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Lovecraft Magia do Caos

Uma Introdução às Obras de Kenneth Grant

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Traduzido por Lorkshem e por um colaborador que preferiu não se identificar.

Kenneth Grant foi um dos ocultistas mais influentes do século XX. Ele deixa para trás um substancial e formidável corpo de obras que irá ser explorado e desenvolvido ao longo dos próximos anos. O que se segue aqui é um estudo introdutório de sua obra – uma base para uma consideração mais profunda, mais substancial de seu trabalho no futuro.

Nascido em Essex em 1924, Kenneth Grant desenvolveu um intenso interesse pelo ocultismo desde tenra idade, bem como ao longo da vida uma devoção ao Budismo e a outras religiões orientais. Ele comentou em algum lugar em seus escritos que o Misticismo Oriental foi seu primeiro amor – não apenas uma indicação de quão bem instruído ele foi, mas talvez mais importante que isso, de seu exacerbado senso de imanência. Grant relata em Outside the Circles of Time como ele se deparou com uma cópia de Magick in Theory and Practice – em Zwemmers, na Charing Cross Road – no final da década de 1930 ou início da de 1940. Neste período, ele também havia descoberto The Book of Pleasure de Austin Osman Spare na Livraria Atlantis de Michael Houghton na Museum Street.Posteriormente mergulhando nas obras de Crowley, ele finalmente conseguiu fazer contato com ele em 1944, escrevendo para o endereço fornecido em The Book of Thoth que acabara de ser publicado.Visitando-o várias vezes, Grant posteriormente ficou com ele em ‘Netherwood’ em Hastings em 1945, imerso em Magick. Muitos anos depois, Grant escreveu um livro de memórias deste período de sua vida, Remembering Aleister Crowley. É evidente a partir de observações em seus diários e em outros lugares, que Crowley desenvolveu uma alta estima por Grant, vendo nele o potencial para tornar-se um futuro líder da O.T.O.

Foi nessa época que Grant se deparou pela primeira vez com o desenho de Lam de Crowley, ou “O Lama”, como Crowley se referia a ele. Tendo oferecido a Grant um documento de sua escolha, inicialmente ele foi hesitante quando Grant escolheu o desenho – ou, como Kenneth coloca, Lam o escolheu. Eventualmente, ele passou o desenho para Grant após um ataque de asma extremamente grave que Grant ajudou a aliviar apressando o médico de Crowley para lhe dar heroína. Crowley se refere a este incidente em seu diário em 08 de maio de 1945: “Aussik ajudou bastante; dei-lhe ‘O Lama’…” O desenho foi posteriormente reproduzido no The Magical Revival e Outside the Circles of Time, e passou a ocupar cada vez mais um papel proeminente no desenvolvimento do corpo da obra de Grant.

Após a morte de Crowley, em dezembro de 1947, Kenneth e Steffi Grant estiveram entre os presentes no funeral de Crowley, e foram posteriormente membros do pequeno círculo que se esforçou para manter a memória de Crowley e seu trabalho vivo. Crowley nomeou Karl Germer – vivendo então nos EUA – como seu sucessor, e sua Vontade estipulou que seus papéis fossem enviados a Germer. Preocupado que devesse haver cópias dos documentos mais importantes em caso de alguma coisa acontecesse a eles enquanto em trânsito, Grant e, posteriormente, Gerald Yorke começaram a fazer cópias datilografadas daqueles que consideraram de importância particular. Assim eles fizeram, depois disso a coleção de documentos de Germer foi roubada de sua viúva Sascha em 1967 por membros da Solar Lodge e, posteriormente, destruídos em um incêndio. As cópias datilografadas feitas por Grant, Yorke e outros formaram a base do arquivo que Yorke mais tarde passou para o Instituto Warburg da Universidade de Londres, e que continua acessível a pesquisadores.

Durante o fim dos anos de 1940 e início dos anos de 1950, um pequeno círculo de ocultistas acumulou-se em torno de Grant, desenvolvendo-se como o núcleo de um grupo de operações. Germer tinha patenteado Grant em 1951 para formar um ‘Capítulo’ da O.T.O.. À parte disso desenvolveu a New Isis Lodge como uma célula dependente da O.T.O., com uma estrutura de qualidade e programa de operações que foram influenciados pela Astrum Argenteum de Crowley, bem como pela O.T.O. como era nos dias de Crowley. A relação com David Curwen foi o que contribuiu para Grant obter uma cópia de um comentário de um adepto de Kaula sobre um texto tântrico, o Anandalahari.Este comentário deu importantes insights sobre a magia sexual tântrica, aproximando a magia sexual de uma direção muito diferente daquela de Crowley. A abordagem de Crowley é basicamente solar-fálica, para não dizer falo-cêntrica, há grande ênfase na importância das energias sexuais masculinas, mas muito pouco sobre as energias femininas. Muitas vezes, a parceira é considerada como pouco mais do que um copo em que o magista masculino verte seu bindu.O texto Kaula aborda o assunto de uma perspectiva diferente, acentuando o papel dos kalas e como eles variam ao longo do ciclo menstrual.

No lançamento formal da Loja, em 1955, Grant emitiu um Manifesto da New Isis Lodge no qual falou da descoberta de um planeta além de Plutão, o Isis transplutoniana, e o que ele pode significar para a evolução da consciência neste planeta:

A nova e atraente influência está envolvendo a Terra e ainda há poucos indivíduos que estão abertos ao influxo das vibrações sutis dessa influência.

Seus raios procedem de uma fonte ainda inexplorada por aqueles que não estão unos com eles em sua essência e em espírito, e que encontra seu foco atual no universo exterior no transplutoniano planeta Isis.

No íntimo do homem, igualmente, esta influência tem um centro que irá lentamente começar a se agitar na humanidade como um todo, a influência se fortalece e floresce. Como ela está no início de seu curso em relação ao homem, porém, muitos séculos passarão antes que ela possa valer-se totalmente dos grandes poderes e energias das quais essa influência está silenciosa e continuamente concedendo em todos os que sabem identificar o núcleo interior de seu ser com o seu profundo e inescrutável coração.

Certamente é óbvio que Grant não estava falando sobre a descoberta de um planeta físico, tal descoberta poderia ter sido mais relevante para uma revista astronômica. Se tivermos em mente que a primeira sephira, Kether, é atribuída a Plutão, então um planeta transplutoniano seria ‘Um além do Dez “, o Grande Exterior. Grant expressou isso portanto alguns anos mais tarde, em Aleister Crowley and the Hidden God:

No Livro da Lei, a deusa Nuit exclama: “Meu número é onze, como todos os números aqueles que são de nós “, que é uma alusão direta à A ∴ A ∴, ou Ordem da Estrela de Prata, e seu sistema de Níveis. Nuit é o Grande Exterior, representada fisicamente como o “Espaço Infinito e as Infinitas Estrelas” — isto é, Isis.

Nuit e Isis são identificadas em O Livro da Lei. Isis é o espaço terrestre, iluminado pelas estrelas. Nuit é o exterior, ou espaço infinito, a escuridão imortal que é a secreta fonte de Luz, ela é também, em um sentido místico, o Espaço Interno e o Grande Interior.

Germer certa vez, assim como Crowley, considerou Grant como um futuro líder da O.T.O. em potencial (ver, neste contexto, os resumos de suas cartas à Grant, publicadas no artigo ‘It’s an Ill Wind That Bloweth’ na Starfire Volume I n º 5, Londres, 1994).No entanto, ele foi essencialmente infeliz como alguém que se desviou da linha que, após a morte de Crowley, a única coisa a fazer era simplesmente preservar e promover o trabalho de Crowley. Além disso, ele também não ficou satisfeito quando Grant se recusou a recolher o dinheiro dos membros de sua Loja. Ele, aliás, se irritou ao saber que Grant tinha formado conexões com Eugen Grosche, um antigo adversário de Germer da Alemanha na década de 1920. Ele exigiu que Grant retratasse seu Manifesto, quando ele se recusou, Germer emitiu um aviso de expulsão. Grant simplesmente ignorou a expulsão e continuou com a New Isis Lodge como uma loja dependente da O.T.O., confiante de que seu trabalho mágico lhe permitiria fazer a conexão direta com a corrente mágica no núcleo da O.T.O., assim, substituindo a autoridade de Germer e tornando a expulsão irrelevante. Esta confiança em sua posição como sucessor de Crowley reforçada ao longo dos anos subseqüentes com desenvolvida sua obra mágica e mística.

A New Isis Lodge tinha um programa de operações que começou em 1955 e foi concluído em 1962, embora a Loja tenha continado a operar até meados dos anos de 1960. Desenvolvendo algumas técnicas mágicas inovadoras e interessantes, um relato de alguns de seus trabalhos é dado em Hecate’s Fountain, escrito no início da década de 1980, mas não publicado até dez anos mais tarde. As experiências de Grant na New Isis Lodge foram a base para suas obras posteriores, talvez mais aparente nos volumes posteriores das Trilogias com a publicação de duas das transmissões reificadas durante o curso de Operações da Loja. Uma dessas transmissões foi a requintada e delicada, Wisdom of S’lba a qual foi incorporada no sétimo volume das Trilogias, Outer Gateways, publicado em 1994.O outro foi The Book of the Spider, em torno do qual Grant teceu seu volume final das Trilogias, The Ninth Arch (2002).

A New Isis Lodge não é muito mencionada nos primeiros livros de Grant. Tenho a impressão de que, embora o trabalho realizado na Loja tenha sido formativo para Grant – a fundação de seu corpo de obras posteriores – pela mesma razão foram os cumulativos insight’s destilados ao longo dos anos seguintes, o que permitiu a Grant entender plenamente as realizações dos anos anteriores, e a levar o trabalho a outro nível. O potencial desses anos vieram a serem concretizados muitos anos após a Loja ter cessado suas operações. Lembro-me dele comentando para mim no início de 1990 que ele tinha recentemente topado com o arquivo de materiais que havia sido guardado por muitos anos, e que ao passar por isso novamente uma revigorante corrente de iníciação havia sido deflagrada.

Ao longo dos anos de 1959 a 1963, Grant produziu uma série de monografias, as Carfax Monographs, cada uma sobre um assunto diferente.Anos mais tarde, em 1989, elas foram reeditadas num só volume como Hidden Lore.Mais recentemente, elas foram republicadas, desta vez com material adicional, como Hidden Lore, Hermetic Glyphs (Fulgur, 2006).

Uma das influências mais importantes sobre Kenneth Grant foi Spare. Em 1949 ele e sua esposa Steffi conheceram o artista e escritor ocultista. Eles continuaram amigos até a morte de Spare em 1956, apoiando-o com alguns elementos essenciais à vida, bem como materiais para seu trabalho artístico, e este contato provocou um renascimento eno trabalho de Spare. Grant durante algum tempo adquiriu um grande interesse pela magia e misticismo de Spare, assim como por sua arte, e em particular pelos sistemas de sigilos que Spare havia apresentado em The Book of Pleasure, publicado pela primeira vez em 1913.Contudo, exceto por notáveis exceções como o desenho “Teurgia” de 1928, os sigilos geralmente se tornaram ausente do trabalho de Spare depois da Primeira Guerra Mundial, e ele confessou a Grant que, ao longo dos anos, ele havia esquecido os princípios subjacentes ao sistema. Estimulada pelo interesse e entusiasmo de Grant, Spare aplicou-se à recuperação desses princípios, e sigilos ressurgiram em muitos de seus desenhos e pinturas no final dos anos 1940 e no anos de 1950. O rendimento dos últimos anos de sua vida foi uma espécie de renascimento para Spare, um florescimento tardio.

Este renascimento incluiu obras escritas, que Grant digitou para ele, no processo de fornecer críticas e comentários, e pressionar por elucidação onde parecia benéfico.Muito deste trabalho tardio foi posteriormente publicado por Grant em Zos Speaks! (Fulgur, 1998), junto com cartas e trechos de diários que documentam seu período com Spare, bem como reproduções das obras de arte de Spare. Em sua morte, Spare legou a Kenneth seus manuscritos, textos datilografados, e livros. Incansável na promulgação das obras de Spare ao longo dos anos subseqüentes, em 1975 Grant publicou o belo Images & Oracles of Austin Osman Spare (Muller, 1975; Fulgur, 2003), introduzindo sua obra – escrita e artística – a um novo público.O renascimento do interesse em Spare nos últimos anos se deve muito a seus esforços.

Assim como Spare, do começo ao fim de sua obra Grant enfatizou o primado da imaginação. Longe de ser mero capricho ou fantasia, este é de fato o principal meio para encontrar e explorar o universo e nossa relação com ela. O trabalho de Grant é essencialmente dirigido à imaginação, soando ecos na consciência do leitor de sua obra. Como já vimos, Grant descreveu o Misticismo Oriental como seu primeiro amor, e durante os anos de 1950, ele mergulhou no Advaita Vedanta – a percepção de que a consciência é indivisível – escrevendo uma série de artigos para revistas asiáticas, posteriormente reunidos e publicados muitos anos depois como At the Feet of the Guru (Starfire Publishing, 2006).Embora muitas vezes entendida como um culto que glorifica a individualidade, Thelema está de facto enraizada neste solo, tendo muito em comum com o taoísmo.

Com John Symonds, o executor literário de Crowley, Grant editou autobiografia extensa e turbulenta autobiografia de Crowley, The Confessions (Cape, 1969). Esta desempenhou um importante papel em trazer o trabalho de Crowley à atenção popular. Symonds e Grant edificaram-se nisso, continuando a editar e publicar outras obras de Crowley ao longo dos anos de 1970, especialmente o The Magical Record of the Beast 666 (Duckworth, 1972) – uma seleção de diários de Crowley – e Comentários mágica e filosófica sobre o Livro do Direito (93 Publishing, 1974).

Ao longo dos anos, Kenneth Grant criou seu próprio corpo de obras, e em as obras sobre o trabalho de Crowley – “Amor sob Vontade”, publicado no Internacionais Times durante 1969 – ele se referiu a um estudo das mesmas que estava aguardando publicação, intitulado ‘Aleister Crowley and the Hidden God’. Sua editora, Muller, posteriormente pediu-lhe para dividir o trabalho em dois volumes, o primeiro dos quais foi publicado em 1972 como The Magical Revival. O segundo, emitido sob o título original Aleister Crowley and the Hidden God, publicado em 1973.Este foi o início das Trilogia Typhoniana, dos quais o nono e último volume, The Ninth Arch, foi publicado em 2002 pela Starfire Publishing.Esses volumes compreendem um corpo substancial de obras que, embora ecléticas e que abrangem vastas áreas da magia e do misticismo, estão firmemente enraizadas em Thelema. No decorrer destas obras, Grant levou Thelema à áreas além do que muitas vezes é considerado como sendo os limites das obras de Crowley, destacando no processo a universalidade de Thelema e suas afinidades com uma ampla gama de tradições e disciplinas. O que se segue é um breve resumo de cada um dos volumes das Trilogias, pelo caminho, alguns temas serão destacados.

The Magical Revival (Muller, 1972; Starfire Publishing, 2009) foi um estudo e análise de uma variedade de tradições ocultistas que sobreviveram durante milhares de anos, e que estão agora revivendo em novas formas e com um vigor renovado.Em particular, foi traçada a gênese e o desenvolvimento do Culto Draconiano ao longo das dinastias egípcias, e diante deste pano de fundo mais antigo foram examinadas as mais modernas manifestações, como Blavatsky, Crowley, a Golden Dawn, Dion Fortune, e Spare. Foi demonstrado que, embora essas manifestações sejam recentes, estão enraizadas na considerada mais antiga corrente mágica, que tem nutrido e sustentado todas as eflorações subseqüentes. Foi incluída como uma ilustração no livro uma reprodução do desenho de Lam de Crowley, a primeira vez que foi publicada desde a sua aparição original em The Blue Equinox em 1919.

No capítulo ‘Barbarous Names of Evocation’, Grant desenvolve a ideia da similaridade entre os elementos do Mito de Cthulhu como elaborado na ficção de Lovecraft, e aspectos da obra de Crowley. Isto veio a sugerir que eles se basearam em arquétipos semelhantes do inconsciente coletivo. Em seu trabalho posterior, Grant ocasionalmente brinca com o panteão de divindades, mas isso nunca veio a sugerir que as divindades eram reais, ou que deveriam ser adoradoas.

Este foi sucedido pelo segundo volume, Aleister Crowley and the Hidden God (Muller, 1973).Este foi um estudo mais especifico acerca do sistema de magia sexual de Crowley, amplificado por uma reflexão sobre o comentário Kaula acima referido. Grant resumiu o livro da seguinte forma:

Este livro contém um estudo crítico do sistema de magia sexual de Crowley e suas afinidades com os antigos ritos tântricos de Kali, a deusa negra do sangue e da dissolução representada no Culto de Crowley como a Mulher Escarlate. É uma tentativa de fornecer uma chave ao trabalho de um Adepto cujo vasto conhecimento de ocultismo foi insuperável por qualquer autoridade ocidental anterior. Tenho enfatizado a semelhança entre o Culto de Thelema de Crowley e o Tantra, porque a atual onda de interesse no Sistema Tâmtrico torna provável que os leitores estejam aptos a avaliar melhor a importância da contribuição de Crowley ao ocultismo em geral e ao Caminho Mágico em particular.

Houve também um capítulo sobre ‘Nu-Isis and the Radiance Beyond Space’, em que Grant cita a New Isis Lodge e seu programa de operações.

O terceiro volume, Cults of the Shadow (Muller, 1975), explorou os obscuros aspectos do ocultismo que freqüentemente são vistos negativamente como “magia negra”, o “caminho da mão esquerda”, etc. A ideia deste livro é apresentada no parágrafo de abertura da Introdução:

Este livro explica os aspectos do ocultismo que muitas vezes são confundidos com ‘magia negra’. Seu objetivo é restaurar o Caminho da Mão Esquerda e re-interpretar seus fenômenos à luz de algumas de suas manifestações mais recentes. Isto não pode ser conseguido sem uma pesquisa de cultos primitivos e de fórmulas simbólicas que neles residem. Não existe campo mais rico para uma pesquisa dessa natureza e esqueleto não mais perfeito onde acha-la do que os sistemas de Fetiches da África Ocidental e sua eflorescência em cultos Egípcios pré-monumentais. Tal pesquisa é apresentada nos três primeiros capítulos, após o quais os símbolos emergem à luz dos períodos históricos e aparecem sob a forma da Corrente Tântrico explicada nos Capítulos Quatro e Cinco.

Esta Corrente parece se dividir em duas correntes principais que refletem infinitamente a fenda original entre os devotos dos princípios criativos feminino e masculino conhecidos tecnicamente no Tantra como Caminho da Mão Esquerda e Direita. Eles são os princípios da Lua e do Sol, e sua confluência desperta o fogo da serpente (Kundalini), o Grande Poder Magicko que ilumina o caminho escondido entre eles – o Caminho do Meio – o caminho da Iluminação Suprema.

É a falha quase universal em compreender o adequado funcionamento do Caminho da Mão Esquerda que levou à sua depreciação — principalmente por causa de suas práticas não convencionais — e a uma realização imperfeita dos últimos Mistérios por parte daqueles que são incapazes de sintetizar os dois.

Destaca-se um capítulo sobre o trabalho de Frater Achad (Charles Stansfield Jones) e o Aeon de Maat, em que Grant tinha uma visão um pouco cética em relação às reivindicações de Frater Achad do alvorecer do Aeon de Maat. Posteriormente, como veremos, Grant veio a rever suas opiniões. O livro também contém capítulos sobre a obra de Michael Bertiaux, introduzindo Bertiaux a um público novo e levando a um aumento do interesse em sua obra.

A segunda trilogia abriu com Nightside of Eden (Muller, 1977).No centro deste é uma exploração dos Túneis de Set, que subjazem os caminhos da Árvore da Vida. O trabalho de Grant foi inicialmente baseado em um breve e obscuro trabalho de Crowley, Liber 231, publicado pela primeira vez no The Equinox. Este Liber é composto de sigilos dos gênios dos 22 escamas da Serpente, aquelas dos 22 cárceres das Qliphoth, e alguns oráculos obscuros;ele evidentemente, fascinou Grant, e a exploração dessas cárceres das Qliphoth formaram um elemento importante nas operações da New Isis Lodge. Grant foi criticada em algumas lugares por trabalhar com o que alguns consideram como o mal e aspectos adversos da magia. Contudo, os aspectos mais escuros da experiência são tão necessário de serem compreendidos quanto os aspectos mais luminosos; uma compreensão de ambos é necessária. A seguinte passagem da Introdução do Nightside of Eden aborda este assunto:

Isso me leva ao ponto final: A menos que o ocultismo se torne criativo, no sentido da abrir-se à novas abordagens, modificando e desenvolvendo conceitos tradicionais e de forma geral revelando um pouco mais daquela Deusa Suprema, cuja identidade está escondida atrás do véu de Ísis, Kali, Nuit, ou Sothis, haverá estagnação no pântano de crenças tornados inertes pela recente rápida aceleração da consciência da humanidade, o que é quase um milagre. Se a ciência do não-manifesta não permanecer aterrada a um estágio pré-púbere, enquanto as ciências manifestas voam para o espaço, o ocultista amadurecido deve pôr de lado os brinquedos da superstição e enfrentar sem medo as Árvores da Eternidade, cujos troncos e ramos brilham com o fogo solar, mas cujas raízes são alimentadas na escuridão.

Embora esta passagem se refira especificamente ao Nightside of Eden, o caso aqui articulado pela inovação e criatividade se aplica ao trabalho de Grant como um todo.

Ao longo do livro, há várias referências ao Aeon de Maat, e é claro que Grant teve até agora revisto sua opinião, visão um tanto cética em relação a este aspecto da obra de Achad. Na verdade, ele tinha nesta época recebido um material de Margaret Ingalls (Soror Andahadna), que o levou a reavaliar a obra de Achad acercada chegada em 1948 de outro Aeon que segue ao lado do Aeon de Horus, os dois aeons constituindo uma dupla corrente.

Em 1980 Grant publicou Outside the Circles of Time (Muller, 1980; Starfire Publishing, 2008), um trabalho que abrange uma área extremamente vasta e expõe, para citar a sinopse da contracapa: “uma rede mais complexa do que se imaginava: uma rede não muito diferente da sombria visão de H.P. Lovecraft de forças sinistras que espreitam na borda do universo “.Há muitos fios em um tecido rico e deslumbrante, uma vertente principal sendo a não-dualidade:

O mundo fenomenal não tem existência real para além de sua fonte noumenal. O mundo não está procurando por ninguém, o mundo não sabe nada de ninguém, mas as pessoas estão procurando o mundo e não conseguem encontrá-lo, porque eles são o mundo e elas estão realmente é procurando por si mesmas. Mas por elas não serem refinadas, não serem sutis, não serem silenciosas; por elas serem grosseisas e barulhentas, o mundo também lhes aparece como grosseiro e barulhento. Eles são identificados com estas qualidades, elas são suas, e, portanto, não podem controlá-las.

Somente através do refinar do grosseiro no sutil, o mundo do objeto no mundo do sujeito, o mundo-desperto no mundo dos sonhos, só assim pode ser encontrada a chave para o poder “oculto”. Ele só pode ser encontrado em total silêncio, quando mente cessou os pensamentos, quando a boca cessou a fala, quando o olho cessou a projeção de imagens. Só então a fórmula do controle-onírico levará ao total despertar da ilusão da vida.

É, portanto, necessário se habituar à ideia, a viver perpetuamente com a idéia, que toda a vida de um indivíduo – tudo o que pode ser lembrei dela – foi composta pelo indivíduo como uma peça de teatro é composta por um dramaturgo. É uma invenção, uma lîla, uma máscara ou dança em qual o indivíduo é o único ator, e mesmo este ator é apenas uma figura na peça. Ele não é real; nenhum objeto pode ser real, pois não há absolutamente coisa alguma.

Nada é Nuit, e ela não é uma coisa precisamente neste sentido particular de um jogo de poder (shakti) evoluindo um drama sem fim de luz e sombra que surge à existencia como sujeito e objeto. Mas a objetividade é um sonho, pois não há sujeito, não ha sonhador, ha apenas um sonho.É apenas quando esta verdade é profundamente percebida que o sonho é decifrado em sua origem, que é o bindu conhecido como Hadit, no coração de Nuit…

Hadit se dissolve em Nuit, algo em nada, objeto em sujeito, e sujeito – finalmente! – naquela subjetividade absoluta que, sendo livre tanto de objetividade e subjetividade, permanece indescritível.

O livro é o mais famoso, talvez, por apresentar a obra de Soror Andahadna, uma contemporânea sacerdotisa de Maat, cujo trabalho tinha paralelos com a obra de Frater Achad várias décadas atrás. Muitos Thelemitas têm problemas com o Aeon de Maat. Estão tão distantes quanto preocupados, cada Aeon dura 2.000 anos, estamos no início do Aeon de Horus, então até o de Maat ainda ha um longo caminho. Eles irão ecoar a famosa réplica de Crowley ao jovem Grant: “Maat pode esperar!”. No entanto, a seguinte passagem de Outside the Circles of Time coloca a questão de forma muito mais interessante:

Mitos e lendas são do passado, mas Maat não deve ser pensada em termos de eras passadas ou futuras. Maat está presente agora para aqueles que, conhecendo os ‘alinhamentos sagrados’ e os ‘Portais da Intertemporalidade’, experimentam a Palavra sempre vinda, sempre expressa, da Boca, nas sempre novas e sempre presente formas que estão continuamente a serem geradas a partir do Atu místico ou Casa de Maat, o Ma-atu…

Mas o livro é sobre muito mais que isso. É um potente ondular, em uma série de linhas aparentemente diversas em uma única corrente, larga e potente. Apesar dos livros de Grant serem cada um diferentes de seus antecessores, Outside the Circles of Time parecia anunciar um salto para uma dimensão diferente.

Outside the Circles of Time foi o ultimo livro de Grant publicado pela Muller, e houve uma pausa de 12 anos até 1992, quando a Skoob Publishing lançou o Hecate’s Fountain. Grant tinha originalmente concebido este como um relato dos rituais da New Isis Lodge.No entanto, como é frequentemente o caso, o trabalho tomou uma dinâmica própria e fez brotar uma  flor muito diferente.O livro foi ainda tecido em torno dos trabalhos da Loja. No entanto, este trabalho foi ilustrado como relatos anedóticos de trabalhos específicos, demonstrando em particular o que Grant designa por ‘tantra tangencial’, onde um trabalho mágico tem curiosos e às vezes alarmantes efeitos colaterais em desacordo com o seu propósito aparente. Grant rastreou estas anomalias para uma interface catalítica que ele chamou de ‘the Mauve Zone’, existente entre os reinos do sonho e sono sem sonhos. Há movimentos, impressões e redemoinhos na Zona Malva que dão origem a espectros frágeis, sonhos, imagens que entram na consciência e são vestidas pela imaginação.

A terceira Trilogia abre com Outer Gateways, publicado pela Skoob, em 1994.Este livro continuou e ampliou alguns dos temas do Hecate’s Fountain. Contendo um longo relato das diversas variáveis e de O Livro da Lei, explorou o trabalho de Crowley em relação ao Sunyavada, e teve algumas coisas notáveis a dizer sobre o potencial criativo da gematria:

A percepção, um conceito, ou um número – qualquer objeto de fato – não tem relação real com qualquer outra percepção, conceito ou número. A relação só existe na consciência do observador, a consciência que é o fundo sobre o qual todos os objetos aparecem como imagens em uma tela. Não pode haver associação de idéias, nenhum tipo de correspondências de qualquer natureza, entre os números ou as idéias que representam, salvo na consciência do seu observador, porque nenhuma coisa existe como um objeto em si.

As implicações dessas considerações não são geralmente apreciadas, embora sejam de grande importância. Os números podem significar para o cabalista precisamente o que ele deseja que eles significam no âmbito de seu universo mágico. Eles têm uma existência relativa, mas nenhuma realidade objetiva.

Os números podem, portanto, ser utilizados como um meio mágico de invocar energias específicas latentes na consciência do mago. Em outras palavras, números podem ser vistos como entidades que são identidades objectivas aparentes, ou personalidades, pois eles são um com o poder objetivo do mago.

O poder de números não reside nos números de si, mas sempre e apenas no mago. Se a mente dele está bem guarnecida com números mágicos (ou seja, números significativos para ele) não há limite, quantitativamente falando, para os mundos que ele pode construir a partir de suas energias (shaktis).Esta é a base da ciência dos números e o fundamento da numerologia como uma arte criativa distinta de um indicador meramente interpretativo das probabilidades fenomenais.

O magista não almeja ao prever o futuro – o que implicaria que ele já existiu – quando de acordo com as leis de seu universo mágico está criando o futuro.

Gematria criativa é, portanto, a ciência e a arte de projetar outros mundos ou ordens de seres, em harmonia com as vibrações simbolizados pelos números, que tornam as vibrações receptíveis diretamente.

Gematria é usada ao longo trabalho de Grant para sustentar uma visão que já existe, em vez de deduzir uma visão a partir de uma relação gemátrica.

No entanto, o núcleo do livro foi, sem dúvida, The Wisdom of S’lba e os vários capítulos de análise, que foram anexados.S’lba é uma bonita, altamente carregada e rica transmissão recebida durante muitos anos por Kenneth Grant desde final dos anos de 1930, a maior parte do que reificadas durante os anos da New Isis Lodge.

Há uma boa dose de incompreensão sobre a natureza das transmissões. Não é o caso de simplesmente tomar ditado de uma entidade desencarnada.Contato com o que é referido como nos planos internos é muito mais complexo e mais sutil do que isso. Tomemos por exemplo a seguinte nota introdutória por Grant:

A série de versos intitulado coletivamente a Sabedoria de S’lba … não foram escrito em qualquer tempo ou lugar em particular, embora o estado de consciência em que foram recebidos tenha sido invariavelmente o mesmo. O processo foi iniciado já no ano de 1939 quando a visão de Aossic primeiro manifestou na maneira descrita em Outside the Circles of Time (capítulo 8).

A visão se desdobrou esporadicamente durante o tempo de associação com Aleister Crowley e Austin Osman Spare. Mas o aspecto dinâmico do trabalho, que é dizer a integração da visão em um todo, ocorreu durante o período de existência da New Isis Lodge.

Em uma entrevista à Skoob publicada pouco antes de Outer Gateways ser lançado liberado, respondendo a uma pergunta sobre S’lba, Grant disse: “foi ‘destilado ‘, por um processo prolongado que se estendeu por muitos anos, desde os intensivos rituais realizados na New Isis Lodge entre 1955-1962 “.

Como mencionado acima, Grant estabeleceu pela primeira vez em The Magical Revival sua tese de que houve analogias sugestivas entre os elementos do panteão de Lovecraft e aspectos da obra de Crowley. Há uma passagem em Outer Gateways que joga a função destes e outros dos deuses “em uma luz muito diferente:

… Como outro relato de fases inclassificáveis da história da Terra, o Culto de Cthulhu simboliza o subconsciente e as forças externas a consciência terrestre. Pode-se dizer de partida que a verdadeira criatividade só pode ocorrer quando essas forças são invocados para inundar com sua luz a rede magica da mente. Para fins de explicação a mente pode ser encarada como sendo dividida em três áreas, o edifício que as contém sendo o único principio real ou permanente. Estas áreas são:

1) Subconsciente, o estado de sonho;

2) Consciência mundana, o estado de vigília;

3) Consciência transcendental, velado no não-iniciado pelo estado de sono;

Os compartimentos são ainda concebido como estando ligado com a casa que os contém, por uma série de condutores ou túneis. A casa representa a consciência trans-terrena. As forças invocadas – Cthulhu, Yog-Sothoth, Azathoth, etc – são assim entendidas, não como malignas ou entidades destrutivas, mas como as energias dinâmicas da consciência, as funções que servem para destruir a ilusão da existência separada (os quartos em nossa ilustração).

O próximo volume, Beyond the Mauve Zone foi lançado pela Starfire Publishing em 1999.É, como o próprio nome sugere, uma consideração mais profunda da região entre o sono sem sonhos e sonhos que fecundam a imaginação, e em particular uma consideração de vários métodos de acesso à Zona de Malva. Há três capítulos sobre o Rito Kaula da Serpente de Fogo, dando muito mais material do comentário Kaula iniciado obtido a partir de David Curwen.Há também uma análise prolongada de Liber Pennae Praenumbra recebido por Soror Andahadna, e uma consideração do trabalho do autor sérvio Mihajlovic Zivorad Slavinski.

O volume final das Trilogias, The Nine Arch, foi lançado pela Starfire Publishing em 2002.Consiste de um comentário versículo por versículo em uma transmissão recebida no decorrer do funcionamento da New Isis Lodge, Liber OKBISh, ’The Book of the Spider’.Esta transmissão começou durante um trabalho mágico de Qulielfi, o túnel de 29 de Set, por volta de 1952 O meio principal para as transmissões era uma sacerdotisa conhecida como Soror Arim. Ela aparece no romance de Grant Against the Light como Margaret Leesing.Ela não era o único meio para as transmissões, mas ela teve o papel mais importante e coordenou o trabalho de várias sacerdotisas da Loja.

The Book of the Spider é essencialmente uma coleção de oráculos enigmáticos que foram recebidos ao longo de vários anos, e estavam organizados retrospectivamente em 29 capítulos, cada um dos 29 versos, alguns dos versos não foram ouvidos, ou foram perdidos, mas este é o padrão básico.Alguns anos depois que a transmissão inicial foi recebida, a Corrente mais uma vez se tornou ativa. Esta transmissão subsequente proporcionou um menor número de versos, e foi arranjado em 3 capítulos adicionais, novamente de 29 versos cada.

Transmissões não são uma questão de estabelecer algum tipo de contato de rádio com uma entidade desencarnada e transcrever o que ele tem a dizer Uma transmissão pode ser através de qualquer dos sentidos Muitas vezes será intuída ou sutilmente apreendida, com a imaginação como catalisador. A imaginação não é mero capricho ou fantasia, mas esta é a bagagem que a palavra tem acumulado nos tempos modernos. É cósmica, embora existam áreas individuais de consciência da imaginação, e é nessas áreas em torno do indivíduo de que ele ou ela está mais diretamente consciente que nós consideramos como ‘nossa’ imaginação. A verdade é, porém, que não é nossa, mas uma área comum ou cósmica – um continuum, o alcance local em que somos mais imediatamente conscientes.

Transmissão assume muitas formas. É um fluxo de inspiração para as áreas mais pessoais da imaginação e muitas vezes se vestem em formas extraídas do subconsciente pessoal.Vemos isso na obra de Lovecraft por exemplo, muito da inspiração ocorrendo através de sonho e expressa através de imagens tiradas a partir da leitura extensiva e fantasias da infância de Lovecraft. Como a luz é refractada por da sua passagem através de um prisma ou um pedaço de vidro colorido, ou como o sol poente através da matéria atmosférica produz um concurso de cores gloriosas e vivas, assim a transmissão de uma Corrente será colorida pelas áreas pessoais da imaginação através que ele passa. O vento, por exemplo, só se torna evidente na agitação que causa nas folhas da árvore por onde ele se move, os perfumes que agita, a pele contra a qual se escova, dando forma de redemunhos as areias do deserto.

Na época dos trabalhos da New Isis Lodge que atraiu e em seguida incubou esta Corrente em formação, a sacerdotisa principal, Margaret Leesing, e outros foram apanhados na ficção oculta e em dois livros em particular – Dope por Sax Rohmer e O Besouro por Richard Marsh.Neste momento a New Isis Lodge tinha desenvolvido uma técnica mágico ritual que envolveu a dramatização da ficção. Como Kenneth Grant descreve em The Ninth Arch:

Como já mencionado na introdução geral a este livro, os ritualistas da New Isis Lodge utilizaram certos romances e histórias como outros magistas podem usar pinturas ou composições musicais para simular circularidade e encontros astrais. Eles entraram em um conto como eles poderiam ter entrado em uma imagem, cena, deserto, uma lotada sala de estar, ou outro local. Aplicado ao romance, o processo se desenvolve de forma dramática como uma experiência vividamente cinética que se torna assustadoramente oracular. Utilizamos, principalmente, o romance de Richard Marsh The Beetle, e “A Tale of Chinatown” ou Dope de Sax Rohmer, por nenhuma outra razão além do fato do Vidente principal recentemente ter lido esses escritos, e por outros membros da Loja também terem se familiarizado com eles. O conto de Marsh, em particular, foi escolhido porque continha o único relato publicado conhecido pelo presente autor do Children of Isis e portanto parecia em harmonia com o Wisdom of S’lba e com os oráculos de OKBISh.

Estas são as circunstâncias, o prisma, o vidro colorido, através dos quais os versículos do The book of the Spider são expressos.Existem referências, por exemplo, a personagens como Shoa, a Mulher Má; Sin Sin Wa, o vilão e sábio chines; Tling-a-Ling, seu corvo de estimação e familiar; Tûk Sam, seu antepassado venerado; todos esses personagens são extraídos do Dope de Sax Rohmer. Há referências a Limehouse, a Ho-Nan, a Chandu, ao Rio Amarelo, as trilhas de papoula, que são locais retirados também de Dope.Há o langor do sonho, do devaneio, as imagens parecem flutuar, a mudar, a se fundir – a emergir, a tremer, a cair. Há também referências a personagens extraídos de outras histórias, como Helen Vaughan e Sra. Beaumont da história de Arthur Machen, The Great God Pan.Essas são mascaras, cobertas, e não tem a intenção de apontar a profundidade de significado inerente a essas historias de onde esses personagens foram tirados. Há referências a cenas de novelas, como The Brood of the Witch Queen de Sax Rohmer, ou personagens de histórias de Lovecraft, como Joseph Curwen em O Caso de Charles Dexter Ward.

Há muito nos versos de The Book of the Spider que tem bastante importância na vida de Kenneth Grant, e parecem, por vezes, como se a reveladora Corrente fosse direcionada principalmente a ele.Estamos todos nós expressando uma reveladora Corrente de energia mágica. Nenhum de nós pode expressar uma verdade absoluta, apenas transmitir a verdade como a vemos. O trabalho de um adepto é sempre em um sentido intrínseco a ele ou a ela. A luz é uma, mas as lâmpadas são muitos, e cada lâmpada transmite aquela luz de sua própria maneira.

Personagens não-fictícios também são tecidos nesta Teia de Aranha. No decorrer de The Book of the Spider, nos tornamos conscientes de uma doutrina de avatares, em que várias pessoas que vivem ao mesmo tempo, podem cada uma serem personificações de uma entidade.Como qualquer um que tenha lido Against the Light irá saber, se trata de uma bruxa chamada Awryd, uma ancestral de Grant, que foi executada por bruxaria no século XVI.Awryd retorna, sob o disfarce de Margaret Leesing, Soror Arim, a vidente principal, e antes dela, Yelda Paterson, a bruxa-mentora de Spare. No entanto, a situação se torna mais complexa quando várias pessoas que vivem ao mesmo tempo, são cada uma avatares de Awryd – por exemplo, Margaret Leesing e Clanda Fane, ambas contemporâneas de Grant na New Isis Lodge.Alguns dos avatares são personagens tirados da ficção, como Helen Vaughan de The Great God Pan de Marchen, ou Loriel Besza do romance The Stellar Lode de Grant.Há referências a David Curwen, um contemporâneo de Grant na New Isis Lodge que tinha um forte interesse em alquimia, na Teia da Aranha ele é lançado como um avatar de Joseph Curwen, o alquimista cuja presença sombria paira sobre uma das melhores histórias de Lovecraft , The Case of Charles Dexter Ward.

Seguindo esta breve consideração das Trilogias Tifonianas, no que é que constitui a Tradição Tifoniana que é fundamental para a obra de Grant? ‘Typhoniana’ não é uma indicação precisa, como perceptível nas considerações das entradas de glossário para Typhon, Draco, Ta-Urt e tópicos relacionados através das Trilogias Tifonianas, há uma grande diversidade. Embora durante o período de trinta anos entre as publicações do primeira e do último volume a ênfase tenha mudado, nenhuma dessas entradas por si só são definições da Tradição Tifoniana. Em vez disso, cada uma articula uma faceta dela, não importando o quão importante essas facetas individuais possam parecer à primeira vista. É mais proveitoso, portanto, não pprocurar uma definição firmemente estabelecida, mas permitir à intuição detectar uma coerência subjacente e uma continuidade recorrente ao longo destas passagens.

Se há uma coisa que poderia ser dita para caracterizar a Tradição Tifoniana então é que ela comunga com o que alguns têm chamado de ‘Outside’, quer seja considerado como os confins do espaço além do terrestre, ou as extensões da consciência além da humana. Neste contexto, ‘Outside’ sempre só poderá ser um termo relativo, uma vez que a partir da perspectiva do continuum da consciência não existe dentro ou fora.

Em Beyond the Mauve Zone Grant analisa o transmitido texto Maatiano Liber Pennae Praenumbra a partir de uma perspectiva Tifoniana, e faz a seguinte observação:

É neste ponto que a curge aparece entre o Caminho de Aiwass-Lam e aquele de N’Aton que prefigura uma futura encarnação da consciência humana – em outras palavras, como nós mesmos iremos aparecer em alguma época futura. Como deve ser evidente a esta altura, refutamos este postulado em favor da noção de que a consciência em sua fase humana é um fenômeno completamente transitório, um mero flash na imensidão do Tempo-Espaço (Nu-Isis). Transmissões tais como as Stanzas of Dzyan, Liber AL, o Necronomicon, e continuando, o próprio Liber Pennae Praenumbra, não apoiam a noção de que uma máscara humana identificável com a consciência perpetue-se indefinidamente. Mas tudo cuja vontade seja dar – como a frase de Nema – “o salto mutacional em ser uma nova espécie” deve está preparado para abandonar o conceito de consciência ‘humana’ com todo seu dualismo implícito.

Estes abismos da consciência são muito mais profundos e mais amplos do que a consciência humana, que, como indicado na citação acima, é transitória e relativamente superficial. A Gnosis Tifoniana está preocupada em encontrar e explorar esses abismos. Como Crowley comentou em um posfácio ao capítulo 30 de Magick without Tears:

Eu pensei em um bom plano para colocar minha posição fundamental por si só em um posfácio, para concebê-la. Minha observação do Universo me convence de que há de uma qualidade muito maior do que qualquer coisa que possamos conceber como humano; que eles não necessariamente se baseiam nas estruturas nervosas e cerebrais que conhecemos, e que a única chance que a humanidade tem de avançar como um todo é a de que indivíduos façam contato com tais seres.

Era a convicção de Crowley de que a operação do Cairo de 1904, que levou ao contato com Aiwaz e à recepção d’O Livro da Lei, foi a primeiro de uma série de comunicações.Depois de afirmar sua crença em The Confessions de que não havia mais nenhuma razão a priori para duvidar da existência de inteligência desencarnada, ele afirma:

O caminho é, portanto, claro para eu vir adiante e afirmar positivamente que eu abri comunicação com uma tal inteligência, ou melhor, que eu fui escolhido por ele para receber a primeira mensagem de uma nova ordem de seres.

De facto tem havido mais mensagens ou transmições. A Operação do Cairo de 1904 foi seguida sete anos mais tarde pela Operação de Abuldiz, e sete anos depois que pela Operação de Amalantrah. Todos as três operações foram caracterizados pelo contacto com inteligências praeter-humanas que transmitiram informação. Hauveram também uma série de textos transmitidos conhecidos como The Holy Books, como por exemplo os sigilos e expressões sentenciosas que constituem o Liber 231.

Tais contatos não se restringiram a Crowley. Eles continuaram depois da sua morte com Liber OKBISh e The Wisdom of S’lba, ambos reificados – como delineado acima – durante o período de atividade da New Isis Lodge.Sem dúvida, houveram outras transmissões, e haverá mais no futuro. Estas são irrupções das camadas mais profundos da consciência à consciência desperta.

Assim como suas Trilogias, Grant também publicou vários volumes de poesia e uma série de contos e novelas. Em 1963 viu a publicação de seu primeiro volume de poesia, Black to Black and other poems.Uma intensa e comovente coleção de poemas, foram seguidas em 1970 por The Gull’s Beak and other poems.Um terceiro volume foi lançado pela Editora Starfire em 2005, Convolvulus and other poems, que incluía os dois volumes anteriores e acrescentava um terceiro, coleção inédita anteriormente, Convolvulus: Poems of Love and the Other Darkness.Esta coletânea incluiu rascunhos de Austin Osman Spare, alguns dos quais haviam sido especialmente desenhados para Grant por Spare.

Grant começou a escrever contos em uma idade jovem, e escreveu seu primeiro romance no início de 1950, Grist to Whose Mill? (que em breve será publicado pela primeira vez). Outros se seguiram, e foram publicados a partir de 1996. A maioria desses romances foram escritos durante o período da New Isis Lodge, e revisados antes da publicação. Eles exibiram personagens, muitos dos quais foram baseados em maior ou menor grau nos membros da Loja. Grant deu um insight sobre isso em sua resenha na contracapa do segundo volume da série, Snakewand & the Darker Strain:

Essas histórias, e outros contos nesta série, foram escritos no despertar de rituais realizados durante um período de sete anos na New Isis Lodge. Muitos foram os magistas e médiuns que passaram pela Loja, e alguns deles foram exibidos na série de romances. Suas personalidades mundanas não poderiam ter parecido incomuns para a observação casual, mas quando extendida e percebida pelas perspectivas únicas que seus papéis mágicos criaram para elas, atingiram uma apoteose, uma epifania. Este fenômeno extraordinário demonstrou as alturas e as profundidades que a natureza humana é capaz de escalar e atingir, no frenesi delirante inspirado por sua arte. Estes contos são do mesmo modo orientados para o outro lado de uma realidade raramente vislumbrada fora de um Círculo carregado magicamente.

Apesar de manter uma devoção a Crowley, Spare, e muitos outros místicos e ocultistas, cujo trabalho influenciou toda a sua vida, Grant nunca foi um seguidor, mas, pelo contrário, criou o seu próprio caminho a partir de uma série de influências, transformado através do crisol de sua experiência mística e mágica. Ele tinha uma profunda consciência do princípio de parampara ou linhagem espiritual, segundo o qual é da responsabilidade de um iniciado desenvolver o trabalho de seu antecessor, o antecessor, neste caso, sendo CrowleyNo curso de tal desenvolvimento, novas vias de abordagem são abertas, enquanto conclui-se que outras agora talvez sejam redundantes. Desta forma, um corpo de obras é uma coisa viva, desenvolvida por sucessivas gerações de iniciados.

A obra de Kenneth Grant foi rica, diversificada e eclética, tecida a partir de muitas vertentes e destilada a partir de muitas fontes. No entanto, sua principal influência foi Crowley, e Thelema é o cerne de sua obra. No velar de sua morte, a tarefa imediata é garantir que toda sua obra publicada esteja mais uma vez em versão impressa e prontamente disponível, e continuar a explicação dos princípios que subjazem a essas obras. Além disso, no entanto, o corpo de obras que ele desenvolveu irá, por sua vez, ser continuado, trabalhado e reconstruído por aqueles que vieram depois dele.Este é o maior testamento de que qualquer um de nós pode esperar.

Eu gostaria de encerrar este exame preliminar com uma passagem da Introdução de Outside the Circles of Time. Aqui, Grant deu uma visão sobre os objetivos de sua obra, a passagem em questão é sucinta e belamente expressa:

Um último ponto é relevante aqui, e digo isso sem apologias. Não é meu objetivo tentar provar nada, meu objetivo é construir um espelho mágico capaz de expressar algumas das imagens menos evasivas vistas como sombras de um futuro aeon. Faço isto por meio da sugestão, evocação, e por aqueles oblíquos e ‘intertemporais conceitos’ que Austin Spare definiu como ‘Nem uma coisa-Nem outra’. Quando isto é compreendido, a mente do leitor torna-se receptiva ao influxo de certos conceitos que podem, se recebidos sem distorções, fertilizarem as desconhecidas dimensões de sua consciência. A fim de atingir este objectivo uma nova forma de comunicação tem de ser desenvolvido; a própria linguagem tem que renascer, revivida, e dada a um novo rumo e um novo momento. A verdadeiramente imagem criativo nasce da imaginação criativa, e isto é — finalmente — um processo irracional que transcende a compreensão da lógica humana.

É bem conhecido que os cientistas e matemáticos desenvolveram uma linguagem secreta, uma linguagem tão esquiva, tão fugaz, e ainda assim essencialmente cósmica que forma um modo quase cabalístico de comunicação, muitas vezes mal interpretada por seus próprios iniciados! Nossa posição não é tão desesperadora, pois estamos lidando primariamente com o complexo corpo-mente em sua relação com o universo, e o aspecto corporal está profundamente enraizado no solo da sensibilidade.

Nossas mentes não podem compreender, mas nas camadas mais profundas do subconsciente onde a humanidade compartilha uma base em comum, há um reconhecimento imediato. Da mesma forma, um magista elabora sua cerimônia em harmonia comas forças que ele deseja invocar, do mesmo modo que um autor deve prestar considerável atenção para a criação de uma atmosfera que é adequada às suas operações. Palavras e suas vibrações não devem produzir um ruído meramente arbitrária, mas uma elaborada sinfonia de reverberações tonais que desencadeiam uma série de ecos cada vez mais profundos na consciência de seus leitores. Não se pode sobre-enfatizar ou superestimar a importância desta forma sutil de alquimia, pois é nas nuances, e não necessariamente nos significados racionais das palavras e números empregues, que a magicka reside. Além disso, é muito frequente e na sugestão de certas palavras não utilizadas, porém indicadas ou empregadas por outras palavras, não tendo direta relação com eles, produzirem as definições mais precisas. O edifício de uma realidade construída, às vezes podem ser criados apenas por uma arquitetura de inexistência, através do qual o edifício real é revelado e ao mesmo tempo oculto por uma estrutura alienígena assombrado por probabilidades. Estas são a legião, e é a faculdade criadora do leitor — desperto e ativo — que podem povoar a casa com almas. portanto, este livro pode significar muitas coisas para muitos leitores, e coisas diferentes a todos eles, mas a nenhum deles pode significar nada em absoluto, pois a casa é construída de tal maneira que nenhum eco pode ser perdido.

por Michael Staley


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