Categorias
Sitra Achra

Entrevista Lilith Ashtart

Leia em 24 minutos.

Este texto foi lambido por 257 almas essa semana.

Entrevista concedida a Pharzhuph, Excerto de Lucifer Luciferax XI

1. Quem é a enigmática Lilith Ashtart?

Como você mesmo citou, um enigma que procura se solucionar um pouco mais a cada dia. A resposta que eu poderia lhe dar hoje, com certeza será diferente da que lhe apresentareiamanhã e da que você conheceu há mais de uma década atrás. Sou alguém em eterna mutação, mas que possui alguns aspectos que jamais mudarão, pois fazem parte de minha essência mais pura: sempre fui uma ávida questionadora, buscadora de mim mesma, que tem ânsia por novos conhecimentos e valoriza mais o empirismo do que as fórmulas prontas. Não tenho receios de mudar totalmente o rumo, caso perceba que o anterior não é mais efetivo em minha jornada. Sou uma pessoa apaixonada e intensa para tudo que me é caro. Já cheguei a ouvir algumas vezes que esta era uma característica “demasiadamente hu-mana”, mas eu discordo. O problema se encontra em tornar-se escravo de nossos próprios desejos, e é paraeste aspecto que devemos estar sempre atentos. Caso contrário, seremos controlados não apenas por fatores externos, mas especialmente, e o mais difícil de se identificar e aceitar, por aqueles que se encontram introjetados em nós mesmos. A partir do momento que você mergulha cada vez mais no autoconhecimento, aprimora a aptidão de realizar escolhas conscientes e torna-se responsável por sua própria realidade. E para mim, cada aprendizado obtido, seja por meio de erros ou acertos, foi essencial para a concepção de quem sou, uma pedra em constante lapidar.

2. Como surgiu seu interesse pelo oculto e como foi seu início no Caminho da Mão Esquerda?

O meu interesse pelo oculto foi uma consequência natural em resposta às experiências que vi-venciei durante toda minha infância. Eu possuía o que muitos podem considerar como “mediunidade”, e a visão de seres, assim como conversas com estes em sonhos, era algo muito comum, inclusive compar-tilhado com os mais próximos. Contudo, por ter crescido em uma família católica,apesar de minha mãe possuir os mesmos “dons”, este era um assunto não muito esclarecido e até mesmo evitado quando eu perguntava. Enquanto criança, tudo soava de uma maneira muito natural, mas conforme fui adentrando a adolescência, as respostas que tinhacomeçaram a não me bastar mais, até que por volta dos meus 14 anos, tive um sonho muito real (provavelmente uma projeção astral) que mudou todo o percurso de minha vida. Este foi o momento de minha jornada que considero realmente como o meu despertar. No início da década de 90, o acesso aos materiais de estudo era muito difícil, e como eu não frequentava e nem conhecia o meio ocultista, muito do que fui construindo como filosofia de vida foi por meio de intuições, inclusive a construção de rituais próprios. Hoje vejo que eram extremamente simples, mas a força e a vontade que eram colocados neles os tornavam eficazes. Os primeiros livros que tive em mãos eram os mais populares, dentre eles o clássico São Cipriano, que acho que todo iniciante já teve em mãos.Foi somente com o advento do início da popularização da internet em 1997-98 que comecei a conhecer pessoas realmente envolvidas com a LHP e o ocultismo em geral, e comecei a ter acesso a indicações e leituras de qualidade. Por incrível que pareça, conhecipessoas sérias e que foram muito importantes para o início de minha senda nas então populares salas de bate-papo da UOL. O que mais me espantou foi que muito do que comecei a ler e discutir, coincidia com o que eu mesma já havia construído por meio de minhas intuições, embora, lógico, cada uma com suas particularidades. O sata-nismo de LaVey, da ONA e de Nate Leved, assim como Thelema, foram os primeiros contatos que tive dentro deste campo. Inclusive, a OTO foi a primeira ordem à qual pertenci.

3. Minha memória é ruim, perdoa-me se houver algum engano com relação às datas, mas entre o final dos anos 90 e início dos anos 2000 você já mantinha o site For My Fallen Angel. O que a motivou a criar e manter o site?

Comecei a escrever pequenos ensaios em 98 e 99, que eram apenas socializados com este grupo restrito com o qual eu conversava. Comecei a me aventurar a criar sites em HTML no final de 99, e no primeiro dia do ano de 2000 lancei o site Mystical Land, no qual eu divulgava textos de diversas verten-tes, desde Wicca até Satanismo. Foi nele que divulguei meus primeiros textos sobre Luciferianismo. Havia pouquíssimo material sobre o assunto até então, e praticamente zero em nossa língua, o que me motivou a escrever textos que divulgassem tanto a minha visão particular, que eu já havia construído por meio de minhas experiências, quanto sobre os estudos que estava realizando a este respeito. Os textos foram ficando muito volumosos e por isso decidi criar um site dedicado exclusivamente ao Luciferia-nismo, algo inédito até então, para suprir esta lacuna e poder divulgar a filosofia, que foi o For My Fallen Angel, em 2001. Cheguei a receber um convite para publicar um livro naquela época, mas recusei, pois naquele momento eu acreditava que a divulgação do que eu realmente acreditava e vivenciava deveria ser gratuita para poder estar ao alcance de todos, e assim cooperar com um passo inicial para que cada um pudesse trilhar sua jornada por si mesmo. Hoje possuo uma visão totalmente diferente, pois após tantos anos vejo meus textos editados de forma deturpada, divulgados sem autoria ou fonte, roubados e reescritos por outros “autores”, o que me leva a crer que não vale a pena o esforço, dedicação, tempo e investimento financeiro requeridos na produção de um material para disponibilizá-lo integralmente de forma gratuita.

4. Em quais outros sites você lembra de ter colaborado e quais outros você manteve que gostaria de mencionar?

Nunca colaborei para outros sites com material inédito. Na verdade nunca tive esta pretensão, já que possuía o meu próprio, assim como um blog, ambos atualmente desatualizados e “abandonados”. Mas alguns sites e publicações me pediram para ceder o material para colocar em suas bases de dados, o que sempre autorizei com muita satisfação.

5. Tiveo prazer de conhece-la pessoalmente na época em que me iniciei na Ordo Templi Ori-entis, ordem a qual você também pertenceu por anos. Qual foi a importância de Thelema em sua jornada e busca pessoal e interior?

A OTO foi a minha primeira experiência real com uma Ordem, e foi por meio dela que entrei em contato com vários outros sistemas que até então desconhecia e foram sendo incorporados por mim, entre eles a Goetia e o Caoísmo. Apesar de todas as defasagens, problemas e até mesmo desorganização (e os demais detalhes que quem frequentou a OTOf sabe), a vivência dentro deste grupo foi extrema-mente importante e essencial em minha jornada, que ainda encontrava-se no início, pois me apresentou novos horizontes que vieram a fornecer bases mais sólidas e contribuíram diretamente para o meu ama-durecimento e crescimento pessoale mágicko, tanto filosoficamente quanto na prática. Não me consi-dero Thelemita, e na verdade nunca fui, mas muito de Thelema com certeza está incorporado em mim. Contudo, costumo dizer que não me considero nada que possa ser definido, pois de todos os locais pelos quais passo, de todas as experiências que vivo e conhecimentos que adquiro, há aquilo que trago para mim por ser funcional, e há o que descarto, tornando a minha filosofia única para mim mesma.

6. De quais outras organizações de cunho mágico, religioso, esotérico, filosófico, oculto e simi-lares você participou? Poderia nos falar um pouco sobre suas experiências nessas ‘ordens’?

Eu costumo dizer num tom de brincadeira, embora seja a verdade, que eu nasci para ser solitária. Não consigo pertencer a Ordens, pois não consigo ser condizente com o que não concordo e sou extre-mamente justa, responsável e exigente, tanto comigo, quanto com os demais. Para mim, participar de um grupo é um grande compromisso, pois o andamento do mesmo depende da igual dedicação de todos. O problema é que grupos são feitos de pessoas, individualidades, e isso é o estopim para que as coisas não caminhem como deveriam. Nem todos possuem o mesmo compromisso e dedicação, nem todos estão alí com as mesmas intenções, nem sempre há lealdade entre os próprios membros, não são todos que conseguem não se deixar dominar pelo ego e se aproveitar de sua posição, nem todos recebem as mesmas cobranças devido a privilégios, enfim… desde cedo percebi que este não era o meu caminho, embora sempre tive grande prazer em realizar estudos, práticas, debates, com outras pessoas, como ainda o é até hoje. Mas de forma independente, sem regras e crenças a serem impostas. Por isso, pertenci apenas a duas ordens, e depois disso, resolvi que realmente não funcionaria comigo este tipo de organi-zação. A primeira dela acabamos de conversar, que foi a OTO. Foi onde vi na prática muita coisa errada acontecer, que prefiro não entrar em detalhes.Embora também houvesse a dedicação de muitos que aliestavam, isso não foi suficiente para mudar a realidade encontrada e acabei não conseguindo mais com-pactuar com tais condições e me afastei. Após você me apresentar a Ordo Nox Magistralis (ONM) e algunsdos manuscritos da Ordem, me identifiquei de imediato com a mesma. A maioria dos pensamen-tos apresentados era semelhante aos meus, mesmo sem nunca ter tido contato anterior com os mesmos, e, ao me ver refletida desta maneira, resolvi me candidatar e frequentei a Ordem por alguns anos, alguns dos quais você também esteve presente. Compartilho até hoje de muitos ensinamentos da mesma, man-tenho contato com alguns membros, mas, apesar disso, me afastei pelos problemas citados no início: pessoas são individualidades, e muitas vezes não funcionam juntas, o que reflete em todo o grupo. Ainda assim, foi um período importante e produtivo para mim, durante o qual adquiri muitas experiências, escrevi vários ensaios e obtive um crescimento pessoal que dificilmente obteria em uma Ordem seme-lhante. Após estas experiências, tive contato com membros de várias outras organizações e até mesmo recebi convite para adentrar algumas delas, mas continuei de forma independente, por vezes comparti-lhando e realizando estudos em conjunto com amigos, mas sem me comprometer com nenhuma Ordem/Seita/Religião e afins oficialmente.

7. O que é a Ordo Astaroth?

A Ordo Astaroth foi o início de um projeto que infelizmente não se concretizou, devido a algu-mas divergências pessoais. O intuito era se tornar um grupo para a divulgação de novos estudos e práticas que estavam sendo desenvolvidos por mim e um parceiro, com a contribuição da sabedoria do Sr. 7 Encruzilhadas, ao qual sou eternamente grata. Seus ensinamentos me fizeram me questionar sobre mui-tos conceitos que norteavam meus caminhos, e desconstruiu muitas teorias e práticas que pareciam até então as mais fidedignas. Posso afirmar, sem sombra de dúvida, que eu me transformei por meio destes ensinamentos, ao vivenciá-los efetivamente. Alguns materiais chegaram a ser produzidos, e ensaios inici-ais elucidativos sobre alguns temas começaram a ser divulgados. Contudo, os demais conteúdos conti-nuarão restritos.

8. Você é reconhecidamente uma das pessoas que mais contribuiu para o que se costuma cha-mar Luciferianismo no Brasil. Você se considera uma Luciferiana? O que é ser “Luciferiano” para você?
Não sou uma pessoa que gosto de me definir por meio de rótulos, até porque todos sabem o quanto se autodenominar uma coisa é limitante, e a limitação é algo que procuro sempre transcender em minha existência. Contudo, o conceito do que nomino como “Luciferiano” com certeza está inte-grado ao que sou. Para mim, um Luciferiano é aquele que está constantemente explorando a Escuridão para se encontrar com a verdadeira Luz. Que tem como objetivo se tornar senhor absoluto de si e de tudo que o cerca, e que para isso deverá perseguir o autoconhecimento. Ele possui disciplina e vigia-se constantemente, de forma a não agir de forma intempestiva e impetuosa, impedindo que os desejos imediatistas, típicos de nossa esfera, o iluda, enfraqueça, escravize e acabe por desviá-lo de sua meta principal. Enfim, para mim um Luciferiano é aquele que realmente iniciou seu despertar.
9. O que Lúcifer representa e é para você?
Lúcifer é o nome pelo qual denomino uma força criadora, que manifesta-se de diversas maneiras em diferentes níveis de existência. Por fazer parte também de suas emanações, acredito carregar sua centelha em meu Ser, e a Ele mereligarei ao alcançar novamente a unidade. Apesar de todas as concep-ções que eu possa possuir, tenho ciência de que tudo o que é possível conhecer a seu respeito não passará de nada além do que nos é permitido conhecer neste estágio limitado de nossa evolução, em nosso plano dual, sendo Ele aquele eternamente oculto sob véus. Mas também aprecio a representação arquetípica e romantizada do anjo rebelde, que nos incita a não nos subordinarmos ao que não é de nossa natureza, e a lutar pelo direito de nos tornarmos nosso próprio deus, mesmo que para isso tenhamos que enfrentar imensas ordálias e abandonar a estagnação reconfortante na qual nos encontrávamos. O que, diga-se de passagem, nada é além do que é necessário para a uma verdadeira iniciação.

10. Para você, o que seria uma iniciação ideal na intrincada Via Sinistra?

Em primeiro lugar, como já citei anteriormente, uma iniciação verdadeira apenas poderá ser aquela que tenha como meta o autoconhecimento, pois sem ele não conseguimos identificar, e assim nos utilizar, de nossos verdadeiros potenciais para desvelarmos quem realmente somos, e obtermos então a força e o discernimento para arrancar a máscara que nos ofereceram e nos ludibriaram a vestir. Con-tudo, muitos daqueles que procuram pela Via Sinistra almejam em primeiro lugar a obtenção de resul-tados de forma imediatista e com o menor esforço possível, além de reconhecimentos, prazeres, poder, pompas, mas esquecem-se que só os obterão de maneira ilusória caso não foquem-se no principal: em sua própria essência, já que é apenas em nós mesmos que se encontra tudo que necessitamos para nos consagrarmos como os deuses que somos. O processo de iniciação é contínuo, e jamais será simples de se percorrer, pois não há atalhos verdadeiros. Qualquer obstáculo contornado com certeza será cobrado mais à frente, e, por não ter sido dominado anteriormente, derrubará o candidato no decorrer da jor-nada. Na ânsia por resultados, e na ilusão de que apenas grandes ordálias e/ou feitos são dignos de um iniciado, a maioria acaba por pular etapas essenciais para o seu progresso, e com isso entra em uma estagnação da qual não consegue mais se desvencilhar. Por isso que sempre enfatizo que todo momento é único e essencial, e não há um mais importante do que o outro: é durante ocaminhar que vamos nos lapidando, por meio de erros e acertos, por meio da dor e do prazer, ao vivenciar na prática as teorias que construímos e a que nos são passadas, já que nem todas se demonstrarão verdadeiras para nós, e que só em seu aspecto teóricode nada nos serve a não ser um acúmulo inútil de conhecimentos. Assim, a Vida torna-se nossa própria iniciação, e são em nossas colheitas que observamos os seus mais claros resultados. Observe-se a si mesmo, aos seus sucessos e conquistas em todas as áreas de sua vida, e terá um termômetro exato do processo, e assim um norte para prosseguir, ou analisar o que deve ser modifi-cado. Ter esta consciência de ser o único responsável por suas escolhas e consequências, e estar em constante vigiar dos atos e pensamentos para poder ousar com prudência e desfrutar da liberdade com responsabilidade, é primordial para uma iniciação ideal na qual almeja-se desvencilhar-se dos grilhões da ilusão e da escravidão.

11. O que a motivou a compor os ensaios da análise do Corpus Hermeticum sob o ponto de vista luciferiano?

Estes ensaios foram resultantes de estudos que estava realizando na época, por volta de 2002. Eu possuía o hábito de, ao adquirir um novo livro, identificar trechos que possuíam de forma intrínseca ideias condizentes com a filosofia Luciferiana e registrar em forma de resumo. No caso do Corpus Her-meticum, este resumo se tornou muito extenso, formando um longo ensaio. Não havia inicialmente nenhuma intenção de divulgar tais textos. Era apenas um material de estudo como tantos outros. Por coincidência, alguns anos depois, ao entrar na ONM, a análise desta obra estava entre os requerimentos exigidos, e então realizei sua revisão e ampliei um pouco mais o conteúdo original. O texto final foi dividido em duas partesque vieram a ser publicadas apenas nas edições da revista Nox Arcana.

12. Quando e como surgiu a ideia de criar a revista eletrônica Nox Arcana? Quais são seus planos atuais para essa publicação?

A ideia de criar a revista surgiu em 2009, após ter sidoobrigada a mudar o servidor de hospeda-gem do site da Geocities para o Wix, ao qual não me adaptei. Na época estava escrevendo alguns novos textos, e lançá-los no site era um trabalho que exigia paciência, pois para a velocidade da internet da época era umsite extremamente pesado para carregar e que não abria corretamente em todos os navega-dores. Estava insatisfeita com estes aspectos e o layout do site, e me veio a ideia de condensar os ensaios que lá estavam de forma mais organizada por meio de uma revista eletrônica aperiódica, onde poderia estar acrescentando novos materiais constantemente, assim como divulgar obras de outros autores. Desta forma, poderia abandonar completamente o site, que foi o que ocorreu. A revista contou com cinco edições, lançadasentre janeiro de 2010 e janeiro de 2011, que atenderam esta finalidade. Tenho planos de futuramente retornar a editá-la para divulgar novos ensaios que estou redigindo, mas ainda não há uma data definida ou planos de como será sua divulgação. Atualmente ela pode ser acessada por meio da página no Facebook https://www.facebook.com/Nox-Arcana-301671763344139/. Estarei também usando esta página para divulgar novos textos e futuras edições.

13. Como foi a reverberação do lançamento de seu livro Lux Æterna?

Na verdade, me surpreendeu bastante desde a primeira edição. Por ser um livro que encontra-se praticamente na íntegra na internet, de forma gratuita, há mais de uma década, apesar de algumas inclu-sões mais recentes, não esperava uma recepção e retorno tão positivo. E não me refiro apenas ao número de vendas, mas também pelo contato de diversas pessoas elogiando o trabalho e apoiando novas publi-cações, inclusive algumas com as quais havia perdido o contato.

14. Recentemente você publicou uma nota sobre o possível encerramento das vendas da se-gunda edição de sua obra Lux Æterna. Você irá mesmo retirar a obra de circulação? O que motivou essa decisão?

A primeira edição na época foi lançada em formato físico a pedidos de alguns amigos que que-riam ter um exemplar em sua coleção, e não apenas no formato digital. Resolvi disponibilizar um número restrito de cópias e retirar do mercado assim que este número fosse atingido. A intenção ao fazer isto foi realmente a de tornar o livro um item de colecionador. Não pretendia lançar uma segunda edição do mesmo, mas sim um segundo livro com novos ensaios que estavam sendo produzidos. Contudo, os planos mudaram, já que iniciei um novo projeto pessoal no ano seguinte ao lançamento, que me ocupou muito tempo, e por me desanimar cada vez mais com os rumos degradantes que o ocultismo, e de forma ainda mais notória o Luciferianismo, foram levando nos meios virtuais. Parei de editar a revista Nox Arcana e de nutrir o site com novos textos, assim como de participar ativamente dos grupos/ fóruns de discussão e das redes sociais. Passei por uma época (e talvez esteja apenas iniciando a saída dela) em que optei pela reclusão neste aspecto, e que coincidiu com muitos acontecimentos em minha vida pessoal que me tornaram mais introspectivae me levaram a me questionar sobre minha própria jornada. Nunca me afastei completamente do ocultismo neste intervalo, mas muitos conflitos internos, conquistas e derrotas, desconstruções e reconstruções, ocorreram neste período que pareceu um mar revolto, e ainda assim necessário, para que eu pudesse resgatar novamente minha essência, que cada vez mais estava se embotando sem que eu percebesse, a ponto de chegar a um estágio em que eu mesma não me reconhecia mais ao me olhar no espelho. E apesar da jornada de cada um ser solitária, houve pessoas que contribu-íram muito neste meu processo, me auxiliando a percorrer cada fase direta e indiretamente, e sou grata a cada uma delas. Há uma crença equivocada que a queda não faz parte do caminho de um iniciado, e que esta deve ser motivo de vergonha. Porém, isso é utopia, e muitos se perdem justamente por não serem capazes de discernir e aceitar que escolhas errôneas muitas vezes são cometidas, que muitas vezes sem perceber deixamos fraquezas nos dominarem, e que apenas esta consciência torna possível a supe-ração e afirmação de nós mesmos. E, apenas desta maneira, cada vez menos quedas sofreremos, apesar das ordálias se tornarem cada vez maiores. A decisão da publicação de uma segunda edição foi para abrir as portas para a divulgação de novos livros a serem lançados pela Ordo Astaroth, com a inclusão de pequenos ensaios na ampliação da nova edição. Como o projeto foi encerrado, não há mais motivos para manter o livro à venda, e ele acaba de ser retirado do site.

15.Há algum plano de novos livros de sua autoria? O que poderia nos falar a respeito?

No momento não há planos para novos livros, mas estou planejando retomar a escrita. Mais do que nunca, minha preocupação não é escrever tratados filosóficos ou compêndios mágic’kos, até porque há excelentes publicações e autores dedicados a isto, mas discorrer sobre como vivenciamos estas teorias na prática, em nossas simples ações cotidianas, e a importância de nos tornarmos conscientes de seus resultados. Sempre gostei deescrever sobre assuntos oriundos das minhas experiências, sobre o que, mais do que na teoria, se tornaram reais para mim, e até por isso nenhum de meus ensaios até hoje teve a pretensão de serem verdades absolutas. Sempre foram apenas o compartilhamento de meus conheci-mentos, minhas vivências, de forma muito simples e direta. Se, um dia, estes textos formarem capítulos suficientes para um novo livro, talvez os lance neste formato. Alguns deles eu penso em publicar em possíveis edições futuras da Nox Arcana, o que também é um projeto que está ainda em estudo.

16. O brasileiro comum não pode ser considerado um aficionado pelo bom hábito da leitura ou do estudo. Você tem planos de publicar seus trabalhos em outros idiomas fora de nosso país?

Infelizmente esta é uma triste realidade, que torna-se cada vez mais consolidada em nossa popu-lação. Vide a infinidade de grupos, websites, perfis, cheio de conteúdos “ctrl+C, ctrl+V”, que nem sequer dão-se ao trabalho de ler o que estão divulgando. Tirando aqueles que querem obter tudo pela lei do mínimo esforço, por meio dos demais, sem nem ao menos tentarem por si mesmos obter a informação. Numa era em que há tanto conhecimento facilmente acessível, encontramos o maior número de indiví-duos que não fazem o mínimo esforço para obtê-lo. Penso o quanto teria aproveitado se tivesse tido esta oportunidade quando iniciei neste caminho, mas ao mesmo tempo a experiência do contato pessoal, das superações que apenas foram possíveis pela presença de obstáculos, talvez não tivessemsido as mes-mas. Cada época com suas vantagens e desvantagens. Apesar de inicialmente ter os meus textos também em versão inglesa, acabei com o tempo não priorizando a divulgação para fora do país. Hoje penso que seria uma ideia interessante, até mesmo para ter mais contato com pessoas realmente interessadas no assunto, com diferentes visões e de diversas culturas, o que é sempre enriquecedor.

17. Se não me falha a velha memória novamente, o site For My Fallen Angel já teve uma versão traduzida para o inglês. Por que atualmente só temos a versão brasileira, em português, no ar?

Sim, a primeira versão do site teve sua tradução para o inglês no lançamento, por meio da con-tribuição de uma amiga. Inclusive recebi muitos contatos de pessoas de outros países na época, pois teve uma grande divulgação. Entretanto, novos textos foram sendo acrescentados aos poucos apenas em por-tuguês, ao invés de serem publicados em ambos os idiomas. Quando me dei conta, a versão inglesa estava totalmente desatualizada, e resolvi retirar do ar. Embora tenha domínio pleno sobre a leitura em língua inglesa, a minha escrita não acompanha tal aptidão, e traduzir todos os novos textos iria requerer além de bastante empenho, um revisor para os erros. Cheguei a pensar em compensar tal defasagem com a publicação do webzine Nox Arcana em inglês, por serem menos textos em cada edição, mas acabei de-sistindo da ideia por falta de tempo, já que havia iniciado concomitantemente uma nova graduação.

8. Há alguns anos tenho notado o surgimento de algumas vertentes sinistras, incluindo algu-mas demonólatras, que me parecem uma mera inversão de divindades dentro de uma estrutura extre-mamente similar às religiões ‘destras’ e de ‘massa’ (parece, em alguns casos, que só trocaram o deus entronizado). O que você pensa acerca dessas novas vertentes?

Difícil até de comentar, porque me deixa deveras indignada observar a inversão que é feita dos princípios da Via Sinistra e o aumento cada vez maior do número de adeptos destas “novas” vertentes. É exatamente o que você colocou: nada além da substituição do “deus”, contudo com a mesma menta-lidade servil. Lúcifer, exu e goéticos são colocados como seres de natureza extremamente bondosa, super preocupados com o bem estar humano e responsáveis diretos por todas as conquistas e acontecimentos que ocorrem na vida dos seus servidores, que só por adorá-los, já ganham estes créditos. Um deus que é uma mistura de chefe amigo, anjo da guarda, parceiro dos rolês e culto evangélico satânico. Extrema-mente ridículo. Estes grupos são formados por pessoas que possuem em si a mentalidade de rebanho, que precisam de líderes e deuses para seguir e responsabilizar pela vida que possuem. São dissidentes do cristianismo, originados com certeza de grupos renegados pela igreja, mas que possuem os mesmos valo-res fatalistas, escravistas e pestilentos que constituem a base desta. Esquecem que na LHP a principal e fundamental condição é a de se tornar um Deus, e não um pedinte ou escravo de um deus alheio. Que o Universo é caótico e não há nenhuma energia/ser/deus/demônio ou equivalente olhando por nós ou se preocupando em construir nossos destinos. Que é cada um por si. O máximo que pode haver são trocas, negociações realizadas para contemplar o interesse de ambos, mas que se um não oferecer, o outro não servirá de graça. A mente humana dificilmente consegue aceitar esta condição solitária e a dor de entrar em contato com sua própria sombra, destruindo os ideais de ego que vê em si. E desta forma, estes grupos conseguem prestar um desserviço ainda maior do que as organizações já institucionalizadas, pois trazem a filosofia de morte e servidão para dentro de uma vertente que tem como princípio justa-mente a quebra destas correntes, impostas a nós pela sociedade desde o nosso nascimento.

19. Quais personalidades mais influenciaram e influenciam você em sua senda pessoal? Por quê?

Talvez seja estranho o que vou responder, e ao mesmo tempo parecer caricato, mas não há per-sonalidades específicas que me influenciam. Eu creio que tudo e todos que passam por mim deixam sua marca, seja de maneira a absorver tais influências ou a refutá-las. Valorizo cada uma de forma igual, pois me construo e me fortaleço com ambas. Poderia citar uma lista de autores clássicos e respeitados, e fazer uma média como intelectual, mas a contribuição deles para mim é tão grande quanto a de alguém que conheça pessoalmente ou esteja convivendo e admire por suas ações, superações e conquistas no dia-a-dia. Sou muito observadora, e por ser extremamente crítica comigo mesma, o contatocom o outro me instiga a me questionar sobre mim, meu caminhar, a colocar em prova o valor de minhas “verdades”, e é neste momento que as teorias se unem com as práticas, e tanto Jung quanto um anônimo, se tornam grandes influências para meu crescimento pessoal.

20. Atualmente, como você analisa as manifestações relacionadas ao luciferianismo, à Via Si-nistra e ao saber arcano em nosso extenso Brasil?

Analiso em grande parte com tristeza, e muita desconfiança dos rumos que irão tomar, pelos motivos que explanei anteriormente. Lógico que não é uma generalização, pois embora a maior parte está brincando de doces ou diabruras, estou observando muitos indivíduos e a permanência e/ou con-solidação de grupos que parecem realmente interessados e sinceros, cada emsuas particularidades, na desconstrução do que está sendo propagado de forma distorcida como LHP e Luciferianismo em nosso país, e que estão trazendo novamente vida para esta Via. Mas em minha opinião, a Via Sinistra sempre será muito restrita, e percorrida por poucos, pois ela exige o completo enlance com a própria Escuridão, o sacrifício de hábitos, fraquezas e crenças, a capacidade de reconhecer-se no Espelho como sendo o único responsável por suas próprias colheitas, sejam elas boas ou ruins, a capacidade de morrer e renascer constantemente. Estas são exigências perturbadoras e que podem levar à loucura aqueles que não tiverem norteado uma diretriz e que não possua Vontade suficientemente forte para percorrer o caminho, que embora pareça cheio de espinhos, é o mais prazeroso que se pode obter em vida. Embora isso sempre foi assim, só que atualmente a facilidade da comunicação veio a evidenciar e com isso facilitar a identi-ficação e manifestação das ovelhas que se proclamam lobos. Mas jamais deixará de existir manifestações genuínas por aqui.

1. Qual é a lista dos 11 livros fundamentais que você recomendaria aos nossos leitores?

Não estão em ordem de preferência, pois estarei colocando aqui conforme for lembrando, mas todos de alguma maneira foram fundamentais em alguma época da minha vida, mesmo que hoje não tenham mais tanto significado. Nem todos estão relacionados ao Ocultismo, mas lá vai a lista de alguns livros que foram essenciais no meu processo:

Nightside of Eden –Grant
Grandes Contos –Lovecraft
Magick (Book 4) –Crowley
O Homem e seus Símbolos –Jung
A Bíblia Satânica –LaVey
Liber Null &Psiconauta –Carroll
Magus –Barrett
A Virtude do Egoísmo –Ayn Rand
O Ponto de Mutação –Capra
A Goetia Ilustrada de Aleister Crowley –DuQuette
Anatomia da Psique –Edinger

22. Eu fiquei extremamente lisonjeado por você ter concedido essa breve entrevista à pasqui-nada Lucifer Luciferax. Meus mais sinceros cumprimentos e agradecimentos! Por fim, qual mensagem você gostaria de deixar registrada aos nossos estimados leitores?

Eu que agradeço a oportunidade, e tenha certeza que o sentimento é recíproco! Gostaria de agradecer aos leitores pelo apoio que sempre recebi, pelos amigos que fiz através destes meios virtuais, e deixar um trecho do prefácio do livro Lux Aeterna para que os mesmos possam refletir: “Somos tão poucos e somos tão diferentes em meio a uma multidão ignorante e moldada. Por isso somos muitas vezes incompreendidos e condenados: pelo simples fato de lutarmos para sermos nós mesmos, e não mais uma marionete neste grande teatro que é a humanidade. (…) pare e pense sobre o que você está fazendo de você nesse momento. Tire a máscara diante do espelho e veja a si mesmo. E procure refletir a imagem mais bela que você pode ter, que é a de quem realmente você é”.

Deixe um comentário

Traducir »