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Fúria Periódica – a volta dos alquimistas

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Muitos de nós tem uma vida onde momentos de horror são intercalados por períodos de stress. Muitos de nós encontramos monstros enquanto ainda somos jovens que mal atingiram a puberdade. Este período de trevas e medo deixarão marcas, cicatrizes e distúrbios que nos atormentarão pelo resto de nossas vidas enquanto outros, simplesmente serão engolidos pelo nosso subconsciente, numa tentativa de poupar uma mente já em frangalhos de perder o pouco da razão que ainda lhe resta. Dos monstros que nos atormentam, poucos são tão cruéis e assustadores quanto a Tabela Periódica.

Aparentemente criada por algum tipo de sádico sem vida (nem social nem sexual), ela aparenta não passar de um lego infernal em duas dimensões. Semanas gastas tentando se decorar acrônimos, que seriam transformados em colunas de letras e, então, reproduzidos em nomes de elementos que nem sempre eram escritos com as letras que os representavam.

Quantos adolescentes não respiraram com alívio quando perceberam que, tirando um possível susto no vestibular, jamais teriam que se preocupar com aquelas janelas quadradas e vazias de pestilência? Quantos de nós não suspiraram pensando “finalmente me livrei daquela coisa inútil”. Inútil de fato, afinal, que utilidade prática pode ter aquela coleção de sílabas e letras Lovecraftianas, cercadas por números que representam um universo que dificilmente tocará o nosso futebol de cada dia, nossos chops gelados, nossos afazeres profissionais? Química não passa, afinal, de uma gíria que usamos quando queremos indicar alguém que provavelmente se revelará uma boa trepada, “rolou uma química entre nós”, e o máximo que chegamos de repetir os experimentos daquele laboratório, que não passava de um suprimento inesgotável de formol para os alunos sem perspectiva, é jogar o miojo na água fervendo e então acrescentar o conteúdo do envelopinho prateado. E então podemos respirar aliviados e ir assistir ao último episódio de Breaking Bad.

Tolo mortal!!!

O domínio da Química tem um papel sem igual dentre as ciências no tocante de entender e controlar o mundo a nossa volta. Sem ela não teríamos uma infinidade das facilidades que temos hoje como aspirinas (C9H8O4), anfetaminas (C9H13N) e anticoncepcional (C20H26O2). Nem mesmo poderiamos tomar um cafezinho (C8H10N4O2). Da tecelagem à construção civil não existe nenhuma atividade humana que não tenha sido revolucionado por ela.  A Química nos ajudou a entender a biologia e a física nos seus níveis mais fundamentais. Por meio dela são desenvolvidos novos remédios e métodos de tratamento que têm prolongado a vida de muitas pessoas; na agricultura tem permitido uma produção mais farta de alimentos, entre muitos outros aspectos extremamente importantes. Ao contrário das religiões institucionalizadas o ocultismo sempre teve um fascinio próprio pela matéria e suas transformações, que se espelha, por exemplo no tradição da Alquimia.

É por isso que a Tabela Periódica não foi criada por um santo, profeta ou por uma revelação divina, mas por uma série de malucos, sádicos, eunucos, nerds e sociopatas ao longo da história.

Antoine Lavoasier foi um dos primeiros deles sendo por isso frequentemente chamado de o “Pai” da química moderna. Talvez chamá-lo de pai seja um exagero, mas não é exagero dizer que ele fez com a química o que o Newton fez com a física. Ele foi o primeiro cientista a enunciar o princípio da conservação da matéria, identificou e batizou o oxigênio, sistematizou o uso da balança, refutou a teoria flogística. Ao descobrir a composição química do ar e da água, Lavoisier deu um fim a teoria dos quatro elementos clássicos. Disso resultou também a publicação de seu ‘Tratado Elementar de Química’ em 1789 e sua importante participação na reforma da nomenclatura química, tomando como ponto de partida o conceito de ‘elemento químico’. Também um dos pioneiros da bioquímica, associou o calor animal ao produzido pelas combustões orgânicas dependentes do carbono e do hidrogênio, criou a medição calorimétrica e encontrou na combinação do oxigênio respirado com o ‘ar fixo’, proveniente do sangue, o mecanismo de conservação dos calor nos seres animais. Bom, talvez ele seja realmente o “Pai da Quimica.” Em 1789 puclicou uma lista com os 33 elementos químicos conhecidos na época, agrupando-os em substâncias simples, metálicas, não-metálicas ou terrosas. Quarenta anos depois, Johann Wolfgang Döbereiner observou que muitos dos elementos poderiam ser agrupados em conjuntos de três, com base em suas propriedades químicas, observando também que quando organizados por peso atômico o segundo membro de cada trio – ou tríade – tinha aproximadamente a média do primeiro e do terceiro. Como parece sempre acontecer, por não ter uma vida cheia de aventuras, peripécias e perigo, ao invés de inventar a arqueologia, Döbereiner inventou uma Lei científica, a lei das tríades.

Oitenta anos após a publicação da tabela de Lavoasier o número de elementos conhecidos não havia crescido muito: 49 – menos de um novo elemento por ano. Por décadas, mais e mais químicos olhavam para um punhado de elementos e tentavam encontrar uma lógica entre entre eles. Não se satisfaziam em simplesmente catalogá-los, queriam saber que padrão havia por trás daquelas substâncias que não podiam ser reduzidas ou simplificadas através dos processos químicos conhecidos na época. Foi apenas então que surgiu o que podemos considerar a Mãe de todos os horrores e maravilhas da era moderna. O mapa anatômico do mundo material. Pelas mãos do russo Dimitri Ivanovich Mendeleiev a tabela dos elementos se tornada periódica.

Dizemos que a tabela é periódica porque o Russo decidiu não apenas listar os elementos, mas organizá-los segundo uma ordem maior levando em conta não apenas sua massa atômica, mas também as propriedades químicas de cada elemento. Em uma noite especialmente estranha de 1869 Mendeleiev sentou-se, escreveu e recortou 63 cartões. Em cada um deles colocou o nome de um dos elementos conhecidos na sua época assim como seu pema coluna  so atômico e outras características. Então ele dispôs estas cartas em linhas e colunas e percebeu que podia organizar elas de modo que o peso atômico aumentásse conforme descesse, mas que os elementos de cada linha dividiam propriedades similares. Na primeira linha ele colocou o lítio seguido de berílio, boro, carbono, nitrogênio, oxigênio e flúor. Isso por si só foi genial, mas o lampejo de mestre foi notar que haviam as vezes lacunas vazias nesta tabela, o que apontava supostos novos elementos que ainda não eram conhecidos. Mendeleiev estava certo e ainda foi além. Ao estudar as tendências que sua tabela lhe revelava, ele foi capaz de predizer as propriedades desses elementos. Ele havia descoberto pegadas espalhadas pelo mundo elementar, restava seguí-las para ver quem as havia deixado para trás.

E foi então que começou a corrida atrás de novos elementos. Hoje 118 casas estão preenchidas, algumas ainda precisam ser devidamente batizadas, mas aparentemente todos os criptóides já foram apanhados e nós, que já deixamos a escola para trás trás podemos dormir em paz, deixando esse monstro de 118 olhos enterrado em nosso passado.

Ou não . Ainda hoje a tabela periódica vive a nos espreitar, a nos testar, a nos atacar de modo furtivo ou de forma violenta, e assim como o diabo, cuja maior astúcia foi a de nos convencer de que ele não existe, a cria de um químico russo já morto nos massacra diariamente de maneiras que sequer somos capazes de imaginar.  Ela é a cartografia necessária para qualquer pessoa que queira entender como o mundo funciona numa escala atômica. Como os elementos se organizam e interagem. Devemos lembrar ainda que destes elementos apenas 92 podem ser encontrados em estado natural. Os 26 elementos restantes são sintéticos, ou seja, foram produzidos a duras penas em laboratórios e alguns deles, mesmo depois de criados duram apenas alguns segundos.  Assim como seu irmãos naturebas eles possuem suas prórias características sendo, por exemplo, usados pela medicina e tecnologia nuclear. Além disso algumas pessoas dizem que a tabela ainda não está completa e que na verdade ela é composta de 144 elementos, ou seja em algum lugar entre os quintais do universo existem outros 26 elementos só esperando para ser batizados por seres humanos.

Isso serve para mostrar que a química é fruto do suor e do sangue de muitos homens e mulheres e esta será usada como base de uma nova alquimia.

Opa, espera ai! Você disse Alquimia??? Essa não era apenas uma metáfora simbólica sobre a evolução da alma?

Não, não apenas.

Realmente existe um lado místico e, quem sabe, espiritualmente evoluído na antiga tradição da alquimia medieval. Por nós, você pode jogá-la na privada e apertar a descarga. Estamos interessados na parte materialista da coisa. Pode ficar com o corpo cristalino, queremos dominar o mundo material e, se no processo, transformarmos chumbo em ouro tanto melhor – como brinde vamos conseguir foder a sua preciosa economia e o seu sagrado capitalismo.

O que poucos céticos modernos e discípulos de Dawkins entendem, é que a mudança de nome de Alquimia para Química, foi pouco além de uma estratégia de marketing. Os alquimistas medievais não foram os predecessores tolinhos dos químicos modernos, foram seus pais. Entre suas buscas experimentais estavam a transmutação dos metais para a criação artificial de ouro e prata e o elixir da longa vida. É bem verdade que em geral os alquimistas eram místicos e no começo não eram muitos científicos, certamente porque a própria Ciência não havia sido inventada. Na verdade coube aos próprios alquimistas inventarem o Método Científico. Roger Bacon, por exemplo era um alquimista, discípulo de Roberto de Grosseteste e escreveu um longo tratado sobre os metais.

Hoje existe uma tendência a retratar os alquimistas como ingênuos e fantasiosos, mas nada pode estar mais longe da verdade. Muitos alquimistas fizeram descobertas importantes que formaram a base da química moderna. Alberto Magno, discípulo de Jordão da Saxônia, conseguiu preparar a potassa caustica e a descrever uma série de compostos químicos como o do carbonato de chumbo e do mínioe. Raimundo Lúlio criou a fórmula do bicarbonato de potássio e descobriu o ácido azótico e os calomelanos. Paracelso identificou o zinco, pioneiro na utilização medicinal dos compostos químicos. Basile Valentin, cônego beneditino, descobriu os ácidos sulfúrico e clorídrico e dissertou sobre o antimônio, os vinhos e a aguardente. Jan Baptist van Helmont fundou o que hoje chamamos de química pneumática. Até Tomás de Aquino, doutor da igreja católica, escreveu largamente sobre o arsênico e dedicou uma parte de sua Summa Teológica para discutir se seria ética a venda do ouro artificial.

O rompimento drástico entre alquimia e química é uma propaganda moderna  que não condiz com a verdade. O que realmente houve foi uma evolução gradual. Muitas pessoas atribuem a publicação de “O Químico Cético” de Robert Boyle como o pontapé inicial desta mudança, e embora seu trabalho seja muito importante, tanto suas críticas como idéias já estavam presentes em publicações anteriores. Sua retomada do atomismo já constava entre as bandeiras levantadas por Pierre Gassendi e René Descartes.

Mas não é necessário contudo refazer os mesmos caminhos que todos os alquimistas anteriores percorreram. Eles já deixaram uma infinidades de setas indicando as muitas ruas sem saída que encontraram por ai. De suas incontáveis experiências nasceu um mapa preciso que hoje pode ser usado com segurança, nossa já mencionada Tabela Periódica:

Yeap, ok, ela é assustadora mesmo. E se torna ainda mais assustadora quando você sabe como ela deve ser lida.

Em primeiro lugar, cada quadrado representa um tipo de átomo. Nesta diagramação temos, de cima para baixo: seu número atômico, símbolo químico, nome, e massa atômica. O número atômico representa quantidade de elétrons na periferia de cada âtomo e a massa atômica representa o número de protons e neutrons em seu núcleo. Ou seja vendo a tabela sabemos que o hidrogênio (H) possui um único elétron (número atômico = 1 ) ao passo que o Urânio 9 (U) tem noventa e dois atômos elétrons ao seu redor. Também sabemos que o hidrogênio possui um único proton (número inteiro mais próximo) e o Urânio 238 núcleons, sendo 92 protons (igual aos elétrons) e portanto 146 neutrons. Pense nisso por alguns instantes… algum filho da puta realmente contou o número de subpartículas que formam a composição de cada átomo de cada coisa que existe no universo.

Quanto a organização da tabela precisamos adiantar que cada átomo é formado de no máximo 7 camadas elétrica, sendo que a primeira é composta de no máximo 2 e a última sempre de no máximo 8 elétrons. Assim pode-se entender que cada linha horizontal da tabela possui o mesmo número de camadas de elétrons. Ou seja, o hidrogênio e o hélio só tem uma camada, o lítio, berílio, boro, carbono, nitrogênio. oxigênio, fluor e neônio, duas, e assim vai… Além disso, cada coluna esta organizada de modo a mostrar que seus átomos possuem o mesmo número de elétrons na última camada.  Sabemos assim que o hidrogenio e o lítio tem um átomo sozinho na última camada enquanto que o boro e o alumínio possuem 13 eletrons na sua camada final. Você verá mais para frente como isso é importante na combinação entre átomos e na compreensão de todo o mundo químico.

Por favor, leia os dois parágrafos anteriores novamente. O saber que eles e a tabela trazem não é trivial. Hoje a tabela periódica é um conhecimento  que está ao alcance de todos, mas poucos sabem seu valor. A verdade é que esta tabela esconde um poder terrível sobre o mundo material. Entre os que sabem de seu poder estão as nações mais poderosas da terra, organizações militares, os magnatas da indústria farmacêutica e é claro, os traficantes e terroristas.Mas entre as pessoas os ocultistas foram os primeiros a investigarem os mistérios da matéria, e os bons ainda o fazem.

Os alquimistas voltaram.


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