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Exú é, sem dúvida, a figura mais controvertida dos cultos afro-brasileiros. Para alguns, uma figura brincalhona, associada à imagem de um menino irresponsável, divertindo-se com as confusões que consegue armar entre os seres humanos e entre os próprios orixás: para outros, uma figura temível, perigosa, voltada exclusivamente para o mal. É, segundo, a maioria das lendas, filho de Yemanjá, mas não é considerado unanimemente como um orixá.
Segundo a tradição, Exú e o causador das brigas, calamidades, acidentes e desgraças. Em resposta a essa afirmação, também se atribui a ele um lado bom, que talvez só apareça quando são prestadas a ele homenagens.
A partir dessa dificuldade em se definir Exú de maneira mais rígida, Pierre Verger afirma que “Exú revela-se, talvez desta maneira, o mais humano dos, orixás, nem completamente mau, nem completamente bom.
Parte dessa contradição toda não vem das crenças iorubás. A identificação de Exú com o mal é mais clara no Brasil, principalmente quando os cultos se distanciam do candomblé tradicional.
Na umbanda, por exemplo, onde o sincretismo religioso corresponde à própria base da religião, Exú e o demônio cristão são quase indistintamente a mesma figura. A história explica o processo de acumulação das características de um pelo outro com certa facilidade.
Num primeiro momento, os jesuítas católicos tentaram impor a religião católica aos “negros pagãos”. Dada a dificuldade em submeter um povo com todo um conjunto de deuses e divindades inclusive mais rico do que a teologia ocidental, alguns missionários optaram por aproveitar o panteão africano e moldá-lo, na medida do possível, à configuração católica mais precisamente à dualidade bem-mal. Era, portanto, preciso encontrar um diabo e a controvertida e irrequieta figura de Exú foi a que melhor se prestou a esse objetivo, por diversas razões.
Exú é uma divindade de fácil relacionamento com os humanos a mais próxima do mundo material. A ele se pede interferência nas questões mais mundanas e práticas. Por essa faculdade, Exú se constituía no protetor dos negros, no período da escravidão, contra o arbítrio e despotismo dos senhores.
Eram seus os ebós (conhecidos vulgarmente como “despachos”) deixados nas encruzilhadas próximas à casa grande. Numa circunstância de luta, o que pratica o bem para um antagonista, defendendo-o de outro, também pode ser visto, pelo ponto de vista deste último, como o que faz o mal.
Assim, os senhores de engenho viram em Exú o demônio que os negros “lançavam” contra eles. Outro fator que facilitou a identificação de Exú com o demônio cristão é sua ligação com o fogo, com a massa ígnea. Além disso, a sexualidade desenfreada de Exú (muitas vezes representado por uma figura humana com sorriso debochado e uma permanente ereção) deve ter ajudado a tarefa dos jesuítas na sua procura de um demônio na mitologia africana.
O responsável pelas forças do bem e do mal Aos poucos, essa identificação Exú/Diabo foi sendo aceita quase que integralmente pela umbanda e, de maneira mais contida, por boa parte do candomblé brasileiro. Isso representa uma distorção dos conceitos iorubás tradicionais, que permitem a ele, graças a sua irresponsabilidade e falta total de padrões morais, o controle tanto sobre as forças do bem como sobre as do mal. A moralidade não está na divindade, mas sim em quem se relaciona com ela; assim sendo, Exú é, consequentemente, uma concepção exterior à dualidade cristã.
Esse preconceito se revela no pequeno número de pessoas que são consagradas a ele como filhos. Em geral, existe uma postura diferente entre os Filhos de Exú e os de outros orixás. Enquanto estes revelam um grande orgulho de trazerem dentro de si as características de uma divindade a quem aprovam, os filhos de Exú geralmente são apontados como sofredores, “gente que carrega um pesado fardo”. Mesmo a linguagem de muitos terreiros marca essa diferença: enquanto se diz, em relação aos outros santos, que estão “possuindo” ou “incorporando-se” ao seu filho, os filhos de Exú são apontados como os que estão “carregando” a divindade, dado o peso que ele representa. Uma crença visivelmente criada a partir dos contatos com o cristianismo afirma que o fato de alguém nascer filho de Exú significa castigo por algo feito em encarnações anteriores.
Finalmente, o receio do que Exú pode fazer com a cabeça de um ser humano é tão grande que muito de seus filhos, ao invés de assim serem iniciados, são raspados como filhos de Ogum, depois de cerimônias em que Exú é fixado (isto é, “emprestado” por um prazo limitado a Exú), e acalmado. Essa transferência só é possível dada a boa relação que se atribui existir entre Exú, Ogum, irmãos por parte de mãe e igualmente donos de caráter violento e agressivo. Afora isso o dia consagrado a Exú é a, segunda-feira, demonstrando assim a relação que existe entre ele e a morte, já que segunda também é o dia dos eguns, as almas dos mortos.
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