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Sitra Achra

Metafísica Lovecraftiana – Os Rituais Satânicos

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Parte deste capítulo foi traduzida por Rev. Obito

Até para seus conhecidos mais íntimos, Howard Phillips Lovecraft(1890-1937) permaneceu frustrantemente enigmático. Da caneta deste ingênuo garoto de New England(USA) surgiu uma coleção dos mais convincentes e aterradores contos de ficção macabra dos tempos modernos. Seus contos eram adornados de maneira única com uma pseudo-documentação rica em detalhes fantásticos e descrições meticulosas de personagens e cenários. É freqüentemente dito que uma vez que alguém entra em contato com Lovecraft desiste da competição. Essa afirmação tem se provado difícil de ser refutada.

Como era de se esperar, Lovecraft se tornou uma celebridade e foi extensivamente copiado por um sem número de escritores cuja imaginação foi despertada por seu “Mito de Cthulhu”, o termo popular usado para descrever uma série de contos baseados em um grupo de criaturas sobrenaturais que ele criou. Ele tinha a convicção de que a referência à mitologia clássica iria contrabalancear a atmosfera de desorientação cíclica e espacial que ele procurava criar. Lovecraft criou suas próprias criaturas, cujas atividades pré-históricas na Terra resultaram na criação da raça humana assim como os horrores de sua imaginação. Enquanto Einstein e Freud batalhavam em suas respectivas especialidades no isolamento da especialização acadêmica, Lovecraft estava descrevendo a incrível influência das leis da física e geometria na psiquê humana. Mesmo hesitando se tornar um mestre na arte da especulação científica, ele merece este título tanto quanto Asimov e Clarke.

O que deixava muitos de seus admiradores atônitos era a atitude quase que casual do autor por sua obra. Ele repetidamente se referia a ela simplesmente como um meio de subsistência financeira. Para aqueles que suspeitavam que ele possuía uma crença pessoal no mito, ele respondia que uma indiferença objetiva do próprio material era necessária para uma escrita mais efetiva. Ele estava acostumado a mencionar suas narrativas com uma falta de seriedade que beirava o escárnio, como se ele não as considerasse genuíno material literário. Como autor, Lovecraft possui uma reputação estabelecida, mas e quanto a Lovecraft o filósofo?

Talvez as pistas mais significantes para a filosofia no mito se derivem da fascinação do autor com a história da humanidade, especialmente as épocas clássicas. Que muito de seu material foi tirado de lendas egípcias e árabes é fato conhecido. Existem evidências de que ele estava a par dos efeitos da civilização sobre a raça humana – tanto educacional quanto repressivamente. Seus contos constantemente lembram o leitor de que a humanidade está a um passo de distância das mais depravadas e violentas formas de bestialidade na cadeia evolutiva. Ele sentia a atração dos homens pelo conhecimento, mesmo que ele resultasse na perda da própria sanidade. A excelência intelectual, ele parecia dizer, é alcançada juntamente com um terror catastrófico – e não tentando evitá-lo.

Este tema de uma constante relação entre as facetas construtivas e destrutivas da personalidade humana é a pedra angular das doutrinas do Satanismo. O teísmo argumenta que a integridade do indivíduo pode ser ampliada por uma rejeição da carne e obediência à moralidade. Lovecraft relatou sua aversão ao dogma religioso convencional em A Chave de Prata, e ele tratou com um escárnio semelhante aqueles que, rejeitando a religião, sucumbiram à uma controversa substituta, i.e. o conceito popular de bruxaria. O conceito de adoração é obviamente ausente nos mitos de Cthulhu. Nyarlathotep, Shub-Niggurath, Yog-Sothoth e Cthulhu são todos glorificados em bizarros festivais, mas a relação entre eles e seus seguidores sempre é como a de um professor para com seus alunos. Compare a descrição de uma cerimônia lovecraftiana com uma missa cristã ou um rito vodu, e fica claro que o elemento da servidão está definitivamente ausente na primeira.

Lovecraft, como o Satã de Milton, preferiu reinar no Inferno do que servir no Céu. Suas criaturas nunca são estereótipos absolutos do bem ou do mal; elas oscilam constantemente entre benevolência e crueldade. Elas respeitam o conhecimento, pelo qual o protagonista de cada história abandona qualquer comedimento prudente. Críticos que consideram os Antigos como elementais aristotélicos – ou uma influência maligna coletiva que o homem deve destruir para prevalecer – sugerem uma disposição grosseira. Lovecraft, se tolerou tais análises, dificilmente se impressionou com elas.

Supondo que Lovecraft fosse um advogado do amoralismo satânico, o que poderia estar contido nas práticas rituais em Innsmouth, R’lyeh, ou Leng? Em sua obra ele se limita a falar de algum “rito sem nome” ou “orgia indescritível” celebrada por grotescas aparições em cavernas sulfurosas com apodrecidos fungos fluorescentes, ou perante titânicos monolitos de aspecto perturbador. Talvez ele julgasse que uma exposição incompleta fosse mais eficaz em dar asas à imaginação de seus leitores, mas ele foi claramente influenciado por fontes muito reais. Se suas fontes de inspiração eram conscientemente reconhecidas e assumidas ou fruto de uma extraordinária absorção “psíquica”, pode-se apenas especular. Não há dúvida de que Lovecraft tinha conhecimento de ritos não tão “sem nome”, visto que as alusões em suas narrativas são frequentemente idênticas às práticas e nomenclatura de cerimônias verdadeiras, principalmente aquelas praticadas e expandidas por volta da virada do último século (XIX).

Os Innsmouths e Arkhams de Lovecraft tem suas duplicatas em pequenas vilas praianas e áreas costeiras abandonadas ao redor do mundo, e para localizá-las não precisamos de nada além de nossos sentidos: a área de Land’s End em São Francisco; Mendocino no norte da costa da Califórnia; de Hamptons a Montauk em Nova York; entre Folkestone e Dover no Canal da Mancha; na costa córnica a oeste de Exmouth, e em vários pontos ao longo da costa da Bretanha na França. A lista não tem fim. Onde o homem comtemplar o fim da terra e a transição para o mar com medo e desejo misturados em seu coração, a isca de Cthulhu existe. Qualquer plataforma costeira de extração de petróleo ou “Torres do Texas”(bases da Força Aérea Americana não mais existentes) poderiam ser altares para o habitante do abismo das águas.

Lovecraft parece ter pegado os monstros de cem pickmans – os grandes pintores simbolistas da década de 1890 – e os colocado num cenário do séc. XX. Suas fantasias podem muito bem ter sido uma projeção consciente da idéia tão eloquentemente expressa por Charles Lamb em seu Witches and Other Night Fears:

“Gorgons, Hydras e Quimeras podem se reproduzir no cérebro da superstição – mas elas já estiveram aqui antes. Elas são transcrições, seus arquétipos estão em nós e são eternos.”

Por isso é impossível deixar de especular sobre a realidade proposta pela fantasia – a possibilidade de que os Antigos sejam os espectros de uma futura mentalidade humana. É como resultado desta especulação que A Cerimônia dos Nove Ângulos e A Invocação de Cthulhu são apresentadas. A primeira dá ênfase ao poder, a segunda reflete o obscurecimento de um passado quase esquecido. O idioma usado não possui nome. A tradução é o mais exata possível que permitem os métodos atuais.


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