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Lovecraft Magia do Caos

O Universo de Cthulhu – Psiconomicon

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A maneira como o ocultista encarava esses fatos sobre Lovecraft cria uma linha divisória entre as duas escolas da filosofia oculta sobre o escritor:

– Uma entende as obras de H.P. Lovecraft como ficções de terror e consequentemente Lovecraft como um talentoso mestre das palavras com simbolos potentes que podem ter alguma utilidade mágica;

– A outra, um corpo selecionado de pessoas que enxergam Lovecraft como um conhecedor de verdades cósmicas ocultas, mesmo que não acredite na veracidade do que escrevia ou desse valor a suas próprias idéias, considerando-o como um receptor, um profeta involuntário do Caos.

Em ambos os casos, fossem como fonte estética ou como uma linha direta para um Caos primordial, magos, feiticeiros, bruxas e curiosos sobre os poderes que existem do outro lado do véu não conseguiam ignorar o apelo que abre o conto ‘O Chamado de Cthulhu’:

“A coisa mais misericordiosa do mundo, creio eu, é a incapacidade da mente humana em correlacionar todo o seu conteúdo. Vivemos numa plácida ilha de ignorância em meio a negros mares de infinito, e não está escrito pela Providência que devemos viajar longe. As ciências, cada uma progredindo em sua própria direção, têm até agora nos causado pouco dano; mas um dia a junção do conhecimento dissociado abrirá visões tão terríveis da realidade e de nossa apavorante situação nela, que provavelmente ficaremos loucos por causa dessa revelação ou fugiremos dessa luz mortal rumo à paz e à segurança de uma nova Idade das Trevas.”

Foi de forma natural que os praticantes da nova magia abraçaram as obras de Lovecraft. Com a ajuda de alguma desinformação por parte de editoras que desejavam lucrar com as idéias do escritor, auxiliadas por escritores criativos, não demorou para que logo muitos dos livros que Lovecraft mencionava em seus textos começassem a surgir no mercado. O Necronomicon possui hoje mais de 7 edições diferentes, todas elas clamando ser o livro que Lovecraft mencionava em seus contos.

Magos inspirados pelos avanços mágicos conseguidos por Spare, Crowley, pelo renascimento do Paganismo causado por Gerard Gardner e o surgimento de novas ordens mágicas, cada vez mais caseiras e numerosas começaram a buscar um simbolismo que não tivesse ligações com culturas passadas e que ganhavam cada vez menos importância na vida cotidiana e eram alvo de um sentimento cada vez maior de descaso. O universo de Lovecraft, já cercado por uma aura maldita de um elo com o lado obscuro e pervertido da deidade se tornou uma escolha óbvia para muitos.

O simbolismo desenvolvido pelo autor era primal e atávico e ao mesmo tempo atemporal. Se qualquer símbolo poderia se tornar uma passagem para uma fonte de poder, porque não escolher um que estaria à disposição de qualquer um que desejasse desenvolvê-lo livre de dogmas, baseados apenas na própria imaginação, nas emoções que despertavam e no poder oculto latente que traziam? Mesmo sendo relativamente novos, as palavras, símbolos e rituais, assim como os insights trancedentais, descritos por Lovecraft são, em si, antigos e arcanos o suficiente para possuir a mesma carga de assombro e misticismo que antigos grimórios medievais ou as chamadas enoquianas de Dee.

São essas qualidades que fizeram que muitos afirmassem que Lovecraft, mesmo sem perceber ou desejar, foi um escritor de fantasia que possuia um conhecimento oculto real, conseguido através de sonhos. Ele era como as personagens sobre as quais escrevia, alguém preso a uma força muito maior do que pode perceber ou compreender, alguém que se tornou a marionete de um destino poderoso, cego e idiota, e que não teve outra opção a não ser assumir o papel que lhe foi reservado. Seu mito, em suas próprias palavras “encerrariam um significado para os cérebros compostos pelo gás das nebulosas espirais”. Através de seus escritos Lovecraft não defendia a existência literal de criaturas ou cultos que existiram por milênios, ou livros reais capazes de enlouquecer aqueles azarados o suficiente para encontrá-los, e sim desafiava, de maneira indireta, qualquer um a provar que seus escritos não fossem emocionalmente legítimos.

“este ramo da literatura [o realismo fantástico] foi cultivado por grandes escritores, como Lorde Dunsany, e por fracassados como eu. Ele constitui o único realismo verdadeiro, a única tomada de posição do homem frente ao universo.”

Desta forma ele ofereceu aos entusiastas e buscadores da sabedoria oculta uma plausibilidade suficiente poderosa para que conseguissem erguer no mundo real uma filosofia e uma prática que tranformariam o falecimento de Lovecraft em uma espera, na mais profunda escuridão, onde sonhos desafiam com sua existência sua própria morte.


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