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Percepção e Realidade

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Nossa percepção não identifica o mundo exterior como ele é na realidade, e sim como as transformações, efetuadas pelos nossos órgãos dos sentidos, nos permitem reconhecê-lo. Assim é que transformamos fótons em imagens, vibrações em sons e ruídos e reações químicas em cheiros e gostos específicos. Na verdade, o universo é incolor, inodoro, insípido e silencioso.

Para a moderna neurociência, o real conceito de percepção começou a brotar, quando Weber e Fechner descobriram que o sistema sensorial extrai quatro atributos básicos de um estímulo : modalidade, intensidade, tempo e localização, Hoje não mais se admite, como acontecia no passado, que o nosso universo perceptivo resulte do encontro entre um cérebro “ingênuo” e as propriedades físicas de um estímulo. Na verdade, as percepções diferem, qualitativamente, das características físicas do estímulo, porque o cérebro dele extrai uma informação e a interpreta em função de experiências anteriores com as quais ela se associe. Nós experimentamos ondas eletromagnéticas, não como ondas, mas como cores.

Experimentamos objetos vibrando, não como vibrações mas como sons. Experimentamos substâncias químicas dissolvidas em ar ou água , não como químicos, mas como cheiros e gostos específicos. Cores, tons, cheiros e gostos são construções da mente, à partir de experiências sensoriais. Eles não existem, como tais, fora do nosso cérebro. Na verdade, o universo é incolor, inodoro, insípido e silencioso.

Assim, já se pode responder a uma das questões tradicionais dos filósofos : Há som, quando uma árvore desaba numa floresta, se não tiver alguém para ouvir ? Não, a queda da árvore gera vibrações. O som só ocorre se elas forem percebidas por um ser vivo ! As informações, oriundas do meio ambiente ou do próprio corpo, são captadas pelos sistemas sensoriais e o cérebro as utiliza para três funções : percepção, controle dos movimentos corporais e manutenção do estado de vigília.

O sistema sensorial começa a operar quando um estímulo, via de regra, ambiental, é detectado por um neurônio sensitivo, o primeiro receptor sensorial. Este converte a expressão física do estímulo (luz, som, calor, pressão, paladar, cheiro ) em potenciais de ação, que o transformam em sinais elétricos. Daí ele é conduzido a uma área de processamento primário, onde se elaboram as características iniciais da informação : cor, forma, distância, tonalidade, etc, de acordo com a natureza do estímulo original.

Em seguida, a informação, já elaborada, é transmitida aos centros de processamento secundário do tálamo. ( se originada por estímulos olfativos, ela vai ser processada no bulbo olfatório e depois segue para a parte média do lobo temporal). Nos centros talámicos, à informação se incorporam outras, de origem límbica ou cortical, relacionadas com experiências passadas similares.

Finalmente, bem mais alterada, a informação é enviada ao seu centro cortical específico. A esse nível, a natureza e a importância do que foi detectado são determinados por um processo de identificação consciente a que denominamos percepção.

O que percebemos ?

Percebemos o mundo ao redor, através dos nossos sistemas sensoriais. Cada sistema é nomeado de acordo com o tipo da informação : visão, audição, tato, paladar, olfato e gravidade. Esta última ligada à sensação de equilíbrio. Discretos receptores sensitivos, captam estímulos proprioceptivos, que indicam a posição do corpo e de suas partes, enquanto outros, que recebem estímulos denominados kinestésicos, são responsáveis pela monitorização dos movimentos, auxiliando – nos a andar, correr e realizar outras atividades cinéticas, segura e coordenadamente.

“Sensores”, mais sutis, captam informações como temperatura, excitação sexual e volume sanguíneo. Cada um dos sistemas sensoriais também distingue as qualidades do sinal detectado. Assim é que percebemos a luz em termos de cor e brilho. Em um som, detectamos tonalidade e altura. O paladar indica se o alimento é doce, amargo ou salgado. Receptores táteis permitem distinguir como as sensações atuam sobre a pele : por pressão contínua ou por vibração.

Receptores especiais informam sobre a intensidade de cada estímulo, enquanto outros dizem de onde ele vem, quando começou e por quanto tempo persiste. Ainda que dois seres humanos dividam a mesma arquitetura biológica e genética, talvez o que eu percebo como uma cor distinta e cheiro, não é exatamente igual à cor e cheiro que você percebe. Nós damos o mesmo nome a esta percepção, mas nós não sabemos como elas se relacionam à realidade do mundo externo. Talvez nunca saberemos.

Autor: Jorge Martins de Oliveira, MD, PhD Professor Titular e Mestre da UFRJ. Livre-Docente da UFF. Coordenador Científico e Diretor do Departamento de Neurociências do Instituto da Pessoa Humana (RJ). Fellow em Pesquisa pelo Saint Vincent Charity Hospital, Cleveland, USA. Membro Titular da Academia Brasileira de Medicina Militar. Membro da Academia Brasileira de Médicos Escritores, Diplomado pela Escola Superior de Guerra (ESG). [email protected] 

Copyright 1997 Universidade Estadual de Campinas

Jorge Martins de Oliveira, MD, PhD


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