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Por Asenath Mason, Visions of The Nightside (Visões do Lado Noturno). Tradução de Robert Pereira. Revisão de Ícaro Aron Soares.
O reino do Lado Noturno é caótico e dinâmico. De modo a nos movermos pelos labirintos sombrios do Lado Noturno nós criamos mapas e modelos iniciáticos pelos quais tentamos organizar o caos na ordem, dando a ele sentido lógico e coerência. Organizamos nosso mundo colocando-o em estruturas, categorias, polaridades, opostos, etc. Tendemos a ver o tempo como linear: o dia segue a noite, estações vêm e mudam para outras, nós nascemos, crescemos, ficamos idosos e morremos. Toda nossa visão de mundo é baseada no desejo de lógica e continuidade. A mente humana se acha confusa se este equilíbrio universal é perturbado, se as forças do Lado Noturno começam a fluir para dentro do mundo e revertem sua ordem natural. Mas o que realmente é o Lado Noturno? Deixe-nos pensar em todas as coisas que nós conhecemos: familiares, lógicas, compreensíveis, evocando sentimentos de segurança e confiança. O Lado Noturno é todo o resto. Tudo que encontra-se fora das fronteiras da segurança, familiaridade, lógica ou coerência. É o irracional, o rejeitado, o reprimido, o repugnante, o temido, o aversivo, etc. São as Qliphoth, conchas habitadas por monstros e demônios, excrementos da Criação. Tudo o que preferiríamos não terem nossas vidas. Consequentemente, nós podemos nos perguntar porque absolutamente alguém quereria entrar no Lado Noturno e deixar essas forças dentro de seu mundo?
A magia do Caminho da Mão Esquerda, que trabalha com as forças do Lado Noturno, tem uma reputação bastante duvidosa, pois inclui coisas com as quais os magos e iniciados de outros caminhos de desenvolvimento espiritual nunca iriam trabalhar. Alguns veem-nas como perigosas e imprevisíveis, com vagas perspectivas de sucesso. Outros são atraídos para esta magia por causa de seu comportamento sombrio, práticas excitantes e a promessa de resultados rápidos. Somente poucos abordam-na com entendimento genuíno de seus mecanismos e consciência do que ela detém e como este processo iniciático realmente funciona.
Nos tempos atuais, o mais popular mapa iniciático do Lado Noturno é a Árvore da Noite Cabalística, também conhecida como a Árvore da Morte, ou a Árvore das Qliphoth. Ela consiste de 11 mundos, ou zonas de poder, que sucessivamente despertam e ativam certos poderes mágicos e desenvolvem habilidades psíquicas do iniciado. A Árvore das Qliphoth é vista como o lado escuro ou sombra da Árvore da Vida, a antítese, ou a contraparte negativa. De fato é muito mais complicado. Existem muitas teorias sobre a origem e a natureza de ambos os lados da Árvore. Algumas delas enxergam a Árvore da Morte como um vasto reservatório de tudo aquilo que a Árvore da Vida não é. Outros comparam a Árvore da Vida a uma ilha em um imenso oceano negro que a cerca por todos os lados, também acima e abaixo. Este oceano é o reino das Qliphoth e muitos magos acreditam que ele não pode ser realmente organizado ou categorizado como mundos ou quaisquer estruturas, simplesmente por causa de sua energia bruta, indiferenciada, puro caos que contém tudo e nada ao mesmo tempo. Enquanto a Árvore Cabalística contém apenas um número limitado de reinos, há milhões de mundos Qliphóticos, caminhos e dimensões que nunca foram mapeados. Muitos pensam que é sem sentido utilizar essas forças como um modelo iniciático, já que nada aqui é previsível e nada pode ser tido como certo. Por outro lado, muitos magistas têm trabalhado com sucesso com a Árvore Sombria, superando o nível de desenvolvimento mágico que eles deveriam normalmente alcançar através de outro mapa iniciático, ou progredido extremamente rápido em sua Ascensão pessoal. Há também a hipótese de que a Árvore das Qliphoth é a antítese direta, ou o oposto da Árvore da Vida. As 11 Qliphoth existentes no lado escuro da Árvore representam forças e princípios que estão em oposição direta às 10 Sephiroth, contradizendo os poderes da Árvore brilhante. Mesmo o número das Qliphoth é uma paródia da unidade divina e coerência do número 10, que simboliza a perfeição de Deus. O domínio das Qliphoth goza de uma má reputação e é visto como o reino de Satã, o Adversário, identificado com Lúcifer ou Samael, que governa sobre hordas de espíritos malignos e demônios com sua consorte impura, Lilith, a Rainha da Noite. Eles são os primeiros iniciadores, guias e aliados no caminho iniciático Qliphótico, e em seu reino somos confrontados por tudo o que nós normalmente mantemos fora de nossas vidas. Então, novamente, nós precisamos perguntar por quê absolutamente trabalhar com as qliphoth? Aqueles que percorreram o caminho longe o suficiente para entenderem como o processo iniciático funciona muito provavelmente responderão: porque o encontro com o Lado Noturno é inevitável. O Lado Noturno não é um reino distante existente em outros planos e consistindo de mundos misteriosos e outras dimensões. Ele está aqui e agora. É o lado repulsivo e cruel da realidade que nós encontramos todos os dias, mas que simplesmente escolhemos não perceber. É violência, fome, vícios, pobreza, doenças, morte, assassinato, guerra, estupro, destruição, abusos, desespero, medo, terror, desgosto e muito, muito mais. Nós o observamos todos os dias e estamos felizes com ele contanto que tudo não nos diga respeito de qualquer maneira direta. Quando somos confrontados diretamente com o lado escuro do mundo e nos tornamos diretamente envolvidos nele, para muitos de nós este encontro leva à destruição. Poucos são fortes o suficiente para enfrentar esta prova e emergir vitoriosos e fortalecidos. Este é o Lado Noturno no nível mundano, manifestação das qliphoth em nosso mudo cotidiano. Isto é também com o que você terá de lidar no caminho iniciático Qliphótico. Este encontro é inevitável certamente. Não é uma questão de se, é uma questão de quando tudo isto entrará em sua vida e colocará você através de ordálias severas que irão despedaçar seu mundo e transformá-lo a partir de dentro. Fracassar nas provas é sucumbir à escuridão e ao desespero, ser devorado pelo Vazio. Somente tendo êxito com as ordálias iniciáticas, que se manifestam através de eventos de nossa vida diária, nós podemos avançar para outro nível de nossa Ascensão pessoal.
Um iniciado da Árvore da Vida, onde tudo parece coerente e lógico, e o caminho leva de um ponto concreto a outro, será confrontado com as qliphoth quando alcançar o abismo. Até então o mapa parece nítido: em Malkuth, o Reino, nós exploramos o corpo e aprendemos a controlar o mundo no qual nós vivemos. No reino astral de Yesod (Fundamento), Hod (Esplendor) e Netzach (Vitória), nós viajamos para os mundos internos dos sonhos, visões,fantasias e imaginação; através de modelos racionais de pensamento aprendemos a formar conceitos, definições, teorias e estruturas; e nós também desenvolvemos o sentido de dar e compartilhar, abraçando o outro e explorando o significado de paixões e emoções. Em Tiphereth (Beleza), que é o centro da Árvore, nós aprendemos os princípios de equilíbrio e integridade, que são então trazidos para a manifestação no reino de Geburah (Força) e Chesed (Misericórdia); aqui nós também encontramos nossa deidade pessoal, ou o sagrado anjo guardião, ou nossa imagem pessoal de Divindade. Então, enquanto se prepara para ascender para a tríade mais alta na Árvore, Binah (Entendimento), Chockmah (Sabedoria) e Kether (Coroa), o adepto é repentinamente lançado no abismo para confrontar sua escuridão pessoal, a Sombra interna. Lá, teremos de enfrentar tudo o que nós sempre rejeitamos, reprimimos, ou recusamos perceber. Tudo isso, sem exceções, e tudo ao mesmo tempo. Esta é uma ordália severa e traumática, e realmente, há poucos relatos de magos que foram bem sucedidos neste teste iniciático. É a experiência direta do Vazio, a tremenda, infinita força que existe como um eterno oceano contendo todos os mundos e universos, destruindo-os a cada momento e criando novamente. Para o adepto do caminho Qliphótico, acredita-se que a experiência é menos traumática e nós estamos melhor preparados para o que lá nos aguarda, a medida que confrontamos, conquistamos e absorvemos nossa Sombra pessoal em cada nível sucessivo do caminho.
Como se parece na prática? Deixe-nos dar um breve passeio através dos sucessivos mundos na árvore das Qliphoth. Primeiro nós temos a Qlipha Lilith (A Rainha da Noite), o Portão para o Desconhecido. Aqui encontramos os primeiros aliados e guias no caminho e a consciência se abre para o contato com as energias do Lado Noturno. A Chama da Divindade é inflamada, a Serpente Kundalini desperta e começa a ascender rumo à Iluminação, e a Deusa da Noite se aproxima para nos guiar através dos labirintos do Lado Noturno. Na esfera de Gamaliel (O Obsceno), nós encontramos a Deusa da Lua que nos apresenta os segredos da magia lunar, mistérios da bruxaria e alquimia sexual. Esta é a esfera astral dos sonhos e fantasias, imaginação e alucinações. No mundo de Samael (O Veneno de Deus), bebemos o Veneno alquímico, o elixir da morte, que nos é entregue pelo Anjo da Morte, Samael. Nesta esfera aprendemos sobre os mistérios da morte e separação da alma do corpo. Aqui nós encontramos o Ceifeiro e somos confrontados com testes de insanidade, dúvida e descrença. No último dos mundos astrais, A ́arab Zaraq (O Corvo da Dispersão), nós adentramos no caminho do misticismo sexual e somos confrontados com as ordálias do guerreiro espiritual. Aqui a consciência é movida do corpo para o espírito, e a alma é liberada em voo extático entre o plano astral e a esfera solar. No coração da Árvore, a Qlipha Thagirion (O Litigiador), nós encontramos nossa deidade pessoal, o conceito integrado do Anjo e Besta, que é então equilibrado entre as forças de Golochab (O Incendiário) e Gha ́agsheblah (O Atormentador). Aqui, na esfera solar, e através de ordálias de luxúria e sofrimento nos tornamos o Fogo do Apocalipse, os Atormentadores. O caminho do guerreiro, iniciado no reino astral, é agora completado, e preparemos a nós mesmos para a jornada através do Abismo. Além do Abismo Cabalístico existe a tríade superior da Árvore, que no mundo das Qliphoth é a Trindade Profana: Satariel (O Ocultador), Ghagiel (O Estorvador) e Thaumiel (Gêmeos de Deus).Aqui, todas as regras e definições são quebradas. Nós enfrentamos testes de surrealismo e absurdidade e aprendemos a encontrar a verdade no que está oculto. Thaumiel representa a realização da Divindade. O Olho do Dragão é Aberto e o iniciado é convidado a entrar no próprio Vazio, o verdadeiro Ventre do Dragão.
O Abismo é a janela paro o Vazio. Ele existe em ambos os lados da árvore e se estende além, para dentro do Ventre do Dragão. Aqui nós utilizamos a teoria da Árvore Cabalística descrita como uma estrutura coerente, onde os lados escuro e luminoso coexistem juntos em um equilíbrio universal e complementam um ao outro através da polaridade dos opostos. Este é o alicerce da maioria dos mapas e modelos iniciáticos dentro dos sistemas mágicos baseados na Cabala. Tudo o que existe além da Árvore é o Vazio, o Dragão, a força por trás de toda a criação e manifestação. Aqui é onde todos os mapas, estruturas e definições não fazem mais sentido, onde tudo o que aprendemos até agora se contradiz, onde tudo e nada é real. Aqui nós encontramos a Torre Negra, que está de sentinela no limiar do Vazio, onde os mundos da manifestação e do Não Ser se encontram e se cruzam. É a encruzilhada entre estar sonhando e acordado, entre o sono da ignorância e a consciência desperta, o portão para o Ventre do Dragão e o canal para a corrente primordial do Vazio.
O que nós conhecemos como o “Lado Diurno” é somente uma pequena parte da eterna força que existe fora do universo conhecido para o homem. É infinita, dinâmica, indefinida, e ilimitada. E quando nos tornamos uma parte dessa força, nossa jornada espiritual também se torna um continuo fluxo. É o processo de mudança sem fim, reconstrução e reavaliação de nossas metas, interesses, relacionamentos, personalidades, ou meios de autoexpressão. A forma com a qual tendemos a descrever o mundo é limitada, apenas ilusão. Nomes e definições atribuídos às coisas criam limites e fronteiras. Através do processo iniciático do caminho Qliphótico nós aprendemos a perceber essas limitações e transcendê-las. Redefinimos nosso mundo e aprendemos desconstruí-lo e criá-lo novamente, apenas pela força da nossa Vontade.
O Dragão é a força bruta, indiferenciada e indefinida que não pertence às leis do tempo e espaço e não está limitada pela percepção humana. É importante salientar aqui que o termo “Dragão” não se refere a qualquer deidade específica ou personagem mitológico. Ele denota a infinita, eterna corrente do Vazio que flui através dos portões do Lado Noturno para o mundo do homem e pode ser aproveitada e utilizada como veículo evolutivo para aqueles que buscam abrir as portas para esta força primordial e abraçar seu poder. Mitos e lendas ao redor do mundo descrevem esta força como um monstro primitivo, um dragão ou uma serpente. Na tradição Escandinava, nós encontramos vários monstros dragões: Jormungandr, a aterrorizante serpente segurando o mundo do homem em seu abraço espiralado, Nidhogg, que se alimenta das raízes da Árvore da Vida, Yggdrasil, e o dragão Fafnir, que protege tesouros lendários e provoca terror no coração das pessoas. Na mitologia Egípcia, o princípio draconiano do Caos lutando contra a Ordem é representado pela serpente Apep que incessantemente tenta devorar o Sol e aprisionar Ra, o Deus Sol, na escuridão do submundo. A Bíblia descreve o aterrorizante Leviatã, o monstro marinho, e Behemoth, o dragão da terra. Tífon, o temível monstro da mitologia grega que combateu Zeus sobre o Olimpo, também é identificado com o Dragão primitivo. Mitos Ugaríticos mencionam Lotan, a serpente marinha de sete cabeças, e Yamm, o antigo deus do mar que habita em Tehom, as águas do Abismo. Há também Tiamat, a deusa dragão da cosmologia Babilônica, a mãe do universo, cuja história é um dos mais antigos mitos da Criação. O mundo como nós o conhecemos foi formado a partir da sua carne e os seres humanos foram criados a partir do sangue de seu demônio consorte. E há muitos outros dragões e monstros mitológicos personificando a força do Lado Noturno, o princípio do Caos primordial, Escuridão e Vazio. Nos mitos e lendas, esses seres são mortos ou derrotados por heróis que representam a nova ordem mundial, o triunfo da Luz sobre as Trevas. Deuses e heróis desses mitos representam o desejo humano de entender e controlar o mundo transformando Caos em Ordem. No mito Babilônico, Marduk, que derrota Tiamat e suas hordas de demônios, organiza o universo de acordo com um padrão fixo – ele coloca estrelas e constelações em ordem, cria fronteiras entre o mundo do homem e o reino dos deuses, e tranca os monstros e criaturas do caos primordial atrás de portões protegidos por sentinelas especialmente nomeados. O mundo se torna uma estrutura segura e familiar, onde todos conhecem seu lugar e todos os seres representam seus papéis designados. Também isto é tudo ilusão, visto que o Vazio é tão imenso, tão poderoso, tão tremendo para ser trancado fora do mundo e mantido longe por fronteiras artificiais. As paredes racham e desmoronam, os portões são destrancados e abertos por aqueles que buscam o poder do Dragão, o equilíbrio universal é continuamente perturbado, e os monstros do Vazio entram no mundo do homem para causar destruição e guiar aqueles que os chamaram, levando as almas dos iniciados para os tortuosos labirintos do Lado Noturno.
A mente humana tem a tendência de definir, categorizar, racionalizar, fazer comparações,buscar analogias, atribuir forma e significado para o que é incompreensível. Mesmo entre magos, poucos podem admitir que existe algo que não pode ser colocado em estruturas, dissecado, analisado e entendido. Assim, nós tendemos a ver a Árvore das Qliphoth como o reflexo negativo da Árvore das Sephiroth. A verdade é que isto é muito mais complicado. O Lado Noturno é uma massa infinita de túneis, caminhos, zonas de poder, esferas, mundos e dimensões. Nada aqui possui estruturas, não existe simetria e nada é previsível. Nada também corresponde em qualquer maneira direta à Árvore da Vida. Toda forma está no Vazio, bem como o Vazio se manifesta em todas as formas. O sentido de tempo linear, que é uma parte da consciência do Lado Luminoso, não existe aqui. A ilusão do tempo e do espaço é despedaçada e tudo se torna simultâneo. Tudo se funde e se torna um. A magia do Vazio é intuitiva e irracional. Não há mapa que descreva a imensidão do Lado Noturno. A Árvore das Qliphoth, com seus túneis de Sete zonas de poder Qliphóticas, é meramente um esboço do que este tremendo reino realmente detém. Um viajante por estes caminhos e esferas encontrará poderosos guias e aliados, bem como inimigos viciosos que tentarão rasgar a alma em pedaços e se alimentar de sua essência imortal. Nós alcançaremos maravilhosos mundos e lindos locais, mas também seremos puxados para labirintos negros, onde nada faz sentido e onde podemos facilmente nos perdermos, para sempre vagando em desespero e confusão. Em um momento a jornada se parecerá como uma bela aventura, em outro, será um horrível trauma. Aqui tudo se torna um, terror se funde com fascinação, beleza com repulsão, aversão com prazer. Tudo isto espera por nós no caminho, e tudo isto tem de ser aceito como uma parte natural da iniciação Qliphótica. Com cada nível iniciático, horror e loucura desaparecem e produzem êxtase e fascinação com o quê o que acabamos de experimentar. Para entender este processo, temos de perceber que esta é a jornada para a inteireza, recuar para dentro de nós. Este recuo é catártico e leva à inspiração e integração. Conforme viajamos através das sucessivas camadas de nós mesmos, nós exploramos tudo o que parece repulsivo, detestável, aterrorizante, medonho e aparentemente inaceitável. Tudo isto tem de ser confrontado, absorvido e abraçado com alegria e deleite. A consciência livre dos grilhões da matéria é liberada, mas o corpo é o templo e o altar no processo alquímico de transformação espiritual. Explorando o que parece repulsivo, perigoso ou proibido, nós transgredimos nossas limitações -este é método das Qliphoth.
Nas mitologias antigas, lendas populares, ou simplesmente sonhos e visões daqueles que tiveram um vislumbre do Lado Noturno, monstros e criatura do caos primordial personificam tudo o que não pertence ao mundo do homem, tudo o que é alienígena, desconhecido, estranho. Seres amorfos, horrores sobrenaturais, alienígenas híbridos compostos de partes tomadas emprestadas de feras lendárias ou diferentes animais, todos esses representam o caráter primevo do Vazio, onde tudo e nada existe ao mesmo tempo e palavras e símbolos podem ter podem ter todos os possíveis significados ou absolutamente nenhum. Eles refletem o caos e desordem da Escuridão primordial, enquanto as deidades mais jovens, nascidas nas novas estruturas do universo, são normalmente retratadas na forma humana, de modo a retratar o mundo compreensível, o visível e o familiar. Essas criaturas nascidas no Ventre da Escuridão, deuses dragões e espíritos de mitos e lendas, antigos Titãs e Gigantes, ou mesmo Os Grandes Antigos do Necronomicon, todas elas carregam a essência do Vazio, o Dragão Primevo, mas nenhum deles é o Dragão. Elas são meramente centelhas desta força sem limites percebida pela limitada mente humana. O Dragão não deve ser percebido como “deus”, “espírito”, ou qualquer ser tangível, definido, apesar de que muitas entidades podem ser vistas como manifestação da essência do Dragão, intermediários que nos ajudam a tocar e entender esta infinita corrente. Nós utilizamos formas e nomes para representar a energia do Vazio de uma maneira tangível, para alcançar e entender sua essência, mas a mente humana não está predisposta para experimentar o Vazio, que não é nada parecido com o mundo em que nós vivemos: não há muros, estruturas, fronteiras, direções, tempo, formas, nomes ou definições. Existe tudo e não há coisa alguma. Há todos os deuses e nenhum deles ao mesmo tempo. Ele contém tudo e nada e tudo isto é real -à medida que acreditamos que seja real. O próprio Dragão é indefinido e intangível. Deuses e espíritos que carregam a essência Draconiana primordial são apenas manifestações desta força mas nenhum deles é a única e completa representação do Dragão. A força do Vazio é energia primária, bruta, o Ventre do Dragão, onde todos os mundos e todos os seres vivos nasceram e onde eles podem ser reconstruídos e recriados novamente.
Este processo de renascimento, ou recriação, é o propósito do trabalho iniciático do Lado Noturno. É a dissolução e reconstrução da consciência, personalidade, o ego, identidade -tudo o que constitui a nossa autoimagem com a qual nós tendemos a nos identificar. Com cada iniciação, esta imagem é quebrada, despedaçada, reformulada de modo a se adequar ao nosso nível de Ascensão pessoal. Com cada nível, nossas percepções, metas e interesses mudam e se desenvolvem. Esta transformação não vem sem um preço, e com cada iniciação somos confrontados com a necessidade de sacrifício. Monstros primitivos e dragões chegam com relâmpagos e trovões, rasgando o céu e espalhando destruição pelo mundo. Este é o simbolismo da iluminação Draconiana. Uma vez que trilhamos o caminho e nos tornamos uma parte da corrente, a Chama Negra do Vazio, o fogo primitivo do Dragão, irá gradualmente incinerar qualquer obstáculo que se interponha em nosso caminho na busca de Divindade. Para entender a natureza deste processo precisamos estar cientes de que a transformação toda ocorre em nossa consciência e somente se manifesta em eventos do mundo físico, empurrando-nos para rearranjar nossas vidas a fim de se adequar ao destino que se abre para nós. Esta tarefa não é de forma alguma fácil, e sacrifícios que precisam ser feitos a fim de seguir o caminho são frequentemente assustadores e traumáticos. O “obstáculo” em seu caminho de Ascensão espiritual pode parecer ser o seu cônjuge, seu pai, seu filho, seu emprego, sua casa e assim por diante. Você está pronto para deixar tudo para trás e mover-se com a corrente? A verdade é que quando o processo já está em movimento, você pode não ter uma escolha e isto irá acontecer de qualquer forma, independente do quanto você possa querer prevenir esta transição. Esta é a natureza das Qliphoth. Muitos serão atraídos pelo caminho, poucos permanecerão, prontos para aceitar e encontrar o poder que ele detém. A única forma de ser bem sucedido no caminho é se abrir para tudo que possa acontecer, e quando vier, você precisa abraçar e transformar fraqueza em força, medo em coragem, veneno em elixir da vida. É assim que você ganha poder e aprende a moldar sua vida. O caminho do Lado Noturno torna muitas coisas possíveis,mas elas jamais lhe serão entregues em uma bandeja.
A crise no caminho espiritual ocorre quando nós olhamos direto para o Vazio, quando enfrentamos a loucura e o terror do Lado Noturno, quando temos de encarar a desagradável verdade acerca de nós mesmos e do mundo ao redor. A experiência do Vazio destrói todas as camadas da psique, deixando o âmago de nossa existência desnudo e despojado de todas as proteções, mecanismos defensivos, muros e escudos que tendemos a construir ao redor de nós mesmos. Nós mergulhamos nas águas negras de Tiamat, e nos tornamos a manifestação viva do Vazio e o canal ativo para suas energias. A fase inicial deste processo pode se manifestar através de toda sorte de fenômenos negativos -muitos magistas falam de relacionamentos destruídos, perda de emprego e alicerces materiais, mortes na família, doenças, infortúnios, etc. Quando isto acontece, nós normalmente desistimos ou tentamos nos proteger por meio de ferramentas e rituais mágicos. A verdade é que não podemos proteger da essência dissolvente do Vazio nem a nós mesmos ou aqueles que nos cercam, porque as coisas que acontecem à nossa volta são manifestações de nossa Vontade e ocorrem porque queremos que aconteçam. Mesmo se não percebermos agora, chegará um momento em nossas vidas quando iremos olhar para trás e iremos saber e entender o que aconteceu e porquê,e nós também saberemos que tinha de acontecer, independente de toda a dor e desespero que causou. Quando as energias do Vazio, se manifestam, pessoas são assustadas e confusas. Este é o momento quando começamos a questionar e duvidar de tudo. Contudo, uma vez que o processo é posto em movimento, ele não pode ser parado. Não é fácil entender que é você e você sozinho o responsável por isto, que todas as coisas boas e ruins acontecem porque você as trouxe para sua vida, por sua Vontade consciente ou inconsciente – não importa, porque cedo ou tarde seu inconsciente será trazido para a luz da consciência de qualquer maneira. Poucos são capazes de aceitar essa responsabilidade e viver com ela. Não adianta fugir, abandonar o caminho, ou construir mais muros e escudos em volta – tudo isto vem de dentro.
O Vazio não é um local ou uma esfera, ou qualquer coisa que possa ser explicada por definições ou descrita por temos da consciência do Lado Luminoso. Seus portões não podem ser abertos e fechados à vontade. Ele está em toda parte, sempre profundo, sempre em movimento, mudando a cada momento singular, fortalecendo Apetite e Desejo, que é a mais poderosa força motriz do universo. Ele é a força pura e bruta da consciência cósmica, o princípio motor por trás de toda criação e toda destruição. Nós carregamos o Vazio por dentro – é nossa Sombra interna, a Besta interior. Ela é o Apetite que todos nós sentimos a cada momento de nossa existência – o desejo de poder, amor, admiração, dinheiro, sucesso, saúde, paz, conforto, descanso, sono, comida, sexo, etc. Há sempre alguma coisa pela qual nós ansiamos, algo que sentimos falta, uma promessa de satisfação. É a energia do Vazio que nos motiva e conduz-nos a agir. Esta é a força dinâmica da evolução, o veículo da Ascensão espiritual. Os sucessivos níveis da iniciação Qliphótica nos dão um vislumbre desta força, mas mesmo se expandirmos a consciência através de técnicas de alteração da mente, nós ainda não seremos capazes de alcançar a imensidão do Vazio. Meramente iremos avançar mais os muros da percepção. A fim de experimentar o Vazio, nós temos de entrar nele e nos deixar ser transformados por sua corrente primordial. Este é o renascimento alquímico nas Águas Negras do Abismo, nas espirais do Dragão. Como adeptos Draconianos nós procuramos entrar no Vazio e recuperar a consciência primordial que está contida no Ventre do Dragão, a eterna e imortal essência Draconiana de evolução pessoal. Não existe Abismo para “cruzar”, nem muros, margens ou fronteiras. Quando nós estamos no coração do Vazio, olhando para fora a partir da sua imensidão, o universo parece pequeno e limitado, e tudo o que importava antes é visto de uma perspectiva diferente. Aqui nós nos tornamos conscientes de todas as possibilidades, e nós podemos olhar para o passado, presente e futuro. Aqui nós também somos livres da sujeição do destino e nós podemos mudar o mundo e alterar os padrões de eventos unicamente pela força da nossa Vontade. Esta é a experiência libertadora para a qual nós nos preparamos através dos sucessíveis níveis da iniciação Qliphótica, a gnose da Autodeificação.
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