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Magia do Caos

Três formas diferentes de fazer sigilos

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Trechos selecionados de Magia Pós-Moderna de Patrick Dunn

Tradução Paulo Ricardo Krahan

O que acontece quando não podemos encontrar um símbolo para o nosso objetivo desejado, ou todos os símbolos que encontramos parecem carregar algo estranho que não queremos? Quando isso acontece na linguagem, cunhamos uma palavra ou tomamos emprestado uma de outra fonte. Para descrever as novas máquinas que poderiam fazer cálculos com mais rapidez e confiabilidade do que qualquer dispositivo anterior, criamos a palavra “computador”. Para descrever a rede mundial que conecta esses computadores, criamos a palavra “Internet”. Na magia, temos uma opção similar disponível para nós: podemos cunhar novos símbolos. O único requisito é que, de alguma forma, tenhamos que conectar o símbolo, pelo menos em nossas próprias mentes, ao nosso desejo. Nós chamamos esse símbolo construído de “sigilo”.

O sigilo é uma representação gráfica abstrata de um desejo. Ele não lembra, de maneira alguma, conhecida ou tradicional, o desejo, mas ainda está simbolicamente ligado à mente do mago que o fez. Pode vir de elementos icônicos – um desenho de um carro novo para representar um carro desejado – ou pode vir de imagens completamente abstratas. Existem três maneiras de fazer sigilos (embora eu imagine que um leitor inteligente possa produzir mais).

O primeiro e mais comum método é abstrair o sigilo das formas das letras encontradas em uma sentença de desejo, ou a forma de uma palavra expressando a significação desejada. Basicamente, isso resulta em um monograma complexo, mas não se pode prontamente reconstruir a sentença do desejo a partir do próprio símbolo. O processo para criar um sigilo abstrato a partir de formas de letras é muito fácil.

Sigilos Monogramas

Escreva uma sentença clara de desejo ou uma coleção de palavras associadas a um desejo. Se você quer um carro novo, por exemplo, você pode escrever: “Eu vou ter um carro novo”. Então, elimine letras repetidas; não é necessário escrever a mesma letra várias vezes no mesmo sigilo. Isso nos deixa com “EUVOTRMCARN”. Combine as letras graficamente – você pode torcê-las, usar fontes diferentes, desenhá- las em tamanhos desproporcionais e assim por diante. Quando você tem o monograma complexo, você pode simplificá-lo da maneira que quiser. Você não precisa se preocupar em manter intactos todos os elementos de todas as letras. As letras apenas ajudam você a começar o processo de design.

Fig 2.1:  Sigilo em Monograma

Sigilos Icônicos

O segundo método é abstrair o sigilo de um desenho simbólico e icônico. A coisa mais importante a lembrar quando se trabalha com este método é abstrair suficientemente o sigilo, para que nenhum elemento de um link simbólico perceptível seja visível. Ninguém, muito menos o mago, deve ser capaz de olhar para o sigilo pessoal de alguém e dizer, com base apenas na forma, que representa qualquer desejo dado. Embora eu tenha ouvido falar de algumas pessoas tendo sucesso com um símbolo puramente icônico, como a fotografia de um carro novo, o detalhe de uma imagem tão icônica pode interferir na nossa capacidade de nos conectar simbolicamente com o desejo. Essa abstração é fácil de fazer se, como eu, é um mal desenhista.

Vamos imaginar que você queira desenvolver a coragem como uma virtude. Considere o que representa “coragem” para você, algo facilmente visualizavel. Não se pode traçar uma imagem de coragem, mas é possível tirar uma foto de um leão, ou de uma mãe protegendo seus filhos, ou de um soldado enfrentando o fogo inimigo. Sem pensar muito nisso, desenhe rapidamente a imagem. Desenhe de novo e de novo, até que você mal possa enxergar a ilustração original. Esta peça de arte abstrata é o seu sigilo.

Fig. 2.2: Sigilo icônico

Sigilo Intuitivo

O terceiro método requer que o mago construa o desejo na imaginação e deixe que ele se abstraia em um sigilo. Isso tem alguma relação com a prática da glossolalia, na qual um sentimento (geralmente religioso) se expressa como uma palavra “absurda”. Essa prática é conhecida por outros nomes como “língua bárbara”,  “palavra de poder” ou – entre os crentes como – “falar em línguas”. A prática da glossolalia por si só é uma alternativa aos sigilos pictóricos. Isso prova que os sigilos podem se formar na mente ou existir em um plano verbal.

Esse tipo de sigilo pode ser muito poderoso e raramente tem qualquer ligação óbvia com seu desejo. Além disso, esses sigilos podem expressar desejos infinitamente detalhados sem se limitarem à arte ou à palavra usada. Isso prova que se pode fazer um sigilo para qualquer coisa que se possa imaginar.

Para usar este método, o mago deve ter uma idéia forte do objetivo desejado em mente ao criar o sigilo. A maneira mais fácil de fazer isso é usar o método surrealista de desenho automático, no qual você deixa sua mão rapidamente esboçar a imagem enquanto imagina a situação emocional que você deseja que o sigilo simbolize. Por exemplo, se você quiser curar um amigo, poderá visualizá-lo em perfeita saúde, ao mesmo tempo em que evoca sentimentos de amor e compaixão. Segurando esses pensamentos, deixe sua mão trabalhar por conta própria. O sigilo estará naturalmente ligado à visualização sem mais nenhum trabalho de sua parte.

Fig. 2.3: Sigili Intuitivo

Para aqueles que os usam com frequência, fazer um sigilo é apenas o começo de um longo processo no qual o sigilo ganha maior significado simbólico na prática pessoal. A. O. Spare, o inventor da técnica do sigilo, defendeu a contemplação ativa de um sigilo no momento da “vacuidade”. Esse estado de vazio parece corresponder ao silêncio da mente, por exemplo, no momento do orgasmo ou durante a meditação intensa. Consequentemente, muitos magos se masturbam com seus sigilos para “carregar”, “implantar”, “ativar” ou “disparar”. Ou, eles infligirão sobre si mesmos algum outro estado alterado de consciência – chamado de “gnose” pelos magos do caos – através da dor, esforço, exaustão, sufocação ou, muito menos comumente, meditação.

Eu sou suspeito dessas técnicas. Eu acho que o ato de alcançar essa gnose é provavelmente um contraponto estético ao sigilo. Pode-se, ao que parece, queimar facilmente o sigilo e ter um cheeseburger se tais ações proporcionarem para você um sentido apropriado de drama e poder. As técnicas de gnose funcionam, mas muitas vezes simplesmente fazer um sigilo com a intenção apropriada funciona igualmente bem.

Por que as coisas são assim eu tenho apenas uma vaga ideia… Costumo acreditar, como já expliquei, que a realidade é fundamentalmente simbólica, pois tudo o que percebemos é, na verdade, uma dança colaborativa de vários símbolos, que são essencialmente sem sentido em si mesmos. Um símbolo pode receber qualquer significado, qualquer espaço semiótico, e isso tende a reestruturar a realidade.

Em última análise, não importa por que a magia funciona, porque a magia funciona; e funciona com facilidade notável. O que me leva a outro ponto: a magia é em si muito, muito fácil. Ela consiste simplesmente em fazer propositalmente o que o cérebro humano faz todos os dias, isto é, perceber e manipular símbolos. Magia só é difícil porque requer que percebamos e manipulemos símbolos que a maioria das pessoas nem sequer admite existir.

Ser um grande mago tem muito mais a ver com ser um ser humano competente do que com o domínio da magia. Mais precisamente, há mais mágica em ser um ser humano descente do que em distorcer a natureza fundamental e simbólica da realidade.

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