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Sexualidade e Gênero na Umbanda

Leia em 10 minutos.

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Por Cris.

Esse é um tema polêmico mesmo nos dias de hoje. Sabemos que a Umbanda não segrega ninguém, e isso pode se comprovar na própria Carta Magna da Umbanda, itens 7 e 14, respectivamente:

“7. A Umbanda é uma religião sincrética fruto da cultura religiosa de três segmentos: branco do elemento europeu, colonizador; negro – escravizado na África para laborar na terra e o indígena que já ocupava esta terra, portanto, não admite qualquer forma de preconceito, discriminação ou intolerância” e “14. A Umbanda será sempre uma casa de portas abertas para todos”. Certo?

Mas ainda resta explicar melhor sobre as formas de identificação de gênero e as orientações sexuais. Acredito ser um assunto mais abrangente e que deve ser discutido, então venho hoje explicar esses aspectos, dentro do meu conhecimento atual (baseado apenas em leituras e conversas) amparada por textos umbandistas e educacionais. Separei em duas partes pra não ficar muito grande e cansativo. Vamos lá!

Gênero:

Os gêneros feminino e masculino são muito mais do que simplesmente nascer com órgãos sexuais femininos ou masculinos. Ser mulher é se identificar como mulher, e ser homem é a mesma coisa. Quando você nasce sendo de um gênero x e se identifica com esse gênero x, tudo é mais fácil perante a sociedade, mas nem sempre é assim. Repare que aqui estamos falando apenas sobre gênero e não sexualidade.

Desta forma, temos as pessoas:

Cisgênero: significa ‘do mesmo lado’. A pessoa cis é aquela que reivindica ter o mesmo gênero que o que lhe registraram quando ela nasceu. Sendo assim, a mulher cis é aquela pessoa que nasceu e foi registrada mulher e se reivindica mulher. O homem cis é aquela pessoa que nasceu e foi registrado homem e se reivindica homem.

Transgênero: significa ‘além de’, também é usado por muitas pessoas como abreviação para transexual e por outras para transgênero. Trans é aquela pessoa que se reivindica com um gênero diferente do que lhe registraram – há também quem diga que nesse grupo abarca-se as pessoas com papel de gênero divergente do imposto de acordo com sua identidade de gênero. A mulher trans ou transexual é aquela pessoa que nasceu e foi registrada homem porém se reconhece mulher, e vice-versa.

Identidade de gênero não tem nada a ver com roupas e cirurgias de troca de sexo. Ser mulher e identificar-se como homem não quer dizer que esse homem sentirá atração por mulheres. Muitas vezes, o homem trans se vincula emocionalmente com homens, ainda que sua identidade de gênero seja diferente daquela identificada em seu nascimento, por exemplo.

“– Ah! Mas é complicado… O que devo fazer?”

Nada. Você não precisa fazer nada. Ser cis ou trans é uma questão pessoal, você precisa apenas respeitar. No terreiro, como médium de uma corrente, você respeita, só isso. Se o Paulo se identificar como pessoa trans e quiser ser chamado de Ana, você a tratará como mulher (porque a pessoa se identifica como mulher) e usará o nome que a mulher deseja, Ana.

Você, como sacerdote, fará tudo isso e ainda tratará de romper preconceitos dentro (e fora) do seu terreiro, estudando e disseminando os conceitos corretos.

Respeito é regra na vida!

“– Eu não aceito isso em meu terreiro!”

Então você não aceita o fundamento básico da Umbanda de receber a todos sem distinção, não aceita o que aprendeu com a espiritualidade e não aceita a vida como ela é.

Você pode achar esquisito? Pode. Você pode achar confuso? Pode. Mas não pode desrespeitar essa pessoa e lhe tolher direitos, jamais. Não se esqueça que o corpo é apenas uma casca, nós não somos corpo. Somos alma.

No aspecto social, temos o sistema de preconceitos e privilégios de um sexo sobre outro, mas isso não se aplica na Umbanda, ou não deveria se aplicar. Perante a espiritualidade reina a igualdade dos gêneros; não importa se à frente de um terreiro está um homem ou uma mulher, ou ambos. Não importa se uma corrente tem mais mulheres do que homens, e vice-versa. Apenas importa o propósito pelo qual àquele terreiro foi fundado. Os fundamentos da Umbanda são respeitados? A caridade fala mais alto que a vaidade e o orgulho? Todos estão ali, em amor e respeito a Deus, Orixás e Guias Espirituais? Se a resposta for sim, está tudo certo. Não existe regra de comportamento nem subordinação da mulher cis ou trans.

Ou como eu disse, não deveria existir.

Qual é a diferença entre um Caboclo e uma Cabocla? Exu e Pomba Gira? Repare que em todas as linhas de trabalho temos os dois gêneros, o feminino e o masculino. Toda Preta Velha faz o que um Preto Velho faz. Toda Pomba Gira faz o que um Exu faz.

Aliás, a Pomba Gira é vista como o símbolo máximo do feminino e do poder de igualdade de uma mulher. A Pomba Gira surgiu como forma de resistência em uma época que a mulher era ainda mais subjugada. Perceba que a própria Umbanda planeja suas linhas de trabalho de forma a promover a igualdade e reduzir o preconceito.

Sexualidade:

A sexualidade é algo que independe de gênero. A maioria das religiões pregam que um homem só deve se relacionar com uma mulher, e qualquer coisa diferente disso é pecado, é uma anomalia.

Na Umbanda, possuímos o conhecimento de que se um relacionamento é construído em cima do amor e do respeito, é válido, embora saibamos que nem todos os adeptos pensem assim. Vale notar que o sufixo correto é dade (que remete à qualidade, estado) e não ismo (que remete à doutrina, doença, sistema político). Desta forma temos:

Heterossexualidade: aquele que sente atração e afeição pelo sexo oposto.

Homossexualidade: aquele que sente atração e afeição pelo mesmo sexo (gays e lésbicas). Para o espírito Emmanuel, “a homossexualidade é a tendência do ser para a comunhão afetiva com outro ser do mesmo sexo… A “inversão‟ não é somente quanto ao relacionamento sexual. Trata-se de vínculo emocional e afetivo”.

Bissexualidade: aquele que sente atração e afeição por ambos os sexos.

Assexualidade: ausência de atração sexual, independente do sexo. O que não inclui falta de afeição. O sentimento de amor e a atração sexual não estão necessariamente associados. Por isso, da mesma forma que muitos praticam relações sexuais sem amarem seus parceiros, é possível amar alguém sem que se queira relacionar-se sexualmente com a pessoa, e é caso que ocorre muitas vezes com os assexuais.

Precisamos entender que as preferências sexuais do outro não nos diz respeito. As pessoas têm medo/raiva de uma coisa que sequer as atinge. Se você é contra as relações homossexuais, por exemplo, não se relacione com pessoas do mesmo sexo, é simples. Como falei mais acima, respeito é regra e usurpação de direito é crime. Além de que nenhuma orientação sexual define caráter e moral.

A conduta dos demais membros de um terreiro deve ser a mesma, dentro e fora do terreiro. Novamente (porquê reforçar nunca é demais): respeito é regra na vida.

Gênero e Sexualidade se Escolhe?

Não. Já se nasce com uma identificação específica para um gênero (sem necessariamente corresponder com o sexo de nascimento) e uma orientação sexual.

Algumas correntes de estudo da espiritualidade afirmam que nós, antes de nascermos, além de estarmos cientes de nossa missão e de vislumbrarmos alguns aspectos de nossa vida, podemos escolher algumas particularidades visando a evolução da pessoa enquanto encarnada. Dentre elas, a sexualidade. Mas perceba que o espírito, uma vez encarnado, possui essa particularidade a lhe acompanhar por toda a vida.

E entrando no campo da lógica… Quem escolheria ser segregado, hostilizado pela sociedade, somente pelo bel prazer da polêmica? Quem sacrificaria desejos e afeições reais só para provocar o sistema? Quem escolheria sentir na pele o repúdio e a violência de uma sociedade intolerante que caminha ainda tão devagar na reforma do pensamento tradicional e patriarcal?

É só pensar.

Apresentado os conceitos e desconstruído alguns mitos, continuo agora com explicações sobre a visão da Umbanda sobre o sexo, troca energética e o reflexo da mediunidade. Vamos lá!

Visão do Sexo na Umbanda:

O sexo é tão parte da vida quanto o oxigênio que respiramos. Não é visto como algo sujo nem pecaminoso, como algumas vertentes religiosas sugerem. Se Deus nos criou assim, com a capacidade de amar e expressar nosso amor através do sexo, porquê haveria de ser errado?

Ainda que o sexo seja feito livre de emoções profundas, é importante haver respeito e consentimento de ambas as partes.

Nas palavras de Alexandre Cumino: “… podemos definir o sexo (biológico), o corpo (soma), como masculino ou feminino. O que independe da natureza do espírito, da alma (ancestral), que também é masculina ou feminina. O mais comum é que espíritos de natureza feminina encarnem em corpos de natureza feminina e que corpos de natureza masculina encarnem em corpos de natureza masculina. Mas também é possível encarnar em corpos com o sexo diferente de sua natureza, ou seja: espírito de natureza feminina encarnado em corpo masculino e espírito de natureza masculina encarnado em corpo feminino. Assim, podemos verificar que há: mulheres com natureza masculina e homens com natureza feminina. … As pessoas não se atraem apenas por uma questão sexual de polaridade. As pessoas também são atraídas por sentimentos de afetividade, admiração e sensualidade. Muitos amam e querem trocar amor, carinho e convivência com outras pessoas, independente do sexo ou de sua natureza. Quanto aos rótulos de homossexual, homoafetivo, heterossexual, transexual e outros são apenas títulos utilizados na tentativa de classificar o comportamento humano. Para a Umbanda, o que importa é o amor, o sentimento, o carinho, a afetividade, a convivência e, claro, o respeito.

Vícios e Desequilíbrios:

Fazer sexo com muitas pessoas diferentes com frequência pode ser considerado um desequilíbrio. Não que seja necessariamente errado, não é. Você, e somente você, sabe o que é bom para si mesmo, você é o dono do seu corpo, e mais ninguém. Mas é sabido que cada pessoa tem uma energia diferente, cada pessoa está situada em uma faixa vibratória. Podemos nos relacionar com pessoas de faixas elevadíssimas e outras nem tanto; energias positivas e negativas. E todas essas diferentes energias nos influenciam de algum modo. Afinal, se com simples apertos de mão já ocorre troca energética, imagina em uma relação sexual!

Portanto, a única mensagem é: cautela. Estamos sujeitos até mesmo à vampiros astrais. Entregar-se à uma vivência sexual desmedida pode trazer danos à essa energia sagrada que é a energia sexual e de nossa energia como um todo;

“Sexo é energia de troca entre o fluir de dois sistemas de energia. Sexo é a troca de poder, um dando ao outro e um recebendo do outro.

Sexualidade é uma expressão que move a força sexual, que permeia e absorve, que impulsiona e acolhe, que funde e separa. É um processo de vincular, de tornar um com o outro. A mais alta expressão do ato sexual acontece quando o seu Eu Superior funde-se com o seu parceiro. A baixa expressão do ato sexual acontece quando é praticado meramente para alívio físico ou interesse que não seja o amor.

O sexo pode ligar os corpos físico, emocional, mental e espiritual num só corpo. Através dessa conexão com a sexualidade que forças profundas de sentimento dentro de nós se encontra com o Grande Espírito dentro de nós.”

Preceito e Mediunidade:

“– Se o sexo é benéfico e divino, porque tenho de fazer preceito no dia do trabalho e nos rituais?”

Porque quando nos relacionamos sexualmente com alguém, há uma troca intensa de energia, conforme dito acima, além do desgaste físico. Não é nada relacionado à impureza, mas sim, a uma outra energia misturada à sua, por mais positiva que seja. Para os trabalhos, é recomendável que haja, sim, abstinência para que a energia do médium se afinize perfeitamente à energia do Guia. Além disso, nossa vibração estará inteiramente focada no trabalho a ser realizado, além da “cabeça estar firmada” somente nesse propósito (e não no prazer sentido, na lembrança do ato). Outro fator é o cansaço pós gira; nada de energia drenada além da conta.

Além disso, para outros rituais o preceito também se faz necessário para que os elementos envolvidos possam agir com todo o potencial, além de facilitar a transmutação feita pelas Entidades.

Amor, Respeito e Bom Senso:

Toda união deve ser pautada em amor, respeito e consentimento. Bom senso, como eu canso de dizer aqui no blog, é regra. Pedofilia e outros distúrbios sexuais são atos de violência, assim como agressões sexuais. Não correspondem à Criação, não correspondem ao Amor, ao Respeito e à Lei Divina. Nenhuma argumentação é válida para tais atos.

“O que é bom e faz bem ao ser humano é amar e ser amado de uma forma saudável. Onde, como e com quem, é da conta apenas de quem está amando, e ninguém além de você mesmo pode saber onde encontrar este amor. Todos são livres para trocar carinho e afetividade, que faz bem para a saúde emocional, psicológica, hormonal e afetiva. O amor não tem sexo, a alma tem uma natureza, mas somos todos livres para trocarmos amor com quem queiramos.

 

Quem ama não agride!”

Nada feito com amor e respeito pode ser mau visto. Elimine seu preconceito, discuta sobre este assunto com outras pessoas.

Axé!

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Fontes:

Site: Umbanda, eu curto! sobre Umbanda e sexualidade.

Site: Não me Kahlo sobre identidade de gênero – texto de Daniela Andrade.

Site: Relações de Gênero e Sexualidade – publicação de Letícia de Castro Guimarães.

Site: Comunidade Assexual sobre perguntas e respostas sobre assexualidade.

Site: Xamanismo sobre Sexualidade.

– Recomendo o curso Sexualidade e Mediunidade ministrado no site Umbanda EAD.

Não está disponível no momento (na data desta postagem), mas a plataforma costuma trazer cursos antigos de volta.

– Recomendo um estudo mais aprofundado sobre as questões de gênero e sexualidade.

Originais:

Sexualidade e Gênero na Umbanda: Parte 1.

Sexualidade e Gênero na Umbanda: Parte 2.

Revisão final: Ícaro Aron Soares.


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