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Sar Naquista
“Não é preciso outras formulas senão nosso desejo;
nem outras luzes senão as de nossa pureza”.
– Louis Claude de Saint-Martin
A tradição esotérica ocidental chama de Teurgia, todas aqueles rituais e práticas espirituais que tem como objetivo o contato com seres mais elevados, seja para obter ajuda ou para se comunicar com eles. Sendo o Martinismo uma tradição do cristianismo esotérico, é natural que seus praticantes realizem estas práticas para invocar espíritos elevados, como seus próprios Guias Espirituais, certo? Bom, pelo menos foi isso que Martines de Pasqually pensou em um primeiro momento.
A partir de Papus, o Fundador da Ordem Martinista, que começamos a falar mais de duas vias: uma via externa, ligada a magia cerimonial e uma via interna que conhecemos hoje como Via Cardíaca. Mas, em defesa de Martines de Pasqually devemos lembrar que a Teurgia praticada pela sua Ordem dos Elus Cohens, era indissociável de sua prática interior.
Isso é algo que é frequentemente esquecido entre os praticantes modernos do ocultismo que seguem a tendência da separação entre a religião e magia. Mas seguindo as antigas tradições da Teurgia Ocidental, e especialmente dentro o Cristianismo Esotérico, não existe Magia Cerimonial verdadeira que não seja necessariamente acompanhada do desenvolvimento de uma vida interior por meio da adoração, prece e da persistente prática da vigília moral.
Entretanto, no final de sua carreira, pós anos de pratica teurgica Pasqually conclui que muitos dos rituais empregados para realizar essa união com o mundo espiritual podiam apenas fornecer uma união parcial com o Divino. Na maioria das vezes estes rituais serviam apenas para produzir experiências interessantes, impressões aos sentidos que alimentam o orgulho e contanto com seres do mundo mundo invisível que nem sempre são quem dizem ser e que embora a Teurgia pudesse ter seus benefícios ela abria também espaço para muitas perturbações, abusos e manipulações por parte de forças astrais cegas ou mal intencionadas.
Não estamos dizendo aqui que a Teurgia está errada. Mas surgem problemas sempre que ela se torna toma o lugar do trabalho espiritual ou quando se torna uma substituta da religião. A Via Cardiaca sem a Teurgia é ainda totalmente completa e eficiente, já a Teurgia sem a Via Cardiaca é apenas uma forma disfarçada de Taumaturgia, a produção de prodígios popularmente conhecida como feitiçaria.
Louis Claude de Saint-Martins, nos alerta ainda que tais fenômenos são mais perigosos quanto mais substituírem nosso trabalho interior:
“[Essas] operações teúrgicas pelas quais acontece do Espirito se Ligar a nos, velar por nós, até rogar por nos, e exercer a Sabedoria e as virtudes por nós, sem que sejamos nem sábios nem virtuosos, já que este Espirito só exteriormente uniu-se a nos e faz sempre essas mesmas coisas, mesmo com nosso desconhecimento, o que nos mantem entretidos no orgulho e numa falsa segurança, mais perigosa talvez que nossas fraquezas e nossas falhas, que nos levam a humildade. Aqui, ao contrário, tudo deve começar pelo centro”.
Em uma escala diferente este é um dilema que se apresenta a toda cristandade desde o início de sua história. Já no Concílio de Jerusalém, feito pelos próprios apóstolos após a Ascenção de Cristo a grande discussão era se para ser os novos cristão deveriam também ser obrigados a seguir todos os mandamentos e rituais judaicos ou se deveriam apenas seguir os mandamentos de Jesus. Desde então muitos rituais, igrejas e preceitos de purificação foram criados, todos bem intencionados para permitir a melhor conexão possível com o mundo espiritual.
Assim como seu mestre, Louis Claude de Saint-Martins também chegou a conclusão, assim como disseram outros mestres do passado que a Via Cardíaca é um caminho melhor e muito mais seguro para a união com o divino. Esse caminho não consistia em invocar os Espíritos dos mundos intermediários, mas sim o próprio Cristo em nosso Coração e isso não por meio de nenhum ritual externo mas sim por um caminho universalmente disponível utilizando o aparato que é dado a todos os seres humanos.
Assim disse nosso Filosofo Desconhecido em uma carta a Nicolas Antoine Kirchberger, barão de Liebistorf, quando ele lhe pediu conselhos sobre iniciação:
“A única iniciação que eu recomendo e que busco com todo ardor de minha alma, é aquela por onde podemos penetrar no coração de Deus e fazer o coração de Deus penetrar em nos, para então fazer um casamento indissolúvel, que nos torne amigo, irmão e esposo de nosso Divino Reparador. Não há outro mistério para chegar a esta santa iniciação senão adentrar cada vez mais nas profundezas de nosso Ser, e de não abandonar esta intenção, caso contrário não conseguiremos retirar dela a viva e vivificante raiz; ai, então, todos os frutos que deveremos produzir, segundo nossa espécie, se produzirão naturalmente em nós e fora de nós.”
Também Jean-Baptiste Willermoz, outro grande expoente do martinismo assim coloca a questão:
“Penetre corajosamente no fundo de deu coração, sonde até o a profundeza da sua alma ara encontrar ai o conhecimento de ti mesmo. Esse trabalho é penoso, mas fornece a chave de todos os mistérios e conduz é verdadeira felicidade. O mais belo direito do homem é a de poder conhecer-se a si mesmo. Aquele que não sabe desfrutar disso ignora a extensão dessas forças, e não pode dar a elas um emprego justo”.
Pela simplicidade com que é possível acessar a Luz Divina pelo nosso próprio coração, Saint-Martin, que também se dedicou muitos anos a teurgia, considerou por fim que as formulas e rituais elaborados podiam nos distanciar de nossa natureza espiritual. E não apenas isso, mas dizia que se uma pessoa realmente se dedicasse a Via Cardíaca poderia alcançar verdades e alegrias infinitamente superiores aos que podem ser alcançadas pela Teurgia.
Isso não quer dizer que a teurgia não funcione. Temos testemunhos o bastante para não afirmar este tipo de coisa. Mas é uma ciência como muitas outras e como tal, sempre que lidamos com forças para as quais não estamos suficientemente orientados, acompanhados e preparado, corremos o risco real de dano. No caso, dano psíquico que pode levar ao desvio espiritual e em alguns casos a desdobramentos físicos.
Existem muitos tipos de Teurgia, mas apenas um Caminho do Coração. As formas de invocação variam muito, mas um Bom Coração é um Bom Coração em qualquer idioma. Isso porque os sistemas teúrgicos são caminhos intelectuais criados por diversas culturas, com ou sem a ajuda de agentes astrais que por mais bem intencionada que forem, nunca poderão substituir o caminho do coração com os quais todos já nascemos, e que não apresenta nenhum risco de nos prejudicar.
Só não confunda a simplicidade e segurança da Via Cardíaca com a ilusão de que este seja um caminho fácil. Fechar-se para as más inclinações e abrir o próprio coração com perseverança a Luz de Deus é muito mais difícil do que dizer as palavras certas, e fazer os desenhos certos sob as estrelas apropriadas. A elevação de nossos pensamentos por meio da prece e do silêncio e a vigília pessoal de nossos pensamentos, emoções, palavras e atos feita com perseverança é o que nos levará ao encontro do nosso verdadeiro Guia Espiritual e é o início do caminho que nos levará ao que Louis-Claude de Saint-Martin chamou de Nascimento do Novo Homem.
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