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Para os pré-socráticos, “arkhé” seria o princípio presencial em todas as coisas, ou seja, por intermédio do qual tudo vem a ser. Em miúdos, seria a substância a partir da qual tudo deriva.
Diógenes de Laércio, explicou o sentido de “arkhé”:
“Todas as coisas são diferenciações de uma mesma coisa e são a mesma coisa. E isto é evidente. Porque se as coisas que são agora neste mundo – terra, água ar e fogo e as outras coisas que se manifestam neste mundo -, se alguma destas coisas fosse diferente de qualquer outra, diferente em sua natureza própria e se não permanecesse a mesma coisa em suas muitas mudanças e diferenciações, então não poderiam as coisas, de nenhuma maneira, misturar-se umas as outras, nem fazer bem ou mal umas as outras, nem a planta poderia brotar da terra, nem um animal ou qualquer outra coisa vir a existência, se todas as coisas não
fossem compostas de modo a serem as mesmas. Todas as coisas nascem, através de diferenciações, de uma mesma coisa, ora em uma forma, ora em outra, retomando sempre a mesma coisa.”
A idéia de “arkhé” entre os filósofos pré-socráticos nunca foi unânime, cada um apresentando a sua própria visão da substância primordial.
Para Tales de Mileto, considerado o primeiro filósofo e um dos sete sábios da Grécia Antiga, o “arkhé” deve ser identificado com a água. Essa idéia proveio da doxografia desse filósofo, já que Tales não deixou nada escrito. Na verdade, conhecemos o pensamento de Tales por outros filósofos, como Aristóteles: “Tales diz que o princípio de todas as coisas é a água, sendo talvez levado a formar essa opinião por ter observado que o alimento de todas as coisas é úmido e que o próprio calor é gerado e alimentado pela umidade. Ora, aquilo de que se originam todas as coisas é o princípio delas. Daí lhe veio essa opinião, e também a de que as sementes de todas as coisas são naturalmente úmidas e de ter origem na água a natureza das coisas úmidas.”
É importante observar também que a água é a substância primordial da vida, compõe cerca de 70 % do planeta e do ser humano, alguns dos antigos também diziam que a água sustentava a Terra.
Olavo de Carvalho faz uma correlação interessante entre o estado de vigília e o estado onírico, de sonho, ao dizer que, quando a pessoa dorme, a realidade se “liquefaz”, algo como uma profunda mudança de estado.
Anaximandro de Mileto contesta Tales, dizendo que a água é fria, assim como o fogo é quente, e um elemento que permite o seu antagônico não pode ser a substância primordial de todas as coisas. Destarte, Anaximandro afirma que o verdadeiro princípio é o “apeiron”, que significa o ilimitado, o indeterminado, o infinito, que, segundo Ubaldo Nicola, é “uma realidade primigênia e diferenciada, sem limites e sem fronteiras”. Esse princípio estaria espalhado por tudo.
Niezsche afirma que Anaximandro dá um salto metafísico em relação aos demais filósofos pré-socráticos, pois a idéia do “apeiron” necessitou de um algo grau de abstração, muito superior a Tales, se a água nasce e morre, não é imortal, assim o imortal seria o infinito, o indeterminado. O apeiron seria algo insurgido embora existente.
Anaxímenes afirma que o princípio de todas as coisas é o ar. Simplício, na obra Física, explica que: “Anaxímenes de Mileto, filho de Eurístrates, companheiro de Anaximandro, afirma também que uma só é a natureza subjacente, e diz, como aquele, que é ilimitada, não porém indefinida, como aquele (diz), mas definida, dizendo que ela é Ar. Diferencia-se nas substâncias, por rarefação e condensação. Rarefazendo-se, torna-se fogo; condensando-se, vento, depois, nuvem, e ainda mais, água, depois terra, depois pedras, e as demais coisas provêm destas. Também ele faz eterno o movimento pelo qual se dá a transformação.”
No sentido físico, o ar se presta a inúmeras variações, assim o fogo seria ar rarefeito, o ar se converte em água através da chuva, depois se transforma em terra. Além disso, num sentido mais místico, a própria alma seria de ar.
Xenófanes de Cólofon propõe que seja a terra, afinal tudo que existe começa na terra e volta para a terra. O próprio fundo do oceano seria formado por camada de terra. “Pois tudo vem da terra e na terra tudo finda” (Aécio)
Intuindo acerca da unidade da natureza, abriu caminho para o discípulo Parmênides de Eléia, que viria a expor a doutrina da identidade e da permanência do ser.
Heráclito de Éfeso acreditava que o “arkhé” era o fogo. “O fogo transforma-se em água, sendo que uma metade retorna ao céu como vapor e a outra metade transforma-se em terra. Sucessivamente, a terra transforma-se em água e a água, em fogo.”
No entanto, Heráclito, ao contrário de Parmênides, acreditava no fluxo, na mobilidade de todas as coisas, “panta rhei” (tudo flui), atribuindo ao elemento fogo o maior símbolo desse devir.
Assim, uma das suas maiores afirmações é que não é possível se banhar duas vezes no mesmo rio, porque as águas já serão outras e a própria pessoa já terá mudado também, física e psiquicamente.
Pitágoras de Samos afirmou que todas as coisas são números. Nesse sentido, os números formariam a própria ordem do universo. O melhor exemplo é o da música, que nada mais é do que a harmonia dos números.
Os discípulos de Pitágoras acreditavam que “a ciência dos números pode explicar cada aspecto da realidade” e que “o número não é um ente abstrato, coincide com a matéria e possui dimensão espacial”.
Empédocles de Agrigento postulou que a natureza possuía quatro princípios básicos, terra, ar, fogo e água, no entanto acreditava na permanência das coisas, ou seja, nada se altera. Do mesmo modo, postulou também duas forças como princípios, que seriam o amor, “philotes”, e o ódio, “neikos”, um princípio associativo e outro dissociativo.
É interessante observar que tanto o “philotes” quanto o “neikos” assumiriam a função do outro elemento. O “philotes”, ao atrair o que lhe é semelhante, também ajudaria a dissociar-se daquilo que não é semelhante, assumindo a função do “neikos”.
Anaxágoras de Clazomena achava que o universo inteiro era formado por minúsculas partículas ou sementes chamadas homeomerias, que dariam origem à realidade por participação do “nous” (mente, espírito,
inteligência). Assim, por exemplo, em cada célula, existe um pouco de tudo do cosmos.
Finalmente, Demócrito de Abdera, na mesma linha acima, dizia que tudo era constituído de átomos e de vazio. Ele afirmava que do nada, nada surge. É interessante notar que Demócrito foi considerado o mais lógico dos pré-socráticos e a Química moderna seguiu a linha de raciocínio dos átomos, e foi além.
Estive questionando acerca do que realmente mantém o universo e não pude encontrar nada por uma simples razão, nada existe universalmente, cada substância, essência ou ser somente em existe como singularidade.
Nesse sentido, um dos desafios do caminhante da mão esquerda é justamente romper com os liames do “universal” e construir a singularidade própria ou, se preferir, a própria indiviidualidade. Assim, se tivesse de optar por um “arkhé”, escolheria seguramente a inteligência. A inteligência, em maior ou menor grau, é que traduz a idéia em movimento.
Destarte, mais um questionamento.
Louvado seja Satan!
Por Maleficence
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