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O abade Trithemo, que foi, em magia, o mestre de Cornélio Agrippa, explica, na sua Estenografia , o segredo das conjurações e evocações de um modo muito filosófico e muito natural, mas, talvez por isso mesmo, muito simples e muito fácil.
Evocar um espírito, diz ele, é entrar no pensamento dominante desse espírito e, se nos elevarmos moralmente mais alto na mesma linha, arrastaremos esse espírito conosco e ele nos servirá; de outro modo, ele nos arrastará no seu círculo e nós o serviremos.
Conjurar é opor a um espírito isolado a resistência de uma corrente e de uma cadeia: cum jurare , jurar mutuamente, isto é, fazer ato de uma fé comum. Quanto mais esta fé tem entusiasmo e força, tanto mais a conjuração é eficaz. É por isso que o cristianismo nascente fazia calarem – se os oráculos: só ele possuía, então, a inspiração e a força. Mais tarde, quando São Pedro envelheceu, isto é, quando o mundo acreditou ter acusações legítimas a fazer ao papado, o espírito de profecia veio substituir os oráculos; e os Savanarola, Joaquim de Flora, os João Huss e tantos outros agitaram por sua vez os espíritos e traduziram em lamentos e ameaças as inquietações e revoltas secretas de todos os corações.
Podemos, pois, estar sós para evocar um espírito, mas para o conjurar é preciso falar em nome de um círculo ou de uma associação; e é o que representa o círculo hieroglífico traçado ao redor do mago, durante a operando, e do qual não deve sair, se não quiser perder, no mesmo instante, todo o seu poder.
Examinemos claramente, aqui, a questão principal, a questão importante: são possíveis a evocação real e a conjuração de um espírito, e esta possibilidade pode ser cientificamente demonstrada? À primeira parte da questão pode – se responder, primeiramente, que todas as coisas cuja impossibilidade não é evidente podem e devem ser admitidas, provisoriamente, como possíveis. À segunda parte, dizemos que, em virtude do grande dogma mágico da hierarquia e da analogia universal, podemos demonstrar, cabalisticamente, a possibilidade das evocações reais; quanto à realidade fenomenal do resultado das operações mágicas conscienciosamente realizadas, é uma questão de experiência, e, como já dissemos, verificamos por nós mesmos esta realidade, e poremos, por este Ritual, os nossos leitores em condições de renovar e confirmar as nossas experiências.
Nada perece na natureza e tudo o que viveu continua a viver sempre sob formas novas; mas até as formas anteriores não são destruídas, porque as achamos na nossa memória. Não vemos, em imaginação, a criança que conhecemos e que agora é um velho? Até os traços que acreditamos apagados na nossa lembrança não o estão realmente, porque uma circunstância fortuita os evoca e nô – los faz lembrar. Mas, como os vemos? Já dissemos que é na luz astral, que os transmite ao nosso cérebro pelo mecanismo do aparelho nervoso.
De outro lado, todas as formas são proporcionais e analógicas à idéia que as determinou; são o caráter natural, a assinatura desta idéia, como dizem os magistas, e desde que evocamos ativamente a idéia, a forma se realiza e se produz.
Schroepffer, o famoso iluminado de Leipzig, tinha lançado, pelas suas evocações, o terror em toda a Alemanha, e a sua
ousadia nas operações mágicas fora tão grande, que a sua reputação se lhe tornou um fardo insuportável; depois deixou- se arrastar pela imensa corrente de alucinações que deixara formar- se; as visões do outro mundo o desgostaram deste mundo, e ele suicidou – se.
Esta história deve deixar circunspetos os curiosos de magia cerimonial. Não violentamos impunemente a natureza, e não jogamos sem perigo com forças desconhecidas e incalculáveis.
É por esta consideração que nós nos recusamos, e que nos recusaremos sempre, à vã curiosidade dos que querem ver para crer; e responder- lhes – emos o que dizíamos a um personagem eminente da Inglaterra, que nos ameaçava com a sua incredulidade: “Tendes perfeitamente o direito de não crer; da nossa parte, não ficaremos, por isso, mais desanimados nem menos convencidos ”.
Aos que viessem dizer-nos que realizaram, escrupulosamente e corajosamente, todos os ritos e que nada se produziu, diremos que farão bem de ficar nisso, e que é, talvez uma advertência da natureza que recusa para eles estas obras excêntricas, mas também que, se persistirem na sua curiosidade, só tem de recomeçar.
O ternário, sendo a base do dogma mágico, deve necessariamente ser observado nas evocações; por isso, é o número simbólico da realização e do efeito. A letra é ordinariamente traçada nos pantáculos cabalísticos que têm por objeto a realização de um desejo. Esta letra é também a marca do bode emissário na Cabala mística, e Saint-Martin observa que esta letra, intercalada no incomunicável tetragrama, fez dele o nome do Redentor dos homens: .
É que os mistagogos da Idade Média representaram, quando, nas suas assembléias noturnas, exibiam um bode simbólico, trazendo na cabeça, entre os dois chifres, um facho aceso. Este animal monstruoso, cujas formas alegóricas e culto bizarro descreveremos no décimo quinto capítulo deste Ritual, representava a natureza votada ao anátema, mas resgatada pelo sinal da cruz. Os ágapes gnósticos e as priapéias pagãs que se faziam em sua honra revelavam bastante as conseqüências morais que os adeptos queriam tirar desta exibição. Tudo isso será explicado com os ritos, proibidos e considerados, agora, como fabulosos, do grande Sabbat da magia negra.
No grande círculo das evocações, ordinariamente é traçado um triângulo, e é preciso observar bem de que lado deve ser posto o seu cimo.. Supõe – se que o espírito vem do céu, o operador deve ficar no cimo e colocar o altar das fumigações na base; deve – se subir do abismo, o operador ficará na base e o fogareiro será colocado no cimo. Além disso, é preciso ter na fronte, no peito e na mão direita o símbolo sagrado dos dois triângulos reunidos, formando a estrela de seus raios, cuja figura reproduzimos, e que é conhecida, em magia, sob o nome de pantáculo ou selo de Salomão.
Independentemente destes signos, os antigos faziam uso, nas suas evocações, das combinações místicas dos nomes divino que demos no dogma conforme os cabalistas hebreus. O triângulo mágico dos teósofos pagãos é o célebre ABRACADABRA, ao qual atribuíam virtudes extraordinárias, e que figuravam assim:
ABRACADABRA
ABRACADABR
ABRACADAB
ABRACADA
ABRACAD
ABRACA
ABRAC
ABRA
ABR
AB
A
Esta combinação de letras é uma chave do pentagrama. O A que começa é repetido cinco vezes e reproduzido trinta vezes, o que dá os elementos e números destas duas figuras:
O A isolado representa a unidade do primeiro princípio ou do agente intelectual ou ativo. O O A unido ao B representa a fecundação do binário pela unidade. O R é o sinal do ternário, porque representa hieroglificamente a efusão que resulta da união dos dois princípios. O número 11 das letras da palavra ajunta a unidade do iniciado ao denário de Pitágoras; e o número 66, total de todas as letras adicionadas, forma cabalisticamente o número 12, que é o quadrado do ternário e, por conseguinte, a quadratura mística do círculo. Notemos, de passagem, que o autor do Apocalipse , esta clavícula da Cabala cristã, compôs o número da besta, isto é, a idolatria, acrescentando um 6 ao duplo senário do Abracadabra : o que dá cabalisticamente 18, número assinado no Tarô como signo hieroglífico da noite e dos profanos, a lua com as torres, o cão, o lobo e o caranguejo; número misterioso e obscuro, cuja chave cabalística é o 9, o número da iniciação.
O cabalista sagrado diz expressamente a este respeito: “Que aquele que tem a inteligência (isto é, a chave dos números cabalísticos) calcule o número da besta, porque é o número do homem, e este número é 666 ”. É, com efeito, a década de Pitágoras multiplicada por si mesma e ajuntada à soma do Pantáculo triangular de Abracadabra; é, pois, o resumo de toda a magia do mundo antigo, o programa inteiro do gênio humano, que o gênio divino do Evangelho queria absorver ou suplantar.
Estas combinações hieroglíficas de letras e números pertencem à parte prática da Cabala, que, sob este ponto de vista, se subdivide em gematria e temurah . Estes cálculos, que agora nos parecem arbitrários ou sem interesse, pertenciam, então, ao simbolismo filosófico do Oriente e tinham a maior importância no ensino das coisas sagradas emanadas das ciências ocultas. O alfabeto cabalístico absoluto, que unia as idéias primárias às alegorias, as alegorias às letras e as letras aos números, era o que se chamava, então, as chaves de Salomão. Já vimos que estas chaves, conservadas até nossos dias, mas completamente desconhecidas, outra coisa não são que o jogo do Tarô, cujas alegorias antigas foram notadas e apreciadas pela primeira vez, nos tempos atuais, pelo sábio arqueólogo Court de Gebelin.
O duplo triângulo de Salomão é explicado por São João de um modo notável. Há, diz ele, três testemunhos no céu: o Pai, o Logos e o Espírito Santo, e três testemunhos na terra: o enxofre, a água e o sangue. São João está, assim, de acordo com os mestres da filosofia hermética, que dão ao seu enxofre o nome de éter, ao seu mercúrio o nome de água filosófica, e ao seu sal a qualificação de sangue do dragão ou mênstruo da terra: o sangue ou o sal corresponde por oposição ao Pai, a água azótica ou mercúrio ao Verbo ou Logos, e o enxofre ao Espírito Santo. Mas as coisas de alto simbolismo só podem ser bem entendidas pelos verdadeiros filhos da ciência.
As combinações triangulares uniam – se, nas cerimônias mágicas, às repetições dos nomes por três vezes, e com entonações diferentes.
A baqueta mágica era, muitas vezes, remontada por uma forquilha imantada, que Paracelso substituía por um tridente, cuja figura damos abaixo.
O tridente de Paracelso é um pantáculo que exprime o resumo do ternário na unidade, que completa, assim, o quaternário sagrado. Ele atribuía a esta figura todas as virtudes que os cabalistas hebreus atribuem ao nome de Jeová, e as propriedades taumatúrgicas do Abracadabra dos hierofantes de Alexandria. Reconheçamos, aqui, que é um pantáculo e, por conseguinte, um signo concreto e absoluto de uma doutrina inteira que foi a de um círculo magnético imenso, tanto para os filósofos antigos como para os adeptos da Idade Média. Dando – lhes, moderadamente, o seu valor
primitivo pela inteligência dos seus mistérios, não poderíamos restituir- lhe toda a sua virtude milagrosa e todo o seu poder contra as doenças humanas?
As antigas feiticeiras, quando passavam, à noite, por uma encruzilhada de três caminhos, uivavam três vezes, em honra à tríplice Hécate.
Todas estas figuras, todos estes atos análogos às figuras, todas estas disposições de números e caracteres nada mais são, como já dissemos, senão instrumentos de educação para a vontade, cujos hábitos fixam e determinam. Servem também para reunir conjuntamente, na ação, todas as forças da alma humana, e para aumentar a força criadora da imaginação. È a ginástica do pensamento que se exercita na realização: por isso, o efeito destas práticas é infalível como a natureza, quando são feitas com uma confiança absoluta e uma perseverança inabalável.
Com a fé, dizia o grande Mestre, transportar – se- iam árvores ao mar e se deslocariam montanhas. Uma prática, mesmo insensata, mesmo supersticiosa, é eficaz, porque é uma realização da vontade. É por isso que uma oração é mais poderosa, se formos fazê – la na igreja, do que se a fizéssemos em nossa casa, e que ela alcançará milagres se, para fazê- la num santuário milagroso, isto é, magnetizado em grande corrente pela afluência dos visitantes, fizermos cem ou duzentas léguas, pedindo esmolas com os pés descalços.
Riem – se da mulher pobre que se priva de alguns centavos de leite, de manhã, e que vai levar os triângulos mágicos das capelas uma pequena vela, que deixa acesa. São os ignorantes que riem, e a mulher pobre não paga muito caro o que compra, assim, de resignação e coragem. Os abastados mostram bastante altivez para passar levantando os ombros; eles se insurgem contra as superstições com um barulho que faz estremecer o mundo; e que resulta disso? As casas dos abastados se desmoronam, e os restos delas são vendidos aos fornecedores e compradores de quinquilharias, que deixam gritar de boa vontade, em toda parte, que o seu reino acabou para sempre, contanto que governem sempre.
As grandes religiões só tiveram a temer uma rival séria, e esta rival é a magia.
A magia produziu as associações ocultas, que trouxeram a revolução chamada Renascença; mas aconteceu ao espírito humano, cego pelos loucos amores, realizar em todos os pontos a história alegórica do Hércules hebreu: desmoronando as colunas do tempo, sepultou – se a si mesmo debaixo das ruínas.
As sociedades maçônicas não conhecem, agora, a alta razão dos seus símbolos mais do que os rabinos compreendem o Sepher Yetzirah e o Zohar na escala ascendente dos três graus, com a progressão transversal da direita para a esquerda e da esquerda para a direita do setenário cabalístico.
e o esquadro de Salomão vieram a ser o nível grosseiro e material do jacobismo ininteligente, representado por um triângulo de aço: eis para o céu e para a terra. A O compasso do G
Os adeptos profanadores, aos quais o iluminado Cazotte tinha predito uma sangrenta morte, ultrapassaram, atualmente, o pecado de Adão: depois de ter colhido temerariamente os frutos da árvore da ciência, de que não souberam alimentar- se, lançaram- nos aos animais e répteis da terra. Por isso, o reino da superstição começou e deve durar até o tempo em que a verdadeira religião se reconstituir nas bases eternas da hierarquia de três graus e do tríplice poder que o ternário exerce fatal ou providencialmente nos três mundos.
Alimente sua alma com mais:
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