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Na noite de 17 para 18 de outubro de 1903, o sábio russo Mikhail Mikhailovitch Filippov foi encontrado morto em seu laboratório. Fora, sem dúvida, assassinado por ordem de Okhrana, polícia especial do tzar. A polícia apreendeu todos os trabalhos do sábio, notadamente o manuscrito de um livro que deveria ser sua 301º publicação. O Imperador Nicolau II examinou, ele mesmo, o processo, depois o laboratório foi completamente destruído e os papéis queimados.
O livro apreendido chamava-se: “A Revolução pela Ciência ou o fim das Guerras”. Não era um livro unicamente teórico. Filippov havia escrito a amigos – e suas cartas devem ter sido abertas e lidas pela polícia secreta – que havia feito uma prodigiosa descoberta. Havia, com efeito, encontrado um meio de transmitir por rádio, sobre um feixe dirigido de ondas curtas, o efeito de uma explosão. Escrevera numa das cartas que foram, efetivamente, encontradas: “Posso transmitir sobre um feixe de ondas curtas toda a força de uma explosão. A onda explosiva se transmite integralmente ao longo da onda eletromagnética portadora, o que faz com que um cartucho de dinamite explodindo em Moscow possa transmitir seu efeito até Constantinopla. As experiências feitas mostram que tal fenômeno pode ser produzido a milhares de quilômetros de distância. O emprego de uma tal arma na revolução faria com que os povos se levantassem e as guerras se tornassem totalmente impossíveis.”
Compreende-se que uma ameaça desse tipo tenha espantado o imperador e que o necessário seria uma ação rápida e muito eficaz.
Antes de entrar nos detalhes do caso, damos algumas indicações sobre o próprio Filippov.
Sábio eminente, havia publicado trabalho de Constantin Tsiolkovsky: “A exploração do espaço cósmico por engenhos à reação”. Sem Filippov, Tsiolkovsky teria ficado tão desconhecido que é a Filippov que devemos, indiretamente, o Sputinik I e a astronáutica moderna. Filippov traduziu igualmente para o francês, fazendo com que o mundo inteiro pudesse conhecê-la, a obra capital de Mendeleev, “As bases da Química”, onde se encontra a famosa lei de Mendeleev que dá uma tábua periódica aos elementos.
Filippov criou também uma importante revista de vulgarização científica, em alto nível, a primeira na Rússia, que se chamava “Revista da Ciência”.
Era marxista convicto e procurava difundir as idéias marxistas, apesar do perigo dessa difusão. Tolstoi anota em seu diário, em 19 de novembro de 1900: “Discuti marxismo com Filippov; é muito convincente”.
Mas Filippov não se limitava a ser um grande sábio, foi também um dos grandes escritores russos. Publicou, por volta de 1880, “O cerco de Sabastopol”, romance que Tolstoi e Gorki concordaram em que é admirável.
Pode-se perguntar como uma vida tão breve – Filippov foi assassinado quando tinha quarenta e cinco anos – pôde ser tão completa. Redigiu uma enciclopédia inteira, criou uma revista que agrupou todos os sábios russos e que publicou, igualmente, artigos de escritores como Tolstoi e Gorki. Toda sua vida trabalhou não somente para a difusão da ciência mas também pela do método científico.
Seu filho, Boris Filippov, que ainda vive, publicou sobre seu pai uma biografia: “O caminho semeado de espinhos”, duas vezes reeditada pelas Edições da Ciência em Moscow, nos anos de 1960 e 1969.
Filippov estudou também a estética do ponto de vista marxista, e sua obra nesse campo, como em muitos outros, ficou clássica. Influenciou bastante Lenine e temos razão para pensar que ele foi o autor da famosa frase: “O comunismo é o Soviets mais a eletrificação”. Ele despertara em Lenine o interesse pela investigação científica avançada, e é parcialmente responsável pela expansão da ciência soviética.
Eis o personagem: vulgarizador científico, grande escritor, experimentador, teórico das relações entre ciência e marxismo, revolucionário convicto, perseguido pela polícia desde o assassinato do Imperador Alexandre II.
Que pensar da realidade de sua invenção? Lembremos primeiro que uma invenção muito semelhante acaba de ser realizada nos Estados Unidos: o que se chamou impropriamente de bomba à árgon.
O princípio dessa invenção é conhecido: a energia fornecida pela explosão de um cartucho de dinamite ou de um pedaço de plástico num tubo de quartzo comprime o árgon gasoso que se torna intensamente luminoso. Essa energia luminosa é concentrada num raio laser e transmitida, assim, em forma de luz, a grande distância.
Chegou-se já a incendiar uma maquete de avião em alumínio a uma altura de mil metros. O sobrevôo de certas regiões dos Estados Unidos é, atualmente, interditado aos aviões, pois se fazem experiências desse tipo. E espera-se poder instalar esse dispositivo em foguetes e servir-se dele para incendiar outros foguetes, o que constituiria uma mostra eficaz, mesmo contra o foguete múltiplo portador de bomba H.
Uma forma incompleta do aparelho de Filippov foi pois efetivamente realizada.
Filippov não conhecia, certamente, o laser, mas estudava as ondas ultracurtas, de comprimento de cerca de um milímetro, que produzia por meio de um gerador à centelha. Publicou alguns trabalhos a este respeito. Ora, mesmo hoje, as propriedades desse tipo de ondas não são totalmente conhecidas, e Filippov teria podido encontrar um meio de converter a energia de uma explosão em um feixe estreito de ondas curtas.
Pode parecer surpreendente que um sábio isolado pudesse fazer uma descoberta tão importante, descoberta totalmente perdida. Mas existem muitos argumentos contra tal objeção.
De início, Filippov não era um sábio inteiramente isolado. Era relacionado com os maiores espíritos científicos, do mundo inteiro, lia todas as revistas e era dotado de um espírito enciclopédico capaz de operar na fronteira de muitas ciências e fazer delas uma síntese.
De outro lado, apesar de tudo o que se conta sobre as equipes científicas, não é menos verdade que as descobertas são ainda feitas por indivíduos. Como dizia Winston Churchill: “Um camelo e um cavalo preparados para um comitê”.
As grandes descobertas de nossa época, notadamente no domínio da física, foram feitas por indivíduos: o efeito Mossbauer, que permite medir os menores comprimentos pela radiotividade; o princípio da não conservação da igualdade que transformou toda nossa concepção do mundo, mostrando que a direita e a esquerda são realidades objetivas no micro-universo; o efeito Ovshansky que permite fabricar vidros dotados de memória. Enquanto grandes equipes como a C.E.A. ou o C.E.R.N. nada descobriram de novo, apesar de terem consumido centenas de milhões. Filippov não tinha muito dinheiro, mas não tinha formalidades administrativas a observar para obter um aparelho, o que lhe permitia avançar mais depressa.
De outro lado, Filippov trabalhava quando a ciência das hiperfreqüências estava em seu começo, e os pioneiros têm em geral uma visão clara dos territórios que só serão descobertos séculos mais tarde.
De minha parte, estou persuadido de que Filippov realizou, em seu laboratório, experiências concludentes, provando que seu processo podia ser generalizado.
Façamos, por instantes, o papel de advogado do diabo, e perguntemos se o Imperador Nicolau II, da Rússia, mandando assassinar Filippov e destruir seu livro e trabalhos, não teria salvado o mundo da destruição.
A questão merece ser posta. Filippov foi assassinado em 1903. Se houvesse publicado seu trabalho, este teria sido, certamente, aplicado na guerra de 1914-1918. E todas as grandes cidades da Europa, e talvez da América, poderiam estar destruídas.
E durante a guerra de 1939-1945? Hitler, possuindo o processo de Filippov, não teria destruído completamente a Inglaterra, e os americanos o Japão?
É de temer-se que não devamos responder a essas questões afirmativamente. E não está excluída a hipótese de que o Imperador Nicolau II, geralmente aviltado, não deva ser colocado entre os numerosos salvadores da humanidade.
Que aconteceria hoje se alguém encontrasse um meio de utilizar o processo Filippov para transmitir, à distância, a energia das explosões nucleares, das bombas A e H? Isto seria, evidentemente, o apocalipse e a destruição total do mundo.
E este ponto de vista, quer se trate da invenção de Filippov, ou de outras invenções, começa a ser largamente partilhado. A ciência moderna admite que ela se torna, hoje, muito perigosa e nós citamos em nosso prefácio advertências de sábios eminentes.
São advertências graves. Os dirigentes do movimento “Survivre”, os padres Grothendieck e Chevalley não ficam, aliás, apenas nisso, mas tentam isolar completamente a ciência e impedir qualquer observação entre sábios e militares. Assim, dever-se-ia, igualmente, impedir a colaboração de sábios com revolucionários, de qualquer tendência política que possam ser. Imaginemos contestadores que, ao invés de borrarem a porta dos edifícios, fariam explodir, graças ao processo de Filippov, os Campos Elíseos, ou Matignon!
A invenção de Filippov, quer seu emprego seja militar ou revolucionário, me parece ser daquelas que podem aniquilar totalmente uma civilização. As descobertas dessa ordem devem ser isoladas.
E, entretanto, elas podem, igualmente, ter aplicações pacíficas. Gorki publicou uma entrevista que teve com Filippov, e o que marcou o escritor foi a possibilidade de transmitir a energia à distância e industrializar, dessa forma, mais depressa o país que precisasse disso. Mas não fala de uma aplicação militar.
Glenn Seaborg, presidente da comissão americana de energia atômica, evocou, o ano passado, possibilidades análogas: uma energia que viria do céu sobre um feixe de ondas e que permitiria industrializar quase instantaneamente um país em vias de desenvolvimento, isto sem criar nenhuma poluição. Ele não fala também de aplicações militares, mas sem dúvida isto não é de sua competência.
A extraordinária personalidade de Filippov começa a interessar cada dia mais o público soviético e os escritores. O grande poeta Léonid Martinov consagrou-lhe, recentemente, um poema intitulado “A Balada de São Petersburgo”.
Fatos novos aparecem constantemente. Um deles, surgido em 1969, destruiu uma lenda muito bonita.
Na “Revista da Ciência” apareciam resumos de livros assinados por V. Oul, e pensou-se que tal assinatura indicaria Vladimir Oulianov, isto é, o próprio Lenine. Seria interessante estabelecer, assim, uma ligação direta entre Lenine e Filippov. Infelizmente, a investigação moderna mostrou que tais resumos eram de fato de um tal V. D. Oulrich. Isto impede colocar-se Lenine entre os colaboradores da revista.
Mas Lenine conheceu a fundo a obra de Filippov, que certamente o influenciou bastante. A célebre passagem de “Materialismo e Empiriocriticismo” sobre o caráter inesgotável do elétron, vem diretamente de um trabalho de Filippov.
Filippov era ao mesmo tempo um sábio desejoso de publicar e um revolucionário. Como indicamos anteriormente, sua descoberta sobre a transmissão da energia da explosão deveria constituir sua 301ª publicação, e ele a teria certamente revelado, sem dar conta que iria assim destruir o mundo.
Porque pensar, e parece que ele o fazia, que os povos munidos da arma que ele lhes dava, fossem depor reis e tiranos, e, graças ao marxismo, estabelecer a paz universal, parece-me ingenuidade. Estamos ameaçados, atualmente, de uma guerra entre os dois maiores países marxistas, a URSS e a China.
Se todos os dois dispusessem de uma bomba H transportada por foguete, os estragos seriam consideráveis. Se reinventassem, os dois, o dispositivo Filippov, destruir-se-iam mutuamente. Ora, o passo não é grande entre a bomba à árgon e o dispositivo Filippov.
Por isso, deve-se esperar que o conflito URSS-China, que alguns consideram como inevitável, não se efetive.
Mas o problema da aplicação das ciências e das técnicas para a guerra continua. A maior parte dos congressos científicos chegam cada vez mais à conclusão de que é preciso esconder certas descobertas e adotar atitude semelhante à dos antigos alquimistas; senão o mundo perecerá.
Não é a justificação das idéias dos Homens de Preto, mas a indicação de um problema que existe.
Fred Hoyle, atacando o problema num outro ângulo, escreveu no livro “Os Homens e as Galáxias”:
“Estou persuadido de que é possível escrever cinco linhas apenas que bastariam para destruir a civilização.”
Hoyle é hoje, certamente, o homem melhor informado do planeta no que concerne à ciência moderna, e ao que ela pode fazer.
O caso Filippov parece constituir uma nova fase, importante, na história dos livros malditos.
Ao invés de voltar a um saber muito antigo, o manuscrito Filippov dava a chave de descobertas bem modernas baseadas na experiência e nas teorias gerais de Marx. Filippov era um espírito enciclopédico, que sabia, sem dúvida tudo o que se poderia saber sobre as ciências no ano de 1903. Por isso foi capaz de efetivar sua descoberta que o levou à morte.
Podemos perguntar se outras descobertas análogas não foram feitas e, como sempre, destruídas ou dissimuladas.
O Presidente Richard Nixon ordenou, recentemente, a destruição de todos os estoques de armas bacteriológicas, cuja base são os micróbios e vírus. Ordenou, igualmente, que se destruíssem os arquivos referentes a esse campo? Nada, menos certo, e talvez surja, um dia, um sábio americano que escolherá a liberdade e descreverá seus trabalhos, permitindo, assim, fabricar o que Sir Richie Calder batizou de “O micróbio do julgamento final”.
É preciso reconhecer que aqueles que destruíssem esse manuscrito seriam benfeitores da humanidade.
Tem-se desprezado muito o segredo militar. É, por vezes, ridículo, mas pode impedir a divulgação de armas extremamente perigosas.
Do mesmo modo, é evidente que os segredos da alquimia não possam ser divulgados. Se é possível fabricar uma bomba de hidrogênio num forno à gás, o que creio possível, pessoalmente, é preferível que o processo de fabricação não seja dado a público.
Pois ainda é muito bom viver num período de contestação, desde que os estragos dessa contestação sejam limitados. Se cada grupo, ou cada pequeno país contestador pudesse, para protestar, destruir Paris ou New York, a civilização não duraria muito tempo.
Não esqueçamos que em nossos dias qualquer um pode, com investimentos mínimos, constituir um laboratório que Curie ou Pasteur teriam invejado. Pessoas já fabricam, em suas casas, o LSD ou a fenilciclidina, droga ainda mais perigosa.
Se qualquer um, hoje, conhecesse o segredo de Filippov, poderia certamente encontrar no comércio todas as peças necessárias para construir o aparelho, e, sem nenhum risco pessoal, fazer explodir, a muitos quilômetros de distância, pessoas que lhe desagradassem.
Pessoalmente, tenho também minha lista de pessoas que me desagradam e de edifícios que julgo medonhos, e gostaria de eliminá-los. Mas se todos pudessem chegar a esse resultado com plástico roubado a um canteiro de obra e um projeto Filippov feito em casa, mal poderíamos sobreviver.
Existe, diz-se, listas de invenções muito perigosas. Uma dentre elas, estabelecida pelos militares franceses, tem, nada menos, que 805 nomes. Se alguém redige um texto que as exponha todas e o publica, bateríamos o recorde de livros malditos.
Pode-se imaginar, também, um manuscrito do tipo Fred Hoyle, que não conteria invenções perigosas, mas idéias perigosas, essas “frases de cinco linhas” que podem mudar o mundo. Se alguém redigir esse manuscrito, poderá dedicá-lo à memória de Mikhail Mikhailovitch Filippov.
por Jacques Bergier
Alimente sua alma com mais:
Conheça as vantagens de se juntar à Morte Súbita inc.
Uma resposta em “O Caso Do Professor Filippov”
Já chegou com bom conteúdo.
Que saudades dos engodos do Diabo!