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PRÓLOGO
O presente ensaio busca exaurir analiticamente a simbologia presente na figura de Baphomet. Digo exaurir, mas não esgotar. Ver-se-á a riqueza que esta imagem encerra, a qual não poderia ser sintetizada senão pictoricamente, como o fez Eliphas Levi. É bem conhecida sentença popular que diz “uma imagem vale mais do que mil palavras”. Tal se aplica ao simbolismo presente neste grande síntese panteísta, que se resume neste nome tão mal compreendido.
A imagem de Baphomet é comumente associada ao demônio, a Satã, ao bode do Sabbath dos feiticeiros. Tudo isso pode estar correto num certo sentido (profano, evidentemente).
Entretanto, acima das falsas luzes do mundo cotidiano, respirando o ar luminoso do Monte Zyon, Baphomet é um sacramento dos Iniciados e Adeptos (do latim sacro+mente=aquilo que mantém o sagrado na mente, traz a santidade aos pensamentos).
Deixai que os profanos o maldigam e o apedrejem. Os profanos não são culpáveis por isso, como não são imputáveis pelos seus crimes os loucos e os incapazes. Eles não são capazes de contemplar o rosto horripilante do ídolo, como não são capazes de nada. Eles não têm “olhos quem vem” e nem “ouvidos que ouvem”. São cegos e surdos. Baphomet não é para estes. Baphomet é para os que têm os olhos abertos e contemplam, para os que ouvem e entendem, para os que estão despertos. Para aqueles que são capazes de trilhar o Caminho que suas mãos indicam: mergulhar nas profundezas, ascender aos céus, santificar as profundezas e as alturas, descansar sob a sombra das suas asas, sorver leite das estrelas que flui de seus seios, o elixir da eternidade.
Baphomet é uma imagem (ειδολον). Nós tentaremos ir além da imagem, e decompô-la ao máximo. Solve! É a ordem dada pelo Senhor da Iniciação, até reduzir tudo a pó. Coagula! O sentido extraído do todo deve se aglutinar no templo interior do Adepto até tornar-se Pedra.
Agora tritura tudo, e tereis a tintura, o Elixir da eternidade. Baphomet é tudo isso e não e nada disso. Depende da perspectiva e da capacidade do artesão.
Mas cuidado. Eu me refiro varias vezes a ele como ídolo, ainda assim Baphomet não deve ser adorado. Aparta-te da idolatria. Baphomet não é um deus.
Ademais, os Adeptos não adoram deuses:
os Adeptos são DEUSES!
A.´.M.´.E.´.M.´.
I CAPUT
Após os pilares do templo, adentra-se no átrio do Sanctum. Não há como ver muito longe. O silêncio é absoluto e qualquer murmúrio é uma blasfêmia.
Mas há uma luz que se adivinha lá adiante, no Sanctum Sanctorum. Até aqui as sombras reinaram.
O irmão terrível, ainda em silêncio, aponta adiante o Véu dos Mistérios Sublimes, o véu de Peroket.
Olhar além deste véu é como mergulhar no abismo.
Então o irmão terrível dá a ordem e o véu se abre, e contemplamos face a face o senhor da Iniciação.
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Entre os cornos de Baphomet vemos a tocha, porque ele é o Dadouches, o principal iniciador de Eleusis, o portador da tocha, o Phosphoros Grego, aquele que trás a luz da Iniciação, associado a Prometeu, que furtou de Zeus o fogo sagrado (λογοσ), e deu-o aos homens. Para os romanos ele é Lúcifer, aquele que trás a luz. Note-se que tais significações estão no seu sentido original, i. e., não maculadas pelo sentido cristão.
Como portador da luz, representada pelo fogo, teremos que nos focar nas significações deste elemento, uma vez que a tocha existe em função do fogo. É também o chakra Sahasrara, o lótus de mil pétalas. Resultado da aplicação correta da fórmula I.N.R.I. que será analisada em ocasião própria.
Quem trouxe o fogo aos homens foi Prometeu, segundo o registro de Heródoto em “Os Trabalhos e os Dias”. Tal episódio reproduz com outra simbologia a passagem do Atharva Veda, 12, 2, que proclama: “O Deus Agni escalou os cimos celestiais/ e ao liberar-se do pecado/ ele nos libertou da maldição”. Assim teremos uma semelhança entre Agni e Prometeu, ambos como seres benfazejos ao homem. Agni (raiz etimológica de Ignis = fogo em latim, veja também que “puro” e “fogo” tem a mesma palavra no sânscrito) é apenas um aspecto do fogo, pois há no hinduismo, três espécies: primeiro Agni, o fogo em si-mesmo, o segundo Indra, o raio e o terceiro Surya, o fogo como Sol, portanto, estes são os arquétipos do fogo terrestre, intermédio e celestial.
Seja qual for o aspecto, o fogo (Pyr em persa, πυρ em grego), guarda estreitas relações com os ritos de regeneração e purificação (note aqui a raiz etimológica). Assim a tocha de Baphomet acende o Athanor filosófico, o cadinho onde é gestada a pedra filosofal que será triturada para produzir o Elixir da Imortalidade (Amrita ou Soma). O Athanor assim encontra-se no coração, pois este é o centro do Manipura-chakra, cujo símbolo é triangulo ígneo, segundo os Upanichads. O sistema de chakras também é encontrado no tantrismo tibetano, que consideram apenas cinco centros de força sutil, e que também associa o fogo ao coração. Além disso, o coração é a morada do espírito (Jacob Boheme), e relacionando-se com o espírito e fogo chegaremos ao Espírito Santo, que se manifesta no cristianismo como línguas de fogo no pentecostes. O Logos manifesto. Note que o Espírito Santo é relacionado ao sêmem, pois no BAHIR é dito que o sêmen provêm do cérebro e caminha pela espinha até o falo, este também um símbolo cognato (φαλοσ é um cognato de πιραμισ onde ocorriam iniciações).
No judaísmo, as ofertas ao Tetragrammaton eram queimadas, pelo que nos explica Abu Ya’qub Sejestani, o fogo eleva as coisas ao estado sutil (espiritual) pela combustão do invólucro grosseiro, assim tanto se presta a trazer aos homens o Logos, quanto a levar aos deuses a essência. Vejamos também como tal o sentido dos ritos fúnebres, a cremação dos corpos entre os gregos e os hindus tem o mesmo significado, pois o fogo é não apenas um elemento purificador ou regenerador, mas também seu toque assegura a passagem de um estado a outro.
Ainda, o fogo da tocha de Baphomet é o fogo que consome, o fogo devorador, o αγαπε, um dos três aspectos do Amor, segundo Platão (εροσ e φιλοσ são os outros dois), e justamente o aspecto cósmico do amor, e não apenas o sexual (εροτοσ) e altruísta. O αγαπε é o amor que leva o Adepto ao auto-sacrifício espiritual.
Por fim, sendo o fogo um símbolo do intelecto ou logos, ou de Tipheret para os qabalistas, o sentido pleno só pode ser compreendido em relação aos dois chifres, formando assim um ternário, como nos desvelou E. Lévi. Sem o a tocha, os chifres significam a díada, o dois, o número que, tomado em si mesmo, é a dualidade, o mal (διαβολοσ, origem etimológica de diabo, significa aquele que divide). Em seu aspecto negativo é vhbv vht, o vazio e o amorfo, cujo valor é 430, o mesmo de >pn, a alma animal (irracional) do homem. A tocha sendo o Espírito Santo, ‘>ydq ‘xvr, que organiza o vácuo e a matéria, reconciliando o Caos primordial. (Compare com a passagem do Gênesis I, 2.)
Sendo o chifre um símbolo do Poder (em hebraico nrq=chifre, poder, força, provável raiz etimológica da palavra latina “cornu”), sem o Espírito reconciliador, o poder é dividido, e não subsiste, além do que são de caráter lunar e não solar, pois são de touro para alguns, e de cabra para outros, ambos símbolos ligados a terra e seu aspecto fecundo, também ligado à fertilidade e daí a sexualidade, dividida em papéis ativo e passivo.
Segundo René Guénon, a associação entre o Touro e a Lua era familiar aos sumérios e também aos hindus, sendo reconciliada pelo crescente lunar, presente em ambos os panteões. Para os hindus o Mahabharata identifica Shiva com sua montaria, o Nandi, ou touro sagrado. Em representações mais antigas, Shiva possui chifres.
O Amom egípcio, o deus oculto, era chamado no livro dos mortos de “Senhor dos dois chifres”, mas estes são de caráter solar, chifres de carneiro, conforme se tem pelas representações de Apolo Karneios e mais tarde Dionisos. Segundo Jung o chifre reconcilia, em si mesmo, os papéis ativo e passivo, respectivamente pela força de penetração e por sua abertura em forma de receptáculo.
Nas religiões persas encontramos Mitras imolando o touro, o pai de todas as coisas. Esta relação entre o touro e Mitras encontra uma ressonância em Baphomet que para alguns ocultistas induz a plena identificação de ambos os seres. Crowley dizia, citando Von Hammer-Purgstall, que Baphomet era originalmente grafado com um “r” solar no fim da palavra, assim teríamos Baphometr (?) ou Baphomitr (?), que significava “pai Mitra”, e ele era um deus touro ou matador de touros.
Além disso, Mitra era uma divindade solar dos persas, na realidade ele não matava o touro, mas o sacrificava, fazendo deste animal, entre os orientais, um animal solar, em contraposição a natureza lunar do mesmo touro entre os babilônios, embora ambos estejam relacionado à fertilidade, aos ciclos do das estações e a agricultura.
Resumidamente, os poderes dos chifres lunares de Baphomet poderiam ser tomados como as forças ativas e passivas da natureza, balanceadas pelo intelecto ou Logos. O Adepto ou iniciado deve possuir esses atributos, sendo essa a natureza do Bodhisattva, termo sânscrito (em tibetano Diang Shuv Sempa), que significa “aquele cujo espírito é desperto (a tocha) e que age com coragem (os chifres)”.
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O simbolismo dualista presente no glifo nos indica a princípio o caráter andrógino do ídolo. Nele estão presentes, além dos signos duplos dos braços, chifres, luas, etc., a unidade dos dois sexos, representados pelos seios e pelo falo, ou lingan, em forma de caduceu. Os traços da androginia são presentes em muitas divindades como Adônis, Dioniso, entre outros. Não é um ser assexuado, como quer o modelo do cristianismo, mas explicitamente bissexual, conforme podemos observar nas divindades gregas. Zeus teve “casos” com mortais e imortais de ambos os sexos, Dioniso o fazia igualmente.
O lingan tântrico é representado muitas vezes com a Yoni em seu corpo. Shiva e Shakti abraçam-se e tornam-se Adha-Nari, o ser primordial. Veja também os diálogos de Platão, especialmente o Banquete.
Não apenas no paganismo encontramos tais ocorrências.
O Midrash judaico também relaciona a androginia de Adam-Kadmon como um estado que é preciso reconquistar.
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A cabeça do ídolo é a do Bode, animal de natureza lunar, em oposição ao carneiro solar, mas segundo Levi trás os traços do cão, do touro e do asno. Levi interpretou esses hieróglifos de uma forma demasiadamente pejorativa, associado-os a responsabilidade da matéria e a expiação dos pecados corporais; provavelmente, em relação ao bode, tenha sido inspirado pelas lendas do Bode de Zazel, o bode expiatório, e daí sua relação com o pecado. Essa significação não se esgota nisso, aliás, ela é muito mais profunda e dirige-se a rumos bem diferentes do imaginário judaico-cristão.
Isto apenas indica que o simbolismo do bode e da cabra foi extremamente degenerado do cristianismo para frente, principalmente pelo aspecto sexual da figura. Libidinosus foi a palavra usada por Horácio nos Épodos, Livro 10, verso 23, para designar o animal que era sacrificado para afastar as tempestades, ambos os símbolos associados ao desregramento e ao caos. Saint-Martin chama-o de “animal fedorento”, sinal da “abominação”, “rejeição”, “putrefação e iniqüidade”. Foi na idade média que a iconografia cristã associou o Diabo, o deus da luxúria (sexo) ao bode, em decorrência de sua absorção a necessidade de reprodução.
Na Índia, a cabra é Prakriti, a mãe do mundo (AMMA MUNDI), que possui três qualidades essenciais: sattvas, rajas e tamas. A cabra, além de sua ligação com a fertilidade (Pan, divindade arcádica da fertilidade era representado com cascos e chifres de bode) e a luxúria por sua pujança e fecundidade genésica (libido), era sagrada na maior parte das culturas antigas. Adorada entre os babilônios em Susa como deus da fertilidade, era especialmente considerada pelos gregos como portadores de teofania, sendo sacrificada na ocasião da consulta dos oráculos. Diodoro da Sicília relata que em Delfos foram elas que chamaram a atenção dos camponeses para certos vapores que exalavam das rochas, e que faziam as cabras pular de modo bizarro e incomum. Sobre estas rochas eles fundaram um oráculo. Ainda entre os gregos, é conhecida a tradição órfica que a alma iniciada é como um cabrito caído dentro do leite. O bode é especialmente caro também a Dioniso, uma vez que além de ser sua oferenda predileta, foi na forma de um bode que ele fugiu de Typhon, indo para o Egito.
O simbolismo do bode se liga de forma sutil ao do fogo, vez que ambos são considerados elementos essenciais dos ritos de Iniciação. Ainda no Atharva Veda, 9, 5 vemos tal associação de modo claro: “o bode é Agni; o bode é o esplendor/que afasta as trevas para longe./ ó bode, sobe ao céu dos homens justos”.
As patas da figura são também de bode. Além do que os bodes são exímios em escalar grandes montanhas ou picos rochosos. Seu equilíbrio é notável e não demonstram medo algum de altura. Tais qualidades são esperadas do iniciado, mas em sentido esotérico, i. e., as alturas da sabedoria as vezes se tornam sufocantes, o ar se rarefaz, mas como o bode, no qual ele tem se convertido (a idéia é de Orfeu), ele não deve se deixar arremeter pela falta de ar nem pelo medo da altura.
Os traços de cão ou chacal são facilmente associados ao deus Anpu ou Anúbis como psicopompo, ou guia das almas ao mundo subterrâneo, Thuat. Esse processo de morrer implica o renascimento de Osíris, um cognato explícito da Iniciação. Assim Anúbis é o guardião do portal para o mundo subterrâneo, isto é, o mundo oculto, o templo onde a Iniciação ocorre para o renascimento do neófito como Osíris. Vemos o cão no mesmo posto na mitologia grega, onde haveremos de encontrar Cérbero, o cão de três cabeças do Hades, um monstro mitológico, afável para os que chegam, brutal e feroz para os que tentam escapar. Além disso, para os profanos o principal atributo do cão é a fidelidade, que para um iniciado é uma das principais virtudes. Assim o iniciado tem estes atributos do cão como elementos do seu juramento: ser fiel a ordem, e guardar as portas do templo contra a curiosidade dos profanos.
Ainda ligado ao mundo dos mortos, veremos que na Índia o asno aparece como o asura Dhenuka, ligado a Nairrita, guardião da região dos mortos e Kalaratri, aspecto sinistro de Devi. O asno era relacionado comumente a ignorância na maioria das culturas antigas. Apuleio, no livro O Asno de Ouro, mostra-nos Lúcio, apaixonado por uma cortesã, sendo transformado em asno, que segundo Jean Beaujeu, é “a manifestação concreta, o efeito visível e o castigo de seu abandono ao prazer da carne”.
Concluímos assim que o asno está intimamente ligado aos aspectos bestiais da força sexual. Mas no quesito relacionado à Iniciação, encontramos o asno relacionado a Baco. Aristófanes, no poema As rãs, coloca estas palavras na boca do deus: “eu sou o asno que carrega os mistérios”, e, conhecendo as relações das lendas de Cristo e Dioniso ou Baco, teremos um paralelo com a celebração da festa dos ramos, quando o Cristo (que representa um grau e não uma pessoa) adentra as portas da cidade sagrada montado numa mula (um asno “castrado” para os freudianos). No cristianismo o asno parece ser um animal sagrado, uma vez que, além de carregar o Cristo na sua sagração pública, aparece em sua natividade e na fuga para o Egito. Neste âmbito judaico cristão, o asno esta também associado a Saturno, o segundo sol, que é a estrela de Israel. Saturno portanto é identificado com o Tetragrammaton. Por sua vez, Saturno se relaciona com Set, o deus Egípcio que era adorado nos desertos do sul na forma hierática de um deus com cabeça de asno. Finalmente, quanto a natureza do glifo, não parece ser um animal lunar, mas solar, uma vez que é associado comumente pelo tamanho de seu pênis a Príapos, uma divindade grega da fertilidade e da agricultura, de natureza solar-fálica, como todos os deuses solares, que são também relacionados ao falo.
Os traços de touro e seu simbolismo já foram explicados acima quando interpretamos os chifres.
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II TORAX
Os seios da figura, segundo Levi, são relacionados à maternidade, uma asserção bastante óbvia. Mas há também uma relação estreita com proteção e medida. Bath (tb) em hebraico significa filha, mas também medida, a palavra mãe (ama) também se refere a medida, o que infere que os seios da figura, sendo um glifo da maternidade e de medida ao mesmo tempo. No que tange a esta última significação, há uma referência velada ao equilíbrio necessário entre as operações alquímicas sugeridas nos braços humanos da figura (solve et coagula), isto é, seus seios são o “fiel” da balança. tb tem valor numérico 402. Dividindo por dois, encontraremos a palavra Luz, em hebraico Aur (rva cuja forma alternativa é ra). São dois seios, duas luzes, medidas, balanceadas, equilibradas. Além disso, o seio esquerdo pode querer significar a lua, cuja natureza feminina se refere a coagulação, enquanto o direito ao sol, masculino e quente, responsável pela solução. Num plano mais acima, simbolizam as sephiroth Chesed e Geburah, respectivamente aglutinante e corrosiva.
Os seios da figura vertem leite, são uma fonte. Leite em hebraico é Chalav (blx), cujo valor é 40 (40×4=160= qny mamar, sugar os seios). No Ramaiana, o elixir da eternidade é resultado da batedura de um mar de leite, além disso, o leite é o primeiro alimento e a primeira bebida que nutrem o recém nascido, assim, é um símbolo esotérico da pura gnosis, o primeiro alimento dos iniciados, uma vez que o leite é expressamente associado por Maomé ao conhecimento e a sabedoria, segundo um hadith (tradição) registrado por Ibn Omar (El Bokhari, les traditions islamiques, Paris, 1914), há também referências em harmonia com esse conceito na literatura tântrica, o Boddhichitta simboliza tanto o pensamento como o sêmen.
Os Vedas se referem ao leite como a bebida da imortalidade no Agnihotra, a oração matinal: “Indra e Agni vivificam/ este leite em alegre canto: / que ele dê a imortalidade / ao homem justo que sacrifica”. Também nos hinos órficos o leite é exaltado como símbolo da imortalidade: “Feliz e bem aventurado / serás tu feito um deus, e não apenas mortal. / Cabrito, caí dentro do leite”. A relação sugerida do cabrito, que simboliza o recém iniciado já foi acima elucidada.
Assim o leite dos seios de Baphomet é o “leite da virgem”, uma expressão alquímica para o Elixir da Longa Vida.
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Levi desenha penas no dorso da figura, entre os seios e as escamas. As penas são multicoloridas ou policrômicas, como as do pavão, que é, nos Jataka Budistas, um símbolo do Bodhisattva, o iluminado.
Por serem as penas do pavão policrômicas, representam as variações de luz do prisma, simbolizando os sete planos astrais ou os planetas da astrologia clássica. Afinal, todas as cores do espectro que o homem pode captar são em número de sete.
Em outras culturas, como no Curdistão, teremos os Yezids venerando Malik Tauus, o pavão real. Segundo Idries Shah, o significado deste nome é Rei (malik, semelhante à melek em hebraico) da terra verdejante (tauus). É na realidade, para o mesmo autor, um símbolo da soberania (indicada pelo termo Malik) sobre a mente (a terra verdejante – tauus).
As associações do pavão com a vaidade são degenerações típicas do cristianismo.
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As escamas do seu ventre não foram elucidadas por Levi, e podem ser tanto de peixe quanto de serpente. Segundo Levi devem assumir a cor verde, o que as relaciona com Netzach, o firmeza ou vitória, e daí a Vênus, divindade nativa do mar, indicando para alguns que as escamas sejam de peixe, símbolo riquíssimo, relacionado ao elemento água, que pode ser relacionado a três grandes temas: fonte da vida, regeneração e purificação. A natureza aquática de Baphomet, liga-o ao grande mar de Binah, o mar da sabedoria, as águas negras, Maym, sobre as quais paira o Espírito dos Elohym, a água como a matriz ou suporte físico da criação, e também da nutrição do conhecimento (gnosis), pois são várias as passagens nas escrituras sagradas do judaísmo em que se faz referência a “águas vivas”, e água, no Bahir é uma palavra cognata a conhecimento. O simbolismo da água, sugerido pelas escamas de peixe da figura, são demasiadamente complexos para serem analisados aqui.
Na Índia, o peixe Matsya é um avatar do deus Vishnu. Este peixe salva Manu do dilúvio e lhe entrega os Vedas; assim o peixe é o revelador da doutrina sagrada, sendo um ser relacionado à teofania, como a cabra (lembre que o signo de capricórnio é representado comumente com corpo de peixe e dorso caprino). São também considerados como elementos de teofania o Dagon fenício e o Oannes mesopotâmico, ambos portadores da revelação. O peixe além de revelador é também um animal ligado a redenção. É conhecida a história de Jonas, que passou três dias na boca de uma baleia, e também de Ântio, na Grécia, salvo por golfinhos. O simbolismo do delfim mescla os atributos de revelador e redentor fazendo parte do culto de Apolo, o deus da profecia, e dá o nome ao principal oráculo desta divindade (delfos = raiz etimológica de delfim).
A simbologia do peixe é deveras conhecida no mundo antigo. Tal é sua popularidade que foi posteriormente associada a Cristo. A palavra grega ΙΧΤΘΣ, peixe, é um notariqon de Ιεσουσ Χριστσ Τεοσ Θιουσ Σοτηρ (Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador).
Além disso, o peixe é relacionado ao espermatozóide ou o sêmen, por motivos bastante óbvios, e daí relacionando-se com o Logos, conforme se pode ver acima. Assim, lembremos ainda que o peixe além de estar relacionado a Vênus, está do mesmo modo a Mercúrio, primeiro pela sua cor e depois por ter sangue frio. Este ultimo símbolo o reconcilia com a qualidade de revelador e redentor, ambos atributos de Hermes ou Mercúrio, o mensageiro dos deuses.
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III PHALO
Chegamos, assim, num dos sigilos mais importantes da figura, o Kerikeyon, ou caduceu de mercúrio (que rompe do manto que oculta as pernas do ídolo e atravessa um semicírculo que representa o anel de constelações do zodíaco) é um símbolo dos fundamentos do mundo (Yesod). O caduceu é posto no ídolo no lugar do falo. Há passagens no Bahir que aduzem explicitamente que o falo dos justos é o fundamento (Yesod) de tudo o que vive, e a coluna sobre a qual se apóiam os céus; há também a passagem em Provérbios, 10, 25 com significado semelhante (o justo é o fundamento –Yesod – do mundo). A figura pode parecer um tanto provocativa para o gosto judaico-cristão, mas o falo na antiguidade não tinha o sentido pejorativo que ganhou após a ascensão dos patriarcas católicos.
Sua significação não se restringe a atributos eróticos ou sexuais, mas sim ao poder gerador, o canal e fonte do sêmen, como símbolo do Logos Divino, e é venerado de forma velada em inúmeras religiões. O falo é o pilar da vida, seu manifestador, além do que fica no centro do corpo, sendo chamado de sétimo membro, assim não é simplesmente um membro sustentador, mas equilibrador, e o falo de Baphomet não é um falo qualquer, é o Caduceu de Hermes, o símbolo maior do equilíbrio dinâmico das forças complementares.
O caduceu é um dos símbolos mais antigos da humanidade, e remonta ao século XXV a.C. aparecendo simultaneamente em Lagash, na Suméria, e na Índia, nas tábuas Nagakals. Essas tábuas retratam o Brama-danda, o eixo (falo) do mundo, enlaçado por duas serpentes helicoidais (naga) que por suas origens tântricas, representam claramente sushuma (o bastão ou falo) que é, segundo Blavastky, o eixo central da espinha dorsal, pelos quais sobem em forma espiral os dois aspectos do pranayama, os nadis chamados ida e pingala (as serpentes helicoidais – naga-kalas). Os nadis ou canais ou kalas são representados pelas duas serpentes, uma vermelha e a outra azul, símbolos das correntes cósmicas ou akáshicas, de polaridade dupla, equilibrado pelo eixo central ou bastão, por onde flui a energia ígnea da Kundalini. Temos aqui uma reprodução no plano microcósmico do que a cabeça da figura representa, isto é, em relação aos chifres e a tocha entre eles.
Com os gregos, talvez por inspiração egípcia, o caduceu ganha novos atributos, o globo alado, símbolo de Aton, o disco do sol. Assim o símbolo deixa de ser ctoniano (pelas simples presença das serpentes) e ganha qualidade uranianas (representadas pelas asas). Nele também estavam os símbolos dos elementos primários: a madeira do bastão correspondia a terra, as asas ao ar e o fogo e a água pelas duas serpentes. Os romanos interpretavam o caduceu como poder, pela presença do bastão, prudência qualidade das serpentes, a diligencia, sugerida pelas asas e os pensamentos elevados, em virtude do círculo.
A dualidade presente no símbolo faz lembrar os poderes de vida e morte detidos por Hermes, que segundo Pausânias, tinha dois cultos distintos: o Hermes negro (ctoniano) que guiava as almas ao Hades e o Hermes branco (uraniano) que desempenhava o papel de núncio divino.
O caduceu encontra ecos na qabalah, sendo uma síntese hieroglífica da árvore da vida ou Otz Chiim (e o bastão é de fato um símbolo da arvore do Éden, onde a serpente da sabedoria se enrosca). Assim, o circulo alado representa Kether, a cabeça das serpentes são Chokmah e Binah, o nódulo superior Daath, o duplo enlace superior Chesed e Geburah, o nódulo do meio Thipheret, o duplo enlace inferior Netzach e Hod e o nódulo inferior Yesod; Malkut é a base do cetro.
Por fim, citemos Van Lennep (Ars et Alchemie, Bruxelas, 1966) que aduz significações alquímicas ao caduceu:
“É o cetro de Hermes, deus da alquimia. (…) Estas (as serpentes) representam para o alquimista os dois princípios contrários que se devem unificar, quer sejam o enxofre e o mercúrio, o fixo e o volátil, o úmido e o seco, o quente e o frio. Esses princípios conciliam-se no ouro unitário da haste do caduceu que surge, portanto, como a expressão do dualismo fundamental que ritma todo o pensamento hermético e que deve ser reabsorvido na unidade da Pedra Filosofal”.
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O manto que envolve a parte inferior da figura é de cor púrpura, a cor de Chesed, a mesma utilizada pelos imperadores e magistrados romanos, expressando autoridade ou supremacia. O manto está especialmente ligado a transmissão de um ensinamento, a uma tradição herdada (veja os episódios de Elias e Eliseu no livro dos reis). O manto de Maomé era disputado pelos discípulos, e por fim foi dado ao primeiro ayatholá, como sinal da autoridade passada de uma pessoa para a outra, o mesmo acontece entre os sufis. O chefe da tariqa, ou casa, antes de morrer deve delegar a chefia para outro, e a transmissão do manto é o ponto central do ritual.
Significa também o ocultamento dos processos alquímicos, o manto do segredo, de onde emerge a grande obra. Por isso o caduceu não aparece completamente, sua parte inferior está em Malkuth, oculta nas entranhas da terra, sob o manto da fertilidade natural. Daí se infere que o ouro alquímico deve ser extraído das entranhas da terra. Tal asserção infere o uso da fórmula V.I.T.R.I.O.L. (Visita Interiore Terrae Retificando Invenies Ocultum Lapidem), que por sua vez implica no conhecimento da fórmula I.N.R.I., Igni Natura Renovata Integra; Intra Nobis Regnum deI; Isis Naturae Regina Ineffabilis; Igne Nitrum Roris Invenitur entre outras sentenças, das quais a mais comum é a primeira, ou “o fogo da natureza renova todas as coisas”, fogo este que aparece entre os chifres. O fogo natural, conjugação dos quatro elementos incinerados pelo fogo do espírito, que na fórmula rosacruciana escreve-se yrny, 270, ou y (Yaym=água), n (Nour=fogo), r (Ruach=ar) e y (Yabesh=terra), vem das entranhas da terra (V.I.T.R.I.O.L.), sobe pelos nadis e explode em chamas no chakra Sahasrara, o lótus de mil pétalas. A formula I.N.R.I. tanto a latina quanto a rosacruciana conecta-se com a fórmula F.I.A.T. cuja significação iniciática representa o Verbo Divino, também de origem latina (sendo Flatus, Ignis, Aqua, Terra).
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IV SOLVE & COAGULA
As mãos caracterizam a santidade da grande obra, para Eliphas Levi, ademais simbolizam atividade, prática adquirida. Um tratado alquímico taoísta identifica as mãos com os processos de solução e coagulação, da mesma forma que as formulas escritas no antebraço direito e esquerdo.
O y é um glifo da mão, e significa também poder (poder=dy=14). São duas mãos, mas um só poder, isto é, 14×2=28 (poder=xk=28), referindo uma operação única, uma unidade (dvxy=28).
A mão esquerda aponta para a lua branca (Binah), a mão direita para a lua negra (Netzach), assim a figura contrabalança a atuação da severidade, apontando para a pura sabedoria, ao mesmo tempo que indica misericórdia, apontando a firmeza, Netzach. Tanto Netzach quanto Binah são emanações passivas, femininas. Mas cada uma esta num dos extremos da árvore da vida, Netzach abaixo, Binah acima. A natureza severa (ativa) da Grande Obra é sugerida pela força corrosiva de Geburah, enquanto a natureza misericordiosa da mesma é indicada pela ação coagulante de Chesed.
O mudra de ambas as mãos é o sinal sacerdotal do Dadouches, o iniciador, revelando a doutrina exotórica, simbolizada pelos dedos esticados, e ocultando os mistérios esotéricos, reservados aos iniciados, simbolizados pelos dedos dobrados, que escondem parte da palma da mão. A letra hebraica k significa “palma da mão”, e seu valor é 20, a letra y significa mão, e quando soletrada em hebraico vale 20 (dvy). O mistério que o Dadouches oculta é a doutrina secreta, a Grande Obra em si mesma, que é o ouro filosófico (ouro=bvhz=20).
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A figura toda tem o sentido sublimado quando atribuem-se-lhe asas, e sublimada não apenas no sentido espiritual, mas alquímico, isto é, a passagem para a categoria sutil, tal como o simbolismo da águia devorando o leão.
As asas se relacionam com o elemento ar. O vocábulo asas em hebraico escreve-se mypnk, cujo valor é 200, o mesmo de verão – iyq – a estação onde predomina o calor do sol; a letra r significa sol e seu valor é também 200.
As asas são atributos da potência cognitiva (no Rig-Veda é dito que a inteligência é a mais veloz das aves) além do que a maioria dos seres espirituais e mesmo os demoníacos possuem asas, quando são benfazejos, as asas são de natureza uraniana, de pomba ou águia, etc., quando malfazejos, são de natureza ctoniana, sendo as representações mais comuns as asas de morcego.
Na tradição gnóstica as asas significam a potência espiritual, o pneuma (espírito); provavelmente um conceito herdado da cultura egípcia onde o ba, o espírito individual que vaga pelo mundo dos vivos, é uma ave com cabeça humana. (vide a introdução ao Livro dos Mortos de Budge).
O livro dos salmos faz referência as asas do Tetragrammaton (XVI, 8 e XXXV, 8) e segundo Gregório de Nissa, se o criador tem asas, o homem original, feito a sua semelhança, também o teria. A queda ou pecado original foi que as decepou, necessitando, portanto, haver a reconciliação entre o criador e os homens para que este atributo seja reconquistado. As significações desta fábula são obvias.
Em suma, as asas simbolizam a natureza do ser divinizado. Mas de que espécie de asas são as asas do ídolo? E esta pergunta se justifica porque a significação pode se alterar conforme sejam elas de corvo, pomba ou águia…
A iconografia maçônica de Baphomet o mostra como uma águia de duas cabeças, de cor negra (porque ela é relacionada à Fênix, que renasce das suas próprias cinzas, e as asas de Baphomet como águia e como Bode são negras, por que resultam da calcinação). A águia se relaciona especialmente a Fênix porque de tempos em tempos ela troca suas penas, garras e bico, em cujo período torna-se frágil, para depois “renascer”. O símbolo da águia bicéfala apresenta um triângulo negro entre as cabeças com a cifra 33, o triangulo é símbolo do fogo, relacionando-se com o fogo do Dadouches. É também o símbolo do grau 33, o grau máximo do templo, o grau do Venerável Mestre, cuja sentença “ordo ab xaos” expressa a mesma significação, uma vez que o V.´.M.´. cumpriu a Grande Obra, restabelecendo o equilíbrios dos elementos sob a predominância do espírito (ver a fórmula INRI). Em outras iconografias o triângulo com a cifra é substituído pela coroa, relacionando-se então a Kether, o que transpõe o simbolismo para um plano divino.
A águia bicéfala é segundo alguns uma divindade vegetal. Para Frazer (A Rama de Ouro) era o símbolo do poder absoluto, que migrou com as cruzadas na idade média das civilizações da Ásia menor para a Áustria e a Rússia, como símbolo das armas imperiais.
A águia representa em outros panteões a percepção da luz intelectual, a gnosis direta, pois ela pode mirar o sol que não a cega. Era atribuída a Zeus e mais tarde a Júpiter, sendo o emblema imperial da autoridade de Roma.
No extremo oriente ela é Garuda, a montaria de Vichnu. Garuda tem os atributos de nagari, inimiga das serpentes, e também nagantaka, destruidora de serpentes. Tal inimizade provem de lendas pré arianas onde Garuda é o emblema das raças solares e Naga, o ancestral primeiro das raças lunares. Em sânscrito garuda também significa “palavra alada”, um símbolo cognato ao verbo cristão. No Irã a águia ou falcão é um símbolo de varana (poder ou unção divinas) que no Avesta (Zamyad-yashta; XIX, versos 43 e 38) é representado como uma falcão (varaghna) um parente próximo da águia.
No xamanismo indígena é comum encontrarmos a águia como o animal totêmico do xamã. Sua origem encontra-se no mito siberiano na qual a águia é o ancestral dos xamans. A história conta que o Altíssimo mandou a águia para socorrer os homens, perturbados por enfermidade e morte, mas eles não entenderam sua linguagem, então ela copula com uma mulher e ela concebe o primeiro xamã. (Este episódio é contado por Uno Harva no volume Lês representations religieuses des peuples altaiques, Paris, 1959). Há uma analogia com as lendas do nascimento de Cristo, como portador dos poderes curativos de Deus.
-o0o-
V
O ASTER TON PENTE!
Abaixo da tocha está o Pentalfa, a estrela que indica a quintessência, e conforme Levi:
“O pentagrama é o signo da onipotência (…) do Verbo feito carne e, segundo a direção dos seus raios, este símbolo absoluto em magia representa o bem ou o mal, a ordem ou a desordem, o cordeiro bendito de Ahura-Mazda e de São João, ou o bode de Mendes. É a iniciação ou a profanação, a vitória ou a morte, a luz ou a sombra. Elevado no ar, com duas pontas para cima, representa satã, ou o bode da missa negra; com apenas um dos raios para cima, é o Salvador. O pentagrama é a figura do corpo humano, com quatro membros e uma única ponta, que deve representar a cabeça. Uma figura humana, de cabeça para baixo, representa, naturalmente, o demônio, ou melhor, a subversão intelectual, a desordem, a loucura”.
Goethe conhecia também as virtudes do pentalfa, pois sem dúvida era um Iniciado de primeira ordem; eis como a ele se refere no Fausto:
“Ah, que deleite a vista tal, se estende de súbito por todos os sentidos, e prazer juvenil, sagrado gosto até à medula ardentes me penetram! Seria um deus quem desenhou tal signo que a eterna tormenta em mim serenam, o pobre coração de paz me enchem e com secreto impulso patenteiam em torno a mim as forças da natura? Serei deus? Tão claro se me torna tudo! E patente nestes puros traços vejo ante mim a natureza ativa. Agora compreendo a voz do Sábio: ‘não está cerrado o mundo dos espíritos; o coração tens morto e o pensamento! Eia, discípulo! O terreno peito no rubor da manhã banha incansável!’”
Paracelso o considerava como o mais poderoso dos signos mágicos, onde estão resumidos os mais sublimes mistérios da magia, da alquimia, dos símbolos gnósticos e qabalísticos. Lembra-nos também o mestre que sua ponta virada para cima indica a natureza da obra, ligada a teurgia, ou conexão com a espiritualidade superior, em oposição à goécia, que não seria necessariamente má, contudo teria natureza experimental, o que a torna perigosa para uma pessoa despreparada.
O pentagrama flamejante, como o chamava Agrippa, é identificado com Lúcifer (do latim, aquele que trás a luz, o titulo latino do Dadouches, o Senhor da Iniciação). Lúcifer é também o filho da aurora, a estrela da manhã, rx> ]b llyh, um símbolo do Sagrado Anjo Guardião, !lm ynda, ambos com a mesma valoração gemátrica, 635. O pentagrama é o símbolo supremo de hrvbg, a quinta emanação da coroa, seu valor é 216, porque ela reina e julga (]d=54) sobre os quatro elementos 54×4=216. O pentagrama, portanto, deve estar presente em todos os trabalhos de Magia, os quais ele testemunhará e julgará.
Há um mistério acerca do pentagrama que é muito pouco conhecido. Ele simboliza todas as manifestações divinas. Os ângulos de cada ponta são de 72º(=360º/5). 72 são os nomes de Deus, segundo a qabalah, Shem-há-mephorash, os Nomes ocultos do Tetragrammaton, que se extraem da passagem do Êxodo, XIV, 19, 20 e 21. Há também aqui uma relação com a tetrakys pitagórica cujo arranjo de é este:
o o
o o o
o o o o
Somando-se cada um dos elementos chegamos a 10 (1+2+3+4), o número da Unidade manifesta. Há igualmente um arranjo qabalístico do Tetragrammaton, que fica no centro do triângulo teúrgico:
h y
v h y
h v h y
Somando-se os valores gemátricos de cada linha (10)+(15)+(21)+(26) chegaremos a 72. A doutrina que se extrai disso é que todas as expressões da divindade (72) ocultam-se no y, cuja numeração é 10, e a chave deste mistério se oculta no pentagrama.
Pentalfa (um notariqon gráfico, com 5 “A” conjugados) era como os Pitagóricos a ele se referiam, uma vez que encerrava os cinco deveres do Adepto: ver, ouvir, meditar, bem agir e calar, ou
Ατρεο, Αιστον, Αδαλεσθη, Αγατοπειρον, Αβακιδζι,
bem como as cinco qualidades esperadas: amabilidade, beneficência, incorruptibilidade, castidade e severidade ou
Αγανετοσ, Αγελασοσ, Αγατηοεργοσ, Αδιαφιτηορτοσ, Αγνοσ.
As cinco pontas reapresentam ainda os cinco elementos, como dito no início: o espírito, a água, o fogo, a terra e o ar (em sentido horário); o homem, as ondinas, as salamandras, os gnomos e os silfos, etc.
* * *
O simbolismo cognato, tanto do pentagrama quanto do ídolo Baphomético é extremamente maleável, e poderíamos prosseguir infinitamente. Há inegáveis implicações alquímicas, as quais me reservo o direito de abordar em outro ensaio futuro, especificamente relacionando o ídolo a esta disciplina, como o fiz aqui, em que BAPHOMET é posto como um espelho do Adepto.
Julgamos que o presente ensaio tenha trazido mais luz onde não é necessária nenhuma. De qualquer forma, é preciso iluminar o ambiente para que os mais tímidos possam se aproximar do ídolo sem nenhum medo.
Minha intenção maior foi demonstrar Baphomet como um espelho do Iniciado, como disse antes, e também um mapa indicativo, tanto do trabalho a ser desempenhado na Grande Obra como do resultado desta Grande Obra e, outrossim, um hieróglifo dos Mistérios mais sublimes e terríveis.
(Verão de 2008 e.v.)
APÊNDICE
ΝΟΜΟΣ
(EPITETVS)
Sobre o Nome do Ídolo
A origem do ídolo é desconhecida. Eliphas Levi não refere à fonte de onde tenha tirado sua imagem. O mesmo ocorre com o nome cujo significado também é algo controvertido. Tudo o que os eruditos disseram até hoje é pura especulação. Assim, o que segue no resto deste capítulo sem valor (de número 0) é também pura especulação.
Para alguns o vocábulo Baphomet teria origem na Grécia, na conjunção dos vocábulos Bapho+Methis, algo como “Batismo da Sabedoria”, que não parece tão inverossímil como a suposição de que seja uma corruptela gnóstica de tvmhb, o hipopótamo do Egito (cuja gematria resulta 453, o mesmo valor de hyx >pn, a alma animal do todo, ou “ANIMA MUNDI”, um título do ídolo entre os Iniciados). A palavra é plural, e não se refere a um animal, mas um conjunto deles. Existem ainda inúmeras hipóteses.
Minha opinião é de que a asserção de Levi esteja correta: TEM.´.OHP.´.AB, Baphomet é um acróstico ou sentença iniciática que significa O Pai do Templo, a Paz de todos os Homens ou TEMPLI OMNIUM HOMINUM PACIS ABBAS.
De qualquer forma, a raiz etimológica do nome ou a origem da figura não apresentam tanta importância, ainda que o seu estudo talvez revele alguns fatos interessantes como a comparação da grafia de Baphomet, em grego com a qabalah hebraica. É uma operação ousada, e ainda que para alguns seja um disparate, tomemos a seguinte: βαφομηθ = 630. Este valor, na qabalah hebraica corresponde a Espírito Santo (‘>ydq ‘xvr) e também a Adão e Eva (hvxv ,da), ambas figuras bissexuadas, como o próprio ídolo. Há também um fato interessante a respeito deste valor 630. Somando a cifra com sua imagem invertida 630+036 (cujo zero perde o valor) temos 666, o número da Iniciação e também o numero da Besta no apocalipse.
Besta selvagem em hebraico é hmhb, cujo valor é 52, o mesmo que )my), Mãe Suprema, um título de Binah. Segundo esse jogo nada usual – eu reconheço – de valores gemátricos, poderíamos inferir que Baphomet é a besta selvagem do abismo de Da’ath – Choronzon (?), conforme alguns acreditam, mas não devido a este mirabolante mecanismo que eu apresento aqui. O Iniciado deve enfrentá-lo, portanto, para descansar em Binah, a Mãe Suprema, cuja mão direita do ídolo indica.
A cifra 666 é o número místico de Tipheret, e seu valor gemátrico conecta Ommo Shaytan (]tc vmmi) a tríade demoníaca da invocação preliminar do não-nascido), ao Nome Jesus (hv>hy m>), ambos de valores idênticos.
Por Emanuel Pavoni (IAIDAH BAPHOMETO 6667)
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