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Bruxaria e Paganismo

Paganismo Eslavo

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A religião original dos eslavos é tão antiga quanto a presença humana no leste europeu. Suas crenças remontam ao período neolítico onde encontramos a base de todas as as proto-religiões indo-europeias.

Infelizmente a escrita só chegou aos eslavos junto com o cristianismo, de forma que todas as suas crenças originais foram registradas após a influencia cultural da igreja. A Morávia foi cristianizada em 863, a Bulgária em 885 a Polônia em 966 e a Rússia em 988. Tudo o que sabemos hoje sobre o paganismo eslavo é portanto baseado na tradição oral de suas lendas, contos e canções populares, assim como os relatos dos missionários cristãos.

Pela falta de linguagem escrita original o paganismo eslavo não tem uma forma primária genuína em sua literatura. Um suposto Livro de Veles contendo suas lendas e princípios morais teria sido descoberto em 1919 mas foi perdido em 1941 durante a segunda guerra e sua existência concreta ainda é um assunto disputado entre os especialistas.

O Templo e a Adoração

Sobre os locais de adoração eslavos a descrição mais detalhada que temos é a de Saxo Grammaticus, datado de 1208. Segundo ele um ídolo de grandes proporções ocupava o centro dos templos que eram recintos fechados de uma só porta e cerca de 400 m². As paredes ornamentadas por relevos variados e decorado principalmente com tecidos púrpuras e vermelho berrante acompanhados de figuras de animais.

No centro dos templos havia um ídolo fálico pertencente a Svarog (também chamado Svetovid) a divindade suprema do panteão eslavo e senhor da guerra, da fertilidade e da abundância. Este ídolo central de dois ou mais metros de altura era talhado em madeira ou esculpido em rocha e possuia quatro cabeças ou quatro faces, cada uma olhando em uma direção. O ídolo era isolado do resto do edifício por um biombo formado de panejamentos escarlates que desciam do telhado.

Na mão direta da estátua de Svarog havia uma taça em forma de chifre destinada a receber todos os anos o vinho das festas das colheitas. Quanto mais cheia ficasse melhores seriam as perspectivas para o ano.  Na base do ídolo uma pequena elevação circular rodeada por uma vala eram o espaço do fogo sagrado onde se queimavam as oferendas: grãos de cereais, pães, landes de carvalho, imitações em barro de grãos ou pães, vasos em tamanho normal e miniaturas, adornos e outros objetos de ferro. Deve-se notar que a prática da oferta votiva de grãos cereais se manteve entre os Eslavos em pleno século XX e não é desconhecida hoje em dia. Ao redor da estátua central os ídolos de outros deuses podiam ser  colocados.

Segundo Procópio, os eslavos também sacrificavam animais ao deus Svarog: a oferta mais frequente era a de um galo por sua ligação com o nascer do Sol. embora o touro, o urso e o bode fossem também imolados em ocasiões especiais. Depois da oferta o animal era servido como alimento aos presentes.

O templo era um local de adoração e local onde eram realizados os casamentos e funerais, mas também era a casa do tesouro da tribo na qual seus membros faziam oferendas e pediam auxilio. O templo era ainda um oráculo no qual o sacerdote emitia decretos divinos e previsões do futuro por meio da observação do comportamento pelo lançamento de dados e pela observação do comportamento do cavalo branco, identificado com Svarog .

Svarog

Svarog ou Svantevit é o deus dos deuses do paganismo eslavo. Era tanto o deus da guerra como o deus dos campos era celebrado igualmente após as colheitas e vitórias contra os inimigos. Tinha seu cavalo branco que era montado pelo grão-sacerdote e acreditava-se que o deus acompanharia nele os homens que iam para batalha.

Por ser uma tradição puramente oral seu nome recebe grafias diversas em diferentes países. Svitovyd na Ucrânia, Zvaigzde na Lituania, Svetovid entre russos, búlgaros, eslovenos e macedônios,  Pērkons entre os bálticos, Suvid entre servos, croatas e bósnios,  Svantovit entre tchecos e eslovacos, Świętowit (Poloneses), além de Sutvid, Porovit, Ruevit,  Jarovit, Svevid, ou apenas Vit entre diversos povos.

Jarovit, Beolobo, Ruenu, Chernobog

A explicação para esta variedade de nomes pode ser encontradas nas sagas de Saxo, Helmod. Nessas sagas descobrimos que Svarog é um deus policéfalo. Cada cabeça rege e simboliza uma estação do ano, dando a entender que a adoração ao ídolo possui uma espécie de rotação que acompanhava o passar do ano. Quatro desses nomes pelo menos são facilmente relacionados com as estações do ano Jarovit, liga-se a Jaru, Primavera( mas também, novo, ardente, brilhante, arrojado).  Ruenu é o outono, época de acasalamento dos animais que atingiam pleno desenvolvimento, no eslavo antigo rainu significa ‘setembro’, em checo rijen é ‘outubro’.  Da mesma forma Belobog, o Deus Branco seria sua face de Verão e Chernobog, o Deus Negro sua face invernal.

Para todos os efeitos os eslavos foram adoradores do Sol, na velha saga islandesa de Knytli o sacerdote de Jarovit diz: “Eu sou teu deus, que cobre de relva os prados e de folhas a floresta. Tudo o que os campos e os bosques derem, as crias do gado e todas as coisas que servem ás necessidades humanas, tudo isso está sob meu meu poder.”. Além disso nas sepulturas os corpos ficavam com a cabeça para o leste e sabe-se que era costume dormir com a cabeça virada para o lado do sol nascente.

Essa tese é confirmada por Almass, viajante árabe do século X, que fala da existência de aberturas na cúpula dos templos e arranjos arquitetônicos especiais para observação do nascer do Sol. Na Ucrânica, na Bielo-Russia e na Polônia Meridional faziam-se preces pagãs ao nascer e ao por do Sol e haviam saudações especiais para estes momentos. Apesar de sua relação com o Astro Rei os eslavos acreditavam que ele  poderia se manifestar como quiser entre os homens e animais, especialmente como um velho mendigo para testar a boa vontade e moralidade das pessoas.

Perun

Deus bastante popular entre os eslavos que possui muitas similaridades com o thor nórdico. É representado como um homem forte e vigoroso com barba acobreada usualmente dirigindo um carro puxado por um bode e empunhando em uma das mãos um machado que volta ao seu poder após ferir os espíritos e homens malignos. Este machado recebeu entre os eslavos o nome de strella (ou no plural strelly) que significa flecha ou raio pois acreditava-se que os raios de Perun penetravam a terra para cumprir seus designeos e que penetravam até uma certa profundidade para voltar a superfície depois de um tempo – normalmente entre quareta dias e sete anos. Era o efeito dos strelly que afastavam os maus espíritos, faziam as vacas voltar a dar leite, protegiam as colheitas, afastavam as dificuldades e garantiam vidas felizes aos recém nascidos e recém casados. Outra crença curiosa era que a primavera só começava de fato após o Perun enviar o primeiro trovão da estação, que colocava a terra de novo em atividade.

Por atrair os raios as árvores de grande porte, nomeadamente o carvalho, eram dedicadas a este deus- trovão. Uma árvore atingida por um raio era uma fonte de poder mágico capaz de realizar desejos e curar enfermidades. Este costume é regra entre todos os povos eslavos. Tanto é que em meados do século XVII a Russia teve que emitir uma lei proibindo “preces em redor dos troncos de carvalho”.

Vilas

Os assuntos humanos pouco interessam aos deuses eslavos que vimos até agora. Se seu objetivo era uma boa colheita ou vitória da tribo em combate as ofertas eram feitas para Perun ou uma das cabeças de SvarogMas para resolver conflitos entre as pessoas, superar enfermidades ou proteger o gado em geral as oferendas eram feitas para as vilas.

As vilas são deusas de aparência bela, jovens e fortes que se manifestam como arqueiras e tecelãs, mas que também possuem a capacidade de tomar a forma de animais, redemoinhos e rajadas de vento.

Isso ocorre porque em muitas narrativas a origem da espécie humana está ligadas a elas. Entre os lituanos por exemplo elas são chamadas de Valdytojos (Deusas Sociais) sete irmãs que criaram os seres humanos com sua arte de tecelãs: Verpiančioji (que girou os fios da vida), Metančioji (que jogou jantes de vida), Audėja (a tecelã), Gadintoja (que cortou o fio), Sergėtoja (que repreendeu Gadintoja, e instigado a guerra entre as pessoas) , Nukirpėja (que cortou o pano de vida), e Išskalbėja (a lavadeira).

No norte da Rússia a crença nas protetoras do lar, do amor e das amizades sobreviveu por muito tempo na imagem de Makusha ou Makhsha, uma fiandeira que trabalha durante a noite se possui a cabacidade de mudar de tamanho tornando-se grande e assustadora ou pequena e imperceptivel. Provavelmente esta é a origem da figura da Matrioska, ainda hoje um símbolo de grande afeto e desejo de vida longa e feliz quando dadas de presente.

Estas deusas mais próximas dos seres humanos eram especialmente veneradas entre Búlgaros, Eslovacos Sérvios e Croatas. A principal forma de culto a elas consistia em deixar-lhes oferendas nos bosques e também em fontes, grutas e escarpas e em cavar buracos e falar dentro deles seus pedidos para que a terra os levasse até as deusas. Os buracos eram usados como uma forma de oráculo. Para isso após serem cavados os ouvidos eram aproximados para que se escutasse o que as vilas tinham a anunciar. Um ruído semelhante a um trenó carregado significaria uma confirmação – geralmente uma boa colheita; se o som se assemelhasse ao de um trenó vazio, seria uma negação – em geral uma colheita pobre.

Mas estes buracos não podiam ser feitos antes do dia 25 de março, pois nesse período a “terra estava grávida”. Os camponeses da Volinia e da Bielo-Rússia consideravam um grande pecado trabalhar a terra ou mesmo bater os pés no chão antes deste dia. Isso remonta a mais antiga figura dentre as deuses eslavas, Mati Syra Zemlja (Úbere Mãe Terra).

Ainda no século XIX, em algumas regiões o ritual do casamento buscava a benção das vilas e não de Svarog. Além das coroas de folhas e do  beijo na testa exigia – que deu origem ao costume natalino –  cada um dos nubentes deveria engolir um torrão de terra.

Outras entidades

Além de resolverem as questões humanas as vilas se dedicam a proteger as famílias de criaturas malignas, desencorajando animais e criminosos mas também aplacando ou afastando criaturas fantásticas como por exemplo:

  • Kaukas: duendes domésticos, geralmente inofensivos mas caso algo os estivesse incomodando poderiam ser responsaveis por azedar o leite e esconder objetos pessoais, entre outras travessuras.
  • Veles: são os espíritos de seres humanos mortos não sendo portanto necessariamente ruins.
  • Baubas: espécie de bicho-papão. Criatura escura, olhos vermelhos, braços magros e dedos longos e magros. Se presente, mora no local da casa onde o sol não bate, caso contrário vive em alguma floresta ou caverna próxima.
  • Baba Yaga: bruxa que devora crianças pequenas e que se apoia em pés de galinha, equivalente feminino de Baubas.

Festivais Eslavos

Os festivais mais importantes da religião eslava são os solstícios e equinócios que marcam as quatro estações e o girar do rosto multifacetado de Svarog.

Dentre eles o que recebia mais destaque era sem dúvida Kupala, o  solstício de verão, o Ivanà-Kupala (Noite Kupala) ainda celebrado na Polônia na noite mais curta do ano que ocorre entre os dias 21 e 24 de junho. Neste dia ocorria um banho ritual (kupati significa banhar-se) bem como a montagem de enormes fogueiras envolta das quais danças coletivas entoavam preces e cânticos religiosos.

O solstício de inverno é celebrado no festival de Koliada. Inicialmente celebrada nos dias 6 e 7 de janeiro muitas de suas tradições foram incorporadas nas celebrações de natal dos países eslavos.

O equinócio da primavera é lembrado no festival de Komoeditsa (ou Maslenitsa) entre os dias 20 e 21 de março quando tradicionalmente ocorriam os casamentos.

O outono era celebrado no Tausen (também chamado Bogach, Vtorye Oseniny ou Ruyen) o festival da colheita no dia 21 de setembro, quando era preenchido o copo chifrado de Svarog. Neste dia era costume fazer um voto para o novo ciclo, tomando-se um punhado de terra, fazendo uma declaração e o devolvendo.

Outros festivais

  • Dia de Marzanna (ou Morana) no dia 10 de novembro. Neste festival uma figura de palha representando era afogada ou queimada. Este costume pode ter tido origem em antigos rituais de sacrifício que se  perderam no tempo. Houve uma tentativa da igreja católica de proibir a prática que falhou e em seguida tentou-se identificá-la com a malhação de Judas.
  • Krasnaya Gorka (literalmente “Vale Vermelho” dedicado ao culto dos ancestrais, no qual cada clã fazia uma homenagem a seus ancestrais. Era comum neste dia um clã pregar peças no outro. Celebrado em 01 de abril e 30 de maio
  • Dias de Veles:  Vários dias em janeiro e fevereiro eram usados para honras os mortos.
  • Dia do Perun (2 de agosto) Celebração do deus do trovão.

Thiago Tamosauskas

 

 

 


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