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“Como meu pai era um sacerdote xintoísta, nos disseram para oferecer um copo de água e uma tigela de arroz cozido no vapor no “kamidana” [santuário doméstico xintoísta] todas as manhãs antes do café da manhã. Depois desse ato de adoração, recolhíamos a tigela de arroz e comíamos dela. Ao fazer isso, eu estava confiante de que os deuses nos protegeriam.
“Quando compramos uma casa, confirmamos cuidadosamente a localização auspiciosa da nova casa em relação à nossa antiga consultando um xamã ou médium espírita. Ele nos advertiu sobre três portões demoníacos e nos instruiu a seguir o procedimento de purificação que meu pai prescreveu. Assim, purificávamos esses pontos com sal uma vez por mês.” — Mayumi T.
O xintoísmo é predominantemente uma religião japonesa. De acordo com a Nihon Shukyo Jiten (Enciclopédia das Religiões Japonesas): “A formação do xintoísmo é quase idêntica à cultura étnica japonesa, e é uma cultura religiosa que nunca foi praticada à parte dessa sociedade étnica”. Mas as influências comerciais e culturais japonesas são agora tão difundidas que deve nos interessar saber quais fatores religiosos moldaram a história do Japão e a personalidade japonesa.
Embora o xintoísmo reivindique uma adesão de mais de 91.000.000 no Japão, o que equivale a cerca de três quartos de sua população, uma pesquisa revela que apenas 2.000.000 de pessoas, ou 3% da população adulta, realmente professam acreditar no xintoísmo. No entanto, Sugata Masaaki, pesquisador do xintoísmo, diz: “O xintoísmo está tão inextricavelmente entrelaçado no tecido da vida cotidiana japonesa que as pessoas mal sabem de sua existência. Para os japoneses, é menos uma religião do que um elemento ambiental discreto, como o ar que respiram.” Mesmo aqueles que afirmam ser apáticos à religião compram amuletos xintoístas de segurança no trânsito, realizam seus casamentos de acordo com a tradição xintoísta e despejam seu dinheiro em festivais xintoístas anuais.
COMO COMEÇOU?
A designação “xintoísmo” surgiu no oitavo século d.C. para distinguir a religião local do budismo, que estava sendo introduzido no Japão. “É claro que ‘a Religião dos Japoneses’… existia antes da introdução do budismo”, explica Sachiya Hiro, um pesquisador de religiões japonesas, “mas era uma religião subconsciente, composta de costumes e ‘tradições’. Com a introdução do budismo, no entanto, as pessoas se conscientizaram do fato de que esses costumes constituíam uma religião japonesa, diferente do budismo, que era uma religião estrangeira.” Como essa religião japonesa evoluiu?
É difícil apontar uma data em que surgiu o xintoísmo original, ou a “Religião dos Japoneses”. Com o advento do cultivo de arroz em áreas úmidas, “a agricultura em áreas úmidas exigia comunidades bem organizadas e estáveis”, explica a Enciclopédia Kodansha do Japão, “e os ritos agrícolas – que mais tarde desempenharam um papel tão importante no xintoísmo – foram desenvolvidos.” Aquelas pessoas primitivas concebiam e veneravam numerosos deuses da natureza.
Além dessa reverência, o medo de ‘almas que partiram levou a ritos para apaziguá-las. Mais tarde, isso se desenvolveu em uma adoração de espíritos dos ancestrais. De acordo com a crença xintoísta, uma alma “que partiu” ainda tem sua personalidade e é manchada com a poluição da morte imediatamente após a morte. Quando os enlutados realizam ritos memoriais, a alma é purificada a ponto de remover toda maldade, e assume um caráter pacífico e benevolente. Com o tempo, o espírito ancestral ascende à posição de ancestral, guardião, divindade. Assim, descobrimos que a crença na alma imortal é fundamental para ainda outra religião e condiciona as atitudes e ações dos devotos.
Deuses da natureza e deuses ancestrais eram considerados espíritos que “flutuavam” e enchiam o ar. Durante as festividades, as pessoas invocavam os deuses para descerem aos locais específicos santificados para a ocasião. Dizia-se que os deuses tinham residência temporária nos shintai, objetos de adoração como árvores, pedras, espelhos e espadas. Os xamãs, ou médiuns espíritas, presidiam os rituais para invocar os deuses.
Gradualmente, os “pontos de pouso” dos deuses, que eram purificados temporariamente para as festas, ganharam uma forma mais permanente. As pessoas construíam santuários para deuses benevolentes, aqueles que pareciam abençoá-las. A princípio, não esculpiram imagens dos deuses, mas adoravam os shintai, em que se dizia que os espíritos dos deuses residiam. Mesmo uma montanha inteira, como Fuji, poderia servir como um shintai. Com o tempo surgiram tantos deuses que os japoneses desenvolveram a expressão “yaoyorozu-no-kami”, que significa literalmente “oito milhões de deuses” (“kami” significa “deuses” ou “divindades”). Agora, a expressão é usada para significar “incontáveis deuses”, uma vez que o número de divindades na religião xintoísta está sempre aumentando.
À medida que os rituais xintoístas se concentravam em torno de santuários, cada clã cultuava a sua própria divindade guardiã. No entanto, quando a família imperial unificou a nação no sétimo século d.C., eles elevaram sua deusa-sol, Amaterasu Omikami, para ser a divindade nacional e figura central dos deuses xintoístas. Com o tempo, foi proposto o mito de que o imperador era descendente direto da deusa-sol. Para fortalecer essa crença, dois grandes escritos xintoístas, o Kojiki e o Nihon shoki, foram compilados no oitavo século d.C. Usando mitos que exaltavam a família imperial como descendente de deuses, esses livros ajudaram a estabelecer a supremacia dos imperadores.
A Deusa-Sol no Mito Xintoísta:
Diz o mito xintoísta que, em tempos bem remotos, o deus Izanagi “lavou seu olho esquerdo, e assim deu à luz a grande deusa Amaterasu, a deusa do Sol”. Mais tarde, Susano, o deus das planícies costeiras, amedrontou tanto a Amaterasu que ela “se escondeu numa caverna rochosa no Céu, bloqueando a entrada com uma grande pedra. O mundo mergulhou na escuridão”. Assim, os deuses conceberam um plano para fazer Amaterasu sair da caverna. Juntaram galos cantantes que anunciam o amanhecer e fizeram um grande espelho. Em arbustos sakaki penduraram joias e tiras de pano. Daí a deusa Ama no Uzume passou a dançar e tamborilar numa tina com os pés. Dançando alucinadamente, tirou as roupas, provocando o riso dos deuses. Toda essa atividade despertou a curiosidade de Amaterasu, que espiou para fora e viu-se no espelho. O reflexo atraiu-a para fora da caverna, quando então o deus da Força agarrou-a pela mão e trouxe-a ao ar livre. “De novo o mundo foi iluminado pelos raios da deusa-Sol.” – New Larousse Encyclopedia of Mythology.
UMA RELIGIÃO DE FESTIVIDADES E RITUAIS:
Esses dois livros da mitologia xintoísta, no entanto, não foram considerados escrituras inspiradas. Curiosamente, o xintoísmo não tem um fundador conhecido ou uma Bíblia. “O xintoísmo é uma religião de uma série de ‘não tem’”, explica Shouichi Saeki, um estudioso xintoísta. “Ele não tem doutrinas definidas e não tem teologia detalhada. Ele praticamente não tem quaisquer preceitos a serem observados. … Embora eu tenha sido criado em uma família que tradicionalmente aderiu ao xintoísmo, não me lembro de ter recebido educação religiosa séria”. Para os xintoístas, doutrinas, preceitos e, às vezes, até o que eles adoram não são importantes. “Até mesmo no mesmo santuário”, diz um pesquisador xintoísta, “o deus consagrado era frequentemente trocado por outro, e às vezes as pessoas que adoravam esses deuses e ofereciam orações a eles não estavam cientes da mudança.”
O que, então, é de vital importância para os xintoístas? “Originalmente”, diz um livro sobre cultura japonesa, o “xintoísmo considerava os atos que promoviam a harmonia e a subsistência de uma pequena comunidade como ‘bons’ e aqueles que atrapalhavam como ‘ruins’”. A harmonia com os deuses, a natureza e a comunidade era considerada de valor superlativo. Qualquer coisa que perturbasse a harmonia pacífica da comunidade era ruim, independentemente de seu valor moral.
Como o xintoísmo não possui doutrina ou ensino formal, sua forma de promover a harmonia da comunidade é por meio de rituais e festivais. “O mais importante no xintoísmo”, explica a enciclopédia Nihon Shukyo Jiten, “é se celebramos festivais ou não”. Festejar juntos em festivais em torno de deuses ancestrais contribuiu para um espírito cooperativo entre as pessoas na comunidade de produtores de arroz. As principais festas eram e ainda são relacionadas ao cultivo do arroz. Na primavera, as pessoas da aldeia invocam o “deus dos arrozais” para descer à sua aldeia e rezam por uma boa colheita. No outono, eles agradecem a seus deuses pela colheita. Durante os festivais, eles carregam seus deuses em um mikoshi, ou santuário portátil, e comungam de vinho de arroz (saquê) e comida com os deuses.
Xintoísmo — Uma Religião de Festivais:
O ano japonês é cheio de festivais religiosos, ou matsuri. A seguir estão alguns dos principais:
– Sho-gatsu, ou o Festival de Ano Novo, de 1 a 3 de janeiro.
– Setsubun, lançam-se grãos de soja dentro e fora das casas, enquanto gritam: “Saiam os demônios, entre a boa sorte”; 3 de fevereiro.
– Hina Matsuri, ou Festival de Bonecas, para meninas, realizado em 3 de março. Faz-se uam exposição de bonecas, retratando uma antiga família imperial.
– Festividade dos Meninos, no dia 5 de maio; Koi-nobori (representações de carpas simbolizando força) presas a postes tremulam ao vento.
– Tsukimi, admira-se a lua cheia de meados do outono, enquanto se oferece bolinhos de arroz e primícias das colheitas.
– Kanname-sai, ou a oferta de primícias do arroz pelo imperador, em outubro.
– Niiname-sai é comemorada pela família imperial em novembro, quando o imperador, que preside como sumo sacerdote do xintoísmo imperial, prova as primícias do arroz.
– Shichi-go-san, que significa “sete-cinco-três”, comemorada pelas famílias xintoístas em 15 de novembro. Sete, cinco e três são vistos como importantes anos de transição; crianças trajando quimonos coloridos visitam o santuário da família.
– Muitos festivais budistas também são celebrados, incluindo o aniversário do Buda, em 8 de abril, e o Festival de Obon, em 15 de julho, que termina com lanternas postas para flutuar no mar ou em rios “para guiar os espíritos ancestrais de volta ao outro mundo”.
Para estar em união com os deuses, no entanto, os xintoístas acreditam que devem estar limpos e purificados de toda a sua impureza moral e pecado. É aqui que entram os rituais. Existem duas maneiras de purificar uma pessoa ou um objeto. Uma é oharai e a outra é o misogi. No oharai, um sacerdote xintoísta agita um galho da árvore perene sakaki com papel ou linho amarrado na ponta para purificar um item ou uma pessoa, enquanto na misogi, a água é usada. Esses rituais de purificação são tão vitais para a religião xintoísta que certa autoridade japonesa afirma: “Pode-se dizer com segurança que sem esses rituais, o xintoísmo não pode subsistir [como religião].”
A ADAPTABILIDADE DO XINTOÍSMO:
As festividades e os rituais permaneceram com o xintoísmo, apesar da transformação pela qual a religião xintoísta passou ao longo dos anos. Que transformação? Um pesquisador xintoísta compara as mudanças no xintoísmo às roupas de uma boneca. Quando o budismo foi introduzido, o xintoísmo se vestiu com o ensinamento budista. Quando as pessoas precisavam de padrões morais, ele usava o confucionismo. O xintoísmo tem sido extremamente adaptável.
O sincretismo, ou a fusão dos elementos de uma religião em outra, ocorreu muito cedo na história do xintoísmo. Embora o confucionismo e o taoísmo, conhecidos no Japão com o “Caminho de yin e yang”, já se haviam infiltrado na religião xintoísta, o budismo foi o principal ingrediente a se misturar com o xintoísmo.
Quando o budismo entrou pela China e pela Coreia, os japoneses rotularam suas práticas religiosas tradicionais como xintoísmo, ou o “caminho dos deuses”. No entanto, com o advento de uma nova religião, o Japão ficou dividido sobre aceitar ou não o budismo. O campo pró-budista insistiu: “Todos os países vizinhos adoram dessa forma. Por que o Japão deveria ser diferente?” A facção antibudista contestou: ‘Se adorarmos os deuses vizinhos, estaremos provocando a ira de nossos próprios deuses.’ Após décadas de discórdia, os pró-budistas venceram. No final do sexto século d.C., quando o príncipe Shotoku abraçou o budismo, a nova religião já criara raízes.
À medida que o budismo se espalhava a comunidades rurais, encontrou as divindades xintoístas locais cuja existência estava fortemente enraizada na vida cotidiana das pessoas. As duas religiões tiveram de fazer concessões. Os monges budistas que praticavam autodisciplina nas montanhas ajudaram a fundir as duas religiões. Como as montanhas eram consideradas as moradas das divindades xintoístas, as práticas ascéticas dos monges nas montanhas deram origem à ideia de misturar o budismo com o xintoísmo, o que também levou à construção de jinguji, ou “templos-santuários”. * Gradualmente, uma fusão das duas religiões ocorreu à medida que o budismo tomou a iniciativa de formar teorias religiosas.
* No Japão, os edifícios religiosos para xintoístas são considerados santuários, e os para budistas, templos.
No ínterim, a crença de que o Japão era uma nação divina estava se enraizando. Quando os mongóis atacaram o Japão no século treze, surgiu a crença no kamikaze, literalmente “vento divino”. Duas vezes os mongóis invadiram a ilha de Kyushu com frotas esmagadoras, e duas vezes foram impedidos por tempestades. Os japoneses creditaram essas tempestades, ou ventos (kaze), a seus deuses (kami) xintoístas, e isso aumentou grandemente a reputação de seus deuses.
À medida que a confiança nas divindades xintoístas crescia, elas eram vistas como os deuses originais, enquanto os budas (“iluminados”) e bodhisattvas (futuros budas que ajudam os outros a alcançar a iluminação) eram vistos apenas como manifestações locais temporárias da divindade. Como resultado desse conflito xintoísmo versus budismo, várias escolas xintoístas se desenvolveram. Algumas enfatizavam o budismo, outras enalteciam o panteão xintoísta e ainda outras usavam uma forma posterior de confucionismo para adornar seus ensinamentos.
ADORAÇÃO DO IMPERADOR E XINTOÍSMO ESTATAL:
Após muitos anos de concessões, os teólogos xintoístas decidiram que sua religião havia sido contaminada pelo pensamento religioso chinês. Então eles insistiram em um retorno à antiga maneira japonesa. Uma nova escola de xintoísmo, conhecida como Xintoísmo da Restauração, surgiu, com Norinaga Motoori (pronuncia-se Moto’ori), um erudito do século dezoito, como um dos seus mais notáveis teólogos. Em busca da origem da cultura japonesa, Motoori estudou os clássicos, principalmente os escritos xintoístas chamados Kojiki. Ele ensinou a superioridade da deusa-sol Amaterasu Omikami, mas atribuiu vagamente aos deuses a razão dos fenômenos naturais. Além disso, de acordo com seu ensinamento, a providência divina é imprevisível e é desrespeitoso que os homens tentem entendê-la. Não fazer perguntas e ser submisso à providência divina, era seu conceito dele.
Um de seus seguidores, Atsutane Hirata, ampliou a ideia de Norinaga e tentou purificar o xintoísmo, para livrá-lo de todas as influências “chinesas”. O que Hirata fez? Ele fundiu o xintoísmo com a teologia “cristã” apóstata! Ele comparou o Amenominakanushi-no-kami, um deus mencionado no Kojiki, ao Deus do “Cristianismo” e descreveu este deus que preside o universo como tendo dois deuses subordinados, “o Alto-Produtor (Takami-musubi) e o Divino-Produtor (Kami-musubi), que parecem representar os princípios masculino e feminino”, 9Religions in Japan [Religiões no Japão]). Sim, ele adotou o ensinamento de um deus trino do catolicismo romano, embora nunca tenha se tornado o principal ensinamento xintoísta. A mistura de Hirata do chamado cristianismo com o xintoísmo, entretanto, finalmente enxertou a forma de monoteísmo da cristandade na mente xintoísta.
A teologia de Hirata tornou-se a base para o movimento ‘Reverencie o Imperador’, que levou à derrubada dos ditadores militares feudais, os xoguns, e à restauração do governo imperial em 1868. Com o estabelecimento do governo imperial, os discípulos de Hirata foram nomeados para serem os comissários governamentais da adoração xintoísta, e estes promoveram um movimento para fazer do xintoísmo a religião estatal. Sob a então nova constituição, o imperador, visto como descendente direto da deusa-sol Amaterasu Omikami, era considerado “sagrado e inviolável”. Assim, ele se tornou o deus supremo do xintoísmo estatal.
OS “ESCRITOS SAGRADOS” DO XINTOÍSMO:
Embora o Xintoísmo tivesse seus antigos registros, rituais e orações nos escritos Kojiki, Nihongi e Yengishiki, o xintoísmo estatal precisava de um livro sagrado. Em 1882, o Imperador Meiji emitiu o Rescrito Imperial para Soldados e Marujos. Visto ter-se originado do imperador, foi encarado pelos japoneses como escritura sagrada e tornou-se a base para a meditação diária dos homens nas forças armadas. Enfatizava que o dever de um indivíduo de pagar suas dívidas e obrigações para com o deus-imperador estava acima de quaisquer outros que ela tivesse para com quem quer que fosse.
Outra adição aos escritos sagrados do xintoísmo ocorreu quando o imperador emitiu o Rescrito Imperial Sobre Educação, em 30 de outubro de 1890. Este “não apenas estabeleceu os fundamentos para a educação escolar, mas virtualmente se tornou as escrituras sagradas do xintoísmo estatal”, explica Shigeyoshi Murakami, pesquisador do xintoísmo estatal. O rescrito tornou claro que a relação “histórica” entre os ancestrais míticos imperiais e seus súditos era a base da educação. Como os japoneses encararam esses editos?
“Quando eu era menina, a vice-diretora [da escola] segurava uma caixa de madeira na altura dos olhos e a levava para a tribuna com reverência”, lembra Asano Koshino. “O diretor recebia a caixa e tirava o pergaminho em que estava escrito o Rescrito Imperial Sobre Educação. Enquanto o rescrito estava sendo lido, deveríamos curvar nossas cabeças até ouvirmos as palavras finais: ‘O Nome de Sua Majestade e Seu Selo’. Ouvimos isso tantas vezes que memorizamos as palavras”. Até 1945, e por meio de um sistema educacional baseado na mitologia, toda a nação estava condicionada a se dedicar ao imperador. O xintoísmo estatal era visto como a super-religião, e as outras 13 seitas xintoístas que ensinavam doutrinas diferentes foram relegadas a serem chamadas de seitas do xintoísmo.
MISSÃO RELIGIOSA DO JAPÃO – A CONQUISTA DO MUNDO:
O xintoísmo estatal também foi equipado com seu ídolo. “Todas as manhãs, eu batia palmas em direção ao sol, o símbolo da deusa Amaterasu Omikami, e depois olhava para o oriente na direção do Palácio Imperial e adorava o imperador”, lembra Masato, um japonês mais velho. O imperador era adorado como deus por seus súditos. Ele era visto como supremo, política e religiosamente, em razão de sua descendência da deusa-sol. Certo professor universitário japonês declarou: “O Imperador é um deus revelado nos homens. Ele é a Divindade manifesta.”
Como resultado, desenvolveu-se o ensinamento de que “o centro deste mundo fenomenal é a terra do Mikado [Imperador|. A partir deste centro devemos expandir este Grande Espírito em todo o mundo. … A expansão do Grande Japão em todo o mundo e a elevação do mundo inteiro à terra dos Deuses é o assunto urgente do presente e, ademais, é nosso objetivo eterno e imutável. ” (A Filosofia Política do Xintoísmo Moderno, de D. C. Holtom, em inglês). Lá não havia separação entre Religião e Estado!
Em seu livro Man’s Religions (As Religiões do Homem), John B. Noss comenta: “Os militares japoneses não demoraram a se valer desse conceito. Incluíram na sua propaganda de guerra que a conquista era a missão sagrada do Japão. Certamente, nessas palavras podemos ver o resultado lógico de um nacionalismo infundido com todos os valores da religião.” Que tragédia foi semeada para os japoneses e para outros povos, baseada principalmente no mito xintoísta da divindade do imperador e da mistura de religião com nacionalismo!
Os japoneses em geral não tinham outra alternativa senão adorar o imperador sob o xintoísmo estatal e seu sistema imperial. O ensinamento de Norinaga Motoori de ‘nada perguntar, mas submeter-se à providência divina’ permeavae controlava o pensamento japonês. Por volta de 1941, toda a nação foi mobilizada no esforço de guerra da Segunda Guerra Mundial sob a estandarte do xintoísmo estatal e em dedicação ao “deus-homem vivo”. “O Japão é uma nação divina”, pensavam as pessoas, “e o kamikaze, o vento divino, soprará quando houver uma crise.” Soldados e suas famílias pediam a seus deuses guardiões o sucesso na guerra.
Quando a nação “divina” foi derrotada em 1945, sob os golpes duplos da aniquilação atômica de Hiroshima e grande parte de Nagasaki, o xintoísmo enfrentou uma grave crise. Da noite para o dia, o governante divino supostamente invencível Hirohito tornou-se simplesmente o imperador humano derrotado. A fé japonesa foi abalada. O kamikaze havia falhado à nação. Diz a enciclopédia Nihon Shukyo Jiten: “Uma das razões foi a decepção da nação por ter sido traída. … Pior ainda, o mundo xintoísta não deu explicação religiosamente avançada e apropriada das dúvidas que resultaram da [derrota]. Assim, a reação religiosamente imatura de ‘Não há deus ou buda’ tornou-se a tendência geral”.
O CAMINHO PARA A VERDAEIRA HARMONIA:
O curso que o xintoísmo estatal trilhou destaca a necessidade de cada indivíduo investigar as crenças tradicionais às quais adere. Por apoiarem o militarismo, os xintoístas talvez tivessem procurado um caminho de harmonia com o próximo, os próprios japoneses. Isso, é claro, não contribuiu para a harmonia mundial, e com seus arrimos de família e jovens mortos em batalha, tampouco trouxe harmonia doméstica. Antes de dedicarmos nossa vida a alguém, devemos ter certeza a quem e a que causa estamos nos oferecendo.
Para os xintoístas em geral, o fator importante em sua religião não era a identificação específica de um deus. “Para as pessoas comuns”, diz Hidenori Tsuji, professor de história religiosa japonesa, “deuses ou budas não faziam a menor diferença. Fossem eles deuses ou budas, desde que ouvissem súplicas por uma boa colheita, pela erradicação de doenças e pela segurança da família, isso era suficiente para o povo.” Mas será que isso os levou ao verdadeiro Deus e Suas bênçãos? A resposta da história é clara.
Em sua busca por um deus, os xintoístas, baseando suas crenças na mitologia, transformaram um mero homem, seu imperador, em um deus, o chamado descendente da deusa-sol Amaterasu Omikami. No entanto, milhares de anos antes do xintoísmo começar, um Deus, que se intitulava como o Deus verdadeiro, havia se revelado a um homem de fé semita na Mesopotâmia. Nosso próximo capítulo discutirá esse evento importante e seu resultado.
Fonte: Mankind’s Search for God, páginas 187-204.
Tradução por Ícaro Aron Soares.
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