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Sitra Achra

Homenagem a Tchort: uma noite na montanha – Os Rituais Satânicos

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“Quão mais valioso ao homem é um pequeno pedaço de pão do que um grande navio! Porém quão mais dinheiro se precisa para um navio! Que compreenda aquele que puder compreender.” – Grigory Yefimovitch Rasputin

Poucos estudiosos investigaram a existência de adoração ao Diabo na Rússia durante as centenas de anos em que seu espírito pagão serviu à Igreja Ortodóxica. Se perguntas eram feitas, a resposta invariavelmente era quena Rússia não existia magia negra ou esta era uma doutrina disfarçada com eufemismos cristãos. A última suposição é, é claro, a mais acertada.

Não há cultura mais calcada em forças e deidades negras do que a eslava em geral e a russa em particular. A quantidade de entidades satânicas na mitologia eslava excede e muito a cota usual. O extraordinário é que, ao contrário das evitadas forças das trevas tão frequentemente encontradas na mitologia e religiões, os demônios russos eram venerados com grande reverência e/ou divertimento. Por isso, o Cristianismo passou por tempos muito difíceis combatendo o Diabo lá. A persistência de Satã, principalmente entre os mujiques(camponeses), nos velhos tempos dos ortodoxos russos fez com que fosse necessária toda uma “reforma” dos antigos deuses que faria as técnicas de transição da Roma cristã parecerem pouca coisa.

Incapazes de banir os antigos deuses da Rússia simplesmente transformando-os em demônios (muitos já eram tidos como demônios benévolos), os cristãos lhes deram seu próprio Satã feito sob medida como uma espécie de grande cesto para forças malignas. Os antigos deuses russos da fúria e do prazer foram destituídos de quaisquer instrumentos que pudessem causar problema, receberam tarefas inócuas, e um dia no ano durante o qual seria-lhes permitido um culto perfunctório. Alguns foram “esquecidos” à força.

Pyerun, O Terrível, cuja imagem marcial dava força e poder àqueles em batalha, empunhava um raio pelo qual os guerreiros juravam por si mesmos. Seu companheiro, Volos, O Peludo, era o deus das bestas. Seus resfolegantes garanhões e tigres atroadores davam inspiração aos seus irmãos bípedes. Os nobres cristãos confiscaram a carruagem de Pyerun e lhe deram uma roda de moinho para empurrar. Seu último altar foi destruído e lançado ao rio Dnieper em 988, quando o Príncipe Vladimir de Kiev decidiu converter-se à Ortodoxia Bizantina. Volos sofreu o insulto de ser transformado num guarda de curral e mero pastor, e recebeu um novo nome: Saint Vlas.

Volkh, o Lobisomem Rei, era a personificação da feitiçaria, e era invocado pelos pagãos russos para defender sua terra em tempos de necessidade. O Culto de Kupala cultuava os poderes mágicos da água. A samambaia, sagrada aos seguidores de Kupala, como o pavão dos Yezidis, representava a sabedoria e possuía poder sobre riquezas e mulheres belas.

O Culto de Iarilo recusou-se a morrer até o séc. XVIII, quando o Bispo de Voronezh aboliu suas práticas, que incluíam a realização de festas e “jogos satânicos”. Iarilo, o equivalente russo de Pã, representava a fecundidade e era cultuado principalmente na primavera durante a primeira semeadura.

Zorya, a protetora dos guerreiros, cavalgava com sua pedra de afiar negra acompanhando Pyerun, e oferecia proteção e invisibilidade sob seu longo véu que tremulava ao vento – fornecido por Stribog, o qual também era uma deidade da ira.

Apesar dos princípios dualísticos comuns às mais primitivas mitologias estarem presentes nos mitos russos pré-cristãos, o lado negro(Tchomibog) claramente predominava. O Deus Branco, Byelobog (não um inimigo do Deus Negro, pois ambos eram essenciais), encontrou grande aprovação na Rússia “branca”, onde seus nobres atributos – ele guiava viajantes perdidos e ajudava fatigados camponeses no trabalho dos campos – foram bem-vindos.

Como era de se esperar, os cristãos se empenharam em acabar com todas estas crenças, inculcando um medo mortal de quaisquer forças negras restantes tanto aos simples mujiques, que adoravam os bons e velhos demônios, como aos instruídos. Assim um “underground” satânico que foi cuidadosamente disfarçado com armadilhas cristãs iria se desenvolver na Rússia. Aqueles que ingressaram em tais seitas foram levados apenas por emoção (os seguidores) ou por emoção e razão (os líderes).

Pelo séc. XIX, a severidade religiosa havia alcançado seu apogeu, com praticamente toda a Rússia convertendo-se à Igreja Ortodoxa. Mas os Antigos Deuses estavam preparando um modo de se vingar: os homens de “Deus” revelaram-se, como em outros países, como os verdadeiros vilões, mas eles estavam tão afundados em sua própria santa bondade que eram incapazes de cogitar a própria corrupção. Fora do lamaçal de “bondade” ocasionalmente piscava uma secular faísca de “maldade”. Estas faíscas manteram os Antigos vivos.

Conhecidas seitas religiosas eróticas existiram na Rússia durante os séculos XVIII e XIX, apesar do predominante ambiente ortodóxico. Elas foram lideradas por homens cujas visionárias habilidades, práticas e metas os revelam como satanistas de primeira ordem. A seita de Khlysty demonstra isto melhor do que qualquer outra. Seus sábios homens sabiam que as paixões sempre venceriam. À primeira vista, a “sagrada” justificativa para luxúria e vida dada pelos sacerdotes de Khlysty pode parecer hipócrita, mas é claramente pragmática quando entendemos o ambiente religioso da Rússia dos Czares.
O comportamento religioso russo sempre foi conhecido pela clara sensualidade, e inversão de emoções. Para os russos, a extravagância tinha um coerente e importante papel. O padrão – i.e. sequência – de gritos e perversões embriagadas seguidas de contrição e angustiada penitência quase sempre foi incompreensível aos ocidentais.

O que era a Khlysty e de onde eles vieram? Eles surgiram na Rússia por volta da mesma época que seus irmãos antagonistas, os Skoptsi ou “castradores” (cerca de 1500). Seus rituais, ainda que russos, também continham algumas influências estrangeiras. Eles celebravam com palavras e ações antigos deuses e divindades pré-cristãs como Rusalki e Iarilo, que eram as personificações da paixão e luxúria, e o Domovoy, ou gênio. Os Khlystys invocavam deuses bíblicos do prazer, bem como negros e proibidos demônios como Balaam, e deidades persas como Kors. Nos rituais destes “buscadores do prazer”, seus giros e voltas seguidas de frenética libertação sexual são praticamente indistinguíveis das batidas extáticas dos dervixes.

Sem dúvida a maior prova da influência de seitas estrangeiras sobre a Khlysty era seu dogma de “penitência através do pecado” – a alegação de que sexo com um ser “divino” ou escolhido (alguém em quem um deus ou a centelha de deus habitasse) anularia pecados e os transformaria em virtude. Essa doutrina possui clara semelhança e difere muito pouco da pregada pelos Irmãos do Espírito Livre na França, Alemanha e Tchecoslováquia nos séculos XV e XVI. Os Irmãos do Espírito Livre foi o nome de uma seita de dissidentes abortados do útero de sua mãe a Igreja Católica. Eles acreditavam que no interior de cada ser humano habita uma pequena centelha divina (Fünklein). Eles acreditavam também que um simples reconhecimento desta essência mágica no interior de cada homem bastava para libertá-lo de quaisquer restrições, fossem elas sociais, sexuais ou intelectuais.

A História nos mostra que os russos sempre foram muito receptivos, embora às vezes não muito práticos. E apesar do atual mito da falta de classe, o russo pode facilmente encontrar seu lugar e nele acomodar-se. Intriga e mudança sempre vieram de fora. A doutrina da pequena centelha foi, portanto, facilmente adaptada para caber na “alma” russa. Ao invés de uma congregação de deuses se aperceber da própria divindade, um líder humano tornou-se divino. Ele era o único que poderia salvá-los do pecado! Junto com isso veio o uso de um formato litúrgico ortodoxo totalmente diferente, formando persistentemente uma contracorrente nos rituais.

Associado a este fenômeno está o Mestre russo e conveniente vilão, Grigori Yefimovich Rasputin, o “Monge Louco”, que com sua personalidade forte e duvidosos encantamentos conseguiu suavizar os ataques hemofílicos do Czareviche (título que se dava ao filho do Czar), assim ganhando acesso às operações internas da Corte. A Khlysty ganhou muito de sua notoriedade devido a sua suposta associação com Rasputin. Apesar de muitos livros terem sido escritos sobre ele, apenas um, a compreensiva biografia de Colin Wilson, parece pintar um quadro exato. Para quem possuir discernimento o suficiente, as memórias publicadas pela filha de Rasputin, Maria, também são esclarecedoras. As características que Rasputin possuía um dia se tornarão a matéria prima usada para produzir a grandeza humana – o tipo de grandeza que leva o homem adiante em seu desenvolvimento evolutivo. Alguns viram esta grandeza em Rasputin e sentiram seu efeito de um modo que eles não podiam entender, um modo que invocava a dor da própria incapacidade. Devido ao fato dele ter usado este mecanismo interno, este “detector de incapacidade”, Rasputin fez muitos inimigos, junto com muitos bajuladores.

É interessante observar que as pessoas que levaram Rasputin a São Petesburgo e o apresentaram à Corte não foram malignos ou insignificantes ocultistas, mas proeminentes membros da aristocracia ortodóxica e da intelligentsia (=termo usado para designar uma elite intelectual). Tanto diletantes e santos (John of Cronstadt, principalmente) viram nele um homem santo com poderes de Deus (mas após sua morte lhe condenaram como um demônio). Relatos de suas outras propensões e poderes surgiram. Era dito que uma emanação azulada foi vista saindo de seus lábios. Acreditava-se que ele possuía uma misteriosa habilidade de ler os pensamentos alheios. Isso nasceu de suas próprias palavras, que também negavam as acusações dos detratores que quase sempre incluíam roubo entre seus “vícios”. Sua filha, Maria, recorda sua declaração: “Eu nunca ousei roubar ou furtar a mais insignificante coisa. Eu costumava acreditar que todo mundo imediatamente veria que roubei algo, já que eu ficava a par disto assim que um dos meus companheiros tivesse roubado algo.”

Suas habilidades curativas foram tidas como verdadeiras e tornaram-se famosas, mas não seus métodos, já que Rasputin não foi o usual curandeiro de fé do xamanismo. Sua supostamente extravagante e libidinosa vida tem sido assunto para incontáveis delírios sexuais, bem como seu inexistente papel na Khlysty como líder-redentor de congregações de corpos vivos. Que Rasputin se envolveu numa trama política não há dúvida. Ele era convincente e “navegador” (no original em inglês: outgoing), mas não afetado, apesar de seus modos teatrais, e provavelmente tinha um alto grau de inteligência natural. Pouco se sabe, entretanto, sobre as reuniões secretas realizadas nas “noites especiais” do ano, para as quais apenas alguns poucos membros seletos, tanto nobres como camponeses, eram convidados – noites às quais se referiam, mas nunca comentavam sobre o que realmente era feito, quando Rasputin era a “chama vermelha” e a “grande obra” era realizada.

Quando Alexandra, Imperatriz da Rússia, foi executada no porão da casa Ipatiev em 1918, dois anos após o cruel assassinato de seu batiuska Grigori, os guardas fizeram uma grande descoberta. Enquanto procuravam por jóias entre seus pertences, eles encontraram costurado ao seu espartilho um par de pequenas esmeraldas verdes no formato de dragões, dados a ela por Rasputin muitos anos atrás. Poderia ele ter tido algum contato com a estranha ordem hermética japonesa chamada O Dragão Verde*? Também há muitas especulações sobre as verdadeiras motivações do movimento de fim de século Khlysty.
Transmissão oral e legado fraternal manteram o seguinte rito vivo.

*Mais uma sociedade secreta que supostamente envolveu-se com o movimento nazista.

Requisitos para a Realização

Os participantes consistem em um sacerdote(celebrante), a mulher que funciona como altar, dois acólitos, um iluminador, o tocador do gongo, e a congregação.

O sacerdote veste um robe vermelho de mangas compridas. Seus assistentes (os dois acólitos, o iluminador e o tocador do gongo) vestem robes negros com fitas vermelhas na cintura. O altar fica despido e usa apenas uma coroa de metal, ao redor dele acende-se quatro velas. Os homens da congregação vestem túnicas de estilo russo com calças e botas negras. As mulheres, um tecido transparente de tons escuros, representando o misterioso véu de Rusalki.

Um turíbulo com correntes é necessário para incensar o altar e os artefatos, assim como um grande braseiro. Um pequeno frasco de flash powder (tipo de pó utilizado em pirotecnia, tradução exata não encontrada) é colocado próximo ao braseiro. O pó é jogado no braseiro de acordo com o “script”. O osso de um braço ou perna humana é usado como aspersório, em honra de Kashchey, o deus esqueleto. Todos os outros instrumentos comuns à ritualística satânica são usados.

O altar senta-se num semicírculo de samambaias, dispostas na forma de um leque. A câmara é iluminada por velas e decorada em estilo bizantino.

A música de fundo deve acompanhar cuidadosamente a cerimônia, usando instrumentos folclóricos russos ou gravações apropriadas. Os pequenos sinos típicos da liturgia russa devem ser usados sempre que apropriado ao rito, e tocados no ritmo de Obikhod. Se em dúvida, Modeste Mussorgsky ou Walt Disney podem ser seus guias (N.T. Vide.. The Night on Bald Mountain, no clássico da disney: ‘Fantasia’ ).


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