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Magia Sexual

O Calvário da Razão

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Por Maria de Naglowska, Capítulo Sétimo de A Luz do Sexo.

Eles serão dois para serem completos, mas não se entenderão porque não são perfeitos.

HANOUM*24 1

Nós lhe dissemos, Ó discípulo, que você escalará primeiro o Calvário da Razão.

Nós lhe dissemos que nenhum Iniciado pode servir a Deus se ele não tiver servido primeiro a Satã†25 até que ele chegue à Cúpula.

Se você entendeu os ensinamentos contidos nos capítulos que precedem este intitulado “O Calvário da Razão”, podemos lhe dizer mais.

Ouça bem, e não seja um idólatra.‡26

Como mostra o símbolo que você acabou de ver e sobre o qual o convidamos a meditar longamente, o homem em quem a Razão não é muito forte não é nem Branco nem Negro. Ele é cinzento. Nele o Coração é dominante, o Coração que aceita todas as gotas de sangue sem distinção.

Tal homem pertence à multidão, e como a multidão, ele gosta ou detesta, mas nunca raciocina.

A tal homem (e existem legiões!) nada pode ser dito, porque ele não discerne nada. Pode-se tocar seu Coração, então ele obedece cegamente, pois lhe parece que se está lhe oferecendo o que ele quer. Pode-se chocá-lo, então ele fica irritado, pois lhe parece que se deseja impor-lhe algo que ele não gosta.

Essencialmente, um homem assim – o homem da multidão – não difere da mulher comum, daquela a quem chamamos de cega. Como ela, ele não serve a Satã (a Negação da Vida) nem a Deus (a Afirmação da Vida) em particular.

Ele é a arena inconsciente da luta eterna do Sim e do Não, o mesmo que os animais, o mesmo que as plantas.

E ele é incoerente e harmonioso ao mesmo tempo, como tudo o que compõe o Universo.

É neste sentido que ele obedece a Deus (obedecer não é servir!), pois ao não acentuar nem o Branco nem o Negro, ele flui, como todas as gotas que compõem o dilúvio humano, em direção ao Oceano do qual ele não tem conhecimento.

E temos dito desde o início deste livro que todo rio humano deve permanecer em seu canal.

Ele deve, porque para que o Ângulo Universal se reforme no instante pré-determinado, contribuindo assim para a eterna re-formacão do Triângulo, é necessário que todo o fluxo humano (exceto as perdas inevitáveis) se curve sobre si mesmo no mesmo instante, na mesma época.

É necessário, porque essa é a Vontade do Mais Forte, a Vontade de Deus (= Vida). De nada lhe servirá se opor à Lei do Mais Forte.

Mas a mesma Lei, que deseja isso, deseja também que haja uma alavanca na hora da manhã do Despertar.

Os Iniciados formam esta alavanca. É por isso que os Iniciados são necessários.

Se não fosse necessário, não teríamos recebido a ordem para escrever este livro. Pois o que revelamos aqui não é para a multidão, mas somente para os eleitos, para aqueles adultos que merecem saber de onde eles vêm e para onde vão.

Você é um deles, você, Ó discípulo, que está agitado por estas coisas? Examine sua consciência. Você pertence àqueles que, cansados de pertencer à multidão medíocre do profano, começam resolutamente por caminhos perigosos?

Você não saberá de antemão onde está o objetivo, mas lhe será dito imediatamente que lá em cima o Enforcamento o espera, pois a rosa floresce para que sua semente possa cair.

Você sente em si mesmo esta devoção louca?

O instante de sua resolução lhe pertence; o resto pertence a Deus (Sim – Não – Sim).

Se, por outro lado, você está se enganando, se sua coragem nada mais é do que vaidade, o sono o levará novamente e você será, na multidão, um descontente profano.

Mas que seja feita a sua vontade! Escute bem.

Quando uma pessoa adulta, digna de saber de onde vem e para onde vai, reconhece que a multidão cinzenta é como uma floresta selvagem sem saída, ele é tomado pelo medo e grita, como fez Dante, “Perdi meu caminho”!

Nel mezzo del cammin di nostra vita

M’ incontrai per una selva oscura

Chè la diritta via era smarrita

 

Tradução:

 No meio da jornada de nossa vida

Me encontrei em uma floresta escura

Pois o caminho reto foi perdido

A partir desse momento, ele se encontra contra a floresta selvagem, a multidão cinza, e naturalmente ele se revolta contra Deus (= Vida). Ele então pergunta a sua mãe: “Por que você me deu à luz?”.

Dito isto, ele se encontra fora do círculo vicioso da vida habitual, onde o Sim e o Não se misturam na harmonia contraditória da Continuidade, protegida pelo escudo da Lei, e nele o Não ganha vantagem.

Satã*27 então toma posse de sua força vital, submete-a a seu próprio poder negativo, e acende dentro do Homem rebelde o formidável Fogo do Ouro Negro.

Este Fogo queima tudo e espalha um odor de enxofre. É a base da magia por meio da qual o Homem, libertado das correntes da multidão, trabalha o Bem ou o Mal à vontade.

O Fogo Satânico queima na cabeça do Homem, que então absorve todas as forças distribuídas por todo o seu corpo e mais particularmente aquelas dentro de seu sexo.

Todo o Sol armazenado na haste alada do Homem converge então para o topo de sua cabeça, e se Deus (= Vida = Sim) o abandonasse, logo o Homem Livre não seria mais, ou seria apenas na medida em que ele se tornaria uma perfeita localização de Satã (= Não).

Isto é certamente o que o Espírito do Mal, o Espírito da Negação, vem buscando há tanto tempo quanto o mundo é mundo.

Mas igualmente desde que o mundo é mundo, o Sim vem combatendo o Não: em todos os lugares, de uma maneira geral, e em particular onde predomina o Não.

Vendo que o Homem, libertado das correntes da multidão, começou pelos perigosos caminhos da montanha iniciática, a Vida (= Deus) se apressa diante dele e barra a passagem.

Então, da floresta selvagem, animais simbólicos correm para cima e tentam o Iniciado… Discípulo, você que deseja nos ouvir, aprenda isto: as “tentações” vêm de Deus e não de Satã.

Você já viu, no Egito (terra de sofrimento iniciático), os quatro elementos que compõem a Esfinge: o Corcel, o Leão, a Águia e a Mulher? Seus professores lhe deram a chave para esta sábia composição? Eles já lhe disseram que estes quatro, que separadamente simbolizam as quatro grandes provas sucessivas às quais alguém submeteu os “candidatos” naquele distante tempo dos mistérios de Ísis, juntos são o canto do Chamado à Ordem da Vida (= Deus)?

Você já entendeu que o Homem que é levado pela influência de Satã não precisa de testes para chegar à Cúpula? A Vontade do Não é reta como a do Sim, mas é a luta entre os dois que torna os caminhos tortuosos. Em cada etapa – Corcel,*28 Leão, Águia, Mulher – você se torna novamente a arena, e dois Mestres lutam dentro de você. Mas você é uma arena viva, e pode, se desejar, favorecer um ou outro dos dois combatentes.

Se você se pavoneia no Corcel e o dobra às suas ordens, Satã é vitorioso em você e Deus (= Vida) vencido.

Se você subjugar o Leão e escapar de suas garras, ainda é Satã que se regozija.

Se, como a Águia, você se eleva aos Céus e fixa com seus olhos o rosto deslumbrante do Sol, é o Não que triunfa em você, pois então você viu a Vida (= Deus), e você se fez igual a Ela, a Mulher, que Deus se opõe a você para que o Universo continue.

Nas escolas iniciáticas, que mantêm “a Tradição” nas épocas conturbadas da Noite do Tempo, como aquela em que estamos vivendo neste momento, as formas subsistem, mas o sentido se perdeu.

É por isso que não se sabe mais onde está Satã, onde está Deus, onde está a vida misturada destas duas formas.

Não se sabe mais o que é pureza e, sobretudo, não se sabe mais por que ela é necessária.

Agora, pela luz de nossos ensinamentos, discípulo ansioso, você está começando a ver claramente.

Você está começando a compreender que, para poder ajudar Deus (= Vida) a se re-formar à Meia-Noite – e agora é Meia-Noite – o Ângulo da Salvação, o Ângulo que curva o rio humano sobre si mesmo, fazendo-o formar o Triângulo Eterno, você deve primeiro seguir Satã nos caminhos de seu Calvário. Você deve adquirir a Pureza Negra, intensificando-a incessantemente até a formação do Crescente Lunar em sua testa.

O grande Moisés fez o mesmo e, no Monte Sinai, formaram-se dois chifres acima de sua testa: a Lua da Aceitação.

Falaremos mais tarde deste mistério, que explica o Rito do Enforcado (décimo segundo arcano do Tarô), mas por enquanto concentre sua atenção no primeiro dos Quatro Testes, o Teste do Corcel.

Notas:

  1. Maria de Naglowska, “Une Séance Magique,” La Flèche 12 (May 15, 1932): 2–3.

*24. Hanoum, ou F. Hanoum, é outro pseudônimo de Maria de Naglowska. Digo isto apesar das descrições pessoais imaginárias dadas em “Une Séance Magique”, La Flèche Organe d’Action Magique.

†25. Naglowska já disse que Satã = Motivo, presumivelmente a interpretação aqui.

‡26. Esta é a abreviação de “Não imagine Satã como vivendo fora de si mesmo”.

*27. O Negador da Vida dentro de nós.

*28. No simbolismo de Naglowska, o Corcel Branco sempre representa a energia sexual. Como ela assinalou, é um veículo que pode levar uma pessoa longe, mas deve ser controlado e devidamente dirigido.

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Fonte:

Naglowska, Maria de. The Light of Sex. New York: Inner Traditions International, 2011.

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Texto adaptado, revisado e editado por Ícaro Aron Soares.

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