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1 Para os músicos que prometem a harmonia de um canto que oferece todas as variedades de música, se, durante o concerto, a desarmonia dos instrumentos entrava-lhes o ardor, eis sua empreitada tornada ridícula. Pois assim que seus instrumentos mostram-se fracos para o que querem fazer, os músicos são necessariamente apupados pelos espectadores.
Indubitavelmente produziram a sua obra com inquebrantável boa vontade, mas acusa-se a fraqueza dos instrumentos. Aquele que efetivamente é músico por natureza, e que não somente produz a harmonia dos cantos, mas ainda envia o ritmo da melodia apropriada até cada instrumento em particular, e é infatigável, é Deus, pois que não é de Deus fatigar-se.
2 Se um artista deseja dar um grande concerto musical, quando os trombeteiros expressaram o seu talento, os flautistas exprimiram as finezas da melodia, a lira e os arcos acompanharam o canto, não se acusa a inspiração do músico, atribui-se-lhe a estima que merece a sua obra; mas lamenta-se o instrumento cujo desafinamento perturbou a melodia e impediu aos ouvintes o degustar de sua pureza.
3 No que nos concerne é preciso que nenhum dos espectadores venha acusar de maneira ímpia, pela fraqueza de nosso corpo, nossa raça, mas deve saber que Deus é um Sopro infatigável, sempre nas mesmas relações relativamente à ciência que lhe é própria, saboreando felicidades contínuas, sempre em condições de usar seus benefícios que permanecem os mesmos.
4 Se, em particular, a matéria da qual Fidias, o escultor, se utilizou não lhe tivesse obedecido para conduzir a obra de arte à sua perfeita complexidade e se o cantor cumpriu a sua parte com o melhor de suas forças, não é a ele que devemos considerar, mas é a corda que falhou, ou por falta ou por excesso de tensão, dando uma nota mais grave ou mais aguda, fazendo desaparecer o ritmo do belo canto.
5 Ora, não se pode culpar o músico pelo acidente sucedido ao instrumento, mas, quanto mais os espectadores conhecerem o instrumento, mais glorificaram o músico, ainda que, freqüentemente, a corda tendo desferido o tom certo… e os ouvintes são então apenas mais apaixonados pelo músico e apesar de tudo, não lhe guardam rancor. Dest’arte, Mui Honoráveis Príncipes, afinai por vossa vez, para o Divino Músico, vossa lira interior.
6 Ora, vejo que ele chega mais freqüentemente que um artista, mesmo sem o auxílio da lira, se deseja executar um dia qualquer nobre tema, tendo tomado a si mesmo de alguma forma como instrumento e promovendo por meios secretos o movimento da corda, de forma a tornar seu expediente objeto de glória pela estupefação dos espectadores. Diz-se de um citarista que tornara-se propício ao deus que preside à música, que um dia em ele tocava cítara num concurso, a ruptura de uma corda impedia-o de continuar a contenda, o favor do Ser supremo substituiu a corda e deu-lhe a graça do sucesso: para substituir a corda, pela providência da Divindade, uma cigarra veio a colocar-se sobre a cítara a fim de completar o acorde, ocupando o lugar da corda, e assim o citarista, consolado de sua pena pelo remédio à falta de corda, alcançou a honra da vitória.
7 E foi isto que senti ocorrer comigo, Mui Honoráveis Príncipes. Recentemente, parecia-me que padecia de fraqueza, e sentia-me doente, e todavia, socorro proveniente do céu completou meu canto ao rei. Tenho a impressão de cantar pela potência do Ser supremo. Desde então, a conclusão de meu serviço será a glória dos reis e são os seus troféus que inflamam o zelo de meu discurso. Adiante: este é o voto do músico. Apressemo-nos: tal é o desejo do músico e é por isto que plange sua lira. E seu canto será tanto mais melodioso, sua execução tanto mais agradável quanto o sujeito a ser tratado requeira um canto melhor.
8 Para os reis sobretudo o músico plangeu sua lira, tomou o tom dos panegíricos e deu-lhes por fito o elogio dos reis, mas anima-se agora a cantar o mais alto Rei do universo, o Deus bom, e tendo assim preludiado seu canto pelo céu, desce para saudar em segundo lugar àqueles que detêm o cetro à imagem do Deus supremo, pois isto é uma coisa que agrada aos próprios reis, que o canto advenha do céu para descer em seguida degrau por degrau e que seja do lugar mesmo de onde a vitória lhe foi dada que derivem, em justa sucessão, nossas esperanças.
9 Que da mesma forma que o músico se volta para o Rei supremo do universo, Deus, que é imortal, que, eterno, possui seu império por toda eternidade, primeiro glorioso vencedor de quem derivam todas as vitórias posteriores daqueles que receberam de si, em sucessão, a Vitória.
10 É para elogiá-los que volta meu discurso e se coloca entre os reis, árbitros da segurança e da paz universais, que Deus supremo, há já longo tempo, conduziu ao poder absoluto, a quem a vitória foi dada proveniente da direita de Deus, para quem os prêmios da luta foram preparados antes mesmo que fossem ganhos pela sua superioridade nas guerras, de que os troféus são a parte da disputa; aqueles que foram destinados a ser reis e prevalecer em tudo, aqueles que expandem o terror entre os Bárbaros antes mesmo de cclocar em marcha sua armada.
Acerca do louvor ao Ser supremo – Elogio do rei.
11 Todavia meu discurso anseia acabar seu curso como começou, a concluir pelo louvor ao Ser supremo, depois aos reis divinos, soberanos árbitros, que nos dão a paz de que gozamos. Pois da mesma forma como começamos pelo Ser supremo e a Potência do alto, também nossa conclusão, refletindo o começo, será voltada para o Ser supremo. E da mesma forma que o sol, que alimenta os germes das plantas, é o primeiro a recolher desde que se levanta as primícias, usando para essa colheita os seus raios como mãos imensas – pois são mãos para eles esses raios que colhem em primeiro lugar os mais suaves perfumes das plantas? – da mesma forma devemos, nós originários do Ser supremo, que recebemos o eflúvio de sua sabedoria, que lhe consumimos toda a substância por essas plantas supra-celestes que são nossas almas, dirigir nossos louvores a Ele, que por seu lado, encherá de rócio nosso caminho.
12 A esse Deus perfeitamente isento de mistura e que é o pai de nossas almas, é conveniente que miríades e miríades de bocas e de vozes louvem, mesmo que não seja possível louvá-lo segundo seus méritos, pois nossos discursos não possuem força para igualá-los. Pois estes recém-nascidos não podem louvar seu pai condignamente, mas por fazê-lo como o podem recebem toda a indulgência. E isto é uma glória para Deus, que seja maior que seus próprios filhos, e que o prelúdio, o início, o meio e o final de nossos louvores sejam o confessar a infinita potência e a ilimitação de nosso Pai.
13 Que seja assim também para um Rei. Pois se nos pertence por natureza o louvar a Deus, pois somos como partes saídas dele, é necessário pedir também sua indulgência, mesmo que a maior parte das vezes esta indulgência nos seja concedida pelo pai antes que a peçamos. Pois, como um pai não pode descuidar-se de seus filhos recém-nascidos devido à sua impotência, mas contrariamente rejubilar-se de ser reconhecido por eles, também o conhecimento do Todo, conhecimento que dá a todos a vida e este louvor a Deus que Deus mesmo nos fez presente, ainda que sendo indignos de Deus, ele nos estima pois somos suas crianças. 14 Deus, que é sempre bom e brilhante, que encontra só em si mesmo o limite de sua eterna excelência, que é imortal e envolve em si mesmo o domínio sem fim que lhe pertence, nesta aspersão inesgotável de energia celeste no mundo cá de baixo, nos oferece sua mensagem por um louvor salvador. . . Lá não existe discórdia entre uns a outros. Não há também inconstância, mas todos têm um único pensamento, uma única previsão, pois possuem apenas um espírito, o Pai, uma mesma faculdade de sensação que, opera neles e o filtro que os une, é um mesmo amor que produz neles a única harmonia do conjunto.
15 Portanto, louvemos a Deus. Mas também desçamos em seguida, para aqueles que, de Deus, receberam o cetro. É necessário depois de ter começado pelos reis, aplicando-nos a louvá-lo, colocarmo-nos em forma para os panegíricos, cantar a piedade relativa ao Ser supremo, em seguida, ofertando a Deus a primeira parte de nossos louvores, ensaiar nossas forças, depois exercê-las por Ele, a fim de exercermos de uma única vez, a piedade para Deus e os louvores para os reis.
16 Pois é justo que paguemos esta dádiva, a eles que nos deram a abundância de uma tão grande paz. A virtude do rei, que digo eu, somente o nome do rei confere a Paz. Pois o rei (basileus) recebe este nome porque se apóia em um leve pé (basiléia) sobre o poder supremo e porque é o mestre da palavra que faz a paz e porque nasceu para ostentá-la sobre a realeza dos bárbaros, de sorte que somente o nome do rei é símbolo de paz.
É por esta razão que somente o nome do rei é de natureza a fazer recuar o inimigo, imediatamente. Além do que, as próprias imagens do rei são portos de paz para os homens frente às mais fortes tempestades: e somente pela aparição da imagem real foi produzida a vitória e afastado todo o temor e ferimento dos que se encontravam próximos a ela.
Corpus Hermeticum
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