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O início dos anos setenta é guardado com imenso carinho por aqueles que os viveram intensamente, formando a romântica juventude daquele tumultuado período.
O pouco populoso meio thelêmico da época não escaparia (felizmente) do romantismo que tomara conta da assim chamada geração para frente Brasil. Entre tantos que estiveram em contato inicial com o sistema thelêmico de realização espiritual, dois nomes despontam, bem mais pelo futuro que o destino lhes reservaria, do que pelo conhecimento, propriamente dito, da matéria elaborada por Aleister Crowley: os nomes são, Raul Seixas e Paulo Coelho.
Raul Seixas conheceu Paulo Coelho em 1973, através de um artigo publicado na revista “A Pomba”, do próprio Paulo Coelho. A partir deste momento, nascia a tão famosa parceria musical que viria a projetar os dois no cenário nacional.
Paulo Coelho, então em contato com Marcelo Ramos Motta (1931-1987), tomava suas primeiras instruções sobre Crowley e a Lei de Thelema. O fascínio pela filosofia desenvolvida pelo controvertido mago Inglês, não tardou a contagiar o promissor jovem escritor que, logo em seguida, a apresentou a Raul Seixas. A vida e a obra dos dois foram fortemente marcadas por este período.
Motta, então, escreve para um discípulo, Euclydes Almeida, pedindo para que este se responsabilizasse pelo desenvolvimento de Paulo Coelho, tanto na A.’.A.’. quanto na sua particular versão da “O.T.O.”. Marcelo Motta também comporia algumas músicas em parceria com Raul Seixas e Paulo Coelho. Entre as mais famosas estão as belas “A Maçã”, “Tente Outra Vez” e “Novo Aeon” (essa ultima em parceria com Cláudio Roberto).
Paulo Coelho, como indicado por Motta, estabelece contato com a pessoa indicada e esta o aceita como Postulante e Estudante da Lei de Thelema. A significativa troca de correspondência entre Paulo Coelho e seu novo Instrutor durante o período 1973-74 nos dá a certa medida do entusiasmo e dedicação com que Paulo Coelho, desenvolvendo seu estudos, também tomava para si a responsabilidade de divulgação da Obra do controvertido mago Aleister Crowley. Este trecho de uma carta de Paulo Coelho, datada de 26/03/74, nos dá uma idéia de seu envolvimento com a filosofia thelêmica: “… como tomamos [Paulo e Raul] Crowley, principalmente Liber OZ, como base de um estudo social a que nos propomos, gostaria de ouvir e ser constantemente orientado por vocês no sentido de não comprometer nada, falando demais ou falando errado. Informe urgentemente como devemos continuar agindo na divulgação de todos os nossos ideais e nossas idéias.”
Seu treinamento mágico com teve início formal em 01/01/1974. Em seguida, Paulo Coelho seria admitido na versão de Motta da “O.T.O.”, assumindo o Mote Mágico “Staars”. Raul Seixas e Paulo Coelho, inspirados pela Lei de Thelema e pela Obra de Aleister Crowley, também formulariam um movimento que ficou conhecido com A Sociedade Alternativa, cujo hino, a música que leva o mesmo nome, é a própria declaração da Lei de Thelema.
Paulo Coelho, bem mais organizado que Raul Seixas, seguia firme com suas práticas e estudos thelêmicos. No dia 19 de maio de 1974, Paulo Coelho envia seu Juramento do Grau de Probacionista e é admitido na A.’.A.’. com o Mote Mágico “Luz Eterna” 313 (e não “Lúcifer”, como divulgado por certos autores nacionais). Junto a seu Juramento, envia uma carta em que seus ideais ficam expostos de forma bem clara. Nela, Paulo Coelho diz o seguinte:
“Continuamos a divulgar de todas as formas o Liber OZ, […] A Sociedade Alternativa continua com o sucesso de sua caminhada no sentido de construir as bases sociais para uma verdadeira civilização thelêmica.”
No entanto a eternidade de sua luz na senda thelêmica, bem como sua certeza de propósitos em relação a esta filosofia de vida, não iriam durar muito tempo: ironicamente, esta seria sua última missiva dirigida a seu Instrutor. Cinco dias depois, na sua famosa “noite negra do dia 24”, Paulo Coelho, junto a outros “subversivos”, é preso pela polícia do exército. Sim, ele de fato viu o “diabo” e, muito embora estes não possuíssem rabos pontudos nem chifres e usassem o verde oliva no lugar do vermelho, esse seria o fim de sua carreira mágica, pelo menos naquilo que diz respeito a Thelema.
Provavelmente a forte formação católico-romana de Paulo Coelho o tenha feito associar os dois fatos, mostrando-lhe então o quão “errado” ele estava em seguir “os passos da Besta”. Mais isso é apenas uma especulação. Devemos sempre lembrar que todos têm direito de optar pelo que melhor lhes parecerem. Alguns anos depois, o então convertido e arrependido Paulo Coelho transformou-se no mundialmente famoso escritor que todos conhecem. Não há lei além de faze o que tu queres.
Aqueles que conhecem esta parte da história, todavia, sabem o quanto esta fase marcou o escritor que se formava. Esses também sabem qual é a verdadeira origem do seu conhecimento que, fragmentado e diluído, habita alguns de seus Best-sellers, além, é claro, do que significa sua Ordem de RAM (é curioso observar que a palavra inglesa RAM é designativa para Áries, Carneiro ou ainda de Bode Montês – nesse caso, o Trunfo XV do Tarot de Crowley).
Raul Seixas, por sua vez – que nunca obteve qualquer vinculo formal com qualquer organização de cunho thelêmico – seguindo o exemplo de praticamente todos os estudantes de thelema daquela época, rompeu definitivamente contato com Motta. Raul Seixas, entretanto, seguiu de modo independente e anárquico, características bem próprias a sua fantástica personalidade, a divulgar a Lei de Thelema e a genialidade de Crowley. E assim, através de seus próprios méritos, ele se consagrou, e mesmo hoje, após sua precoce morte em 1989, continua como uma agradável e inspiradora lembrança, bem vívida na mente daqueles que amam a obra do sempre eterno maluco beleza.
Para muitos esse foi o fim do sonho da Sociedade Alternativa, para outros entretanto, seu verdadeiro início…
Quanto a Marcelo Motta, a partir de 1974 ambos, Raul Seixas e Paulo Coelho, não mais se relacionariam com ele (e nem com ninguém associado a Lei de Thelema). Motta, por sua vez, como sempre acontecia em relação a seus “ex-discipulos” (ou a qualquer pessoa) que faziam sucesso, não os poupou de sua insana ira. Especificamente sobre o nosso queridíssimo Raul Seixas, valera’ deixar as palavras do próprio Motta sobre ele, com a referido fonte bibliográfica. Novamente, prestem atenção, digo apenas o seguinte: essas palavras que seguirão abaixo são do próprio Marcelo Motta falando na terceira pessoa, e não minhas. Lá vai a pérola:
“Raul dos Santos Seixas: Cantor e compositor popular brasileiro. Foi em certo tempo um Probacionista de Marcelo Ramos Motta. Tentou USAR Crowley para sucesso pessoal, MACAQUEANDO os Beatles. Por sua própria requisição escreveu varias músicas tendo Motta como seu letrista. Tentou ROUBAR as letras e expurgou varias de suas letras, CURVANDO-SE a censura governamental. Cortou contato com ele.”
Num simples e curto parágrafo, o Raul (logo o Raul!) é acusado de “usar” o Crowley para sucesso pessoal, de se submeter a censura (quem o conheceu pode atestar o que o Raul achava da censura… e salvo me engano, a única musica do Raul que foi de fato censurada foi o debochado “Rock das Aranhas”…), além dele ser chamado publicamente de macaco e de ladrão. Enfim, o Motta seguiu, processando e caluniando o Raul, da mesma forma como fez com tantos outros. Contudo, como praticamente tudo feito por Motta isso não deu em nada…
Marcelo Motta faleceu, em 27 de agosto de 1987, sozinho em Teresópolis, cidade serrana do Estado do Rio de Janeiro.
E ainda existe mais…. mas, por enquanto isso é suficiente, pois já escrevi muito. Espero que essas informações lhes sejam úteis.
Um grande abraço.
por Carlos Raposo
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