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Bruxaria e Paganismo

Bruxaria Ontem e Hoje

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André Correia (Conexão Pagã@bercodepalha)

Longe de mim querer explicar o que é a bruxaria. Até porque, já li alguns longos livros que se propõem a fazer isso, e além de eventualmente se contradizerem, às vezes não chegam a uma conclusão. Imagina resumir em alguns parágrafos. Impossível.

Isso acontece principalmente porque a bruxaria não é um caminho único, surgido em um lugar, com um livro de regras e ingredientes pré-determinados. A bruxaria é plural, surge de muitos lugares e culturas, é espiritual e ao mesmo tempo é operativa, é simples e complexa. Talvez a bruxaria seja mais sentida do que explicada.

Em um passado muito remoto, quando o caldeirão era só uma panela que fazia comida e também misturava ervas, o paganismo original não recebia nem o nome de “bruxaria”. Talvez nem o fosse de fato. As crenças eram baseadas na observação espontânea dos ciclos naturais das estrelas, das estações, da lua, do sol, da vida e da morte. O que não era respondido pela lógica, ganhava respostas místicas. Assim, a conexão com a natureza foi se fundamentando na razão e no oculto.

A vida seguiria assim, se não fosse a igreja metendo o bedelho na vida alheia. A bruxaria em algum momento do medievo, ganha ares diabólicos, que perduram até hoje nas missas e cultos. Mas já pensaram que quem promoveu esse encontro foi a própria igreja? No paganismo não existia o diabo. Essa foi a jogada de marketing que a igreja usou para condenar mulheres que desafiavam o poder do clero. Resumindo, a bruxaria foi difamada como algo malígno, logo veio o Martelo das Bruxas, a Inquisição e toda aquela história de fogueiras, forcas e torturas que estamos pálidos de tanto ouvir a respeito.

A bruxaria então, dá uma desaparecida do mapa. Não que tenha findado da história, mas talvez ela tenha se esgueirado pelas sombras, passeado embaixo dos véus da lucidez e sobrevivido à luz das tochas.

Possivelmente alguns resquícios tenham resistido ao tempo, escondidos ou sincretizados, mas resistiram. Mas um dos grandes problemas, é que quem escreveu sobre bruxaria, foram os padres responsáveis pelos registros da época. Ou seja, muita informação foi manipulada, adulterando fatos históricos e deturpação a realidade. Já ouviu dizer que quem ganha a guerra é quem conta a história? Então.
Nas últimas décadas a bruxaria ressurgiu, repaginada, com um banho de loja e perfumaria. Gardner quando foi iniciado, em 1939, tinha certeza que havia encontrado práticas reais de bruxaria. Então ele remodelou aquelas práticas, acrescentou elementos da Maçonaria, Thelema, Magia Cerimonial e outras tradições que ele acreditou ser enriquecedora. Mas seria isso a nova bruxaria? Eu acredito que a Wicca possua sim muitos elementos que a define como bruxaria. Ritualística, mitologia, alguns elementos folclóricos e uma boa aceitação popular, que a colocam como a religião pagã mais forte e respeitável da atualidade.

No entanto, alguns grupos reclamam a ideia de que essa religião seria a herdeira original daquela bruxaria secular, da Antiga Religião pagã. Bom, aí eu chamo a sua atenção e acendo algumas luzinhas de alerta de megalomania, mas como cavalheiro, respeito também quem crê nisso. Afinal de contas, crença é crença e desde que ninguém queira me impor isso goela à baixo, merece ser respeitado. Certo? Certo!

Por mais que hipoteticamente possa haver um fio condutor que conecte algo da bruxaria atual com a bruxaria ancestral, tanta coisa foi acrescentada, modificada e moldada, que torna a Wicca uma religião absurdamente moderna. Mas veja, isso não é problema nenhum! Religiões surgem o tempo todo, mas somente as competentes e fundamentadas resistem. Ponto super positivo para o Gardner. Mas sobre ser uma continuação fiel do passado? Não mesmo. Inspiração válida? Super possível.

Eu, particularmente, gosto do legado do Gardner, mas penso que muitos seguidores modernos podem estar sambando como mestre sala e porta-bandeira da Unidos do Ego de Ouro. Mas isso não define a Wicca, naturalmente. Existem praticantes, sacerdotes e sacerdotisas extremamente sérios e competentes, aos quais eu tiraria o chapéu (se eu usasse!).

O que mais é bruxaria? Muita coisa.

Muito antes da Wicca pousar suas vassouras em Pindorama, os portugueses chegados no período da colonização, depositavam aqui cidadãos de “primeira classe”. Aqueles que Portugal não queriam mais em seu país, tratavam como expurgo e mandavam para o Brasil. E foi assim que muitas bruxas chegaram no Nordeste brasileiro, com a descarga na privada dos portugueses desaguando aqui na Terra de Santacruz.

Acontece que essas bruxas conheceram e reconheceram nos nativos uma magia e espiritualidade enorme. Dessa fusão, junto com a fé dos africanos que já estavam aqui, surgiu uma das primeiras manifestações de religião que batem tambor até hoje, o catimbó.
Além disso tudo, existe um leque enorme de bruxarias por aqui. Bruxaria tradicional, Bruxaria Tradicional Moderna, Bruxaria Natural, Stregoneria, Eclética solitária, e algumas outras. Nessa festa à lá Brasil, muitas outras práticas foram somadas ao guarda-chuva que é a Bruxaria. A erveira, a rezadeira, a benzedeira, a parteira, a senhora que lê borra de café, a “macumbeira”, todo mundo foi chamada de BRUXA. Elas são? Por mais que eu ache que não, nada mudará a opinião de quem diz que sim.

No fim das contas, creio que a bruxaria é uma prática pagã, que pode conter o culto aos deuses ou não, ser operativa como um ofício, mas não obrigatoriamente.

Penso que a bruxaria surge do folclore, da cultura regional ou de origem, possui misticismo, reconhecimento das forças selvagens da natureza, possui oráculos, se comunica ou comunga com ancestrais mortos e pratica feitiços em sua essência. É tão maléfica quanto o ser humano que a faz, assim como em qualquer religião.
Porém, nem tudo que dizem ser, é bruxaria. Deixo a seu critério avaliar com calma, com alma, sabedoria e muito bom senso.
Creio que a bruxaria é plural demais para escrevermos a sua história somente em um Grimório.


André Correia. Psicólogo atuante em clínica desde 2007, adepto da bruxaria eclética, construtor de tambores ritualísticos. Participa dos projetos Conexão Pagã e Music, Magic and Folklore. Coordenador do Círculo de Kildare e autor da obra musical Tambores Sagrados.


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