Categorias
Magia do Caos

Pornografia – Caos: Panfletos do Anarquismo Ontológico

Leia em 3 minutos.

Este texto foi lambido por 88 almas essa semana.

Na Pérsia eu vi que a poesia é feita para ser musicada e cantada – por uma razão simples – porque funciona.

Uma combinação perfeita de imagem e melodia coloca o público num hal (algo entre um estado de espírito emocional/estético e um transe de supraconsciência), explosões de choro, impulsos de dança – uma mensurável resposta física à arte. Para nós, a ligação entre poesia e corpo morreu junto com a época dos bardos – lemos sob influência de um gás anestesiante cartesiano.

No norte da Índia, mesmo a recitação não-musical provoca barulho e movimento, todo bom verso é aplaudido, “Bravo!” com elegantes movimentos de mãos, e rúpias são lançadas – enquanto nós ouvimos poesia como um daqueles cérebros de ficção científica em um vidro – na melhor das hipóteses, um sorriso amarelo ou uma careta, vestígios dos rituais símios – o resto do corpo longe, em algum outro planeta.

No Oriente, às vezes os poetas são presos – uma espécie de elogio, já que sugere que o autor fez algo tão real quanto um roubo, em estupro ou uma revolução . Aqui, os poetas podem publicar qualquer coisa que quiserem – o que em si mesmo é uma espécie de punição , uma prisão em paredes, sem eco, sem existência palpável – reino de sombras do mundo impresso, ou do pensamento abstrato – um mundo sem risco ou eros.

A poesia está morta novamente – e mesmo que a múmia do seu cadáver possua ainda algumas de suas propriedades medicinais, a auto-ressureição não é uma delas.

Se os legisladores se recusam a considerar poemas como crimes, então alguém precisa cometer os crimes que funcionem como poesia, ou textos que possuam a ressonância do terrorismo. Reconectar a poesia ao corpo a qualquer preço. Não crimes contra o corpo, mas contra Idéias (e Idéias-dentro-das-coisas) que sejam letais e asfixiantes. Não libertinagem estúpida, mas crimes exemplares, estéticos, crimes por amor.

Na Inglaterra, alguns livros pornográficos ainda estão banidos. A pornográfica produz um efeito físico mensurável em seus leitores. Como propaganda, ela às vezes muda vidas por revelar desejos secretos. Nossa cultura gera a maior parte de sua pornografia motivada pelo ódio ao corpo – mas, como em certas obras orientais, a arte erótica em si mesma cria um veículo elevado para o aprimoramento do ser/consciência/glória. Um espécie de pornô tântrico ocidental poderia a judar a galvanizar os cadáveres, fazê-los brilhar com uma pitada de glamour do crime.

Os Estados Unidos oferecem liberdade de expressão porque todas as palavras são consideradas igualmente insípidas. Apenas as imagens contam – os censores amam cenas de morte e mutilação , mas horrorizam-se diante de uma criança se masturbando – para eles, aparentemente, isso é uma invasão de seu fundamento existencial, sua identifica¸ cão com o Império e seus gestos mais sutis.

Sem dúvida, nem mesmo o pornô mais poético faria o cadáver sem rosto reviver, dançar e cantar (como o pássaro do Caos chinês) – mas… imagine o roteiro de uma filme de três minutos ambientados numa ilha mítica povoada por crianças fugitivas que moram nas ruínas de antigos castelos ou em cabanas-totens e ninhos construídos com detritos – uma mistura de animação , efeitos especiais, computação gráfica e vídeo – editado de forma compacta, como um comercial de fast-food…

… mas insólito e nu, penas e ossos, tendas abotoadas com cristais, cachorros negros, sangue de pombos – vislumbres de membros cor de âmbar enrolados em lençóis – rostos, cobertos por máscaras cheias de estrelas, beijando dobras macias de pele – piratas andróginos, faces abandonadas de colombinas dormindo em altas flores brancas – piadas sujas de se mijar de tanto rir, lagartos de estimação lambendo leite derramado – pessoas nuas dançando break – banheiras vitorianas com patos de borracha e pintos cor-de-rosa – Alice via jando no pó…

… punk reggae atonal para gamelão, sintetizadores, saxofones e baterias – boogies elétricos cantados por um etéreo coro de crianças – antológicas canções anarquistas, um misto de Hafiz[20] & Pancho Villa, Li Po[21] e Bakunin, Kabir[22] e Tzara – chame-o de “CHAOS – The Rock Video!”

Não… provavelmente é só um sonho. Muito caro para produzir e, além disso, quem o assistiria? Não as crianças a quem ele gostaria de seduzir. A TV pirata é uma fantasia fútil; o rock, outra mera mercadoria – esqueça o gesamtkunstwerk[23] malandro, então. Inunde um playground com obscenos folhetos inflamatórios – propaganda pornô, excêntricos manuscritos clandestinos para libertar o Desejo dos seus grilhões.

Hankim Bey

Deixe um comentário

Traducir »