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Morte Súbita entrevista Adriano Camargo Monteiro

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Adriano Camargo Monteiro é escritor de Filosofia Oculta, Draconismo e é estudioso de simbologia e mitologia comparadas e membro de diversas Ordens. Possui diversos livros publicados sobre o caminho da mão esquerda e participa do projeto Morte Súbita com a publicação de artigos. Também escreve para a Revista Universo Maçônico, para o Jornal Madras, para o Zine Lucifer Luciferax e para outros sites.

Conte um pouco sobre sua história. Como nasceu seu interesse pelas artes ocultas?

Sempre, desde criança (pelo que me lembro), fui atraído pelo sobrenatural, pelo mistério, por segredos e pela “aura misteriosa e oculta” das coisas. Assim, sempre busquei as manifestações culturais que refletissem isso, seja na arte, na música, na literatura, no cinema, etc. Desse modo, fui me aprofundando nos estudos, buscando livros “estranhos”, ingressando em Ordens e Escolas e praticando conforme fosse possível.

Fale um pouco sobre suas obras.

Minhas obras podem ser lidas (e estudadas) aleatoriamete, porém a obra Sistemagia é mais avançada sob o aspecto prático da Magia, requer discernimento, visão ampla, heurística, raciocínio analógico e capacidade autossuficiente de aplicar seu conteúdo. A Revolução Luciferiana pode ser introduzir o estudante ao assunto, fornecendo também alguns rituais e apresentando-lhe ideias novas, se for o caso. A Cabala Draconiana amplia os conhecimentos sobre o assunto. Contudo, as três obras citadas são importantes, cada uma abordando um aspecto distinto da Magia (abrangendo ciência, religião, filosofia e arte).

Para você o que é Magia?

Magia é um meio de tornar um indivíduo melhor em todos os aspectos, de ir além do comum e corrente; é um meio de autodesenvolvimento e evolução do Eu.

Como suas práticas ocultas influênciam no seu contidiano?

O conhecimento adquirido é aplicado no cotidiano conforme seja requerido e conforme seja possível, já  que nem todo conhecimento oculto convém usar na vida comum, devendo ficar “oculto” na intimidade autoconsciente do magista e de seu círculo “secreto”, de seu templo de Magia.

Você acredita que a Magia traz em si uma armadilha pela idéia de que estalando os dedos possa conseguir qualquer coisa?

Nesse sentido sim, há pessoas que “caem’ numa armadilha e que se decepcionam, pois a Magia de fato não é para toda e qualquer pessoa, e aqueles que não têm continuidade de própósitos, compreensão e vontade verdadeira sucumbem e são afastados por si mesmos dessa Via. Ou seja, a Magia e a Filosofia Oculta não são para meros curiosos ou interesseiros; de fato, a Magia e o Oculto se guardam a si mesmos.

Fale um pouco de sua visão sobre Deus.

“Deus” realmente pode ter muitas definições, e eu mesmo não me fixo em uma única. Conforme nosso conhecimento e experiência se expandem e se desenvolvem, nossa ideia de Deus também se modifica, pois nossa visão e conceitos sempre serão baseados em nossas experiências. Deus/a em primeiro lugar é para mim o meu Logos individual, meu Eu verdadeiro (não a personalidade comum e corrente que se manifesta no cotidiano social). Como psiconauta científico, Deus também pode ser definido como sistema nervoso, mente expandida, consciência supranormal, etc. Enfim, as definições de Deus podem ser muitas, mas jamais devem ser dogmáticas e fundamentalistas.

Quem é Lúcifer para você? Existe diferença entre Lúcifer e Satã?

Em primeiro lugar, Lúcifer e Satã não são o Diabo. Tanto Lúcifer como Satã têm seus equivalentes em outros povos, em outras mitologias, etc., e jamais podem ser vistos como coisas diabólicas, pois o Diabo não existe.

Tradicionalmente Lúcifer é o Portador da Luz, Luz essa que só pode ser vista sobre o fundo negro das Trevas. Portanto, as Trevas são essencias para a manifestação da Luz (que jamais pode ser total e absoluta, pois se fosse assim, essa Luz nos tornaria cegos, sendo necessário, portanto, a interação da Luz com a aconhegante e repousante Noite). A Luz de Lúcifer é a luz da inteligência, da autoconsciência, da mente expandida, da sabedoria (Sophia) humana, sobre-humana, natural e cósmica. Lúcifer é o Eu, o Logos individual, o Deus/a de cada um, com todas as atribuições mencionadas, que se manifesta no Iniciado e para o Iniciado.

Satã tem diversos nomes, tais como Shaitan, Set, Saturno, Shiva, o destuidor das Ilusões do mundo comum e corrente e detestado exatamente por isso! Daí ser ele o “Adversário” das massas condicionadas e inconscientes no mundo prosaico, presas às Ilusões e na estagnação. Satã também é a força impetuosa que impulsiona o indivíduo a progredir, é a força agressiva para enfrentar as dificuldades da vida material, para enfrentar os problemas do mundo, para transpor as barreiras que nos impedem de crescer, de aprender. Satã é a força que agrega todos os nossos instintos (de sobrevivência, de fome, de reprodução, de busca pelo prazer, etc.) para que possamos vivenciar todos os tipos de experiências que são assimiladas pela Individualidade, pelo Eu.

Mas tanto Lúcifer quanto Satã têm seus símbolos, personificações, zoomorficações, tipificações, arquétipos, etc.

O que você acha do inferno?

O inferno não existe como as pessoas comumente entendem (ou existe, se elas querem acreditar numa ilusão forjada). “Inferno” simplesmente quer dizer “o que está embaixo”, “inferior”. E aquilo que é inferior depende muito do referencial e do ponto de vista de cada um, com suas devidas justificativas e idiossincrasias. Para mim, o inferno pode ser este mundo se eu vivenciar experiências que considero inferiores. Assim como o paraíso também pode ser este mundo se eu vivenciar experiências que eu considero superiores, prazerosas, gratificantes, não importando os dogmas, os fundamentalismos e as limitações alheias. Os deuses de um povo são diabos para o inimigo desse povo; o céu de alguém (ou de uma religião ou dogma) pode ser o inferno para outra pessoa… É o que de fato ocorre…

Quais suas fontes de inspiração e consulta para escrever seus livros?

De modo geral, minhas inspirações vêm da observação e experiência, mas para confrontar dados e certas informações, para estimular insights, ou pelo prazer do conhecimento, leio de tudo (força de expressão, pois ninguém é capaz de ler tudo o que existe). Entretanto, dou preferência para obras de filosofia oculta em geral, religiões comparadas, grimórios, simbologia, mitologia, mas também filosofia acadêmica, ciência e “pseudo”-ciência (fringe science), psicologia, literatura clássica, artes.

O que falta para a cena ocultista nacional?

Mais ousadia, mais vontade, mais autores ocultistas e livre-pensadores, mais escritores livres de dogmas, mais estudiosos e praticantes sérios e com continuidade de propósitos.

Como você aprecia o trabalho de Aleister Crowley?

O trabalho de Crowley teve muito impacto e importânica na filosofia oculta ocidental, trazendo coisas até  então não muito exploradas pelos ocidentais urbanizados e abrindo terreno para mais explorações e desenvolvendo certos conteúdos, práticas e conceitos da Magia. Mas, é claro, que nem tudo o que ele fez pode ser aproveitado por todo e qualquer indivíduo. Há coisas que são muito pessoais e particulares e que serviram apenas para ele. Infelizmente, o que existe ainda hoje é uma falta de discernimento e de seletividade com relação à obra de Crowley. Isso pode ser evidenciado num afetado crowleyanismo que pode ser visto em thelemitas (ou falsos thelemitas, pois suas vontades parecem ser a do Crowley) fundamentalistas por aí afora.

Qual sua opinião sobre o satanismo moderno, tal como exposto por Anton LaVey?

Como em tudo na vida, é preciso peneirar. LaVey apresentou ideias úteis que servem para qualquer indivíduo que queira viver mais livre e cuidar melhor de si, buscando os prazeres sem medo, sem as ideias de culpa, pecado e condenação que permeiam a grande parte da sociedade. Apresentou ideias que deveriam ser o normal para qualquer pessoa que busca melhorar a si mesmo de maneira consciente e deliberada. Por outro lado, o satanismo de LaVey parece se apegar às ideias judaico-cristãs, buscando combatê-las por oposição dentro dos próprios dogmas judaico-cristãos. Ou seja, o satanismo laveyano tem como referencial os próprios dogmas que busca inverter, o que acho descenessário quando já não se vive sob o látego desses dogmas religiosos; não há o que renunciar quando não se acredita nos dogmas vigentes, quando não se vive sob eles. Uma renúncia implica em abandonar algo com certo sacrifício, sendo assim não há o que abandonar quando alguém já não segue os dogmas, não há grilhões para se desfazer se a pessoa já é livre disso. Portanto, o referencial dogmático judaico-cristão como objeto de blasfêmia sistematizada é desnecessário e sem sentido para qualquer indivíduo livre, pois um blasfemo só pode ser alguém que vive dentro desse dogma e que já tenha acreditado nele, e que num determinado momento se volta contra ele. A inversão do dogma religiosos demonstra uma certa crença nesse dogma e uma necessidade de libertação (pois ainda não se é livre) pelas mais variadas razões. O ideal é ignorar o dogma, monstrando que ele não tem qualquer importância (e se defendendo de ataques, quando necessário, logicamente). Os dogmas religiosos não têm qualquer importância na intimidade daquele é livre e segue apenas sua Vontade.

Há  também os adolescentes satanistas “de farmácia” imaturos que não sabem nada sobre o assunto nem sobre o que querem atacar ou se revoltar. Preferem “brincar” de fazer terror sem qualquer embasamento ou discernimento, mas da Magia e do Ocultismo de verdade, e com responsabilidade, eles nem chegam perto.

Quero ressaltar também que o LHP (o Caminho da Mão Esquerda) não é satanismo, como muitos pensam, mas sim uma Via que valoriza sobretudo a mulher, o sexo (a magia sexual em contexto ritualístico) e as sombras (forças do subconsciente) como repositório de conhecimento oculto e expriência que dever ser buscado, empreedendo a prática da filosofia oculta, invocações, evocações, etc.

Muito da cultura luciferiana no Brasil ainda está presa à cultura afro. Livros como o de São Cipriano são muito populares em terreiros, inclusive pela temática folclórica. Como você enxerga estas relações?

O luciferianismo (ou draconismo) é bastante abrangente exatamente porque busca o conhecimento em todas as suas formas e graus, na medida em que isso seja possível. Porém, há necessidade de discernimento quando se está iniciando nessa Via. E arquétipos ou manifestações luciferianas sempre existiram em todos os povos, em todas as culturas e mitologias do mundo, desde a Antiguidade. Mas não considero que os livros mencionados, ou outros de orientação semelhante, sejam pura e autenticamente luciferianos, apesar de serem úteis como bagagem de conhecimento de todo estudioso.

Tente encaixar as suas crenças na moral social vigente. Você  usa termos negativos e positivos, “bem” e “mal” em sua crença?

Depende do ponto de vista, do conhecimento individual e da experiência. Por exemplo, o Deus que muitos consideram bom, outros consideram a verdadeira malignidade, e assim por diante. É claro que há muitos equívocos coletivos sobre isso e muitas inversões de valores. Mas eu uso esses termos, sem qualquer dogmatismo, para indicar aquilo que me prejudica (mal) ou prejudica outros gratuitamente de algma maneira, ou para indicar aquilo que me traz prazer, saúde, alegria, conhecimento, etc. (bem). Porém, a questão do mal é muito complexa e vai além do mal ordinário, corriqueiro e comum perpetrado por pessoas desprezíveis, cruéis e atrasadas no mundo e que abunda nas lamentáveis notícias. Essa questão está além dos clichês e dos dogmas, está mesmo em “regiões” do conhecimento ininteligíveis para as grandes massas, em “regiões” em que o mal é entendido de outra maneira, numa dimensão ancestral, cósmica e primeva, sem qualquer ligação com as ideias equivocadas sobre diabo e inferno.

Quais seus planos para o futuro? Algum livro novo em vista?

Mais dois livros para serem lançados pela Madras Editora, possivelmente em 2010. Um é sobre ritualística e o outro é de orientação mais filosófica.

Uma palavra final para quem está começando agora?

Busque o conhecimento, estude bastante, leia obras sérias e diversificadas, compare os autores, pratique e vivencie a teoria por meio da experiência individual. Enfim, liberte sua mente, revolucione sua consciência!


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