% dos espíritas;
  • 2,73% dos umbandistas e candomblecistas;
  • 4,3% dos fiéis de outras religiões;
  • 2,32% dos sem religião.

Agora, dentre os que ganham menos de 1/2 salário mínimo, o percentual , em cada
religião, é:

  • 5,82% dos católicos;
  • 4,79% dos evangélicos
    (5,34% dos pentecostais, e 3,83% dos não-pentecostais);
  • 1,14% dos espíritas;
  • 2,63% dos umbandistas e candomblecistas;
  • 3,79% dos fiéis de outras religiões;
  • 4,82% dos sem religião.

É interessante dizer que os católicos são 79,5% daqueles que ganham menos de 1/2
salário mínimo. Isso confirma, a tese de que quanto melhor a condição sócio-econômica, maior
a diversidade religiosa e filosófica. Todavia, os pentecostais têm o menor percentual de fiéis que
são empregadores (ou empreendedores), o que desmascara o mito da teologia da prosperidade.
Contra fatos (e dados), não há argumentos. Então, o que muda a vida do ser humano ? É
a pergunta que devemos fazer a nós mesmos…

Fazendo o cruzamento de dados, está provado que não existe relação direta entre
religião e melhora nas condições de vida do indivíduo. Até umbandistas e candomblecistas, que
são, freqüentemente, rotulados como “pobres ignorantes”, podem chegar a esse nível sócio-
econômico. E mais uma vez os espíritas (kardecistas) se destacam, pois eles têm o maior
percentual de fiéis que conseguem chegar ao nível mais alto.

Isso desmistifica a tese de alguns grupos que enfatizam a teologia da prosperidade, ou a
preservação de dogmas tradicionais. Para católicos, e evangélicos, resta aceitar o fato de que
não são “melhores”, mas apenas iguais. A religião em si, não melhora a vida do indivíduo, pois
brasileiros de religiões distintas tem padrão de vida similar.

A chance de uma vida melhor pode surgir para todos, independente da religião.

James Mytho, obispojames@hotmail.com

Por: James Mytho.


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