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Nevill Drury, um escritor e ocultista Australiano, afirmou que “descobri em meus estudos das tradições esotéricas, que além do verniz da complexidade – símbolos ocultos, significados ambiguos, palavras secretas e ‘chaves’, além de outros aparatos de proteção – existe uma essência central extremamente simples”. Essa essência foi captada com perfeição pelo mago inglês Aleister Crowley, cujas doutrinas mutias vezes são enxergadas como parte do Mito de Cthulhu. Mais para frente essa conexão será explorada de maneira mais adequada, mas Crowley foi o porta bandeiras do lema: “Faze o que tu queres, há de ser tudo da Lei”. A idéia porposta por Crowley é que um mago, quando atinge certa evolução, tem sua Vontade purificada e desenvolvida, desta forma ele não poderia agir de forma anti natural e tudo o que fizesse seria justificado pela Lei de Thelema, cada ato consciente seu se tornaria um ato de pura magia, não mais acorrentado à moral e às leis das pessoas comuns.O que talvez seja outro grande exemplo de como a literatura influencia a magia. No século XVI, viveu François Rabelais, inicialmente um monge franciscano e posteriormente um monge beneditino que no ano de 1532 deixou o monastério para estudar medicina em Lyon. Enquanto se encontrava na cidade de Lyon escreveu “Gargantua e Pantagruel”, uma série de livros sobre dois gigantes, respectivamente pai e filho, e suas aventuras a partir de uma perspectiva humanista cristã. Nesses livros o termo Thêlema é usado para se referir à Vontade Divina, a regente da Abadia de Thelema. A Abadia de Thelema é descrita no primeiro livro (caps. 52 a 57). Construída por Gargantua – uma clássica utopia gerada como crítica à sociedade nos tempos de Rabelais, nela os desejos de todos eram plenamente satisfeitos. Ainda que satíricos, os princípios ali colocados correspondem os ideais considerados por Rabelais como os mais elevados. Os habitantes da Abadia eram governados apenas por sua livre vontade e por seu prazer, sendo o “faze o que tu queres” a única regra.
Isso fez com que Rabelais fosse considerado por muito o primeiro Thelemita, o próprio Aleister Crowley escreveu no texto “Os Antecedentes de Thelema” (1926) que Rabelais, tanto quanto possível, chegou muito perto da Lei de Thelema conforme Crowley a compreendia, antecipando-se, assim, à escritura do Livro da Lei.
Na mesma época de Crowley, Austin Osman Spare, levou a idéia do ritual mágico a um patamar até então desconhecido. Ao invés de basear suas orperações mágicas em rituais complexos e cerimônias cheias de estrutura, Spare concentrou seu trabalho na criação de sigilos e meditações. Ele defendia que a mente consciente era o que afastava as pessoas da magia real, e que era somente desligando essa mente consciente e deixando a subconsciente despertar que um ritual ou qualquer outra operação mágica teria sucesso. Ele defendia que todo o ritual e aparato mágico não passavam de maneiras de se criar um vínculo entre aquilo que percebíamos de maneira consciente e aquilo que jazia nas profundezas de nossa psiquê, desta forma muito tempo poderia ser economizado se simplesmente trabalhássemos com o subconsciente diretamente. Era uma nova forma de magia bárbara que abandonava toda a compostura e erudição erguida durante séculos pelos magos medievais.
Tanto Crowley quanto Spare conseguiram desenvolver métodos mágicos que praticamente libertavam o praticante de qualquer tradição pré estabelecida. Os símbolos e rituais se baseavam em símbolos pessoais do mago. Com o passar do tempo essas técnicas de meditação, apesar da predileção da simbologia egipcia de Crowley, fizeram com que muitos magos desenvolvessem técnicas pessoais de Path Working, ou Imaginação Ativa, como é conhecida pela psicologia analítica. A idéia é que ao se meditar sobre determinado símbolo, o praticante o tranforma em um portal que é então atravessado.
O Path Working é uma tecnica conhecida e utilizada por Xamãs desde que o mundo ainda era mundo, ou seja, há muito tempo. Com a formação do movimento Hippie a meditação pura foi catalizada pelo uso de drogas psicodélicas, um exemplo desse grupo é a geração que ficou conhecida como Geração Leary, que buscava estados alterados de consciência controlados pela vontade do indívuo.
O grande guro deste movimento foi Timothy Francis Leary, Ph.D., foi professor, psicólogo, neurocientista, escritor, futurista e um dos maiores ícones dos anos 1960 e do hedonismo, que ficou famoso por ser um dos principais defensores dos benefícios terapeuticos e evolutivos de drogas psicodélicas, como o LSD. A Geração Leary foi composta de pessoas que buscavam tomar o controle da própria evolução, tanto física quanto espiritual, através do uso de drogas.
Durante a década de 1960 e 1970 inúmeras experiências com substâncias psicodélicas se tornaram comuns entre aqueles que desejavam expandir os limites da consciência e do espírito e estudos como os realizados por Stanislav Grof mostraram que de fato essas drogas causavam algo mais do que simples “viagens”. Estudos com praticantes avançados de budismo mostraram que pessoas que ingeriam o LSD tinham relatos de estados de espíritos e viagens astrais que correspondiam a mestres que praticavam exercícios de meditação, yoga e pranayama, mostrando que a substância de fato servia como um atalho para os lugares que os ocultistas buscavam alcançar com suas práticas, além de mostrar que de fato existia um lugar, não físico, para ser alcançado.
Assim a revolução psicodélica causou um efeito talvez inesperado, pois se o LSD, assim como outras substâncias, mostravam que havia um lugar para ser atingido, uma expansão real da consciência, ao invés das pessoas buscarem estudar para atingir esse lugar por mérito próprio, eles passaram a se tornar dependente do atalho para chegar lá, o consumo das substâncias passou a ser uma forma de comunhão mágica.
A grande revolução causada por essas técnicas neste período da história da magia é o seu rompimento com os dogmas do passado. Praticamente todas as ordens mágicas até então contavam com uma disciplina férrea. Seu núcleo se baseava no conhecimento adquirido, geralmente, pelo membro, ou membros, fundador/es e passada a todos os seguidores de uma maneira quase militar, mantendo-se uma hierarquia rígida que não deveria ser contestada. Os símbolos tinham determinado poder, mas para esse poder ser alcançado passos precisos deveriam ser dados, qualquer forma mais severa de questionamento era comparada com uma imaturidade espiritual que impedia que o a pessoa que estava se iniciando tivesse acesso àquilo que ela não compreendia. Dion Fortune foi um exemplo de como essa quebra de hierarquia era considerado algo sério, quando começou a buscar por conta própria as respostas para suas perguntas foi acusada de não possuir uma alma evoluída o suficiente e foi expulsa da ordem da Aurora Dourada, sendo depois atacada magicamente por alguns dos membros.
Grande parte delas tinha como base o cristianismo e a idéia de um ser supremo que mostrava o caminho de como chegar a uma evolução e compreensão maior da vida. O espiritismo, fundado por Alan Kardek, serviu também como base ideológica de que estaríamos trilhando uma jornada evolutiva em que cada degraus deveria ser atingido individualmente. Em todos esses casos a crença era a de que a evolução teria um objetivo, um ponto final – afinal, podemos chegar muito próximos de Deus e mesmo habitarmos com Ele, em Sua presença, mas nunca nos tornar Deus ou irmos além desse ponto. Crowley, Spare e outros que se seguiram, começaram a perceber que o primeiro passo importante para a prática mágica não era trazer um poder invisível para o mundo visível, e sim aprender a enxergar esse invisível e então passar a operar seus trabalhos no mundo onde o invisível é real, e esses trabalhos repercutiriam no mundo real; Deus poderia ou não existir, mas isso não dizia respeito ao Mago que poderia enxergar Deus apenas como um objetivo evolutivo a ser alcançado e então ultrapassado, e como esse era o caso, toda a moral filtrada para dentro das ordens, e consequentemente para dentro da magia, eram meras ferramentas que poderiam ser usadas ou descartadas de acordo com a vontade e a necessidade do mago.
Era como se toda a moral e a ética mágica se evaporassem, não havia mais magia branca ou negra, uma grande fraternidade branca ou adoradores do poder das trevas. O mago se tornava um caminhante e o mundo mágico era apenas a paisagem que ele tinha que atravessar. Desta forma a divisão das práticas mágicas não diziam respeito às forças que influenciavam o trabalho do mago e sim à maneira que ele seguia o caminho para obter seus resultados, foi se criando uma filosofia prática mais semelhante ao budismo, onde não existe um Deus para nos aproximarmos e sim um estado de iluminação que cada indivíduo deve atingir. Essa separação filosófica deixou para trás as noções cristãs ocidentais e buscou uma nova união à filosofia e às práticas orientias, desta vez com valores mais práticos e amorais. Com isso, qualquer forma de acesso aos símbolos ganhou uma força até então desconhecida.
Desde os tempos bíblicos a interpretação de sonhos era uma atividade importante. A história de José no egito ou do profeta Daniel mostravam como a interpretação dos sonhos era uma arte dada por Deus a alguns poucos para que desvelassem os segredos do futuro que o próprio Deus permitisse que vissem. Isso é curioso na forma que a própria Bíblia proíbe qualquer tipo de relação com cartomantes ou adivinhos, mas exalta todos os seus profetas que trabalhavam justamente com a mesma linha de negócios dos primeiros: relatar visões do por vir, sendo a diferença que o grupo dos profetas tinha o selo de aceitação divino. Com a nova filosofia mágica, a interpretação dos sonhos deixou de ser um dom enviado por Deus e passou a ser uma ferramenta poderosa na interpretação do conhecimento secreto do universo. E as maneiras para se ter esses “sonhos” ou intepretá-los também passaram a ser mais importantes do que as origens dessas capacidades. Outra mudança importante que ocorreu nessa época, resultado da quebra com a antiga moral, foi a adoção de outras práticas orientais menos espirituais e mais carnais. O Tantra foi uma delas.
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