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Por Dion Fortune,
tradução por Ícaro Aron Soares.
Quando pela primeira vez me aproximei do estudo da Ciência Oculta, ela era extremamente oculta e misteriosa. As várias sociedades abertas que então existiam, ou eram puramente exotéricas e elementares, ou então eram realmente bastante espúrias. Assim sendo, tornava-se difícil saber onde procurar qualquer ensinamento verdadeiro. Consequentemente, a menos que fosse psíquica, a pessoa estava completamente excluída de qualquer conhecimento. Isto, porém, já não acontece com a mesma intensidade e, para muitas pessoas, resta apenas a opção de, se interessar ou não pelo ensinamento oculto. Estamos condicionados a pensar que para obter qualquer conhecimento prático do ocultismo temos que nos separar do mundo, e para uma grande maioria toma-se totalmente impraticável seguir por esse caminho. Isto significa que muitas e muitas pessoas, que poderiam ser imensamente auxiliadas por essa doutrina, estão impedidas de se dedicar ao seu estudo, o que considero uma lástima.
Quando eu estava em treinamento, o processo todo exigia um esforço imenso. Quanto mais eu entendo a respeito, mais eu sinto que o trabalho do adepto é uma coisa e a transmissão geral da doutrina é outra. As proezas que são realizadas pelo ginasta treinado estão inteiramente fora do alcance do homem comum; não obstante, os mesmos exercícios com os quais o ginasta é treinado, porém, não levados a um nível extremo, mantêm o homem comum forte e em boa forma quando são praticados regularmente. Penso que o mesmo acontece com o ocultismo. Se você desejar ser um adepto e realizar impressionantes proezas de Magia, tal como o ginasta, deverá submeter-se a um treinamento muito árduo. Mas eu acho que a aplicação posterior deste trabalho será a transmissão dos ensinamentos, de modo que se tornem acessíveis às pessoas impossibilitadas de abandonar tudo e cujo Carma as mantêm aprisionadas à vida cotidiana.
É interessante notar que na época em que a recrudescência do ocultismo começou no Ocidente – mais ou menos em 1875 três movimentos tiveram lugar: o Ocultismo, o Movimento Espiritualista e a Ciência Cristã, com o Novo Pensamento como seu rebento. Estas são três Unhas distintas que lidam com as forças ocultas. O ocultista baseia seu trabalho na tradição e geralmente utiliza um cerimonial. O espiritualista está abordando o mesmo terreno, mas não tem tradição e baseia o seu trabalho na experimentação. O cientista cristão não tem tradição e não tem experimentação, porém baseia seu trabalho na hipótese dos poderes da mente. O Espiritualismo e a Ciência Cristã são procedimentos empíricos. Se estudarmos o movimento de cura da Ciência Cristã, veremos que ela tem um método muito bom, mas os seus praticantes raramente podem explicá-lo. O Ocultismo é a base científica de todos estes movimentos e pode explicar os fenómenos destes diferentes modos de experiência e de prática. Ê nisso que reside o seu valor. A Ciência Cristã e o Novo Pensamento produzem frutos valiosos, mas não dão nenhuma explicação que possa ser aceita por uma pessoa que pense, não obstante, mesmo assim, elas obtém os seus resultados. Portanto, que se encontre essa base e não se deixem escapar os resultados valiosos. Eu sustento que nas doutrinas esotéricas podemos encontrar uma explicação de tantas coisas na vida que todos ficariam mais ricos se elas lhes fossem franqueadas. Obtendo-se um indício do seu significado, a vida se torna um assunto bem diferente. Sem esse indício somos como folhas sopradas pelo vento, não sabemos onde estamos ou para onde vamos; estamos cegos e vagueamos ao acaso, com grande esforço, tateando pelo caminho afora, sem nenhuma garantia de que não vamos rolar num precipício. Todavia, se adotamos as doutrinas esotéricas, então nos vemos como parte do grande todo. Vemos o nosso lugar na Natureza, vemos de onde viemos e para onde estamos indo, vemos o nosso relacionamento com o Cosmo, e a amplitude da vida se revela. Ë isto que a ciência esotérica pode dar uma aplicação muito ampla, profunda e prática, do ocultismo. Minha experiência com muitos cientistas esotéricos ensinou-me que – se eles fazem uma espécie de estudo intelectual, não é para aplicá-lo em problemas práticos – estão envolvidos, em maior ou menor grau, num trabalho de pesquisa, no estudo de sistemas de símbolos e da Cabala, apenas como um meio de fazer adivinhações. Além do mais, tais adivinhações são muito espúrias e, de um modo geral, tendem a desmoralizar a ideia que as pessoas têm da vida. Se alguma coisa boa ou má em breve deverá acontecer a alguém, qual é o benefício de revelar isso a ela? Todavia, numa interpretação da vida pode-se encontrar uma explicação para os acontecimentos. Quando estudamos as doutrinas esotéricas da evolução, vemos um imenso panorama abrindo-se â nossa frente. E, naturalmente, a crença na reencarnação está implícita no ocultismo, o mesmo se dando com a transferência do pensamento. Aqui nós temos, penso eu, um dos ensinamentos mais esclarecedores que poderiam ser dados a respeito dos problemas da vida. O que é que qualquer ser pode fazer em uma só vida, para ganhar o Céu ou o Inferno por toda a eternidade? Certamente, a doutrina da reencarnação é bem mais racional o ir e o voltar, o tornar a ir, uma vez mais, para a reencarnação, em busca de mais experiência. Para a minha mente, é um conceito de existência deveras maravilhoso saber que atrás de nós se estende uma longa corrente de encarnações. Não nos lembramos delas porque o elo da memória está quebrado, mas elas estão lá e a Centelha Divina é o núcleo, de cada um de nós, ao redor do qual a experiência construiu um todo; este todo constitui o temperamento e as capacidades de cada ser. Esse conceito apresenta uma filosofia de vida muito profunda. Se as coisas boas da vida são um acaso cego, então, somos realmente muito infelizes. Mas se percebemos que as linhas gerais das experiências espirituais que a vida nos traz são determinadas por nossa própria alma, então começaremos a ver de que maneira devemos receber os acontecimentos.
Agora, outra questão se apresenta – a grande doutrina esotérica dos planos invisíveis de existência. Esta doutrina nos diz que aquilo que os cinco sentidos podem ver ou aquilo com que podem entrar em contato não constitui o todo da existência. Isto a ciência exotérica pode confirmar por meio do microscópio, etc. O ocultista, porém, vai mais além e diz que também existem os domínios da mente e do espírito, que você não percebe com os seus sentidos físicos. Nestes vivem as grandes forças que influenciam a vida e suas circunstâncias. Neles você encontrará a chave para as condições de vida no plano físico, uma chave que nunca irá encontrar em qualquer outro lugar. Pessoas, tais como Coué, estão manipulando com sucesso estas forças invisíveis. Se compreendermos bem as condições, então estaremos livres, estaremos capacitados para trabalhar com tais forças e manipulá-las nós mesmos. Todavia, só poderíamos fazê-lo dentro de limites muito definidos. A Ciência Cristã não estabelece limites; mas se observamos os resultados obtidos por seus adeptos, poderemos ver que existem limites. Há certas coisas que você fará melhor se não se meter com elas. O ocultista não tenta dominar a Natureza, mas sim colocar-se em harmonia com estas grandes Forças Cósmicas e trabalhar com elas. Você poderá ter uma ilustração disto se observar as barcaças do Tâmisa afastando-se das margens quando a maré está virando; os barqueiros estão tirando vantagem do seu conhecimento das marés, e o rio faz o resto. No nosso caso e na questão da vida, deveríamos ter o mesmo conhecimento e sabedoria. Temos que compreender estas leis naturais do invisível. Elas são leis naturais e não há nada de espectral a respeito delas. Se as entendemos, podemos fazer da vida uma coisa muito diferente. Naturalmente, há certas condições que somos obrigados a aceitar e que são os frutos do Carma; mas eu não quero que você aceite o Carma da maneira grosseira como às vezes ele é apresentado. Não se trata de uma questão de assassinato por assassinato, de que se você rouba de uma pessoa nesta vida essa mesma pessoa roubará de você na próxima. Não é tão simples assim. Significa que alguma coisa, na sua natureza, tem que ser percebida e modificada para que você possa estar em harmonia. Enquanto esse fator particular permanecer na sua natureza, ele lhe precipitará na vida um tipo similar de problema. Erros de intenção ou más ações deliberadas são dívidas geralmente pagas em vidas futuras; você poderá escapar impune nesta vida – nós todos vimos a florista malvada na forma de um verde loureiro mas o efeito da ação prossegue, é lançado na sua conta e, no devido tempo, terá que pagar. O pagamento, porém, é sempre em valores espirituais. Você aprende que tem que fazer certos ajustes, e quando termina de fazê-los a pressão afrouxa e você está livre. Assim, ponto por ponto, ganhamos caráter e equilíbrio. Conquistamos a nossa liberdade aprendendo as lições que a vida nos impõe; e se recusamos, elas se tomam cada vez mais e mais drásticas. Quando as pessoas já atingiram um certo grau de desenvolvimento, são mais sensíveis e têm maior força espiritual, e sendo assim, os seus problemas tornam-se mais pungentes. A alma poderá ter decidido avançar rapidamente e com isso atrai todo o seu Carma de uma forma concentrada. A aflição parece abater-se constantemente sobre esta alma, e por meio de uma encarnação de sofrimento tal alma é purificada – então, a próxima encarnação se apresenta livre destas condições. Uma simples encarnação não nos oferece qualquer indicação, porém nos deixa com um sentimento de injustiça; mas se podemos enxergar todas as nossas vidas passadas, estendendo-se em linha, então percebemos as coisas de maneira diferente. Devemos sempre observar os fatos na luz de três vidas. E também podemos alcançar nossos objetivos em três vidas. Nós agora estamos criando as condições para a nossa próxima vida, embora no presente tenhamos que assumir todo, ou em parte, o Carma proveniente da vida anterior.
Algumas pessoas dizem “Certamente, uma vida já é bastante cansativa”. Há, porém, uma outra maneira de encarar essa questão. Se nós avaliamos os nossos problemas em comparação com os imensamente longos períodos de tempo de todas as nossas vidas, eles assumem uma proporção diferente. Uma grande sensação de liberdade invade a alma quando acontece a percepção real de que o “eu” está caminhando e de que esta encarnação é apenas um incidente no seu percurso. Não podemos dar essa liberdade para ninguém simplesmente explicando as bases lógicas; mas vem, subitamente, a compreensão de alguma coisa que já existiu antes e isto determina uma grande alteração de valores. Mais uma vez, analisando os problemas existenciais, podemos descobrir que eles talvez estejam presentes porque estamos solucionando rapidamente os nossos assuntos e desenvolvendo-os bem depressa. Nós dizemos: “É a condição material que nos aflige, portanto, precisamos dela e devemos aprender as lições que ela veio nos dar”. Procuramos interpretar a significação espiritual desta experiência. Vamos, então, desenvolver nossa alma, meditando sobre isso. Quando a alma já adquiriu esta qualidade, ou já aprendeu as lições que precisava aprender, então o peso do Carma é retirado. Quando as pessoas atacam as suas condições, elas não mudam até que a liberdade seja ganha. Pensamos que poderíamos ser felizes se apenas certas coisas fossem mudadas; mas não, as condições estão em nós mesmos e somente trarão de volta outras condições similares. Quando estava trabalhando numa clínica de doenças nervosas, víamos isso acontecer repetidamente. O mesmo tipo de problemas estava sempre se repetindo na vida da mesma pessoa. Havia uma mulher que tinha sido atacada por vagabundos por três ou quatro vezes. No curso normal das coisas, isto não acontece com todas as pessoas. Ou, antes, uma mulher poderá encontrar-se constantemente sob o domínio de um tirano e ser tratada com crueldade primeiro por um pai, depois por um marido e por fim no seu trabalho. Vemos que uma determinada forma de problema repete-se vezes e vezes na vida de uma mesma pessoa. Deve haver alguma coisa que determine a experiência que se repete. Se nós, se quase todos nós, olharmos para trás e fizermos um exame retrospectivo nas nossas próprias vidas poderemos verificar isso, pelo menos em certa extensão. Deve haver algum fator proeminente, na nossa própria constituição, que afasta as forças invisíveis. A única maneira de estabelecer relações com elas é modificando o caráter por meio da meditação, construindo formas-pensamento ou destruindo deliberadamente aquilo que chamamos de formas-pensamento e que são os canais através dos quais as coisas indesejáveis chegam até você. Estas são as aplicações práticas do Ocultismo e, para colocá-las em uso, não precisamos ser adeptos. Durante todo o tempo, nós estamos constantemente criando formas-pensamento de um tipo ou de outro.
Nossos pensamentos não somente nos influenciam mas também formam canais de ingresso e atraem as forças correspondentes, existentes no próprio Cosmo. Se você se cerca de pensamentos de ódio, estará atraindo um tipo de ódio Cósmico para você mesmo. O ocultista tem um método para classificar essas forças, ele resolve todas essas coisas. Nós temos um sistema desse tipo na Árvore da Vida, da Cabala, e as crenças que estão ocultas sob ela podem ter um grande valor na vida, pois ensinam o tremendo poder da mente e os limites estritos dentro dos quais a mente trabalha e com os quais podemos realizar tanto. Estas doutrinas deveriam impregnar o pensamento, cada vez mais e mais. A Sociedade Teosófica tem realizado um grande trabalho neste sentido, mas tem, principalmente, atraído o interesse do não-ortodoxo e do rebelde. Esta é uma grande perda porque estes ensinamentos podem e devem ser apresentados de uma forma tal que não desagradem a mente treinada, que é indispensável na ciência pura. A física moderna está se voltando inteiramente para os ensinamentos ocultos. As coisas que Blavatsky disse – e que por tê-las dito foi ridicularizada e escarnecida agora estão se tornando uma questão de física pura. Há grandes aplicações destas coisas, que devem ser feitas. Devem ser aplicadas à sociologia, à administração das prisões e dos asilos, onde as formas-pensamento criadas tornam a infectar as pessoas, a menos que as neutralizemos. Podemos estudar as suas aplicações práticas na medicina, cuja verdadeira chave só elas possuem. Se você trata do homem como sendo apenas um corpo, isso é bastante insatisfatório. Do mesmo modo, se você adota o ponto de vista ortodoxo e lida com o homem como sendo apenas um espírito, não está fazendo justiça a ele. A autointoxicação e o pecado são diferentes. O homem é um ser quádruplo, e você deve tratá-lo como tal. Você deve distinguir em qual nível o problema tem origem. As forças de vida do nível espiritual são as verdadeiras chaves para o problema inteiro, e essas forças-vida, traduzidas através do intelecto e através da compreensão, são trazidas para os outros planos.
Há alguns ensinamentos esotéricos por meio dos quais qualquer pessoa pode beneficiar-se. Creio que a grande necessidade de segredo oculto já é praticamente uma coisa do passado, mas um pouco ainda é necessário. Em parte porque uma mente-grupo é necessária para algumas formas de ocultismo prático, e estas formas precisam ser conservadas, não podem ser dissipadas como acontece quando alguma coisa é do conhecimento de todos e é propriedade comum; e, também, para proteger os indivíduos contra o preconceito popular. Madame David-Neel contou-nos, em seus livros sobre o Tibet, que lá não há segredos a respeito dos ensinamentos dos Lama e da sabedoria secreta. As coisas que são mantidas em segredo são os métodos para treinar seus estudantes. Ela mesma, em seus livros, revelou muitos ensinamentos que são chaves importantes para a compreensão de muitas doutrinas ocultas. Não há mistérios a respeito dos ensinamentos, mas somente a respeito dos métodos práticos, com os quais as pessoas poderão causar males. Assim, vemos que o trabalho prático do ocultismo só pode ser realizado por mentes exercitadas e exige um alto grau de treinamento; mas os princípios podem ser extremamente valiosos e quanto mais divulgados tanto melhor.
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