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Maçonaria e Igreja – Passado e Presente

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1- Introdução

Embora não me considere a pessoa mais indicada para a desenvolvê-lo, julgo ser este um tema privilegiado para a elaboração de um trabalho, dado que provoca grande interesse tanto dentro como fora da Maçonaria.

Analisando a questão concluí que podemos partir de duas afirmações que parecem inquestionáveis, são elas:

* A Maçonaria foi muito próxima da igreja e da religião;
* Hoje a Maçonaria está muito distante das igrejas, mas, na grande maioria das lojas, ainda está próxima da religião.

Estas duas afirmações sugerem uma pergunta: -Por que este processo de distanciamento se deu?

Ao pesquisar o tema deparamo-nos facilmente com manifestações agressivas contra a Maçonaria emitidas por clérigos, religiosos e simpatizantes. Nestas circunstâncias nos ocorre uma segunda questão: -Qual o motivo desta agressividade para com a Maçonaria?

Foi com o objetivo obter alguma luz sobre estas duas questões que este trabalho foi escrito.

2- A Origem da Maçonaria: Próxima da Igreja

As referências

Qualquer um que tenha prestado mínima atenção aos ritos maçônicos perceberá com facilidade a grande quantidade de referências bíblicas contidas nestes. Ao se aprofundar um pouco o estudioso de assuntos maçônicos poderá verificar que aqueles que criaram os rituais certamente eram grandes conhecedores da Bíblia. Assim, a leitura da Bíblia é certamente uma forma de obter esclarecimentos sobre as origens de algumas referências muito constantes no meio maçônico. Alguns exemplos são os seguintes:

* A expressão “a Maçonaria é viúva”, ou os maçons são “os filhos da viúva”, é derivada do fato de que Hirão era filho de uma viúva (1 Reis, 7,14).;
* A nomenclatura dada às colunas pode ser encontrada nos livro dos Reis;
* Em Mateus no capítulo 1 lê-se: Livro da geração de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão. Estudando a genealogia pode-se constatar que Jesus descende de Salomão, seria Ele a quadragésima geração de Abraão. O nome de uma das colunas aparece nesta seqüência genealógica como um dos antepassados de Salomão e Jesus.

Construindo Catedrais

Outra conhecida evidência de proximidade é a história da maçonaria operativa. Estes maçons foram os mestres e os operários construtores da Idade Média, associados em guildas, foram os verdadeiros artistas que ergueram as majestosas catedrais românicas e góticas, os grandes castelos e as fortificações, verdadeiros monumentos arquitetônicos que ainda hoje podem ser admirados em tantas cidades da Europa. Por conseguinte, tinham a Igreja Romana como sua principal cliente.

Templários

No livro “Born In Blood: The Lost Secrets of Masonry [Nascida em Sangue: Os Segredos Perdidos da Maçonaria]” o historiador John J. Robinson demonstra as relações de origem da Maçonaria entre “Os Pobres Cavaleiros de Cristo”, que era como se autodenominavam os Templários, uma ordem militar eminentemente católica destinada a proteger os peregrinos que rumavam à Terra Santa. Relata também como esta ordem foi perseguida por reis e papas depois que amealhou grande riqueza.

Destas três relações de proximidade histórica podemos concluir que, com grande probabilidade, ou Maçonaria se originou do seio da Igreja ou dela recebeu enorme influência no seu início.


3- A visão das igrejas;


Católicos

A Igreja Católica tem uma longa história de manifestações oficiais condenando a Maçonaria. Desde o Papa Clemente XII, com a Constituição Apostólica de 1738, até nossos dias, a Igreja tem proibido aos fiéis a adesão à Maçonaria ou associações maçônicas. O Código de Direito Canônico de 1917 previa pena de excomunhão a quem ingressasse na Maçonaria. Após o Concílio Vaticano II, em 1963, houve quem levantasse a possibilidade de o católico, conservando a sua identidade, ingressar na Maçonaria. Para superar essa interrogação, um documento da Congregação para a Doutrina da Fé, com data 1983, esclarece que é vedado a todos católicos, eclesiásticos ou leigos, ingressarem nessa organização e quem o fizer, está “em estado de pecado grave e não pode aproximar-se da Sagrada Comunhão”. O novo Código de Direito Canônico, também de 1983, assim se expressa: “Quem se inscreve em alguma associação que conspira contra a Igreja, seja punido com justa pena; e quem promove ou dirige uma dessas associações, seja punido com interdito” (cânon 1374). Vale destacar que a Maçonaria é considerada uma destas associações que conspiram contra a Igreja. Ao todo existem na história mais de 15 condenações oficiais.

Abaixo transcrevo parágrafo da Encíclica Dall´Alto Dell´Apostolico Seggio, do Papa Leão XIII sobre a Maçonaria na Itália, que representa o teor do pensamento católico no passado:

“Agora é desnecessário colocar as seitas Maçônicas em julgamento. Elas já estão julgadas; seus fins, seus meios, suas doutrinas, e sua ação, são todos conhecidos com indisputável certeza. Possuídos pelo espírito de Satanás, cujos instrumentos eles são, eles ardem como ele com um ódio mortal e implacável a Jesus Cristo e Sua obra; e eles se esforçam por todos os meios para derrubá-la e acorrentá-la”.

Como manifestação individual recente de um eclesiástico católico poderíamos citar, entre vários outros autores de mesma origem que escrevem sobre a questão, Dom Boaventura Kloppenburg que, em sua obra “Igreja e Maçonaria: conciliação possível?” conclui no capítulo XI, que existe uma “frontal oposição de doutrinas” entre a Maçonaria e a Igreja católica, o que é motivo suficiente para a condenação da primeira.

Outras Igrejas

Pelo lado das igrejas evangélicas não há a unicidade de pensamento expressa pelo posicionamento de um poder central como o Vaticano. Estas igrejas, quando comparadas à Católica são muito fracionadas administrativamente e em sua visão teológica, além de possuírem um menor número de fiéis. No entanto, isto não impede que as frações mais organizadas manifestem-se formalmente acerca do assunto. Infelizmente, várias destas manifestações seguem a linha de pensamento dos católicos.

O padre Estevão Bettencourt em seu opúsculo “Por Que Não Sou Maçom?” relata detalhadamente que Metodistas Ingleses, Anglicanos, Luteranos americanos e cristãos ortodoxos possuem condenações oficialmente manifestadas à Maçonaria.

Manifestações de simpatizantes:
Se as igrejas, católica ou evangélicas, pelo menos em tempos mais recentes, apresentam um certo comedimento em suas condenações à Maçonaria, o mesmo não pode ser dito de seus seguidores e simpatizantes. Sejam estes de que origens forem, muitas vezes, demonstram-se fortemente agressivos e hostis à Maçonaria. A título de exemplo desta atitude reproduzimos abaixo algumas frases retiradas de “sites” mantidos por evangélicos e católicos na Internet:

* “Maçonaria… uma religião muito mal disfarçada! O fato que nos interessa aqui é comprovar aos olhos de todos que a maçonaria é exatamente o que os seus adeptos negam. Ela é um grupo religioso com propósitos espirituais bem definidos e contrários à Palavra de DEUS.” Instituto de Pesq. Teológicas (http://www.ipet.com.br/esot/mac_001.html);
* “Fontes Satânicas Afirmam Que os Cavaleiros Templários Eram Satânicos! Mais Evidência Que a Maçonaria Também Seja Satânica!” (http://www.jesussite.com.br/acervo.asp?Id=179);
* “O Sr.Fedeli informa-me que o Padre é membro da maçonaria ocidental, e que ambas as maçonarias estariam unidas nessa empreitada pois, assim como judeus e romanos uniram-se para crucificar o Cristo, agora também as forças maçônicas do oriente e do ocidente uniram-se movidas pelo interesse comum de impedir a vitória do ristianismo. ” (http://www.olavodecarvalho.org/textos/fedeli4.htm)
* Na “Scarants Home Page” (http://www.netpar.com.br/scarant/orare.htm) pode-se encontrar várias orações de renúncia a Maçonaria, uma entre as várias contidas no site é a seguinte: -“Pertenço” ao Senhor Jesus Cristo, corpo, alma espírito. Seu Sangue me protege de todo o mal. No nome de Jesus, confesso agora que tenho sido culpado do pecado de idolatria na Loja Maçônica (1Jo 1.9). Concordo com o Senhor, chamo a esse envolvimento de pecado, e peço-lhe para removê-lo completamente da minha e das vidas dos meus familiares”. No mesmo site é possível ler um pequeno texto explicando: “O papel da Maçonaria na existência do 666”, o número da Besta.

4- A visão da Maçonaria;

Depois de pesquisar, consegui obter muito pouco que represente especificamente uma posição pública e oficial da Maçonaria acerca da Igreja Católica ou das demais igrejas. Assim sendo, o que podemos mencionar são princípios gerais e postulados, iguais aos da Maçonaria Universal, respeitados por potências nacionais como o GOSP ou o GOB. Alguns destes referenciais parecem ser especialmente apropriados para orientar a posição nas controvérsias com igrejas e religiões. São eles, a Maçonaria:

* Afirma que o sectarismo político, religioso ou racial é incompatível com a universalidade do espírito maçônico. Combate à ignorância, a superstição e a tirania;
* Proclama que a tolerância constitui o princípio cardeal nas relações humanas;
* Defende a plena liberdade de expressão do pensamento;
* Supõe existência de um princípio criador, o Grande Arquiteto do Universo;
* Proíbe a discussão ou controvérsias sobre matéria político partidária, religiosa ou racial, dentro dos templos ou fora deles, em seu nome;

Independente das posições públicas das instituições maçônicas acerca das igrejas e das questões religiosas, devemos reconhecer o fato de que as relações inamistosas com a Igreja Católica, pelo menos no Brasil, decorrem de atitudes agressivas de ambas as partes. Isto ocorre de longa data. Na época da questão religiosa e nos anos seguintes (1872-1880) os ataques ao clero eram constantes, violentos e publicados no Boletim Oficial do Grande Oriente do Brasil (diga-se, a bem da verdade, que, nesta época, os ataques do clero aos maçons não eram menos constantes).

Este tipo de relação não se ateve a ataques verbais. O livro “O crime do padre Sório: maçonaria e igreja católica no Rio Grande do Sul” conta a história do espancamento, castração e morte do padre Antônio Sório em 1900. As razões que motivaram o crime misturam-se ao violento enfrentamento entre a Igreja Católica e a Maçonaria ocorrido no Brasil e mais especialmente no Rio Grande do Sul, nos primeiros 30 anos do século XX. Em meio à problemática local de uma comunidade de imigrantes, essa tese demonstra as complicadas relações de poder estabelecidas entre a Maçonaria e os governos do Partido Republicano Riograndense entre 1893-1928. Nesse mesmo período a Igreja Católica no Rio Grande do Sul, passa por um processo de grande centralização e reforma. Todos estes fatores são estudados para buscar compreender como se estabeleceu o discurso mítico, formulado pelos padres palotinos, responsabilizando a Maçonaria pelo crime cometido contra o Padre Sório, quando esta responsabilidade nunca chegou a ser provada.

Opiniões individuais

Vários são os maçons que se manifestam publicamente acerca da Igreja e das relações desta com a Maçonaria. Curiosamente nenhuma destas manifestações de que tomei conhecimento tem um caráter virulento e hostil como aquele manifestado por alguns católicos e evangélicos. Normalmente não há agressão e o teor tende a ser descritivo (consubstanciado em fatos), opinativo e analítico.

Para ilustrar transcrevo abaixo parte de um texto de autoria de Renato Brenner Napoleão -M.’. I.’. Loja Atlântica N° 15 publicada no Jornal “O Templário” em abril de 1998:

“A CNBB há alguns anos vem realizando com a presença de bispos e sacerdotes, bem como um grupo de maçons convidados, estudo cujo assunto principal era saber se a doutrina católica, era ou é compatível com a doutrina maçônica. Após inúmeras discussões, que duraram anos, os maçons não conseguiram obter nenhuma declaração favorável à maçonaria. Sempre esbarraram nos cânones do Vaticano, em vigor até hoje. Na última reunião, realizada no dia 13/10/1997, o tema conciliabilidade entre maçonaria e igreja católica foi abandonado e foi agendado: o simbolismo dos três primeiros graus, com interpretação católica e interpretação maçônica. Por tudo o que já foi apresentado documentadamente, preferimos concordar com o Padre Jesus Hortal:

“Maçonaria e Igreja Católica são simplesmente inconciliáveis, com uma inconciliabilidade que não depende de conjunturas históricas, nem de ações particulares, mas que é intrínseca à própria natureza de ambas as instituições”.”.


5- Algumas razões das para divergências entre Maçonaria e as Igrejas.

O Conflito de Interesses: A História reporta que a Maçonaria no passado possuiu em seus quadros grande número de religiosos. O convívio deste com pessoas de outros credos e formas de pensamento representava uma fonte de influência sobre o pensamento e comportamento destes religiosos. Para evitar que isto continuasse se contrapondo aos interesses da Igreja “a partir do Papa Pio IX, alguns representantes da Igreja quiseram dar um basta na intromissão dos maçons nas irmandades religiosas e na influência que ela exercia nos próprios padres e através deles, na sociedade” e passaram a ter uma atitude ostensiva de distanciamento.

A Essência: Uma instituição que preconiza a liberdade religiosa, o respeito às divergências filosóficas, que defende a plena liberdade de expressão do pensamento, que proclama a tolerância como princípio cardeal nas relações humanas certamente em nada colabora com as pretensões de quaisquer religiões, que, via de regra, se proclamam como detentoras inquestionáveis da “única verdade aceita”. Simultaneamente, ao defender o combate a ignorância, à superstição e à tirania a Maçonaria coloca-se em rota de colisão com quase todas as igrejas e religiões.

O Desconhecimento: o Pe. Valério Alberton afirma acerca de seu livro: “Realizei este trabalho também para cumprir com um elementaríssimo dever de justiça… De fato, esta reparação é uma necessidade, já que ataquei, não poucas vezes, a Maçonaria e os Maçons, sem muito conhecimento de causa e parcialmente, praticando injustiças e erros objetivos”.

6- Conclusão

O Ir.’. Fadel David Antonio Filho descreve em poucas linhas o que parece ser a síntese do pensamento de muitos maçons acerca desta questão: “a Maçonaria sempre foi um desses alvos prediletos de muitos ditadores, padres, bispos e pastores religiosos que enxergam em toda parte o perigo e o demônio. Vêem na Maçonaria o Anticristo, a seita demoníaca que luta contra suas posições pretensamente divinas. Na realidade, são posições autoritárias, medievais e mesquinhas. Afinal, a Maçonaria sempre lutou contra a tirania, pela liberdade do homem e contra os usurpadores, os medíocres e os fanáticos”. (http://grandeloja-pb.org.br/letras_masonreligiao.htm)

De fato, concordando com o Ir.’. Fadel, devemos lembrar que a política de criar inimigos fictícios sempre foi usada pelos mais diversos lideres como forma de manter a aglutinação da massa de liderados. Assim sendo poderíamos dizer que a Maçonaria pode ser um “demônio ou inimigo útil” para as igrejas, que nela podem evidenciar um possível centro de atividades anticristãs a ser combatido.

Por outro lado, algumas características da filosofia maçônica, como já dito, tendem a provocar conflito com os crédulos de toda espécie. A tendência ao racionalismo, o combate à ignorância e às supertições colocam a maçonaria em posição antagônica às igrejas.

Por fim, infelizmente, enquanto a Maçonaria possuir um caráter de sociedade secreta, o que é parte de sua essência, ela será alvo de manifestações desinformadas, maldosas, preconceituosas e detratoras, independentemente daquilo que os maçons praticarem em loja ou fora dela.


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