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Eduardo Berlim[1]
Tenho um amigo com quem converso muito sobre magia, filosofia, religiões, hermetismo e outros temas afins. Nossas conversas ocorrem quase diariamente neste atual momento e tratamos dos mais variados temas, estudamos através das mesmas aulas para termos debates e fazemos comparações e indicações de materiais que podemos estudar. Este amigo, que gosta tanto da mistura de temas que pode ser considerado um cachorro caramelo do ocultismo, é certamente um dos responsáveis por estes seis ensaios que decidi escrever, pois todos nasceram a partir de conversas que tivemos. É óbvio que para preservar a privacidade do CAIO eu não irei expor seu nome aqui.
Conversas sobre o tema da magia, da filosofia oculta e de todos os pormenores e temas pertinentes costumam ser uma das melhores formas de realmente estudar o conteúdo desta senda. A experiência pessoal só tem valor para o próprio indivíduo e é somente através do contato com outros magistas, seus relatos de experiências e percepções únicas que podemos compreender que nossa experiência é única e individual.
E este é certamente o tema do primeiro ensaio: a conversa mágica.
Perceba que estou dando uma definição direta para o termo “conversa mágica” e por mais que isso possa parecer que estou falando de alguma técnica específica de magia o importante é perceber que, sim, eu estou falando de uma técnica específica de magia.
Ouvi há alguns meses de um dos meus professores que um certo discípulo dele em uma ordem iniciática preferia ter conversas naturais e à esmo com ele do que ter aulas pautadas em temas específicos. Esse mesmo professor já vinha demonstrando isso na aula em seus “botecos” pós-aula que muitas vezes não são gravados nas dezenas de cursos dos quais ele dispõe. É percepção natural dos alunos que “se aprende mais no boteco do que na aula” – apesar de isso ser uma clara inverdade.
A aula possui uma pauta técnica, reta e uniforme – e, pelo menos para mim, é assim que ela melhor funciona –, enquanto o “boteco” traz um clima mais descontraído, com piadas, “causos”, comparações entre sistemas e técnicas afins àquelas do curso em questão. Os verdadeiros ensinamentos que este professor passa não está no conteúdo técnico e brilhante de suas aulas ou nas pesquisas profundas que ele faz atrás de grimórios velhos e livros em latim que ninguém leu nos últimos dois séculos, mas na forma que isso lhe inspira e o mantém humano simultaneamente.
A “conversa mágica” enquanto técnica é o meio pelo qual se percebe a ação da magia na própria pessoa em si, em sua forma de ser e agir; na transformação natural de sua vida através da capacidade de moldar a realidade. Ou melhor: de moldar (acima de tudo) a própria realidade de forma que o divino possa ser tocado por você. Os “botecos” pós-aula são a prova do verdadeiro conhecimento deste professor e é o meio pelo qual seus alunos lembram que estão falando com alguém de carne e osso, com suas próprias questões, dúvidas e falhas. E é isso que realmente faz com que seus alunos o admirem.
Afinal, qualquer um poderia fazer o monstruoso trabalho de pesquisa, tradução e montagem de aulas dele. Basta ter enorme dedicação, um hiperfoco bastante contundente e força de vontade o bastante, certo? Afinal, dá para pedir cópias dos livros aos museus e usar os infinitos tradutores e dicionários disponíveis online, tendo o cuidado de sempre verificar as informações, cruzá-las com outras fontes, estudar constantemente etc. Pode parecer que estou “puxando saco”, mas a verdade é que eu realmente acredito nisso: a dedicação pode te fazer alcançar. Mesmo que esta dedicação seja extrema.
Ainda mais nos tempos estranhos em que vivemos, onde qualquer idiota que leu dois ou três livros se acha um grande sábio, a capacidade de se manter são e fiel a si mesmo enquanto carrega o estudo e a prática constantes é realmente formidável.
O que me leva novamente às minhas conversas com meu anônimo amigo CAIO: quando comparamos nossas próprias experiências dentro dos mesmos sistemas podemos perceber não apenas nossas falhas individuais e nossos acertos fantásticos; mas toda uma síntese de que nossos processos de gnose pessoal naturalmente decorrentes das nossas experiências são sempre únicos.
E esse processo nos ajuda a manter a cabeça no lugar e não distorcer a visão de um sistema mágico qualquer. Sigilos e servidores funcionam de um jeito com ele e de outro comigo; as perguntas dele para o Tarot são totalmente diferentes das que eu normalmente faço; eu aprendi truques de radiestesia com ele que jamais testaria e pude lhe passar uma ou outra dica sobre como reduzir o tempo de um testemunho nos gráficos. Nossas experiências pessoais se tornam testes cegos para buscar uma efetividade maior de nossas práticas ao invés de ser um manual engessado de como trabalhar com magia.
A “conversa mágica” permite que você não seja o idiota que acredita que sua gnose pessoal é regra. O amiguinho não vai ver um Anjo da mesma forma que você e você talvez nunca ouça fisicamente a voz de um Espírito. Tá tudo bem. Magia não é a fábrica da Coca-Cola para ter padronização e você muito provavelmente não é o Henry Ford da senda ocultista.
Magos podem ser solitários por natureza, mas até Gandalf tinha uns amigos e Merlin tinha um serviço como babá de um rei.
Por sinal, deixo agradecimentos aos dois professores que me ensinaram que magia se aprende no dia a dia e que talvez não percebam que me ensinaram muito mais falando de filmes ou de Kung Fu: meus mais lisonjeiros agradecimentos à Rodrigo Grola e Robson Bélli. Que o Altíssimo lhes abençoe!
Eduardo Berlim é músico, tarólogo e estudante de hermetismo com vasta curiosidade. Tem apetite por uma série de correntes diferentes de magia e se considera um eterno principiante. Assumidamente fanboy dos projetos da Daemon e das matérias do Morte Súbita inc.
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