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Hino à Matéria

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Teihard de Chardin (1881-1955)

Bendita sejas, áspera Matéria, gleba estéril, duro rochedo, tu que só à violência cedes e nos forças ao trabalho quando queremos comer.

Bendita sejas, perigosa Matéria, mar violento, paixão indomável, tu que nos devoras se não te acorrentamos.

Bendita sejas, poderosa Matéria, Evolução irresistível, Realidade sempre nascente, tu que a todo o momento, fazendo em pedaços os nossos padrões, nos obrigas a perseguir a Verdade até cada vez mais
longe.

Bendita sejas, universal Matéria, Duração sem limites, Éter sem margens, triplo abismo das estrelas, dos átomos e das gerações, tu que, excedendo e dissolvendo as nossas medidas estreitas, nos revelas as
dimensões de Deus.

Bendita sejas, impenetrável Matéria, tu que, em toda a parte entre as nossas almas e o Mundo das Essências, nos deixas vencidos pelo desejo de penetrar o véu sem costura dos fenómenos.

Bendita sejas, mortal Matéria, tu que, ao te dissociares em nós um dia, nos introduzirás, pela força, no próprio coração daquilo que é.

Sem ti, Matéria, sem os teus ataques, sem os teus assaltos, viveríamos inertes, estagnados, pueris, ignorando-nos a nós próprios e a Deus. Tu que feres e que tratas a ferida, tu que resistes e que cedes, tu que alteras e que constróis, tu que acorrentas e libertas, Seiva das nossas almas, Mão de Deus, Carne de Cristo, eu te bendigo, Matéria.

Eu te bendigo, Matéria, e te saúdo, não como te descrevem, reduzida ou desfigurada, as autoridades da ciência e os pregadores da virtude, um feixe, dizem eles, de forças brutais ou de apetites baixos, mas tal
como me apareces hoje, na tua totalidade e na tua verdade.

Saúdo-te, inesgotável capacidade de ser e de Transformação onde germina e cresce a Substância eleita.

Saúdo-te, força universal de aproximação e de união, através da qual se reunifica a multidão das mónadas e na qual todas elas convergem no caminho do Espírito.

Saúdo-te, origem harmoniosa das almas, cristal límpido de onde sai a Nova Jerusalém.

Saúdo-te, meio divino, carregado de Força Criadora, Oceano agitado pelo Espírito, Argila amassada e animada pelo Verbo incarnado.

Crendo obedecer ao teu apelo irresistível, os homens precipitam-se muitas vezes por amor de ti no abismo exterior das satisfações egoístas. Engana-os um reflexo, ou um eco. Vejo-o agora. Para te atingir, Matéria, é necessário que, partindo de um contacto universal com tudo o que aqui em baixo se move, sintamos pouco a pouco desvanecer-se entre as nossas mãos as formas particulares de tudo o que detemos, até ficarmos a braços apenas com a essência de todas as circunstâncias e de todas as uniões.

É preciso, se te quisermos ver, que te sublimemos na dor depois de te termos tomado voluptuosamente nos nossos braços.

Tu reinas, Matéria, nas alturas serenas onde os Santos imaginam evitar-te, Carne tão transparente e tão móvel que já não te distinguimos de um espírito.

Transporta-me para o alto, Matéria, pelo esforço, pela separação e pela morte, transporta-me até onde seja enfim possível enlaçar castamente o Universo!

Jersey, 8 de Agosto de 1919

 

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