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Mais uma vez, E. Levi fica devendo no texto o que anuncia no título do capítulo. Entre divagações filosóficas desordenadas, cita nomes sem maiores referências históricas e deixa a desejar em termos de fatos. Neste estudo, destacamos somente a história “Uma Evocação na Igreja de Notre-Dame”.
Evocação na Igreja de Notre-Dame
Há trinta ou quarenta anos [o autor escreve em 1789], um vigário da Igreja de Notre-Dame, homem muito piedoso e estimável, apaixonara-se pelo magnetismo e entregava-se a freqüentes experiências, consagrando mais tempo do que devia à leitura dos místicos… Sua cabeça cedo fatigou-se, teve insônias; levantava-se para estudar e quando o estudo não bastava para acalmar as agitações de seu cérebro, ele tomava a chave da igreja e penetrava no coro, iluminado somente pela fraca lâmpada do altar-mor.
Sentava-se e ali ficava até o dia seguinte, embevecido nas preces e meditações profundas. Uma noite, o assunto de sua meditação era a danação eterna. Ele pensava na doutrina tão ameaçadora do pequeno número dos eleitos e não sabia como conciliar esta rigorosa exclusão com a bondade infinita de Deus, que quer que todos os homens sejam salvos… Ele pensava no suplício do fogo e nas explicações conciliatórias da teologia.
A Igreja não define o fogo do inferno; ele é eterno, segundo o Evangelho, mas em parte alguma está escrito que o maior número dos homens deve sofrer eternamente… Os pagãos poderão ser salvos pelo batismo do desejo, os pecadores escandalosos, por uma contrição súbita e perfeita, enfim, é preciso esperar por todos e orar por todos, exceto por um só, aquele de quem disse o Senhor [Jesus] que fora melhor para este homem não ter nascido.
O vigário deteve-se neste pensamento: de que um só homem trazia oficialmente a reprovação dos séculos: Judas Iscariotes… Seus olhos encheram-se de lágrimas, parecendo-lhe que a redenção seria sem efeito se não salvasse Judas. …Mas Jesus Cristo, dizia a seu coração que o pária do Evangelho é salvo e que ele será, pela longa maldição que pesa sobre sua memória, o redentor de todos os párias e se assim era, um novo Evangelho deveria ser anunciado ao mundo: o da misericórdia infinita, universal, em nome de Judas regenerado…
Então, unindo as mãos com fervor, disse o vigário: “Meu Deus, dai-me o que não recusáveis outrora à fé, o que não recusais ainda hoje, um milagre para me convencer e me fortalecer, um milagre como penhor de uma missão nova. O entusiasta, então, levantou-se… e pronunciou em alta voz esta evocação: “Tu, que maldizem há dezoito séculos e que eu choro porque parece que tomaste o inferno para ti somente a fim de nos deixar o céu, infeliz Judas, se é verdade que o sangue de teu Mestre te purificou, se tu és salvo, vem impor-me as mãos para o sacerdócio da misericórdia e do amor!”
Tendo dito estas palavras… o vigário atravessa o coro e vai ajoelhar-se sob a lâmpada, ao pé do altar-mor. “Então – diz ele – eu senti positivamente e realmente duas mãos quentes e vivas pousarem sobre minha cabeça como as do bispo no dia da ordenação. Eu não dormia, não desmaiara, eu as senti; era um contato real e que durou alguns minutos. Deus me exaltara; fizera-se o milagre, novos deveres me eram impostos e uma vida nova começara para mim. A partir do dia seguinte, eu devia ser um novo homem…” No dia seguinte, de fato, o infeliz vigário estava louco.
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