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Bruxaria e Paganismo

A Bruxa dos Contos de Fadas

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André Correia (Conexão Pagã@bercodepalha)

Estou escrevendo esse texto a convite de um amigo que é coordenador pedagógico na EMEB do meu bairro, onde meu filho de 4 anos estuda. O foco é falar para algumas professoras sobre o porquê as bruxas não são más e que os contos de fadas podem estar ensinando preconceitos, discriminação e pensamentos errados.

Eu fico bastante receoso em falar sobre isso, pois estarei contradizendo séculos de histórias, mas pretendo fazê-lo com calma e ser o mais coerente possível.

PORQUE A BRUXA SE TORNOU DO MAL?

As mulheres no passado cumpriam papéis sociais de muita importância. Eram doulas, parteiras, curandeiras, líderes de grupos familiares, conheciam sobre os ciclos da Lua e do Sol. Entendiam os melhores momentos de plantar, colher, ordenhar, abater, estocar e tudo mais. Eram as sábias, as wise women, como as anciãs das nossas famílias.

Quando o cristianismo se torna um expoente, essas mulheres sábias são entendidas como uma ameaça ao poder dos homens do clero e ao poder de Deus. Imagine só, precisar de cura para algum mal da mente, da alma e da saúde. Precisar de sabedoria (ou sorte) para um bom plantio, de receitas para a fertilidade e coisas dessa natureza e ao invés de buscar a Igreja, a população buscava a sabedoria popular de forma muito semelhante como fazemos atualmente com as benzedeiras, chás, remédios naturais e com simpatias.

Essas mulheres sábias, que comungavam com a natureza e suas forças começaram a ter suas práticas condenadas e a serem relacionadas com poderes malígnos e sobrenaturais. O diabo, que nem era da crença daquele povo, foi responsabilizado pela sabedoria popular das mulheres. Assim surgiam as primeiras imagens malígnas das bruxas que conhecemos.

PORQUE A BRUXA DOS CONTOS É FEIA?

Com a sua importância social totalmente diminuída e sua sabedoria relacionada ao mal, o cristianismo começou a simbolizar as mulheres sábias com características que fossem antagonistas a beleza. Se Deus era a beleza, o diabo era a feiura. Se Deus era a vida e a vitalidade, o diabo era e morte e a de a decadência do corpo. Assim, as bruxas começaram a ser demonstradas como mulheres decrépitas, muito velhas, sem dentes, narizes grandes, olhos desproporcionais, etc. O objetivo era chocar muito além das características naturais e tornar as bruxas um extremo da “feiura”.
Acho importante ressaltar aqui, que na bruxaria atual a imagem das mulheres mais velhas e com expressões de idade avançada voltam a ser resgatadas como símbolo de sabedoria, competência, liderança e respeito.

OS CONTOS DE FADAS

Os contos de fadas são textos lúdicos, fantasiosos que em sua estrutura apresentam uma narrativa desafiadora a ser superada pelo protagonista e um final com uma conclusão “educativa” passível de interpretação e consequentemente identificação projetiva.
O público alvo, em sua maioria são crianças em seus primeiros contatos com o mundo, suas regras sociais, aquisições de vocabulários, desenvolvimento cognitivo e emocional. E é exatamente aí que está o problema!

Em um conto sempre temos um conflito que é a simbolização dos obstáculos do convívio social, familiar, das emoções e dos pensamentos que estão sendo aprendidos e ainda domados. Aprendemos que o ser humano possui em si aspectos sombrios, selvagens e violentos. No outro extremo do conto estão os heróis e as princesas se sobrepondo à sombra, simbolizando a doma, a razão sobre o instinto. A vida sobre a morte. O bem sobre o mal.

Então qual é o problema? O problema é que a Bruxaria é uma religião, uma prática popular e faz parte do folclore de muitas culturas européia que colonizaram o Brasil. Atualmente, a bruxaria (a wicca, mais especificamente), é uma das religiões que mais crescem no mundo e conforme isso acontece, crianças estão chocando com a realidade de suas famílias pagãs e os contos que afirmam que seus pais e familiares são malvados, malignos e demoníacos.

Além de ser uma afirmação absurdamente errada, é uma prática de preconceito religioso, condenável pela constituição do nosso país.

AS BARREIRAS RELIGIOSAS

A população brasileira é fundamentada nos ensinamentos do cristianismo. Somos um dos maiores países católicos e com igrejas evangélicas em pleno desenvolvimento.

Naturalmente a educação moral acaba por se basear em muito nos valores da espiritualidade dominante da população. Junto com isso, surgem alguns preconceitos involuntários, como é o caso da condenação da Bruxaria como algo satânico e anticristão, sendo que na verdade, só não é uma prática/crença cristã, assim como o Budismo, Hinduísmo, Xintoísmo e etc.

Como melhorar? Estudar, conversar e manter a mente aberta para aprender. Tirar dos ombros das mulheres, das sábias, das madrastas, das benzedeiras e das bruxas o peso do maligno. Falar com as crianças de forma lúdica, abortando que o mal e a vilania como algo inerente ao ser humano. Mas principalmente falar que existe a bondade, o amor e generosidade nessas pessoas também e que não são suas crenças que determinam o seu caráter.


André Correia. Psicólogo atuante em clínica desde 2007, adepto da bruxaria eclética, construtor de tambores ritualísticos. Participa dos projetos Conexão Pagã e Music, Magic and Folklore. Coordenador do Círculo de Kildare e autor da obra musical Tambores Sagrados.


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