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11 – L
Manus – A Força
O grande agente mágico, que denominamos luz astral, que outros chamam a alma da terra, que os antigos químicos designavam sob os nomes de Azoth e Magnésia, esta força oculta, única e incontestável é a chave de todos os impérios, o segredo de todos os poderes; é o dragão volante de Média, a serpente do mistério Edênico; é o espelho universal das visões, o laço das simpatias, a fonte dos amores, da profecia e da glória. Saber apoderar – se deste agente é ser depositário do próprio poder de Deus; toda magia real, efetiva, todo o verdadeiro poder oculto. Está aí, e todos os livros da verdadeira ciência só têm o fim de o demonstrar.
Para apoderar- se do grande agente mágico, duas operações são necessárias: concentrar e projetar; em outros termos, fixar e mover. O autor de todas as coisas deu para base e garantia do movimento a fixidez; o mago deve agir da mesma forma.
O entusiasmo é contagioso, dizem. Por que? É que o entusiasmo não se produz sem crenças firmes. A fé produz a fé; crer é ter uma razão de querer; querer com razão é querer com ma força, não direi infinita, mas indefinida.
O que se opera no mundo intelectual e moral, com maior razão se realiza no mundo físico; e quando Arquimedes pedia um ponto de apoio para levantar o mundo, ele procurava simplesmente o grande arcano mágico.
Num dos braços do andrógino de Henri Khunrath lê – se esta palavra: Coagula, e no outro: Solve.
Reunir e espalhar são os dois verbos da natureza; mas como reunir, como espalhar a luz astral ou alma do mundo? Reúne – se pelo isolamento, e espalha- se por meio da cadeia mágica.
O isolamento consiste, para o pensamento, numa independência absoluta; para o coração, numa liberdade completa; para os sentidos, numa continência perfeita.
Todo homem que tem preconceitos e temores, todo indivíduo apaixonado e escravo das suas paixões é incapaz de reunir ou coagular, conforme a expressão de Khunrath, a luz astral ou a alma da terra.
Todos os verdadeiros adeptos foram independentes até o suplício, sóbrios e castos até a morte; e a razão desta anomalia é que, para dispor de uma força, não deveis ser dominado por esta força de modo que disponha de vós.
Mas então, vão exclamar os homens que procuram na magia um meio de contentar os desejos da natureza, para que serve um poder que não se pode usar para se satisfazer? As pérolas nada são, pois, porque não tem preço alguma para o rebanho de Epicuro? Cúrcio não achava mais bonito mandar nos que têm ouro do que possuí – lo?
Não é preciso ser um pouco mais do que um homem ordinário, quando se tem a pretensão de ser quase Deus? Aliás, sinto afligir-vos e desanimar-vos, mas não invento aqui as altas ciências; eu as ensino e constato as suas rigorosas necessidades, estabelecendo as suas primeiras e mais inexoráveis condições.
Pitágoras era um homem livre, sóbrio e casto; Apolônio de Thyana e Júlio César foram homens de uma espantosa austeridade; Paracelso fazia duvidar do seu sexo, tanto era estranho às fraquezas amorosas; Raimundo Lullo levava os rigores da vida até o ascetismo mais exaltado; Jerome Cardan exagerou a prática do jejum a ponto de morrer de fome, se dermos crédito à tradição; Agrippa, pobre e correndo de cidade em cidade, quase morreu de miséria, para não se sujeitar aos caprichos de uma princesa que insultava a liberdade da ciência. Qual foi, pois, a felicidade destes homens? A inteligência dos grandes segredos e a consciência do poder. Era bastante para estas grandes almas. É preciso ser como eles para saber o que souberam? Não, certamente, e este livro que escrevo é, talvez, a prova disso; mas para fazer o que fizeram é absolutamente necessário empregar os meios que usaram.
Mas que fizeram realmente eles? Admiraram e subjugaram o mundo, reinaram verdadeiramente mais do que os reis. A magia é um instrumento de bondade divina ou de orgulho diabólico, mas é a morte das alegrias da terra e dos prazeres da vida mortal.
– Então, para que estudar? – perguntarão os vivedores.
– Simplesmente para conhecer, e depois, talvez, também para aprender a desconfiar da incredulidade estúpida ou da credulidade pueril. Homens de prazer (e como metade destes homens conto por muitas mulheres), não é um prazer muito grande o da curiosidade satisfeita? Lede, pois, sem temor; não ficareis magos apesar da vossa curiosidade.
Aliás, estas disposições de renúncia absoluta só são necessárias para estabelecer correntes universais e mudar a face do mundo; há operações mágicas relativas e limitadas a um certo círculo, que não exigem tão heróicas virtudes. Pode – se agir sobre as paixões pelas paixões, determinar as simpatias e antipatias, até afligir e curar, sem ter a onipotência do mago; somente é preciso estar prevenido do risco que se corre de uma reação proporcional à ação e de que facilmente se poderia ser vítima.Tudo isto será explicado no Ritual .
Fazer a cadeia mágica é estabelecer uma corrente magnética, que se torna mais forte conforme a extensão da cadeia. Veremos no Ritual, como estas correntes podem ser produzidas e quais são as diferentes maneiras de formar a cadeia. A tina de Mesmer era uma cadeia mágica muito imperfeita; vários grandes círculos de iluminados, em diferentes países do Norte, têm cadeias mais poderosas. Até a sociedade de certos padres católicos, célebres pelo seu poder oculto e sua impopularidade, é estabelecida pelo plano e conforme as condições das cadeias mais poderosas, e é o segredo da sua força, que atribuem unicamente à graça ou à vontade de Deus, solução vulgar e fácil de todos os problemas de força em influência ou adestramento. Teremos de apreciar, em nosso Ritual, a série de cerimônias e evocações verdadeiramente mágicas que compõem a grande obra da vocação, sob o nome de exercícios de Santo Inácio.
Todo entusiasmo propagado numa sociedade, por uma continuidade de comunicações e práticas firmes, produz uma corrente magnética e se conserva ou aumenta pela corrente. A ação da corrente é arrastar e, muitas vezes, exaltar fora das medidas as pessoas impressionáveis e fracas, nervosas, os temperamentos dispostos ao histerismo ou às alucinações. Estas pessoas logo se tornam poderosos veículos da força mágica, e projetam com força a luz astral na própria direção da corrente; opor- se, então, às manifestações de força, seria, de algum modo, combater a fatalidade. Quando o jovem fariseu Saul, ou Schôl veio lançar – se, como todo fanatismo e toda teimosia de um sectário, através do cristianismo invasor, punha- se, contra sua vontade, à mercê da força que acreditava combater; por isso foi fulminado por um formidável raio magnético, que foi, sem dúvida, mais instantâneo pelo efeito combinado de uma congestão cerebral e de uma queimadura solar. A conversão do jovem israelita Afonso de Ratisbona, é um fato contemporâneo absolutamente da mesma natureza. Conhecemos uma seita de entusiastas da qual se ri a distância e na qual entram
contra vontade os que dela se aproximam, mesmo para combatê – la. Direi mais, os círculos mágicos e as correntes magnéticas se estabelecem por si mesmos e influem, conforme leis fatais, sobre os que são submetidos à sua ação. Cada um de nós é atraído para um círculo de relações que é seu mundo e cuja influência sofre. Jean Jacques Rousseau, este legislador da revolução francesa, este homem que a nação mais espiritual no mundo aceitou como a encarnação de razão humana, Jean Jacques Rousseau foi arrastado à mais triste ação da sua vida, o abandono de seus filhos, pela influência magnética de um círculo de libertinos, pela corrente mágica de uma mesa de hotel. Ele o conta simples e ingenuamente nas suas Confissões , e é um fato que ninguém notou. Muitas vezes, são os grandes círculos que fazem os grandes homens, e reciprocamente. Não há gênios incompreendidos; há homens excêntricos , e a palavra parece ter sido inventada por um adepto. O homem excêntrico em gênio é aquele que procurar formar para si um círculo, lutando contra a força de atração central das cadeias e correntes estabelecidas. O seu destino é de ser despedaçado ou ter sucesso. Qual é a dupla condição de sucesso em tal caso? Um ponto central de fixidez e uma ação circular perseverante de iniciativa. O homem de gênio é aquele que descobriu uma lei real, e que, por conseguinte, possui uma força invencível de ação e direção. Pode morrer na obra; mas o que o ele quis realizar se realiza, apesar da sua morte e, muitas vezes, mesmo por causa da sua morte: porque a morte é uma verdadeira assunção para o gênio. Quando me elevar da terra, dizia o maior dos iniciadores, arrastarei tudo após mim.
A lei das correntes magnéticas é a do próprio movimento da luz astral. Este movimento é sempre duplo e se multiplica em sentido contrário. Uma grande ação prepara sempre uma reação igual, e o segredo dos grandes sucessos está inteiramente na presciência das reações. É assim que Chateaubriand, inspirado pelo desgosto das saturnais revolucionárias, pressentiu e preparou o imenso sucesso do seu Gênio do Cristianismo . Opor- se a uma corrente que começa seu círculo é querer ser despedaçado como o foi o grande e infeliz Juliano; opor- se à corrente que percorreu todo o círculo da sua ação é tomar a chefia da corrente contrária. O grande homem é aquele que chega a tempo e que sabe inovar o propósito. Voltaire, no tempo dos apóstolos, não teria achado eco para a sua palavra, e, talvez, teria sido simplesmente um parasita engenhoso dos festins de Trimalcyon. Na época em que vivemos, tudo está pronto para uma nova explosão do entusiasmo evangélico e do desinteresse cristão, precisamente por causa do desengano universal, do positivismo egoísta e do cinismo público do interesses mais grosseiros. O sucesso de certos livros e as tendências místicas dos espíritos são sintomas inequívocos desta disposição geral. Restauram – se as igrejas e constróem- se novas; quanto mais acham falta de crenças, mais esperam – nas; o mundo inteiro espera ainda uma vez o Messias, e não tardará a vir. Por exemplo, que haja um homem de posição elevada, pela sua classe ou por sua fortuna, um papa, um rei ou até um judeu milionário judeu, e que este homem sacrifique pública e solenemente todos os todos seus interesses materiais à salvação da humanidade, que se faça redentor dos pobres, propagador e até vítima das doutrinas de devotamento e caridade, e fará, ao redor de si, uma concorrência imensa, e dar- se-á uma transformação completa no mundo. Porém, a alta posição do personagem é, antes de tudo, necessária, porque nos nossos tempos de miséria e charlatanismo, todo Verbo proveniente de baixo é suspeito de ambição e velhacaria interessada. Vós, pois, que nada sois e que nada tendes, não espereis ser apóstolos ou messias. Tendes a fé e quereis agir na razão da vossa fé; chegai primeiramente aos meios de ação, que são a influência da posição e o prestígio da fortuna. Outrora se fazia ouro com a ciência; hoje é preciso refazer a ciência com o ouro. Fixaram o volátil, é preciso volatilizar o fixo; em outros termos, materializaram o espírito; é preciso, agora, espiritualizar a matéria. A palavra mais sublime não é ouvida nos nossos dias, se não for produzida sob a garantia de um nome, isto é, de um sucesso que representa um valor material. Quanto vale um manuscrito? O que vale, na livraria, a assinatura do autor. A razão social Alexandre Dumas & Cia., por exemplo, representa uma das garantias literárias da nossa época., mas a Casa Dumas só vale pelos seus produtos habituais: os romances. Que Dumas ache uma utopia magnífica ou uma solução admirável do problema religioso, considerado a sua descoberta como caprichos divertidos do romancista, e ninguém o tomará a sério, apensar da celebridade européia do Panurgo da literatura moderna. Estamos no século das posições conquistadas: cada qual na razão do que é social e comercialmente falando. Al liberdade ilimitada da palavra produziu um tal conflito de discursos, que hoje não se pergunta mais: “Que dizem? ”mas sim: “Quem disse isso? ”Se foi Rothschild, ou a sua santidade Pio IX, ou mesmo Monsenhor Dupanloup, é alguma coisa. Se foi Tartempion, muito embora este seja (o que, afinal de contas, é possível) um prodígio ainda ignorado de gênio, ciência e bom senso, nada é.
Àqueles, pois, que me disserem: “Se tens o segredo dos grandes sucessos e da força que pode mudar o mundo, por que não te serves dele? ”responderia: – Esta ciência me veio muito tarde para mim mesmo, e perdi, para adquiri – la, o tempo e os expedientes que, talvez, me teriam posto em condições de fazer uso dela; mas ofereço – a aos que estão em posição de servirem – se dela. Homens ilustres, ricos, grandes do mundo, que não estais satisfeitos do que tendes, e que sentis, no coração, uma ambição mais nobre e mais vasta, quereis ser os pais do mundo novo, os reis de uma civilização rejuvenescida? Um sábio, pobre e obscuro, achou a alavanca de Arquimedes, e vô – la oferece unicamente pelo bem da humanidade, e sem nada vos pedir em troca.
Os fenômenos que ultimamente agitaram a América e a Europa, a propósito das mesas falantes e das manifestações fluídicas, outra coisa não são senão correntes magnéticas que começam a formar- se, e solicitações da natureza que nos convida, para a salvação da humanidade, a reconstituir as grandes cadeias simpáticas e religiosas. Com efeito, a estagnação da luz astral seria a morte do gênero humano, e os entorpecimentos deste agente secreto já se manifestaram
por espantosos fantasmas de decomposição e morte. O cólera- morbo, por exemplo, as doenças das batatas e uvas não têm outra causa, como viram, obscura e simbolicamente, em sonho, os dois pastorinhos de La Salette.
A fé inesperada que a sua narração provocou e a imensa concorrência de peregrinos, determinada por uma narração tão singular e tão vaga como a destas duas crianças sem instrução e quase sem moralidade, são provas da realidade magnética do fato e da tendência fluídica da própria terra em operar a cura dos seus habitantes.
As superstições são instintivas, e tudo o que é instintivo tem uma razão de ser na própria natureza das coisas; é nisso que os céticos de todos os não refletiram bastante.
Atribuímos, pois, todos os fatos estranhos do movimento das mesas ao agente magnético universal, que procura uma cadeia de entusiasmo para formar novas correntes. É uma força cega por si mesma, mas que pode ser dirigida pela vontade dos homens e que é influída pelas opiniões correntes. Este fluido universal, se quiserdes que seja um fluido, sendo o meio comum de todos os organismos nervosos e o veículo de todas as vibrações sensitivas, estabelece, entre as pessoas impressionáveis, uma verdadeira solidariedade física, e transmite, de umas às outras, as impressões da imaginação e do pensamento. O movimento da coisa inerte, determinado pelas ondulações do agente universal, obedece, pois, à impressão dominante, e reproduz, nas suas revelações, ora toda a bizarria e toda a mentira dos sonhos mais incoerentes e mais vagos.
Os golpes dados nos móveis, a agitação ruidosa da louça, os instrumentos de música tocando por si mesmos, são ilusões produzidas pelas mesmas causas. Os milagres dos convulsionários de Saint-Medard eram da mesma ordem e pareciam, às vezes, interromper as leis da natureza. Exageração, de um lado, produzida pela fascinação, que é a o embevecimento especial ocasionado pelas congestões de luz astral; e, de outro, oscilações ou movimentos reais imprimidos à matéria inerte pelo agente universal e sutil do movimento e da vida: eis tudo o que há no fundo destas coisas tão maravilhosas, como se poderão convencer facilmente, reproduzindo à vontade, por meios indicados no Ritual , os mais admiráveis destes prestígios, e constatando nisso a ausência, facilmente apreciável, superstição, alucinação ou erro.
Muitas vezes me aconteceu, depois de experiências de cadeias magnéticas feitas com pessoas sem boa intenção e sem simpatia, ser acordado em sobressalto, à noite, por impressões e contatos verdadeiramente horríveis. Uma noite, entre outras senti realmente a pressão de uma mão que me estrangulava; levantei -me, acendi a luz, e pus – me tranqüilamente a trabalhar para utilizar a minha insônia e afastar os fantasmas do sono. Então, os livros se deslocavam perto de mim, com ruído, os papéis se agitavam e batiam uns contra os outros, a lenha estalava como se fosse partir – se, e golpes surdos eram dados no forro do quarto. Eu observava com curiosidade, mas também com tranqüilidade, todos estes fenômenos, que não eram menos maravilhosos se só a minha imaginação fosse a sua causa, tanta realidade havia nas suas aparências. Aliás, acabo de dizer que de modo algum estava atemorizado, e que me ocupava de outra coisa muito diversa das ciências ocultas, no momento, em que se produziam.
Foi pela repetição de semelhantes fatos que fui levado a tentar experiências de evocação, com o auxílio do cerimonial mágico dos antigos, e que obtive os resultados extraordinários que revelarei no décimo terceiro capítulo desta obra.
Eliphas Levi – Dogma e Ritual da Alta Magia
Alimente sua alma com mais:
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