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Voltaire, François Marie Arouet

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Voltaire nasceu em Paris. Seu nome verdadeiro era François Marie Arouet. Seu pai era tabelião e possuía pequena fortuna. Sua mãe tinha origem aristocrática. Ela morreu depois do parto. François foi franzino durante a infância e teve saúde fraca durante toda a vida. Tinha um irmão mais velho, Arnaud, que entrou para um culto herético jansenista. François revelou talento literário e sensibilidade poética logo na infância. Ele comprou livros com a herança de uma senhora que havia visto nele futuro cultural. Com esses livros, e com a tutela de um abade, começou sua educação. O abade lhe mostrou o ceticismo e as orações religiosas. O pai de François queria um futuro prático para o filho. Achava que a literatura não rendia dinheiro nem prestígio. Com o intuito de tornar o filho advogado do rei, coloca-o num colégio jesuíta. Os jesuítas eram padres com formação militar, que usavam para difundir o evangelho no mundo todo. Eram membros da Companhia de Jesus, que havia sido fundada por Inácio de Loyola. Os jesuítas ensinaram a Voltaire a dialética, arte de dialogar progressivamente, para provar as coisas. Ele discutia teologia com os professores, que reconheciam Voltaire como um “rapaz de talento mas patife notável”.

Seu padrinho o introduziu numa vida desregrada. Conheceu escritores, poetas e cortesãos. Ficava na rua até tarde, divertindo-se com fanfarrões epicuristas e voluptuosos. Seu pai, homem sério, não viu com bons olhos as atividades do filho. Manda-o para a casa de um parente, para mantê-lo quase preso. Mas o parente, quando o conhece, gosta tanto dele que lhe dá liberdade.

Quando François termina o colégio, seu pai arranja para que se torne pajém do marquês de Châteauneut. Parte em missão diplomática com esse embaixador para Haya, Holanda. Logo que chega lá encontra uma moça: Olympe Runoyer, a Pimpette. François teve encontros amorosos com a moça e queria que ela fosse morar com ele na França. O caso foi descoberto. François escrevia cartas apaixonadas, dizendo:”não há dúvida de que irei amá-la para sempre.” Mandam-o de volta para a casa de seu pai.

Compõe uma ode a Luís XIII, com a qual participa de um concurso, que não vence. Luís XIV morre, e seu filho é muito jovem para ser rei. O poder ficou com um regente. Sem um governador legítimo,a vida em Paris corria sem controle e François corria com ela.

François começa a ficar conhecido por ser brilhante, imprudente e turbulento. É malicioso e tem os olhos vivos e perpicazes. Vira amante de Susanne de Livry, faz versos galantes e poemas cômicos. Ele aspira ser o grande trágico da época, e não são poucas as suas tragédias. Suas obras somadas dão noventa e nove volumes. É um espírito versátil, dono de uma cultura notável, que o ajudava a ser fecundo. Em 1715 escreve a peça Édipo e o poema Henríada, um épico sobre Henrique IV. Sua fama aumenta e todas as coisas espirituosas e maliciosas são atribuídas a ele, inclusive algumas anedotas, contra o regente que governava, duque de Órleans. As anedotas falavam que o regente conspirava para usurpar o trono. Em 1717, o regente manda-o para a Bastilha, a prisão parisiense. Na Bastilha adota o nome de Voltaire. Depois de quase um ano de prisão, o regente o soltou. A tragédia que escrevera, Édipo, é produzida em 1718, e fica em cartaz quarenta e cinco noites seguidas, um recorde para a época. Se enconta com Fontenelle. Com um lucro de 4000 francos da peça, Voltaire faz investimentos financeiros, empresta dinheiro, e financia o tráfico de escravos, que era um negócio rentável. Assim , fez render seu dinheiro e pode viver com folga.

Então, uma briga com o duque de Sully, cavaleiro de Rohden, o obriga a ir para o exílio. O nobre não aceita seu desafio para um duelo, e dispõe de meios para prendê-lo de novo. O cavaleiro mandou seus homens baterem nele, depois que Voltaire o respondeu. Preso por um curto período, preferiu o exílio na Inglaterra. Depois de ter ficado e alcançado o sucesso com Édipo e a Henríada, ele passa (de início a contragosto) três anos na Inglaterra.

Aprendeu o inglês. Em Londres, conseguiu desenvolver sua intelectualidade. Se relaciona com os poetas Young e Pope; com o escritor Swift e o filósofo empirista Berkeley. Admira-se com a liberdade de expressão dos ingleses, que escrevem o que querem. A filosofia inglesa, que vinha desde o início da modernidade, com Bacon, Hobbes e Locke e os deístas, o agradou. Estuda a fundo a obra de Newton, e mais tarde propaga suas idéias na França, com as Cartas filosóficas, de 1734.

Voltaire absorve rapidamente a cultura e a ciência inglesa. Gosta da tolerância religiosa. Começa a amar a marquesa de Châtelet, Emile de Bretiul. A marquesa é culta, traduzira Newton e apresentou Leibniz a Voltaire. Ela lhe dá proteção no seu castelo de Cyrei. Acha Voltaire interessante, o mais belo ornamento da França. Ela tinha vinte e oito anos, e ele quarenta. Graças a ela e às grandes damas, acredita na igualdade mental inata entre os sexos. No castelo de Cyrei, passavam o dia estudando, pesquisando e fazendo experimentos no laboratório. Voltaire, com sua amante, aprofundou-se em física, metafísica e história. O castelo tornou-se um centro cultural. Voltaire aprefeiçoa seu estilo ionico e frívolo. Escreve Alzire, Mérope, O filho pródigo, Maomé, O mundano, O ingênuo e Cândido.São romances com bom humor. Will Durant diz que os heróis desses romances são idéias, os vilões são superstições e os acontecimentos são pensamentos.

Em O ingênuo, um princípe huroniano chega na França e submete-se aos costumes franceses, tornando-se católico. Para isso um abade lhe deu um exemplar do Novo Testamento. Se apaixona pela madrinha de seu batismo. O romance mostra as diferenças entre o cristianismo primitovo e eclesiástico.

No romance Micrômegas, Voltaire narra a visita de um enorme habitante de Sirius a Terra. Com oito léguas de altura, e mil sentidos, essa raça costuma viver mais de dez mil anos. Sob essa perspectiva vem a tona a finitude e a pequenez da Terra e seus habitantes. O ET diz que é na Terra que a felicidade mora, se dirigindo aos humanos, átomos inteligentes e imateriais. Um filósofo humano expõem ao visitante a brutalidade da existência carniceira na Terra, provocando ira e decepção no alienígena. O filósofo o dissuade de seu impulso de matar a todos com suas passadas.

Em Zadig, Voltaire conta a história de um sábio babilônio. Ao defender a sua amada, Zadig é ferido no olho. Perde a visão desse olho. A amante, Samira, comprometre-se com outro homem. Zadig casa-se com uma camponesa. Testa a fidelidade da camponesa com um amigo, fingindo-se de morto. Traído, foge para o bosque. Adquirindo sapiência, torna-se amigo e ministro do rei. A rainha se apaixona por Zadig. O rei planeja matá-los e Zadig foge. Num transe vislumbra a ordem imutável do universo. A trajetória de Zadig prossegue. Ele é feito escravo, mas depois torna-se assessor de seu senhor.

A correspondência de Voltaire é numerosa. Não só as cartas sobre os ingleses, mas também com inúmeras personalidades da época, como Frederico, o Grande, da Prússia, de quem foi amigo.

Aos poucos, Voltaire volta a ter contato com Paris. Graças à proteção de madame Poiapadeur, vira historiógrafo real. Em 1745, Voltaire e a marquesa vão para Paris. Ele se torna candidato à Academia Francesa. Em 1746, é eleito e faz um belo discurso de posse. Em Paris escreve muitos dramas. Inicialmente fracassa, mas depois alcança sucesso com Zaire, Nahomet, Mírope, Semiramas.

Depois de quinze anos, sua relação com a marquesa torna-se difícil. Em 1748, a marquesa começa um caso com Saint Lambert. Em 1749, a marquesa morre.

Frederico II, da Prússia, o convida para fazer parte da corte, em Postdam. Ele é convidado a ser professor de francês do monarca, que manda dinheiro para a transferência. O convite se deve ao fato de ser Voltaire querido por todos, e admirado por sua inteligência e seus escritos. A estada lhe agrada, mas não de todo. Foge das cerimônias oficiais. Frederico lhe é gentil e amável e juntos mantiveram altas conversas. Voltaire tinha a sua disposíção uma boa suíte. Frederico e Voltaire se tornam muito amigos, e Voltaire não poupa elogios ao monarca falando para terceiros.

Por causa de uma interpretação de um ponto da teoria newtoniana, Voltaire polemiza com um protegido do rei, Malpertuis, presidente da academia de Berlim. Voltaire dirige seu ataque a Malpertuis num panfleto, Diatribe do dr. Akakia, em 1752. Quando o panfleto foi publicado, Frederico, o grande, manda queimá-lo (o panfleto) e Voltaire deixa a Prússia, escapando da raiva real. Em Frankfurt foi preso pelos agentes do rei. Fica preso durante semanas. Quando vai para a França, descobre que está proibido de entrar em Paris. Vai para Genebra, onde adquire uma propriedade chamada “As delícias”. Ali ele termina suas maiores obras históricas: Um ensaio sobre o costume e o espírito das nações e sobre os principais fatos da história, de Carlos magno a Luís XIII. Ele começou essa obra em Cyrei. E A era de Luís XIV.

Nas suas obras históricas, Voltaire não dedicou um enorme espaço à Judéia e ao cristianismo, e relatou com imparcialidade a gigantesca cultura oriental. O Oriente tinha mais tradição que o Ocidente. Sob nova perspectiva, descobriu-se nesse mundo, e os dogmas europeus puderam ser questionados.

Nas Delícias, tem boas relações com os evangélicos. Os enciclopedistas do Iluminismo Francês, encabeçados por Diderot, pedem sua contribuição. Escreve alguns artigos para a Enciclopédia. Ocorre então uma ruptura entre Voltaire e Diderot, por desavença de opiniões. Voltaire ironiza a defesa do estado de natureza de Rousseau (o famoso bom selvagem) dizendo que o que difere o homem dos animais é a educação e a cultura.

Voltaire sai de Genebra e vai para Ferney, onde permanece quase que o resto da vida. Cuidava de sua propriedade rural e escrevia muito. Plantou milhares de árvores. O lugar rapidamente se tornou um centro cultural, a exemplo do que acontecera com o castelo da marquesa. Alguns Iluministas iam para lá. como Helvetius e d’Alembert. Voltaire mantém em Ferney vasta correspondência, com gente de todos os tipos, incluindo muitos governantes.

Em 1755 soube do terremoto em Lisboa, onde morreram umas trinta mil pessoas. Ficou revoltado ao saber que os franceses consideravam aquilo castigo divino. Lamentou a desgraça do destino dos vivos em um poema. Voltaire sempre lutou contra o preconceito e as superstições , preferindo em lugar delas a razão e a cultura elucidativa.

A adoração a um Ente Supremo e a submissão às suas leis eternas, sem conhecê-las por completo, resulta em rituais que não fazem sentido, não tem eficácia. Os preconceitos , para Voltaire podem ser maus, medíocres, ou ter um fim útil, como amar o pai e a mãe. Preconceito é uma opinião desprovida de julgamento. Podem ser:

a) dos sentidos- como por exemplo: o sol é pequeno, pois vejo-o assim.
b) físicos – “a Terra está imóvel”.
c) históricos – por exemplo a lenda da fundação de Roma, por Remo e Rômulo.
d) religiosos – por exemplo: Maomé viajou nos céus.

Voltaire tem um tratamento racional para desvendar os mistérios da consciência humana . Dá a entender que Descartes estava errado com seu inatismo, e prefere a teoria de Locke, de que tudo deriva das sensações. A sensação é tão importante quanto o pensamento, e o mundo é uma sensação contínua. Ele faz paralelos com a cultura grega e romana, nos verbetes do Dicionário Filosófico.

As crenças tem um lado subjetivo muito forte. Nos esforçando para ver a crença, ela acabará por existir, para nós.

Os sonhos são um mistério, portanto fonte de superstições, como os que sonham com acontecimentos futuros e pensam ser Deus o responsável. O fato de não podermos usar a razão enquanto vivemos um sonho, e de ele ser um estado alternativo, de percepção etérea, é o que faz suscitar dúvidas de interpretação. Os sonhos não tem valor objetivo, para Voltaire. A moral vem de Deus, como a luz. As superstições são trevas.

O dicionário filosófico foi publicado em 1764 . Foi o primeiro livro de bolso da história e alcançou muito sucesso. As idéias nele contidas são revolucionárias, pois criticam o Estado e a religião. Voltaire faz muitas citações de grandes autores, e o livro tem uma parte histórica grande. Voltaire faz parte desse movimento de renovação da cultura e crítica da política absolutista chamada Iluminismo. Suas idéias foram propagadas na Revolução Francesa e refletiam os ideais dessa revolução, durante a qual foi muito lembrado. Voltaire não despreza a cultura pagã e oriental, como fazem outros autores.

Cândido, sua obra principal, foi escrito em três dias. Conta com otimismo pessimista a história de um simples rapaz, filho de um barão. Seu mestre, Pangloss, inverte a lei da causalidade, ao afirmar que as pedras foram feitas para construir castelos e o nariz para suportar óculos. No entanto, se acha muito culto.

O exército búlgaro invade o castelo onde Cândido mora e o transforma em soldado. Entre morrer e ser açoitado, Cândido prefere o açoite. Aguenta as chibatadas de todo o regimento durante um tempo. Os pais de Cândido são assassinados, e o castelo é destruído. O rapaz consegue fugir para Lisboa, e no barco que o leva até lá, encontra Pangloss. Em Lisboa ocorre o terremoto. A Inquisição durou mais tempo em Portugal, que se manteve católico e não aderiu ao protestantismo. Cândido, fugindo dela, vai para o Paraguai, país onde há muita diferença social.

Cândido acha ouro no interior virgem do Paraguai, mas é enganado e fica sem quase nada. Vai para Bordeaux com o que sobrou. E Cândido prossegue, sofrendo males a aventuras. Vai para a Turquia. No livro, Voltaire critica a teologia medieval e o otimismo de Leibniz, que diz ser esse o melhor dos mundos possíveis. Certa feita, um jovem defendeu Leibniz, criticando Voltaire, que replicou: “Se esse é o melhor dos mundos possíveis, por que existem tantos males e injurias?” Apesar disso, o mal, para Voltaire, não é metafísico, mas sim social. Deve-se superá-lo com trabalho e com a razão. O homem deve estar sempre ocupado, para não ficar doente e morrer. Voltaire era muito ativo e combateu o ócio. Rousseau via críticas pessoais no trabalho de Voltaire.

Para Voltaire a metafísica é uma quimera. Pode-se escrever mil tratados de sábios e não desvendar o segredo do universo, ou questões como: O que é a matéria? Porque as sementes germinam na terra?

Voltaire difundiu o conhecimento e filosofia. Suas obras foram muito lidas. Ele comenta outros autores e dá sua opinião. Torna claro os complexos sistemas filosóficos, pois é inteligente e escreve bem. O ceticismo de Voltaire é uma atitude espiritual, contra a metafísica. Voltaire fala que o Ser Supremo, cuja crença veio depois do politeísmo, é válido. Disso resulta num paradoxo, pois Deus existe e não podemos conhecer os mistérios do universo. Voltaire aceita os argumentos para a existência de Deus de São Tomás de Aquino. É a causa primeira de tudo, Inteligência suprema.

Contrariarmente ao Deus judaico-cristão, O Deus de Voltaire fez o mundo em tempos remotos e depois abandonou-o ao próprio destino. Por isso Voltaire é deísta.

Para os Iluministas, Deus não existe e é o mal da humanidade. A ignorância e o medo criaram os Deuses, e a fraqueza os preserva. É um empecilho para a civilização. O materialismo é preferencial à teologia. Essas idéias foram defendidas na Enciclopédia, cujo principal autor é Diderot. Os enciclopedistas chamavam Voltaire de fanático, por esse acreditar em Deus. Lembre-se que Voltaire participou da Enciclopédia. Voltaire via Deus na harmonia inteligente entre as coisas. Mas negava o livre arbítrio e a providência. Respondeu ao Barão d’Holbach, notório ateu, que o título de seu livro O sistema da natureza, demonstra a inteligência superior.

Voltaire foi um defensor da justiça. Defendeu muitos que estvam em desgraça e lutou contra a tirania. Não se entusiasmava com as formas de governo. Achava os legisladores reducionistas. Como viajou muito, não era patriótico. Não confiava no povo e não gostava da ignorância, que estava muito difundida. Levantava dúvidas, muitas de suas obras são repletas de perguntas. Numa carta a Rousseau, no qual comenta o Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade, disse que o livro de Rousseau fazia surtir o desejo de voltar a ser animal, e andar de quatro patas, mas ele já havia abandonado esse hábito há sessenta anos.

Aos oitenta e três anos, viajou para Paris, para rever a cidade-luz, depois de tanto tempo. Teve calorosa recepção. Assistiu uma peça sua encenada. Foi até a Academia de Letras de Paris, recebendo uma homenagem. Morreu não muito depois e toda a população parisiense saiu na rua, para participar do cortejo fúnebre.

1694-1778

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