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O Simbolismo dos Amantes no Tarot de Thoth

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Prólogo

A Lâmina intitulada Os Amantes – tal como aparece figurada no Livro de Thoth – encontra-se intimamente relacionada ao Rito Central da Igreja Gnóstica Católica – Ecclesiae Gnosticae Catholicae – tecnicamente conhecido como Liber XV (1) e mais simplesmente referido como A Missa Gnóstica. Um Rito, no entanto, é sempre um processo dinâmico enquanto que o que temos aqui é uma representação estática – um instantâneo ou um fotograma, se preferirem – das Forças em atuação na Missa. Tais Forças se distribuem na mais perfeita Harmonia para com o sistema cabalístico, de maneira que cada Personagem (2) da Lâmina possui uma atribuição precisa dentro do Hieróglifo da Árvore da Vida. Acreditamos que o Estudo destas Correspondências poderá contribuir para uma compreensão Maior deste Arcano bem como do simbolismo implícito na Missa Gnóstica.

Kether & Malkuth

Na parte inferior desta Lâmina temos uma figuração da Esfera de Malkuth sob o aspecto de um Ovo circundado por uma Serpente – o Ovo Órfico. O Ovo aqui simboliza o Óvulo e a Serpente, o Espermatozóide: a união destes dois Princípios é o único objetivo do ato biológico do Amor. Todo resto é ilusório (MAYA) e dispensável: a Criança, do ponto-de-vista da dinâmica da Vida, é muito mais importante que os pais. Estes, inclusive, começam a morrer no momento mesmo em que ela nasce e, até recentemente, pereciam antes mesmo que ela amadurecesse integralmente (3). Esta Lâmina, portanto, apresenta a Soberana Virtude de negar-se a si própria, uma vez que o próprio Casamento que constitui aparentemente o seu Centro não passa de uma instituição social desprovida de valor, sendo unicamente através do Ato do Amor que a natureza decaída do Homem poderá algum dia se alçar às Esferas Superiores – residirá aí, talvez, o motivo deste conjunto simbólico encontrar-se dotado de amplas asas (4).

A Esfera de Kether é representada basicamente da mesma forma, só que transladada para um outro plano bem mais elevado. O Cupido que se vê na parte superior é uma representação clássica do Amor (Eros) em sua forma mais pura. Seus olhos estão vendados, em concordância com o dito popular que afirma que “o Amor é cego” – isto é, encontra-se além da esfera do que pode ser percebido pelos sentidos.Neste Ponto, devemos compreender que o próprio Amor nada mais é do que o mensageiro de Forças ainda Superiores – o seu arco, em forma de crescente é passivo em relação às Forças situadas acima e além de Kether. A sua flecha, que é um símbolo fálico evidente, aponta para a esfera de Chokmah, aqui representada por uma Virgem nua. Pode-se ainda afirmar, com base da coexistência pacífica de um símbolo feminino e outro masculino nesta mesma figura, que o verdadeiro Amor, para ser Real e completo, implica sempre em uma forma sutil de Androginato. Por fim, é preciso realizar um esforço no sentido de diferenciar o Puro Eros do Ágape cristão. Embora as duas palavras pertençam ao mesmo idioma grego e possam ser igualmente traduzidas como amor representam, na prática, universos inteiramente distintos (5). A diferença essencial entre Ágape e Eros é que aquele não possui a capacidade de atrair os corpos necessários para a realização da Grande Obra. Isto porquê Ágape indica apenas um amor dito “espiritual” ou simbólico o qual se tornou inútil em uma época onde os corpos físicos e sutis dos seres humanos alcançaram uma densidade tal que necessitam de “fortes abalos” para despertar suas energias adormecidas. Os Iniciados do Tantra da Mão Esquerda conhecem há milênios esta Verdade que fundamenta praticamente toda a sua Doutrina, conhecida como a Doutrina dos cinco Ms:

1. Matsya [peixe] ;
2. Mamsa [bife] ;
3. Madya [vinho] ;
4. Mudra [afrodisíacos] ;
5. Maithuna [coito].

A quebra destes Tabus da cultura religiosa hindu pode produzir uma ruptura da “cadeia de condicionamentos” e eventualmente conduzir o Adepto à libertação. No entanto, para o indivíduo nascido e criado no Ocidente moderno a prática desta Doutrina teria pouco ou nenhum efeito sobre o seu aparelho psíquico pois não corresponde à Realidade de sua cultura – o álcool, a carne de peixe e a carne de vaca são completamente franqueados no Ocidente, bem como em boa parte do Oriente que dia-a-dia se “ocidentaliza”. Torna-se preciso buscar novos “desregramentos dos sentidos” que visem libertar o ser humano de seu atual estado. Isto tem sido feito pelas verdadeiras Escolas de Iniciação ainda em atividade.

Chokmah & Binah

As Esferas de Chokmah e Binah encontram-se simbolizadas por duas figuras de aparência feminina situadas nos cantos superiores da Lâmina. Elas são, respectivamente, Eva e Lilith, Maria e Madalena ou, mais simplesmente, A Virgem e A Prostituta – Atu II, A Sumo-Sacerdotiza e Atu XI, Luxúria ou BABALON (6). Acerca destas duas Polaridades da Energia Criadora, está escrito no Liber Tzaddi vel Hamus Hermetico :

33. “Eu vos revelo um grande mistério. Vós estais de pé entre o abismo da altura e o abismo da profundeza.
34. “Em cada um espera-vos um Companheiro ; e aquele Companheiro sois Vós Mesmos.
35. “Vós não podeis ter outro Companheiro.
36. “Muitos têm se erguido sendo sábios. Eles têm dito : ‘Procura a brilhante Imagem no lugar sempre-dourado e uni-vos com Aquilo.’
37. “Muitos têm se erguido sendo loucos. Eles têm dito : ‘Desce ao mundo da escuridão esplêndida e desposai aquela Criatura Cega do Limo.’
38. “Eu, que estou além da Sabedoria e da Loucura, ergo-me e vos digo : realizai ambas estas bodas ! Uni-vos a ambos os Companheiros !
39. “Cuidado, cuidado, digo eu, não procureis um deles para perder o outro!
40. “Meus adeptos estão retamente erguidos ; suas cabeças acima dos céus e seus pés abaixo do infernos.”

O Abismo

A região conhecida como Abismo separa as Três Esferas Superiores – Kether, Chokmah & Binah, que constituem o Macrocosmo ou Grande Mundo – das Sete Esferas Inferiores – de Chesed até Malkuth, que, por sua vez, correspondem ao Microcosmo ou Pequeno Mundo. O Abismo é uma região de “tensão” permanente entre Macro & Microcosmo sendo a sede das Forças dissolventes que o profano conhece como “demônios”. A Travessia do Abismo consiste, portanto, na última depuração que o veículo astral do Adepto deverá sofrer antes de ingressar nas Esferas Superiores (7). Esta Fórmula Iniciática encontra-se perfeitamente registrada no credo romano segundo qual o Cristo (isto é, o Iniciado em Tiphereth) deve primeiro “descer aos Infernos” Qliphóticos antes de proceder à sua “subida aos Céus” das Supernas.

No design desta Lâmina a região do Abismo encontra-se indicada por um número indefinido de Espadas cruzando-se em pleno ar. Trata-se aqui de uma figuração do Cerimonial Maçônico do Arco de Aço ou Teto de Aço. As Espadas simbolizam a virtude dissolvente do Abismo em relação às construções egóicas do Iniciado – construções estas das quais ele deverá necessariamente se “depurar” antes de alçar às Regiões mais elevadas, sendo esta a origem dos relatos das “tentações” dos Santos. É preciso ressaltar ainda que a própria letra hebraica Zaain, à qual se relaciona esta Lâmina, significa literalmente “espada”.

mzla – MZLA (8)
A Influência de Kether

A Influência unificadora de Kether sobre as demais Esferas é simbolizada por uma figura triangular cujo ápice parte do Cupido localizado no Alto e cuja Base se confunde com a próprio Soalho da Lâmina. Não teremos dificuldade alguma de reconhecer neste Personagem um outro aspecto de O Eremita (Atu IX), usualmente representado como um Ancião em trajes monásticos – a propósito, um dos títulos de Kether é “O Ancião dos Dias”. Este Arcano corresponde à letra hebraica Iod que é O Ponto Primordial – um outro título de Kether – que é também a Semente (em grego : Esperma) de toda a Vida.

O Microprosopus

A Metade Inferior da Lâmina é dominada pela Cerimônia de Casamento entre o Rei Negro e a Rainha Branca, sendo esta devidamente assistida por um Pajem Branco e uma Dama Negra e pelas duas Testemunhas que são A Águia e O Leão. Trata-se aqui, em Realidade, de um Tríplice Casamento ou, melhor dizendo, de um mesmo Casamento desdobrado em Três Níveis distintos. A Falha em compreender este aspecto do Arcano poderá levar aos mais grosseiros equívocos na Execução da Arte. A Águia e O Leão, embora sejam os dois elementos mais próximos ao plano de Malkuth – isto é, o plano da manifestação física – NADA podem efetivamente produzir por sua própria Virtude (9). Para que esta Operação produza Resultados é imprescindível que os Seis Elementos acima estejam Equilibrados entre si. A necessidade desta harmonização prévia encontra-se claramente indicada no Processo oculto de Preparação do Sacramento utilizado na Missa Gnóstica. No entanto, não nos seria lícito insistir mais demoradamente sobre este Segredo uma vez que este só pode ser efetivamente Transmitido no Seio de Organizações verdadeiramente Hierárquicas – tais como a Ecclesiae Gnosticae Catholicae e a O.T.O.

Notas:

1- É interessante reparar que 15 = 1+5 = 6, sendo VI o número deste Arcano e também o número de Tiphereth, que é a Sexta Esfera. Também 15 = 1+2+3+4+5, sendo o número místico da 5a Esfera, a Esfera de Geburah, sagrada a Hoor ou Hórus, o Senhor deste Novo Aeon. Na distribuição dos Caminhos da Árvore de acordo com a orientação de Liber Legis – que foi objeto do nosso Trabalho “A Árvore Rectificada” – o Arcano VI se posiciona precisamente entre Tiphereth e Geburah.

2- A Palavra “Personagem” derivada do latim persona é entendida aqui em seu sentido etimológico mais imediato, que é o de “máscara”.

3- A maior parte dos animais vertebrados – o Homem inclusive – tem o seu processo de envelhecimento enormemente acelerado após terem ultrapassado a idade de maior atividade sexual. Uma vez tendo cumprido o seu papel a Natureza incumbe-se de dar cabo silenciosamente e sem grande alarde da velha geração, preparando o Caminho para a Próxima. A Seta do Tempo permanece, desta forma, inflexivelmente apontada para o Futuro.

4- Cf. AL I, 61: “Colocai as asas e despertai o esplendor enrodilhado dentro de vós, vinde até mim.”

5- Para uma discussão mais aprofundada do estado de corrupção e aviltamento que a palavra “amor” tem sido vítima, recomenda-se a leitura atenta do Artigo “Paraum Entendimento Real do Amor”, de H. B. Franco, a sair.

6- Note-se que 2+11 = 13, que é o valor exato da palavras hebraicas para “Unidade” – AChaD – e também “Amor” – AHBH. Também 11 = 1+1 = 2 .: 11 = 2.

7- Este encontra-se representado, no simbolismo dos Arcanos Maiores, por Atu VII – O Carro. Cf. o nosso “A Árvore Rectificada“.

8- A guematria da palavra hebraica utilizada para designar esta Influência (MZLA) têm como resultado o número 78 – que é o número exato dos Arcanos do Tarot. Também AIVAS – “o ministro de Hoor-pa-kraat” [AL, I, 7] e o mensageiro da Nova Lei – soma 78.

M+Z+L+A = 40+7+30+1 = 78
AIVAS = 1+10+6+1+60 = 78

O número 78 por redução produz 15 – que é o número do Liber que constitui A Missa Gnóstica e também Atu XV, falsamente chamado pelo profano de O Diabo – e depois 6 – Atu VI, Os Amantes.

78 = 7+8 = 15 = 1+5 = 6

Consideremos ainda que 78 é o produto da multiplicação de 13 por 6 – sendo 13 o valor da palavra hebraica para designar “Unidade” – logo temos que :

78 = 13×6 = 1×6 = 6

Por último, registremos a existência de uma outra grafia para a palavra MZLA, a qual omite o Aleph final – somando, portanto 77 [M+Z+L = 40+7+30 = 77]. Este é o mesmo valor da palavra hebraica OZ, que quer dizer “bode”, sendo este animal simbolicamente relacionado a Atu XV. A recorrência destes motifs simbólicos não pode de maneira alguma ser atribuída à simples “coincidência” como querem alguns, devendo ser mais corretamente interpretada como a “assinatura”específica das Energias postas em ação neste Rito.

9- Este tipo de prática – e não qualquer convenção de ordem “moral” – é o que caracteriza a chamada “magia negra”. Cf. A II, 5: “Contemplai ! os rituais do velho tempo são negros.”

Por Frater Sinn


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