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Cultos Afro-americanos

A Importância de Èsù na Porteira dos Terreiros

Leia em 10 minutos.

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Uma história Nagô conta que havia um grande sábio, que em razão do seu surpreendente conhecimento era invejado por muitos, até mesmo pala Morte (Iku) e pela Doença (Arun). Ao saber disso, esse grande sábio consultou um Babalorisa, tentando saber o que fazer para afastar um possível mal à sua integridade física.

O Deus da Adivinhação, por meio do jogo, disse que ele seria atacado por Arun (a doença) e em seguida por Iku (a morte) e que para conseguir escapar, ele deveria realizar uma oferenda à dois Èsù, colocando um na entrada principal da sua casa e outro na entrada dos fundos. Assim o sábio fez, com o auxílio do Sacerdote.

No dia seguinte, Arun foi à casa do sábio e, ao chegar na porta de entrada, deparou-se com Èsù. Arun disse: “Me dê licença Èsù, pois quero entrar”. Èsù, que havia recebido as oferendas do sábio, disse à Arun que não permitia a sua entrada, que desse meia volta.

Arun no entanto, não se deu por contente e tentou entrar pela porta dos fundos, mas lá, o outro Èsù também não deixou Arun entrar. Iku, fez o mesmo que Arun e não conseguiu entrar na casa do sábio.

Desde aquele dia, Èsù está na porteira dos sábios, evitando que coisas negativas entrem.

Já citei nesse blog a importância dos Exus para o terreiro, pois bem, neste artigo vou falar um pouco sobre a proteção deles no mesmo e outros fatores que dividirei por subtítulos.

A proteção dos Exus no terreiro de Umbanda é essencial, sem a presença deles o terreiro fica vulnerável, pois, as demais Entidades protegem, mas na gira delas as mesmas estão trabalhando em outras causas, atendendo os consulentes e visando outras necessidades dos filhos. Elas conseguem e fazem por onde proteger, mas precisariam focar nisso e se desprenderem do trabalho que ali estão para cumprir, o objetivo da gira mudaria totalmente de rumo, seria uma espécie de culto para despachar espíritos perdidos. Por isso, nas giras de ‘’direita’’, os Exus e Pomba Giras são afirmados no que chamamos de Porteira, onde se é feito uma firmeza para pedir a proteção e a guarda dos Exus no terreiro.

Firmeza da porteira, Tronqueira e assentamentos para com os Exus:

Como disse, a Porteira é o local onde ficam as firmezas dos Exus, como o nome mesmo diz, ela fica localizada na porta do terreiro, onde cada terreiro, ali, afirmam seus Exus conforme a ordem dada pela hierarquia da casa. Existe também e muitos terreiros têm um local específico dos Exus chamado, ‘’Tronqueira’’, esta tem o intuito de afirmar os Exus no terreiro, um intuito que a Porteira tem, mas que vai muito além do simples fato de deixar a presença dos Exus na guarda do terreiro durante a gira. Na Tronqueira vão fundamentos mais específicos, dos quais obviamente não entrarei em detalhes. A Tronqueira é um lugar fixo que está assentado os preceitos dos Exus que comandam o terreiro, para que eles deixem seus enigmas e teores espirituais 24h ativos na casa, um assentamento dos Exus com o terreiro e não com médium ou filho. Portanto, todo terreiro que tem um local adequado pra isso, tem uma Tronqueira e afirma a Porteira do terreiro, ou seja, depositam os preceitos na Tronqueira, onde estão todos os segredos e os enigmas plantados, e depositam enigmas e fé na firmeza da Porteira, complementando os preceitos e utilizando de objetos ritualísticos na parte superficial do terreiro, especificamente na entrada para o pedido de proteção aos trabalhos que ali estão ocorrendo.

Só acrescentando e citando algo importante sobre assentamentos, esses podem ter vários intuitos e geralmente quando alguém (um indivíduo) diz que tem Exu assentado, significa que o mesmo fez de preceitos e fundamentos mais específicos que ligam a pessoa ao seu Exu, isso não condiz com o coletivo, ou seja, com o terreiro.

PARA QUE SERVE A TRONQUEIRA?:

“Lá na porteira eu deixei meu Sentinela!”

Não podemos esquecer de saudar a tronqueira e os exus guardiões quando adentramos nos templos.

Muitos são, os que chegam a um templo de Umbanda e reparam naquelas casinhas, chamadas de tronqueira, existentes na porta.

Este recurso é, no templo, um ponto de força onde está firmado (ativado) o poder dos guardiões que militam em dimensões a nossa esquerda.

A tronqueira é um portal de polaridade negativa absorvedora e esgotadora fazendo exatamente a justa posição com o altar (conga) que é um portal de polaridade positiva irradiadora.

Dizem alguns clarividentes que, no astral, esse portal de força assemelha-se a um vórtice que “suga” e que impede as forças hostis de se servirem do ambiente religioso de forma deturpada.

Cada pessoa que entra em uma casa de Umbanda traz consigo seu “saco de lixo” cheio (são seus pensamentos mesquinhos, suas raivas, suas desilusões…) e muitas destas energias obscuras e alguns espíritos desorientadas não conseguem nem se aproximar dos Terreiros de Umbanda, pois os Guardiões da Tronqueira ficam encarregados de juntarem todos estes “sacos” para descarregar, dando a cada um de nós a oportunidade de diminuirmos o nosso lixo e facilitando nossas próximas limpezas.

A força da tronqueira advém dos elementos ativados no astral que são instrumentos dos mistérios dos Exús e Pombagiras. São sempre guiados pela Lei Maior e pela Justiça Divina para beneficiar os trabalhos espirituais realizados no terreiro como anulação de forças negativas, recolhendo e encaminhado seres trevosos, protegendo e muitas vezes abrindo caminhos e curando. Alguns exemplos de elementos dispostos são:  tridentes, punhais, velas, ervas, pedras, bebidas, entre outros.

Existem outros tipos de elementos, que são velados. Isto é necessário, para manter o devido resguardo dos trabalhos do templo, evitando até que pessoas deem mau uso a forças tão importantes.

É importante que os médiuns e que toda a assistência saibam da importância de uma tronqueira e que todos entendam que este ponto de força está sobre as ordens da Lei Maior.

Quando alguém deturpa este ponto de força, usando-o de forma negativa, este se torna um portal negativo. Este tipo de procedimento não é da Umbanda e sim de seitas que muitas vezes se utilizam do nome da nossa religião.

Não podemos nunca esquecer de saudar, de forma respeitosa, a tronqueira e os exus guardiões, quando adentramos nos templos.

Palavras de um Exu Guardião da Tronqueira:

Da entrada do terreiro observo os trabalhos. Os médiuns ocupam seus lugares. Velas já firmadas. Pontos irradiando.

Todos integrantes começam a bater cabeça enquanto a vibração dos pontos cantados e tocados pelos atabaques diversificam-se pelo salão. O dirigente recebe as coordenadas. Os mentores e guias irmãos ficam preparados.

Na assistência esperam consulentes, pessoas que frequentam a casa assiduamente, outros vindos pela primeira vez indicados por amigos. Umas pessoas estão emocionadas, não sabem explicar. Eu sei…são seus mentores que se fazem presentes.

Outras estão suando, passando mal, agoniadas, querendo sair. Espíritos trevosos vieram com elas, mas entendendo onde estão agora, prezam para sair antes que sejam capturados e resgatados. Com certeza não poderão sugar mais energias das pessoas que acompanham no plano terreno.

O dirigente inicia os trabalhos. Na corrente um médium bambeia, parece que vai cair. Observo seu caboclo ao lado.

O médium é iniciante, não está totalmente integrado ao seu guia. Com fé e paciência, com o tempo, certamente incorporará seu caboclo. Demais médiuns da corrente já incorporaram.

O caboclo chefe manifesta-se no dirigente igual a primeira vez quando trouxe as primeiras mensagens.

Na sequencia que outros caboclos chegam a energia positiva se multiplica. A egrégora é fortificada.

Estes caboclos durante os passes retiram da assistência os obsessores, eguns e kiumbas.

Limpam as pessoas perturbadas e um jeito sério e fraterno transmitem paz e segurança. Consequentemente levando esperança a muitas pessoas que têm em mente que seria o último lugar que procurariam ajuda na sua agonia. Agora sentem-se aliviadas.

Digo por experiência que em breve algumas delas estarão manifestando seus guias.

Todavia acostumado ver esta situação sempre me emociono.

De onde estou continuo a acompanhar os trabalhos.

Na assistência uma jovem que permanecia sentada, de repente levanta-se e põe a vociferar.

Moça de voz melodiosa e serena transforma-se totalmente. Sua voz fica grave e arrogante.

Ela tenta agredir os cambonos da casa, que são médiuns auxiliares, habitualmente conduzam os necessitados para o salão principal onde são realizados os trabalhos.

O kiumba que acompanha a jovem é perigoso e ao cruzar a entrada: grita e xinga tentando machucar a moça possuída.

Tudo isso devido ela ter se afinizado com ele, pensando negativamente, acompanhando amigas em lugares de baixas vibrações, tomar atitudes contrárias ao modo que foi bem criada, permanecer ao lado de uma pessoa que não entende a caridade, entre outras situações.
Os caboclos alertas abrem a roda. Os atabaques soam em ritmo apropriado para a descarga energética.

O caboclo chefe olha para outro irmão de luz, que entendendo rodeia a moça criando um campo de força para que ela não se machuque. O caboclo da moça também irradia com força sobre ela.

Chegou minha hora, aproximo-me tranquilamente. O kiumba desesperado tenta evitar meu olhar.

Não percebeu, mas já teve suas forças exauridas pelos elementos dos trabalhos.

Sorrindo vou em sua direção. Ele ofende, grita e esbraveja.

O caboclo ordena pelo meu apoio.

Dou um salto na qual encosto a lâmina de minha espada no pescoço do kiumba. Domino-o com facilidade. Chamo outros guardiões que o amarram e colocam no liame, á beira de um círculo de velas. Durante os estudos os médiuns chamam de Mandala Ígnea. Um portal magístico.
O kiumba se joga dentro. Preferiu ser resgatado a uma dimensão paralela, para seu próprio aprendizado e evolução.

Foi esperto… se ficasse iria perder a garganta.

Outros kiumbas menores também são capturados e levados a lugares de merecimento.

A moça volta ao estado normal. Algumas pessoas da assistência comentam que as velas em poucos minutos queimaram muito rápido, estão no fim, faltando pouco para acabarem. Os menos entendidos colocam a razão num vento que não existiu ou na parafina que poderia ser fraca.

Não sabem eles o trabalho benéfico que se faz no astral durante o tempo que permanecem sentados.

Acham muito o tempo para espera. Eu acho pouco o tempo para trabalho.

Enfim, nós mentores e guias fazemos o que podemos segundo necessidade e merecimento de cada um.

Os caboclos acabam os descarregos tirando os resíduos e agradecem meu auxílio.

Volto ao meu lugar na tronqueira e observo o fim dos trabalhos.

Minhas velas, charutos e marafos estão firmados para segurança.

Os trabalhos terminam, todos se vão felizes.

E eu na porteira estou…Sentinela.

A presença dos Exus na Porteira:

Nos rituais de abertura dos trabalhos de Umbanda, já com a Porteira afirmada, se canta e louva aos Exus que ali estão protegendo, mas é muito importante tocar num ponto específico. Muitos pensam que os Exus literalmente irão ficar ‘’plantados’’ na porta do terreiro, nos servindo de seguranças e esperando o encerramento dos trabalhos. Não, o que ficará na porteira, assim como fica nas firmezas das demais Entidades no Congá (altar) dentro do terreiro, são as energias e os enigmas dos Exus, que são depositados diante o ritual da firmeza da Porteira.
Tem que se tomar muito cuidado com interpretações na Umbanda, principalmente porque a mesma usa de termos bem práticos. Quando se diz: ‘’ Deixei Exu na Porteira, ou ali está Exu tomando conta, etc.’’ Quer dizer que ali, foi feito com fundamento os preceitos para deixar a força de Exu na entrada do terreiro, assim como acontece no congá quando o afirmamos antes de começar a gira, as Entidades não vão ficar sentadas no congá ao lado de suas velas, esperando nosso chamado. O intuito dessas firmezas, justamente é depositar os enigmas das Entidades, como demarcar um território, aonde qualquer espírito que ali chegar, saberá que e sentirá o que tem ali. No caso da Porteira, vai saber assim que chegar perto, que ali é chão protegido por Exu, então se ainda assim tal espírito ousar a tentar vazar esses enigmas, Exu como um raio de luz se faz presente, mas sinceramente, uma Porteira bem afirmada é difícil qualquer espírito ousar-se a passar.

Despachar Exu:

Um termo muito usado num ritual de início dos trabalhos. Este termo surgiu desde os cultos referentes ao Orixá Exu dos nagôs, e como há um procedimento semelhante aos Exus (Entidades) nos cultos de Umbanda, este termo também veio parar na mesma. Um termo que na interpretação direta se torna totalmente errôneo, pois, sem os Exus não há proteção no terreiro e sem o Orixá Exu não se faz nada, então como alguém, seja no Candomblé ou na Umbanda vai despachar Exu?…

Existe um ritual na Umbanda, onde muitos terreiros o realizam durante a saudação da Porteira, que durante os pontos cantados (cânticos sagrados) se oferta aos demais Exus, aqueles que não fazem parte do terreiro. Ali, além da oferenda se faz outros procedimentos do lado de fora do terreiro, justamente para despachar Kiumbas (espíritos perdidos), mas, como a falta de orientação que atinge a população leiga e se torna até tradicionalismo atingindo também os consulentes dos terreiros, os mesmos ao verem tais procedimentos ritualísticos, diziam que o Pai/Mãe do terreiro estava despachando os Exus, daí surgiu à tradição do termo ‘’despachar Exu’’. Por isso, tem que se tomar muito cuidado ao interpretar as questões do dia-a-dia da Umbanda, jamais pode se deixar levar pela lógica óbvia e aparente.

Resolvi postar esses assuntos dentro de um só artigo, pois um complementa o outro, e muitos leigos e até mesmo umbandistas, principalmente os neófitos, confundem muito esses procedimentos ritualísticos que fazemos aos Exus. E às vezes por não compreenderem, acabam desvirtuando os sentidos e objetivos dos verdadeiros fundamentos.

(Texto retirado do Blog Monsenhor Horta)

Fontes:

http://amigadosventosnosatabaquesdavida.blogspot.com

http://monsenhorhorta.blogspot.com

Fonte: Ilé Òsùmàrè Aràká Àse Ògòdó.

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Revisão final: Ícaro Aron Soares.

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