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Bruxaria e Paganismo

Um Prefácio à Bruxaria Apocalíptica

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Por Nicholaj de Mattos Frisvold

A Bruxaria Apocalíptica de Peter Grey será lançada em português no Brasil pela Penumbra Livros e, nesse sentido, fui convidado a escrever um prefácio para Bruxaria Apocalíptica, que você pode ler abaixo:

Muito tem sido escrito sobre bruxaria, suas práticas e crenças, sua história e os processos de bruxaria. A grande quantidade de literatura nos dá um fio vermelho constante da bruxa como “malefica” e “venefica” – e é isso que se tornou o ícone da bruxa propriamente dita. A bruxa é uma devota de Circe e Medeia, uma filha de Caim e é esse ícone da bruxa como o “outro”, como opositor, como o perigo que Peter Grey está nos apresentando no pano de fundo da modernidade.

Peter afirma que a bruxa é o que encontramos na ponta de um dedo apontado e na ponta do dedo apontado encontramos o indisciplinado e o rebelde preso ao sobrenatural, o bode expiatório e o perigoso. Portanto, “a bruxaria é obra do inimigo. Bruxaria é o sexo que outras pessoas fazem, bruxaria é a droga que outras pessoas tomam, bruxaria é o rito que outras pessoas realizam”. E, na verdade, a bruxaria pode ser definida pelo ‘outro’ e à medida que o tempo passa e as civilizações e culturas atingem níveis renovados de degeneração, miséria e alienação do núcleo, natureza e alma ‘o mesmo’ torna-se gradualmente mais e mais como concreto, aço e vidro objetar a natureza em favor da moda, da ganância e do poder ilusório sobre o temporal.

A decadência da sociedade se destaca na Bruxaria Apocalíptica como uma tela que torna visível e ameaçador o animus e a anima da bruxa, porque a bruxa é o opositor, é o não, é protesto feito em atos de autocelebração autônoma onde ‘o outro’ é reivindicado como anjo da guarda e uma sombra de ameaça e conforto. É nesse campo que encontramos o desejo de liberdade e nisso uma rejeição da máxima imposta de que precisamos ser ovelhas. Em vez disso, percebemos que somos bodes cobiçando o sangue que corre descontroladamente das estrelas sangrentas que caíram na Terra e vestem o manto do diabo. Como Peter escreve: “O Diabo como a máscara da natureza selvagem e a Deusa, dando-nos a escolha de controlar nossos corpos, mentes e destino está no cerne do que é uma bruxa.”

A Bruxaria Apocalíptica é um manifesto de guerra que visa semear uma consciência que permita à chama agir contra a opressão, qualquer tipo de opressão, seja social, política, psicológica ou o que uma determinada cultura julgou ser “boas maneiras” em favor da verdade. Veracidade para consigo mesmo, para suas ambições, para seu próprio caminho e nisso podemos realmente nos tornar criadores de nosso próprio Destino. Há uma agenda política no livro de Pedro, ele não é apenas uma força terrível para os opressores, ele também é um libertador daqueles acorrentados pelos opressores, sejam eles reais, imaginativos, de fé ou da sociedade como ele invoca o Livre Arbítrio reconhecer a verdade do Eu de maneiras únicas. Falamos de anarquia, mas há uma linhagem nessa anarquia, estamos falando de Thoreau, Tolkien, Tolstói e Chomsky que viram o que Peter está vendo e nisso viram uma necessidade semelhante, que era necessário um retorno às leis da natureza. Para Peter, a percepção da importância deste retorno se transforma em uma insistência em re-asselvajar (isto é, tornar novamente selvagem) a bruxaria e isso só é feito pela participação consciente e voluntária como ‘o outro’ na civilização contemporânea, isso porque “O Diabo não é a mão oculta do história, mas foi formado pela luva que veste”, daí que ‘o outro’ esteja em algum pesadelo foucaultiano sempre definido pela ‘mesmice’ ou pelo que costumamos chamar de ‘a maioria’.

Essa dimensão sócio-política é importante e um fator que muitas vezes escapa a quem acredita estar fazendo bruxaria, a quem escreve sobre isso e a quem de fato o faz que a palavra ‘bruxa’ desde os primórdios definia o bode expiatório, os grãos da areia em uma maquinaria social bem oleada que a fez reprovar e se tornar imperfeita, e claro, em vez de virar os olhos dentro da busca pelo bode expiatório começar sem s e ‘a bruxa’ sempre foi o alvo, querendo ou não a culpa em nome da ‘alteridade’. A este respeito, Peter tomou o próprio ícone da bruxa e tornou Ele ou Ela tangível e reconhecível em nossa sociedade contemporânea. No entanto, não basta ser rebelde, prostituta ou viciado em drogas para ganhar o digno acusativo de bode expiatório, de outra coisa, algo que ameaça as normas e a ordem ou a sociedade. É preciso algo mais, algo muito mais do que apenas estar em oposição, porque a bruxaria está no sangue, é uma raça especial, trata-se dos Cains e das Liliths do mundo, saibam ou não. Como escreve Pedro: “Não precisamos começar com um culto exterior se pudermos aplicar diligentemente os exercícios básicos e, ao fazê-lo, nutrir o florescimento de nossos próprios dons. Se não tivermos a vontade de fazê-lo, procurá-lo fora não resolverá isso”.

E eu acho que é realmente aqui que está, todo o segredo do sangue e da ninhada das bruxas, você precisa reconhecer isso com seriedade e ser verdadeiro sobre quem você é, porque ninguém pode dar o que não tem e o sangue de a bruxa só se acende, como um fósforo colocado na gasolina porque já está lá.

Se olharmos para todas as publicações possíveis discutindo bruxaria, encontramos uma enorme variedade de interpretações possíveis. O material histórico relegado ao “outro” sob o disfarce de “a bruxa” é enorme e às vezes pode ser tão confuso que acabamos com algo como “religiões da bruxaria” uma síntese do outro e do mesmo. Convém fazer uma pausa e refletir sobre o que acontece quando o mesmo e o outro se fundem. Ao contemplarmos percebemos que teremos uma expansão temporária anunciando sua extinção, pois o outro sempre afirmará o status quo e vice-versa. A sociedade sempre foi a luva que dá forma ao Diabo e o Diabo sempre esteve lá marcando os limites do quão longe é longe demais, porque nunca podemos nos afastar mais da mediocridade do que o que arde na ‘alteridade’, como afirmação e desafio ao que é.

A bruxaria sempre foi sobre isso, sempre foi sobre comunhão com os espíritos da natureza e da casa. Sempre foi sobre entender e se tornar sábio em adaptar ou perpetuar. Sempre considerei a bruxaria como ‘ofício camponês’ no sentido de que a bruxaria se ocupa com a terra, com as matas, com as cachoeiras, a fazenda e a família e tudo que se junta nisso, sejam vacas, cabras, pica-paus ou cobras. As bruxas também eram conhecidas por serem ‘astutas’ ou ‘sábias’, pessoas que sabiam um pouco mais do que deveriam saber e mesmo que a bruxaria tenha seus segredos e mistérios como uma arte de entender o mundo ao redor de sua casa é preciso uma bruxa para reconhecê-lo. O fato de que existem realmente tensões genuínas de bruxaria transmitidas como legado através das famílias pode ser frustrante, por causa do silêncio, tabu e restrições de compartilhar sangue e família fora da família que visam apenas a preservação não deve ser um obstáculo para o reconhecimento de quem você é. estão. Peter escreve: “Dado que as técnicas de bruxaria são ou simples truques, ou incomunicáveis para aqueles que ainda não entendem o segredo, é inevitável que uma literatura cresça em torno dela com a voracidade dos espinhos, por mais bem-intencionados que os semeadores fossem, criou, no entanto, uma barricada invasiva de espinhos.” E sua solução está em: “Eu corto isso, eu colho esses espinhos, faço disso o cabo do meu ferrão e golpeio a terra proclamando claramente minha intenção”. Nisto ele dá mais voz ao 3º parágrafo de seu manifesto que diz:

A BRUXARIA É NOSSA CONEXÃO ÍNTIMA COM A TEIA DA VIDA

E quem pode discordar de tal afirmação, pois nesta frase encontramos o cerne do ofício da bruxa. Ser íntimo da teia da vida significa ser amigo de seus medos. Significa estar conectado à mesmice como um opositor daqueles que se opõem à alteridade e permitir que a fonte do profundo entendimento flua enquanto você forja seu próprio Destino. Mesmo o que está escrito em pedra pode corroer nas águas do tempo e as águas do tempo sempre invocarão a necessidade do fogo da bruxa para torná-lo conhecido.

O ofício da bruxa é uma prática e um conjunto de ritos que são significativos e funcionais, que servem e terminam através da compreensão de por que o que se faz é feito. A bruxa é uma pragmática, uma viajante do tempo, uma montadora de feras e cavalos selvagens, porque a bruxa prefere seu tigre e javali indomado e selvagem e busca a comunhão que está além da aparência, a alma do mundo, a carne nua de Deus e sua consorte, a Terra.

A bruxaria não está vinculada à religião e aos sacerdócios; é um matriarcado, porque a terra em que pisamos é Ela coroada por uma miríade de estrelas, razão pela qual o manifesto de Pedro diz na seção 27: “A prática da bruxaria é de revolução e de poder da mulher”.

E esta é uma verdade um milhão de vezes verdadeira.

Para Peter, a Terra é coroada por Algol com os Cains e Liliths do mundo assegurando a alteridade em constante tentação provocativa com o medo da mesmice, porque a bruxaria é sexy, é bela e é perigosa. Se a bruxaria não tem presas, nem diabo, nem perigo, nem sexo, não é bruxaria, é conformidade e mesmice, é uma religião como qualquer outra…

Bruxaria Apocalíptica é um livro que toma o pulso do temperamento da bruxa em nossos dias e tempos. É um livro sobre como a bruxa chega ao poder em qualquer época e idade e nisso como podemos reconhecer e entender o que encontramos na ponta do dedo apontado como algo significativo para o outro. Fazer essa bruxaria apocalíptica acaba colocando em questão nossa própria realidade e a poesia de nossa vida com todas as suas verdades e mentiras criadas em um mundo de decadência e poder que não pede um retorno, mas para re-asselvajar (isto é, tornar novamente selvagem) o que sempre foi selvagem e indomável.

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Fonte: A Preface to Apocalyptic Witchcraft, by Nicholaj de Mattos Frisvold.

Texto adaptado, revisado e enviado por Ícaro Aron Soares.


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