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Entrevista com Anton Szandor LaVey (São Francisco, 1994)
por Michael Moynihan
Excerto de Book of Lies: The Disinformation Guide to Magick and the Occult
Na última primavera eu tive a boa oportunidade para viajar a São Francisco, contratado pela revista de rock Seconds com o objetivo de entrevistar o Alto Sacerdote Anton Szandor LaVey. Depois de dois dias agradáveis cheguei algumas horas adiantado ao meu encontro com o “Doutor”. O tempo passou rápido e logo meu taxi parou em frente na infame Black House e fui calorosamente recebido por Blanche Bardon. A conversa foi alegre, havia acabado de chegar na família Xerxes LaVey com apenas seis meses de idade. Poucos minutos depois o Papa das Trevas entrou com seu charme e bem humor habitual, e saímos todos para almoçar em um de seus restaurantes favoritos.
Depois de horas ao redor da mesa assisti uma apresentação dos dons musicais de LaVey em seu teclado eletrônico. Quando percebi que nem havia começado a entrevista ja eram quatro horas da madrugada. Então levantei algumas perguntas e a conversa durou mais três ou quatro horas, cobrindo apenas parte dos tópicos que eu havia planejado. Combinamos então de nos encontrarmos novamente dali a duas noites para continuarmos a conversa.
No final da segunda entrevista eu já tinha em mãos cinquenta páginas de anotações. Ao retornar ao meu lar passei os próximos dias transcrevendo e sumarizando suas respostas para a Second, nas quais LaVey fala sobra sua vida, os novos satanistas, magia contemporânea e suas visões sobre o futuro.
Como foi o relacionamento com seus pais?
“Eu tenho interesse em eugenia e genética. Como as pessoas são concebidas e comparar notas de suas condições de nascimento, assim como quanta atenção é dada a criança, que tipo de música ela é expostas, etc. É divertido como muitas pessoas que compartilham nossas visões não estão bem com seus pais, e tantos liberais que deveriam adorar seus pais não o fazem. Meus pais nunca me empurraram em nenhuma direção religiosa. Quando eu escrevi a Bíblia Satânica isso não os incomodou – não porque sejam super liberais mas porque eles não tinham nenhuma opinião. Eu comecei a ler porque tinha sede de conhecimento. É algo no cromossomo. Pais podem fomentar isso ou facilitar isso mas não podem produzir uma predisposição artificial na criança. Você pode ter pais completamente normais com crianças excepcionais. Eu vi muito isso acontecer. Mesmo pais alcoólatras as vezes tem crianças brilhantes.
Alguma memória em particular da infância que queira compartilhar?
Eu tive uma câmara de tortura no porão de casa. Em um espaço que podia chega agachado construí todos esses instrumentos de tortura em uma prateleira direto da idade média. Mas antes de pensar em encontrar vítimas adequadas fui descoberto e me meti em apuros. A notícia se espalhou e tive que encerrar a brincadeira. Isso foi antes da guerra, e tinha em torno de onze anos.
E sua vida durante a guerra como foi?
A guerra foi importante no passado e muitas pessoas morreram. Mas eu não sei se é melhor viver neste mundo sanitizado e homogeneizado com conflitos ilusórios e imitações baratas de guerra que temos hoje em dia. O ser humano precisa da guerra de algum tipo. É algo que não se pode desejar que vá embora, porque sempre haverá guerras. Precisamos de inimigos, de adversários, do Outro. Um homem precisa de seus preconceitos e de algo a que nos opor, a não ser é claro que esteja tão repleto de soma ou drogas que não se importe mais. Se este tipo de passividade invalida e estagnada é o fim da história, precisamos fazer algo a respeito.
Mas naquela época eu tinha uma bicicleta alemã que me causou muitos problemas. Estávamos em guerra e não se fabricava mais bicicletas, mas eu encontrei uma alemã em uma loja. Era preta e o equivalente de duas rodas de uma Mercedes Benz 540K. Eu a dirigia por toda parte. A ironia é que meus pais nunca se preocuparam comigo digindo, mas sempre diziam que a bicicleta ia acabar me matando. Então me deixaram dirigir o casso sozinho desde os 14 anos. Se polícia me pedisse licença eu diria que estava indo pra casa.
A polícia nunca te parou?
Eu fui parado uma vez pela polícia em Los Angeles em 1948. Eu estava usando meias vermelhas e sapatos pretos mexicanos de couro, que eram usados pelos marginais da época. Eles não me pararam por causa da roupa de cafetão, das causas largas ou os sapatos.. Mas as meias vermelhas não deixaram passar.
Me perguntaram se eu era parte de alguma organização subversiva e eu respondi: “Que tipo de organização?”
“Oras, o partido comunista” responderam os policiais. Me perguntaram de onde eu era, onde estava me hospedando e onde eu trabalhava. Eu respondi que no “The Mayan” e outras casas burlescas.
“Estes lugares são quentes” disse um dos policiais. “É por isso que usa meias vermelhas? Ou é porque você é de São Francisco?”
A resposta verdadeira é que eu gosto de meias vermelhas, mas nessa época era algo complicado e eles confiscaram minhas meias!
Qual sua visão sobre os cursos de auto aperfeiçoamento?
Eu não sou ingênuo o bastante para acreditar que alguém pode adquirir cultura de uma hora para outra e se tornar instantaneamente inteligente, como essas pessoas que pensam que conquistaram algo ao voltar para a escola depois dos quarenta anos.
Agora nos anos 90, o desenvolvimento físico está dando lugar ao empoderamento mental, a computação parece prover um veiculo que faz as pessoas acreditarem que podem apertar um botão e se tornarem mais espertas. Livros, cassetes e informações online sobre leitura dinâmica, aprendizado rápido, quer convencer as pessoas que podem comprar Q.I.
Estes CEO’s da Esperança vendendo cursos para se tornarem alguém melhor. Senhor Satã, não os aguento. Eles não são mais espertos ou motivados do que antes de terem sido convencidos de que poderiam melhorar suas próprias mentes.
Seus livros são em geral bem curtos, porque isso?
Você já percebeu como os bestsellers de ficção são tão grandes? Há muito para se ler enquanto se espera na fila. É como comer um grande cheesburger que pode ser mastigado por eras. Os leitores mais estúpidas parecem sempre estarem lendo os maiores livros. Talvez isso dê a elas a ilusão de que estão fazendo algo importante.
Muitos o chamam de charlatão, isso te incomoda?
Quando eu comecei a ganhar publicidade eu logo era estigmatizado como ser um empregado do circo. Alguns anos depois eu vi pessoas que trabalharam comigo se gabando de sua origem circense. E então depois elas saíram dizendo que eu não teria estado com elas. Não deixe que ninguém veja nada como uma vantagem ou tentarão tirar de você. São bastardos, não desprovidos de brilho que querem arrastar os outros para seu vazio. Como seu eu tivesse entregado jornais a vida toda! Eu trabalhei no circo por um ano. Eu ajudava no tratamento dos leões. Lá encontrei pessoas que ficaram famosas depois. Eu estava só no lugar certo na hora certa.
A Rússia, como um pais ateu, me considerou o bastante para me colocar em um de seus museus. Eu tive a consideração da União Soviética lá atrás então porque deveria fazer piruetas agora só porque alguém, vinte anos depois age como se não fossemos tão maus? Porque a Bíblia Satânica não é listada nos livros que os influenciaram? É isso que me irrita. Então porque eu deveria dar a essas pessoas um tempo do meu dia? Especialmente nos círculos acadêmicos? Estes mornos quase-satanistas, eu os recebi bem aqui em casa e era um cavalheiro e agora eles guardam segredo e nem mencionam o satanismo em seus livros e literatura. Mas estão bem longe de serem satanistas de fato.
O que seriam estes satanistas de fato?
Os excepcionais que não se encaixam. Como você explica que algumas pessoas realizam tantas coisas enquanto outras nas mesmas condições não o fazem? O que as separa do resto? Teriam eles algum tipo especial de cromossomo? Como alguém como Nat King Cole faz o que fez? O que ele tinha em sua cabeça que o fez agir assim? Algumas pessoas se elevam das demais. Leni Riefenstahl demorou-se com Hitler e Paul Robeson com Moscou. Robeson já era um fabuloso ator shakespeariano e o principal atacante no colégio. Era excelente em tudo – canto, drama, esportes, um super-homem. Deram o nome dele para uma montanha! Mas porque ninguém mais fala desse homem? É o mesmo que ocorreu com Rienfenstahl. Há toda uma história secreta dessas pessoas que não se encaixam nos moldes de nada mas são inegavelmente excecionais em tudo que se propõem.
Como o sujeito que saiu nas noticias por estar caçando caçadores no meio oeste. Ele estava matando homens porque amava os animais. Os liberais anti-armas não podiam apoiá-lo nem os conservadores pró-caça. Criminoso ou não ele não se encaixa. O ser humano é um jogo perigoso.
Seria o caso de Jack London?
Jack London é para mim como um Santo Satânico. Muitas pessoas se referem a ele como um licantropia e quando ele montou sua casa realmente a chamava de Wolf House.
Você também gosta de animais certo?
Eu gosto, mas não sou vegetariano. Se fosse preciso matar um eu acho que mataria. A necessidade é a lei suprema. Mas eu salvaria uma aranha e me ocupo em salvar insetos. Se vejo um caracol atravessando o estacionamento eu o ajudo.
Como foi seu embate com Burton Wolf, autor da sua biografia Devil’a Avenger?
Esse livro foi escrito no velho estilo liberal dos anos sessenta. Um tanto quanto raso, mas entusiasta do que escrevia. De certa forma ele projetou suas próprias visões e me deixou fora do palco. Era seu modo de conseguir atenção do público. A verdade é que depois de The Devil’s Avenger nos tornamos mais próximos. Mais tarde ele se tornou uma pessoa amarga a solitária. Era uma boa pessoa, um irmão de guerra e com um bom senso de humor. Ele escreveu um livro sobre os Hippies que foi adorado por eles. E ele escreveu um livro sobre Hitler e os Nazistas para juventude que foi bem informativo. Mas nunca fomos em nenhum momento antagonistas, apesar do que ele diz no final de The Devil’s Avenger.
Qual sua opinião sobre a geração atual de satanistas?
Como em Notas do Subterrâneo de Dostoiévski você pode sentar sozinho por anos e aprender tudo sobre todas estas experiências, mas cedo ou tarde você vai começar a a falar e verá que tem agora uma audiência totalmente diferente do que quando começou e toda uma nova gama de reações. Não vai cair em ouvidos surdos. Há ainda poucas pessoas realmente subterrâneas, mas é um tipo totalmente novo este que está por ai agora. Uma nova tribo perdida. Uma geração que vai se desenvolver de todos os sistemas de crenças impopulares e repudiados do passado.
Seriam os tais magos do caos?
As pessoas confundem anarquia e caos. Elas pensam que o mundo começou no caos – e eu concordo. Mas no caos e na confusão quando algo de valor ocorre é sempre um acidente. O que aconteceu depois? Células se dividiram e traçaram vários caminhos, em diferentes direções e formas ordenadas.
Caos aqui e agora em 1994 não é o caos que estes Magos do Caos parecem acreditar. Não é o “Venha um, venham todos” do Timothy Leary. Parece utópico mas não é assim que as coisas funcionam. Talvez algo possa se desenvolver do caos, mas é preciso haver ordem. É necessário haver uma direção – vitória não sai da bagunça ou do nada, mas de coisas discriminadas e organizadas em formas novas e terríveis. Está na mão daqueles com direção, planos, propósito e auto-disciplina… isso leva a uma conclusão. Uma mente que não se orienta será orientada por outros. É por isso que que os estádios e o Coliseu sempre foram lotados. São pessoas de mãos dadas indo a lugar nenhum – lhes falta paixão. Wilhem Reich estava certo, eles apenas sugam energia da atmosfera.
E quanto aos seus rituais?
As pessoas hoje estão desmoralizadas, dessensibilizadas e catatônicas. Não pode haver triunfo da vontade quando não há vontade. Dez destas pessoas ritualizando nos bosques talvez façam um belo espetáculo interessante para uma coruja em um dos galhos. Mas raramente elas conseguem entrar em acordo, são muitas agendas diferentes. Um grupo desse é inviável para mais de vinte pessoas. Mas um grupo unido, com uma ideia concentrada, pode conseguir realizar algo.
Esse grupo seria a Church of Satan?
Estas pessoas que entram para a Church of Satan e dizem “Tudo que eu ganhei foi esse cartão vermelho mal feito”.. se elas tivessem o peito cheio de medalhas brilhantes ainda não seriam ninguém. Quando trabalhava como fotografo policial conheci um sujeito que dormia em um quartos cheio diplomas na parede. Um policial brincou que era para ele lembrar quem era quando acordasse. São como estas pessoas que bordam suas iniciais nos pijamas. Elas podem olhar para o bordado e ter certeza que são elas mesmas antes de dormir.
Todos os graus e títulos ocultos são apenas substitutos para conquistas no mundo real. É a mesma coisa quando você vê um artista que não consegue fazer arte elogiando outro que também não tem prestigio com o público. É a conspiração dos incapazes. Como eles podem realizar algo quando sua vida é sugada por um tubo de raios catódicos?
Então você é contra a Televisão?
Dizem que a TV é um grande entorpecente do desenvolvimento, um dos ingredientes mais embrutecedores de suas vidas. Isso foi dito muitas vezes – é a maior culpada. Mas há diferentes tipos de TV. Hoje ela é ajustada para diferentes níveis e demografias, mas a máquina da propaganda é sempre a mesma.
Acusar a TV em si é culpar o revolver quando alguém leva um tiro. A ferramenta é sempre a culpada. O meio é sempre a mensagem. Tv é o meio pelo qual toda casa ganhou um olho Orwelliano. É a nova religião dominante. As antes de TV são mais numerosas e estão mais elevadas que qualquer cruz de igreja. Isso os mantem na linha – o que é bom. Para pessoas com imaginação limitada, TV é sua salvadora. Minisséries = Miseres.
Que conselho você dá para os magos de hoje?
Se querem alcançar um resultado desejado devem se voltar para a magia sexual. Mas isso não é o que as pessoas pensam que sejam. Sim, há certas regras e procedimentos que você pode usar mas mais do que isso é preciso quebrar padrões e regras estabelecidas e ser blasfemo, sem medo de limites que possam lhe sufocar. É preciso alcançar os vícios secretos das pessoas e invocar isso por imagens e palavras. Se for poderoso o bastante e o choque de valores estiver presente você terá o mundo nas mãos. Como Pigmaleão quando esculpiu uma mulher e ela ganou vida porque ele investiu muita emergia nela. Como com minhas pessoas artificiais. Eu trabalhei e trabalhei, e inspirei poeira e fumaça e lhes dei minha energia sexual.. é claro que elas não criaram vida ao pé da letra, mas algumas pessoas dizem que podem as vez se mexer pelos contos dos olhos e então alguém aparece que se parece exatamente como elas – explique isso!
O que quero dizer é que se você coloca energia o bastante no seu fetiche você verá as coisas mudarem, As pessoas pensam que fetiche é chicote e corsets mas é aquilo que faz você se sentir vivo. Se você tem força, energia e foco, algo surgirá na linha traçada. Hugh Hefner talvez seja um dos maiores magos sexuais que já houve porque ele pegou o estilo Coelhinha da Playboy e fez desse o padrão. Um homem com direção e vontade fez isso. O que é bom para a General Motors é bom para o resto do pais! Outras pessoas podem nem saber porque seguem esse padrão. Então não tire seu roupão e as coisas acontecerão.
Sobre estes seus Companheiros Artificias, acha mesmo que serão o futuro?
Nós iremos voltar para os tempos da escravidão. O ser humano é escravocrata. Todo mundo quer alguém em quem mandar. Em breve poderemos comprar um escravo artificial e pagar a prestação.
As pessoas se animam com seus personagens de TV e se emocionam com as ilusões encenadas em suas salas de estar, mas dizem que os companheiros artificiais não serão “reais” o bastante. Espere e verá.
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