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Por Robson Belli[1]
A chamada Alta Magia, historicamente, tem sido vista como uma prática superior em relação a outras formas de magia, frequentemente relegadas a uma posição marginal, bárbara e primitiva. Esse julgamento valorativo reflete uma herança de preconceitos históricos e culturais. Muitas vezes, uma mesma prática mágica é classificada de maneira diferente dependendo de seu contexto; o que pode ser considerado “selvageria” em uma cultura é ignorado ou até romantizado em outra. Um exemplo dessa perspectiva está no livro Dogma e Ritual da Alta Magia, de Eliphas Levi, frequentemente interpretado como uma obra de um mago cristão “do bem”, incapaz de ensinar ou realizar qualquer maldade. Entretanto, essa visão pode se mostrar superficial para quem realmente estuda suas obras até o fim.
Levi é um mestre habilidoso em disfarçar suas intenções. Enquanto condena abertamente o que chama de “Magia Negra”, ele ao mesmo tempo ensina detalhadamente ao leitor como executar tais práticas, utilizando a tática de “mostre o que não deve ser feito”. Um exemplo disso é o capítulo sobre “Enfeitiçamentos e Sortes”, onde descreve práticas que, se associadas a religiões afro-americanas, certamente causariam escândalo.
Uma dessas práticas envolve o uso de pregos consagrados em rituais de ódio, acompanhados por fumos fétidos associados a Saturno e invocações de espíritos malignos. Após a consagração, o feiticeiro segue a pessoa alvo e crava pregos em forma de cruz nas pegadas dela, com o intuito de selar seu destino. Até esse ponto, a prática pode parecer relativamente inofensiva, mas há outras instruções ainda mais sombrias.
Outra prática descrita por Levi inclui a busca por cabelos ou pedaços de roupa da pessoa a ser amaldiçoada, itens que criam uma conexão mágica direta com a vítima. Em seguida, o feiticeiro escolhe um animal que simbolize a pessoa alvo. Através dos itens coletados, ele estabelece uma ligação mágica entre o animal e a vítima, atribuindo ao animal o nome da pessoa a ser amaldiçoada. O ritual culmina com o sacrifício do animal, cujo coração é retirado enquanto ainda pulsa. Este coração é então envolvido nos objetos personalizados e perfurado repetidamente com pregos ou espinhos durante três dias consecutivos, enquanto maldições são pronunciadas.
Estes são apenas dois exemplos do que se encontra nas páginas da obra de Levi. Ele insiste que tais práticas funcionam, como deixa claro no capítulo correspondente em Dogma e Ritual da Alta Magia:
“O malefício, propriamente dito, isto é, a operação cerimonial com o fim de enfeitiçar, só age sobre a vontade do operador, e serve para fixar e confirmar a sua vontade, formulando-a com perseverança e esforço, duas condições que fazem eficaz a vontade. Quanto mais a operação é difícil ou horrível, tanto mais é eficaz, porque age mais sobre a imaginação, e confirma o esforço em razão direta da resistência.”
Levi argumenta que a eficácia das operações mágicas está diretamente relacionada à dificuldade e horror envolvidos, pois essas características intensificam o impacto sobre a imaginação e solidificam o esforço do praticante. Ele prossegue, explicando as atrocidades da magia negra, desde as missas do diabo até os sacrifícios humanos, como manifestações de uma vontade perversa. Segundo Levi, a magia negra representa a “religião do diabo”, sendo o ódio ao bem levado ao extremo, uma verdadeira encarnação da morte e da criação contínua do inferno.
Diante dessas descrições detalhadas, fica a pergunta: se Levi condena tais práticas como reprováveis, por que as ensina de maneira tão meticulosa? Esse é um questionamento válido para os estudantes refletirem sobre o “bondoso” ex-padre.
Contudo, é importante reconhecer que o livro de Levi oferece muito mais do que apenas práticas de magia negra. A obra também explora temas como a invocação e banimento de elementais, o uso de talismãs, a necromancia e muitos outros tópicos que dificilmente seriam aceitos por um católico tradicional. Levi aborda esses temas com um rigor e uma profundidade que desmentem qualquer simplificação de seu trabalho como meramente “positivo” ou “negativo”. Trata-se de um texto complexo, com nuances que desafiam os leitores a reavaliar suas concepções sobre a magia e seu papel na espiritualidade. Se estiver interessado em uma imersão de duas horas, me procure. No meu curso A magia pratica de Eliphas Levi, gravei um conteúdo onde explico minunciosamente diversos capítulos deste manual.
Robson Belli, Estudioso e praticante da tradição esoterica ocidental, com foco em magia cerimonial (tradicional e moderna), colaborador fixo do MorteSubita.net . Cohost dos podcasts Bate Papo Mayhem, sendo também autor de inúmeros projetos e iniciativas relativas a magia cerimonial incluindo: Enochiano.com.br, Secretumsecretorum.com.br, Treinamentomagico.com.br, Lemegeton.com.br, Trithemius.com.br e muitos outros…
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