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Os Simbolismos e os Arquétipos

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Por Lilith Ashtart

Excerto de  LVX AETERNA: FILOSOFIA, PSICOLOGIA E PRÁTICAS LUCIFERIANAS EM NOSSO COTIDIANO”

Independentemente da crença em uma divindade ou apenas no simbolismo de seu mito, Lúcifer é utilizado na filosofia luciferiana como um referencial que, ao ser trabalhado, permite um desdobramento da personalidade e proporciona a convicção e o direcionamento necessários para a condução de metas, fornecendo-nos discernimento perante as escolhas que a vida nos impõe. Esta é justamente a função dos símbolos religiosos e dos conceitos idealizados por uma filosofia.

As primitivas tribos e civilizações identificavam-se instintivamente com os arquétipos percebidos na natureza, em seus ciclos e elementos, transmitindo-os aos demais através de narrações de histórias, que com o tempo se constituíam em mitologias próprias. Não havia ainda um questionamento crítico acerca desses pensamentos, sendo apenas uma tentativa de racionalizar suas experiências e sentimentos. Prioritariamente, valorizava-se a vivência de seu significado devido à observação de suas consequências, as quais contribuíam até mesmo como fator de sobrevivência perante os antagonismos que regiam de forma intensa e decisiva seu cotidiano, como vida/morte, dor/prazer, dia/noite, entre outros.

Essa percepção da influência da natureza, por meio de forças que fugiam do controle humano, levou ao desejo de libertar-se dessa impotência e compartilhar desses poderes, dirigindo-os para seus propósitos. Desse desejo de dominar a interferência dos fenômenos naturais sobre a condição humana nasceu o animismo (do latim anima + ismo). Segundo essa teoria, tudo possui sua própria anima ou alma, seja um animal, uma árvore, uma montanha, a Lua, o rio ou o próprio ser humano.

Cada anima possui sua própria autoridade e virtude espiritual. Assim como podia se comportar de forma benéfica, também era temida por sua capacidade de infligir malefícios. Para muitos povos, a alma não era considerada uma unidade, havendo uma “participação mística”, como definiu o etnólogo Lucien Lévy-Bruhn, com outro ser no qual o indivíduo se identificava, obtendo sua cumplicidade e qualidades. Algumas tribos acreditavam assimilar as virtudes de outro organismo por meio do consumo deste, explicando, por exemplo, o canibalismo de inimigos e mesmo o uso de determinados animais como alimento em festividades específicas.

A utilização de peles, penas, vestimentas e pinturas cerimoniais possui o mesmo significado. Por meio desses estímulos externos, o indivíduo identifica-se psiquicamente com o animal ou arquétipo em questão, convencendo-se de ser este e, com isso, incorporando suas forças.

O totemismo das sociedades tribais primitivas surgiu desse princípio. Nele, o animal ou planta escolhido era visto como um protetor, companheiro, progenitor e guia do grupo ou do indivíduo isoladamente, devido ao seu parentesco místico. Adorado, temido e respeitado, o totem não poderia ser caçado ou tocado por aqueles sob sua proteção, nem utilizado como alimento, exceto em cerimônias rituais consagradas.

Assim, o xamanismo utiliza plantas e animais de poder para manifestar suas respectivas atribuições e poderes arquetípicos ocultos, mas presentes naquele que consegue se conectar com tal consciência natural pela qual foi escolhido.

O totem sagrado é herdado pelos descendentes do clã, sendo considerados irmãos, o que torna necessário casamentos entre membros de clãs diferentes da mesma sociedade. Isso permite que os genes sejam permutados, viabilizando uma maior taxa de recombinação gênica e diferenças entre os descendentes, biologicamente necessárias para a evolução por meio da seleção natural. Embora mistificado em concepções morais baseadas em sua crença, é notável como a sabedoria antiga, por meio da observação atenta da natureza, abarcava fatos hoje explicados cientificamente, comprovando que ambos podem andar juntos e cooperar, desde que cada um tenha suas particularidades e limites respeitados.

O totemismo também contribuiu para a atribuição de diferentes funções a cada clã da sociedade, contribuindo com uma sistematização da sociedade e do próprio mundo para a humanidade.

A divindade para os animistas não era considerada um ser personificado, mas sim uma potência poderosa o suficiente para insuflar vida e energia em cada manifestação terrena. Assim, o sagrado é entranhado na vida real, mesmo não sendo completamente compreendido. Como consequência do culto à natureza, inicia-se o panteísmo, que identifica Deus com tudo o que existe, inclusive o ser humano, sendo seguido pelo politeísmo e sua adoração à infinidade de deuses criados. Segundo o antropólogo Edward B. Taylor, o animismo foi um grande passo evolutivo para o pensamento religioso, pois nele o homem percebe intuitivamente a grandeza do universo e a força responsável por sua criação.

Provavelmente, o conceito de alma surgiu na cultura primitiva devido a imagens oníricas de entes falecidos, alucinações causadas por intoxicações e o próprio enigma da morte, permitindo a aceitação de uma parte imaterial do ser que poderia reencarnar em qualquer objeto ou organismo, sem se perder. Essa crença em uma parte imortal residindo em todo ser humano deu origem à ideia de vida após a morte, predominante nas diversas culturas ao redor do globo.

Os egípcios acreditavam ser constituídos de nove partes: um corpo físico, que permitia sua existência nesta vida; uma sombra que partia assim que o corpo físico morria, mas que poderia ser trazida de volta por cerimônias mágicas específicas; um duplo, chamado ka, que habitava junto ao corpo físico na tumba após a morte e que era visitado pela alma neste local, com a qual dividia as oferendas fúnebres que eram ofertadas anualmente; um coração; um espírito, denominado khu, que mais tarde teria sido identificado com o ka, presente nos sepulcros junto aos corpos mumificados; uma força; um nome; e um corpo espiritual.

As oferendas de comidas, bebidas, flores e incensos aos mortos tinham como função manter esse duplo ou espírito perto do corpo do ente falecido, já que supria suas necessidades pós-morte. Se isso não ocorresse, o espírito vagaria longe de seu local de descanso à procura de tais alimentos, aceitando qualquer um que encontrasse pelo caminho.

Encontramos o mesmo ritual em vários povos de diversas regiões e culturas, frequentemente em túmulos onde o indivíduo era enterrado com armas, animais de estimação, pertences e outros objetos que supririam suas necessidades na outra vida, assim como na presente.

Inicia-se, então, o culto aos mortos e antepassados. Os antepassados forneceriam a seus familiares acesso a poderes sobrenaturais, proteção e sabedoria. São elos entre o mundo dos espíritos e aqueles sob seus cuidados, permitindo que continuem a perpetuar sua estirpe na Terra com todas as qualidades herdadas e para que novas sejam desenvolvidas. Neles estão contidos os valores, responsabilidades e virtudes que devem servir de guia para o caminho de cada nova geração.

Algumas correntes de pensamento defendem a ideia de que possuímos em nosso subconsciente experiências não só da nossa vida atual, mas também de nossos pais e antepassados mais distantes, recebidas por meio da hereditariedade. O culto aos antepassados teria como uma de suas funções colocar o indivíduo em contato com essa sabedoria herdada, para, por meio de sua aplicação e experimentação, manifestar suas qualidades intrínsecas e desenvolvê-las durante a vida.

A maior dificuldade em compreender e vivenciar atualmente a sabedoria antiga da maneira como nossos antepassados o fizeram reside no fato de nossa lógica e abstração das ideias não nos permitirem a conexão com os perfis psicológicos por meio dos quais ela foi construída. Isso, porém, não é motivo para classificá-la como inútil. Basta analisar atentamente para perceber o quanto ela está embutida e influencia nosso modo de viver, ainda que de forma adaptada ao homem moderno. Assim como o homem se transforma, suas filosofias também adquirem novas roupagens, necessitando, dessa maneira, de novas compreensões para serem alcançadas. É um equívoco abandonar a sabedoria tradicional, construída pelo eterno questionamento humano sobre o universo e sobre si mesmo, e pelos conhecimentos obtidos pelas experiências vividas por tantas gerações, assim como seria limitar-se a ela sem agregar alguma parcela individual de contribuição, trazendo-a para o campo pessoal.


Lilith Ashtart é psicóloga, taróloga, escritora, pesquisadora e praticante de ocultismo e LHP. Editora da publicação aperiódica Nox Arcana. Autora do livro Lux Aeterna

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