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Mais um massacre em algum colégio pelos Estados Unidos vai voltar a acender a discussão sobre o porte de armas de fogo. Parece que é só esse tipo de acontecimento que nos faz pensar no assunto: massacres e Estados Unidos.
Vamos então trazer esta discussão para nossa porta! Entre 1985 e 2015 mais de 900 mil pessoas foram mortas por armas de fogo no Brasil. Pronto, este é um ótimo começo. Lendo isso você pode não ter idéia da ordem de grandeza, 900.000 dividido por 30 anos acaba dando 30.000 mortes por ano, agora isso dividido por 12, ai por 7… quantas pessoas morrem por minuto resultado de arma de fogo… Vou te poupar a matemática e dizer de cara que esse número é maior do que o número de mortes das guerras da Bósnia e do Iraque juntas.
A Unesco criou um mapa da violência em 2014 que mostra que desde 1980 o número de homicídios com armas de fogo aumentou cinco vezes.
Isso por si só já deveria servir de argumento que sem armas de fogo não há como matar alguém usando a arma de de fogo. É como afirmar que se proibirmos a posse e o uso de carros terminam as mortes por atropelamento. Simples assim.
Outro ponto interessante é: a maioria é burra! Desculpe o exagero, não quis ofender. A maioria é medíocre. Se não confiamos no povo para escolher nosso presidente imagine confiar no povo para garantir a segurança nas ruas. Dê uma arma para todos e todos poderão se defender, inclusive quando estiverem bêbados, nervosos além da razão, afogados em TPM, quando seus times de futebol perderem algum campeonato. Certo, é melhor deixar que a polícia cuide da segurança.
Somos todos racionais. Somos todos do bem. Somos todos civilizados.
Mas então eu vou ser a voz da ignorância colocando minhocas na sua cabeça e te dando alguns fatos para você começar a exercer esse racionalismo que clama ter.
1º – Vamos parar de demonizar armas de fogo. Não vou entrar aqui no mérito de que aquilo que garantiu nossa evolução enquanto espécie foi o desenvolvimento de armas cada vez melhores, que nascemos sem presas, garras ou músculos e por isso ter facas, machados, lanças, flechas, atiradeiras, mosquetes, ak47’s, foi o que nos fez chegar onde chegamos: um apartamento em um bairro civilizado com uma família civilizada, deixe isso para quem quer discussões infrutíferas, vamos usar a matemática que é impessoal e se baseia em fatos:
– Ter uma piscina em casa é mais perigoso do que ter uma arma de fogo. Isso é fato. A cada ano uma criança morre como vítima de arma de fogo para cada mais de um milhão de armas de fogo existentes. Calcule o número de armas de fogo disponíveis em seu pais e faça as contas, se existem 200 milhões de armas de fogo, haverão entre 175 e 200 mortes de crianças com menos de 10 anos vítimas dessas armas.
Já a morte por afogamento de crianças é de 1 em cada 11.000 piscinas em casa.
Morte por arma de fogo de crianças com menos de 10 anos: 1 para cada 1.000.000 de armas (aproximadamente)
Morte por afogamento em piscinas em casa de crianças com menos de 10 anos: 1 para cada 11.000 piscinas, aproximadamente.
– Se a Unesco usa matemática, vamos usar também: se compararmos o número do aumento de homicídios com o aumento da população, veremos que o número de vítimas de armas de fogo se mantém estável desde os anos 1980.
Posso continuar com mais fatos. Mas vou parar por aqui por um momento. Afinal, qual a finalidade deste texto? É simples:
No Brasil, o Estatuto do Desarmamento é uma lei federal que entrou em vigor no dia seguinte à sua sanção no dia 23 de dezembro de 2003. Trata-se da Lei 10826 de 22 de dezembro de 2003, regulamentada pelo decreto 5123 de 1º de julho de 2004 e publicada no Diário Oficial da União no dia seguinte, que “dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição (…)”.
Ou seja, você vive em um país que tem uma lei que proíbe o porte de armas por civis, com exceção para os casos onde haja necessidade comprovada; nesses casos, haverá uma duração previamente determinada e sujeita o indivíduo à demonstração de sua necessidade em portá-la, com efetuação de registro e porte junto à Polícia Federal (Sinarm), para armas de uso permitido, ou ao Comando do Exército (Sigma), para armas de uso restrito, e pagar as taxas, que foram aumentadas. Um exemplo dessas situações são as pessoas que moram em locais isolados, que podem requerer autorização para porte de armas para se defenderem.
Tudo isso surgiu de um blá blá blá de que se tirarem os carros ninguém mais vai ser atropelado. E claro um referendo onde pediram a opinião de Deus sobre o assunto. (Como Deus não foi encontrado pediram a opinião do povo – já que a voz do povo é a voz de Deus – no ano de 2005 para saber se a população concordaria com o artigo 35 do estatuto, que tratava sobre a proibição da venda de arma de fogo e munição em todo o território nacional. O artigo foi rejeitado com resultado expressivo, com 63,94% dos votos “NÃO” contra apenas 36,06% dos votos “SIM”.)
E hoje você não pode ter armas de fogo ou tem muito trabalho para conseguir uma. E é ai que está o problema.
Você é contra ou a favor do aborto?
Este é outro tema interessante que acho ser um ótimo exemplo. O maior problema para responder esta pergunta é que ela foi feita em um português culto, fora da realidade de muitas pessoas, vou então refazer essa pergunta em um português mais popular e claro:
Você é contra ou a favor de que exista uma lei que permita com que todo mundo decida o que você quer fazer com a sua vida?
Se você é contra o aborto, não aborte. Se é a favor, aborte. Você vive em um país que proíbe que os profissionais que poderiam garantir que uma prática cirúrgica fosse realizada, que alguém em uma situação muito grave pudesse contar com seu plano de saúde. Que uma mulher não tivesse que entrar no circo de ter que convencer o mundo de que ela não vai criar a criança que está carregando, ai você tem problemas.
Se existe uma lei que proíbe um aborto, ele vai acontecer, só que de forma clandestina, sem regulamentação. O pagamento vai ter que ser feito, mas as garantias médicas não existem. Não existe segurança, não existe apoio, não existe ajuda. Só uma mulher em uma situação que ela não queria estar vivendo.
Legalize a prática do aborto e deixe a moral de cada um guiar seus passos. Da mesma forma que curiosamente “agora que nasci sou a favor do aborto”, os que são contra não vão pegar a criança rejeitada para criar.
Voltemos às armas de fogo.
Se você vive em um país que permite que analfabetos votem, mas proíbem que o cidadão de defenda, ai você está com problemas.
Quando falamos de ter o direito de ter uma arma de fogo, não falamos que cidadãos armados vão sair por aí cumprindo ordem judicial, busca e apreensão. Que cidadãos armados vão fazer ronda como se fossem a Polícia Militar. Não estou falando de colocar em jogo o monopólio da força, simplesmente colocar em jogo a possibilidade de adquirir armas.
E quando falo em adquirir armas não evoco uma realidade onde posso comprar rifles pelo mercado livre ou de termos gôndolas de pistolas calibre .22 ao lado da sessão de horta fruto em super mercados. Da mesma forma que um ser humano normal tem que passar por um teste psico-técnico e teste prático de para conseguir uma habilitação para dirigir o carro que pode atropelar pessoas e matar famílias, você teria que passar por testes psicotécnicos e testes e tiro para ter sua arma de fogo! Agora se você acha que qualquer idiota que consegue uma habilitação sem saber dirigir hoje conseguiria porte de arma de fogo… o problema não é dos mentecaptos, mas do sistema. Cobre do sistema que recebe um salário seu para trabalhar direito.
Hoje os maiores defensores do Estatuto do Desarmamento são aqueles que afirmam que o Estatuto reduziu o número de assassinatos por armas de fogo. São os argumentos deles que mostram que qualquer pessoa defendendo o seu direito de ter arma de fogo em casa é um louco que vai terminar com os filhos mortos nos braços.
Os defensores do Estatuto afirmam que no primeiro ano de vigência, em 2004, o ele reduziu o número de assassinatos por arma de fogo no Brasil de pouco mais de 20 para 19 casos para cada grupo de 100 mil habitantes. Além disso os casos de mortes por acidente e suicídios com armas de fogo caiu pela metade.
Os dados são do Mapa da Violência, pesquisa divulgada em 2014 com apoio da Unesco, aquele lá de cima.
Daniel Cerqueira, diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea, resume o efeito do estatuto sobre o índice de mortes:
“O Estatuto do Desarmamento, se não fosse ele, e se a gente, se a trajetória dos homicídios seguisse a que vinha antes do Estatuto do Desarmamento, a gente teria tido a mais 121 mil homicídios no Brasil. Então, o estatuto, ele foi uma lei que poupou vidas.”
O pesquisador analisou o que aconteceu com o índice de violência nas regiões que mais conseguiram tirar armas das ruas, uma das exigências do Estatuto do Desarmamento. Ele comparou com aqueles onde a quantidade de armas de fogo na mão da população permaneceu o mesmo. A conclusão é que os lugares onde mais armas foram apreendidas apresentaram taxas de homicídio até oito vezes menores.
A procuradora da República Luciana Loureiro apresenta outro estudo a respeito dos efeitos do Estatuto:
“Outro estudo, feito pelo professor Manuel Pinho de Melo, da PUC-Rio, mostra que o Estatuto do Desarmamento, de fato, ajudou a poupar vidas no estado de São Paulo. A cada 18 armas apreendidas, ele constatou que uma vida foi poupada, então, um homicídio deixou de ocorrer.”
Agora, se isso é verdade, então como é que o índice o índice de mortes por arma de fogo não teve queda uniforme depois do Estatuto entrar em vigor?
De acordo com o Mapa da violência o número de mortes aumentou, lembram-se? Se confiar em nosso número de que ele se manteve a pergunta continua válida: se o Estatuto funciona, por que o número de mortes não diminuiu?
Nos nove anos anteriores ao Estatuto do Desarmamento a taxa média de homicídios no Brasil era de 26,44 por 100 mil habitantes. Nos nove anos posteriores ao Estatuto do Desarmamento essa taxa subiu para 26,80 a cada 100 mil habitantes. Quando damos esses números para os amantes da paz e os apaixonados por levar o seu direito de se armar embora, como por exemplo o sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz, autor do Mapa da Violência, você ouve respostas como “o desarmamento, sozinho, não sustenta a queda da violência”, para isso, segundo ele, são necessárias medidas complementares:
“Ninguém se iludia, como se pretende fazer iludir ao público, ninguém se iludia que o Estatuto do Desarmamento ia resolver todos os conflitos. Ninguém propôs que resolveria a situação conflitiva que vivia o Brasil. Se propôs, nesse momento, dado que há conflitos, a primeira coisa que faz uma entidade civilizada, uma civilização, é retirar as armas de fogo para que não haja letalidades.”
Preciso tentar sequer começar a argumentar contra isso?
Além disso outro fato interessante é o de que metade das armas do país não está devidamente registrada. Existem mais de 15 milhões de armas nas mãos dos brasileiros. Dessas, mais de oito milhões não estão registradas. São ilegais. E quase quatro milhões estão nas mãos de bandidos. Outro efeito colateral de termos o direito de possuir armas de fogo é que, quanto maior o número de registro legal realizado, quanto maior o número, a quantidade de pessoas que tem a sua arma registrada, que é o Estado pode ter um controle maior sobre o que acontece com essas armas. Se ocorre um crime e ele é ligado a uma arma, esta é ligada a seu dono, isso pode diminuir a impunidade do uso de armas neste país da impunidade.
Frente a esses argumentos surgem respostas como a de Daniel Cerqueira, diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o IPEA:
“Uma maior disponibilidade de armas de fogo na sociedade faz com que mais armas migrem para o mercado ilegal. Isso acontecendo faz com que o preço da arma no mercado ilegal baixe, tornando a arma acessível ao bandido mais desorganizado, que é aquele bandido mais perigoso, que vai assaltar e cometer o latrocínio.”
Aparentemente vivemos também no país de é melhor o crime organizado ter armas ilegais do que o crime desorganizado, afinal os chefes do tráfico nunca dão armas aos bandidos pé rapados que fazem os corres deles. Para encerrar vale lembrar que o Estatuto também tira o direito de pessoas que trabalham com segurança tenham armas de fogo como lembra Wladimir Reale, vice-presidente da Associação dos Delegados de Polícia:
“Em relação ao Estatuto atual, ele foi tão rigoroso, tão excessivo, tão desproporcional, que até os policiais federais dos estados e do Distrito Federal, civis, desse país, quando se aposentam, não podem mais portar armas.”
E você, o que acha de viver em um país onde são as pessoas mais corruptas que decidem se você tem ou não o direito de se defender?
Querem se entreter mais sobre o assunto? Procurem o livro Mentiram Para mim sobre o desarmamento – Bene Barbosa.
por .22
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