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O caráter antagônico da Natureza é descrito pela literatura, pela psicologia e pela filosofia.
Foi Heráclito quem primeiro descreveu a função reguladora dos contrários, mostrando que, em algum momento, as coisas correm em direção ao seu contrário.
Foi seguindo os caminhos da Natureza que Jung descreveu este mesmo jogo antagônico na psique humana.
Demonstrou a inclinação natural da psique de convergir na direção a um Centro – para o Si-mesmo.
Jung chama a atenção para o perigo de haver identificação com um dos pólos, o que resultaria em doença psíquica. A unilateralidade romperia a tensão necessária para manter o equilíbrio e a saúde psíquica.
O oposto da atitude consciente é a sombra, que, ao ser reprimida, faz pressão para se manifestar. Daí a necessidade de se procurar conectar a força oposta da
consciência.
Como acredita Jung, “é no oposto que se acende a chama da vida”.
Jung alerta que o confronto com os opostos, e a sua integração, é fundamental para o processo de individuação, para se alcançar a Totalidade, para que o homem
se torne um ser, não perfeito, mas mais feliz.
Totalidade inclui reconhecer e aceitar em si, as qualidades que estão em oposição “ao ideal do ego”, as qualidades opostas aos valores culturais e
morais.
A integração dos opostos é um processo que começa pelo reconhecimento da sombra, ou seja, da parte da personalidade que contém os aspectos primitivos,
reprimidos, inadequados aos padrões estéticos e morais de uma cultura.
Tomar consciência da sua sombra é condição “sine qua non” para o indivíduo começar o caminho rumo ao auto-conhecimento, rumo à consciência.
O homem que não conhece sua face sombria, é um homem que só conhece uma face de “sua moeda”, é um ser unilateral, falsamente iludido sobre sua natureza humana,
e, por isso, presa fácil do mal, adepto do recurso de projetar no outro, no mundo, as qualidades que não reconhece em si.
Do ponto de vista conceitual, é Freud quem faz a análise mais profunda da divisão entre o lado luz e o lado sombra da psique humana. Mas é Jung quem dá à
sombra uma abordagem mais ampliada.
A cisão entre o lado luz – o Bem – e o lado sombra – o Mal – é evidente e absoluta na tradição judaico cristã.
Originalmente, a tradição cristã reconhecia os opostos que o homem traz em si, conforme as palavras de São Paulo: “Não faço o bem que quero, mas o mal que não
quero”.
Essas palavras, revestidas de conhecimento de psicologia humana, revelam que São Paulo sabia que possuía a sombra, e o fato de ter esse conhecimento é que o
mantinha íntegro.
Segundo Jung, Criador e criatura deveriam ser uma toalidade, mas devido à cisão perpetuada pelo Cristianismo, surgiu o mundo de luz e o mundo de trevas.
O Taoísmo afirma que tudo é criado pela integração dos opostos ( yin-yang ) que representam a luz e a sombra, o positivo e o negativo, o bem e o mal.
Estes pares de opostos são pares complementares da Natureza que nunca podem ser separados. São princípios do Universo e toda a Criação está sujeita a este
contraponto.
A sombra não é basicamente má. Há grande energia e potencial na porção reprimida. Esta energia precisa ser conectada e amalgamada à personalidade, e
não unilateralizada. Porque, tanto para o bem como para o mal, não se deve sucumbir a nenhum dos opostos.
A noção de bem e mal é relativa e fruto de julgamento de valor, portanto subjetiva e passível de contaminação da sombra pessoal.
Sendo assim, o ponto de referência não está nos polos, mas sim, no meio, no equilíbrio.
Se um dia a paz for alcançada, seus promotores não estarão entre as pessoas “que se fizeram santas”, mas entre as pessoas que aceitaram sua natureza pecadora com humildade.
A busca da santidade é nefasta também, porque, ao se identificar unilateralmente com sua parte boa, o indivíduo joga-a contra a sua parte oposta.
Sendo um arquétipo, a sombra tem conteúdos afetivos poderosos, com capacidade de autonomia, obsessão e possessividade que lhe dão capacidade de ascendência sobre a estrutura do ego.
A sombra representa o arquétipo do bode expiatório, do ‘outro”, sobre o qual é lançada toda a culpa, toda a maldade do indivíduo que ele não reconhece como
sua.
Através do recurso do bode expiatório, o homem nega sua sombra. O bode expiatório presta um serviço ao seu acusador, na medida em que ele carrega para
esse, o fardo de sua sombra feia, inadequada ao “padrão de beleza” que o ego idealiza.
A sombra reprimida e relegada ao inconsciente, torna-se um potencial de energia, energia essa que vem a tona sob a forma de projeção.
Na projeção a relação com o mundo externo é uma relação revestida de ilusão.
O meio ambiente ganha a configuração que a sombra lhe dá: a maldade, a feiúra que o homem não admite como sua, é lançada no ambiente, no outro.
A metade bonita, perfeita, ele abraça como sua, o que resulta num ser dividido, de ego inflado, pretensamente bom.
Um dos prejuízos que a projeção traz é que a pessoa reage ao ódio e violência “que-lhe mandam” com mais ódio e violência e o círculo vicioso se forma. A
projeção faz surgir, literalmente, no outro e no ambiente, as situações que o indivíduo projeta.
O perdão aos outros é um modo de dizer que já nos aceitamos integralmente, com nossa sombra. O perdão é a própria aceitação da vida como ela é.
Auto perdão, a indulgencia é o sacudir da poeira, é a renovação da auto estima e da alegria de viver, é o caminho da integridade e da felicidade.
Angela M. Monnerat
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