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No dicionário de Laudelino Freire, compulsão é o ato de compelir; compelir significa obrigar, constranger, forçar, empurrar, impelir. Compulsão é um comportamento fruto de uma coação inconsciente. Segundo a Psicanálise, trata-se de um impulso irresistível de executar um ato contrário ao desejo de quem o executa, ou, ainda, um ato formalista que o obsessivo executa para aliviar a angústia. É de se perguntar: o que realmente está coagindo a pessoa a realizar intensivamente determinado ato, que se revela, na maioria das vezes, extremamente penoso a si mesmo?
Bem, a compulsão é filha da repressão. Quando algo é reprimido a ponto de o desejo ser intensificado de forma exacerbada, nasce a compulsão. É sabido que o fruto proibido é sempre o mais doce. Freud afirma que a compulsão está associada ao princípio do prazer. A realidade é que o prazer vem da satisfação cíclica deste síndrome, como forma a perpetuar um problema inconsciente não resolvido, deixado em aberto. LaVey ensina que “O dogma do Satanismo é indulgência ao invés de abstinência… MAS – não é compulsão.” A razão é que indulgência se baseia na livre escolha, e a compulsão na falta de escolha.
Naturalmente, o compulsivo nunca se lembra do protótipo, pois sempre atribui à atualidade a situação perniciosa em que está envolvido. No fundo, bem lá no fundo, há um desejo recalcado e sua solução periódica, de forma a resolver provisoriamente o conflito. A abstinência gera imenso desconforto físico, uma emoção intensa e pensamentos conflitantes, o que mina a tentativa de sair do círculo vicioso.
As características são a repetição, a ausência de controle, a intensificação ao extremo, a coação inconsciente e a inter-relação entre a situação penosa e o prazer da satisfação momentânea. A repetição, mesmo não sendo comum, pode se dar até anualmente. Há pessoas que bebem apenas uma vez por ano, mas, quando o fazem, perdem totalmente o controle. Há ausência de controle, porque é o inconsciente quem assume as rédeas. A intensificação ao extremo decorre do fato de, uma vez iniciado o comportamento, este ir até o extremo, como os bêbados que caem pela calçada. A coação inconsciente resume-se numa espécie de obrigação, sem cujo cumprimento o compulsivo não terá sossego algum. Por fim, a relação entre a situação penosa e o prazer da satisfação momentânea é que permite a continuidade do processo. De tempo em tempo, retorna a situação penosa, a qual só finda através do ato idiota, que dará uma satisfação provisória e, em seguida, o sentimento de culpa.
Alguns psicanalistas apontam a tendência repetitiva do id aliada a tendência conservativa do ego. Na realidade, a compulsão é energeticamente carregada pelo inconsciente. Não é nada fácil sair desta escravidão. A pessoa pode ter o vício de fumar, de beber, de tomar drogas, de comer demais, de jogar ou simplesmente de roer as unhas. Vício é o que você vê; compulsão, o que você não vê.
Quando você fuma demais, por exemplo, todos dizem que você possui o vício de fumar, isto é como a situação se apresenta, é a aparência externa. Internamente, deixa de ser vício para se tornar compulsão, que é o constranger interno. O que ocorre quando você tenta largar o vício? Inicialmente, a idéia de abandoná-lo surge da necessidade premente de melhorar sua qualidade de vida. Não obstante, o corpo logo apresenta os sintomas da síndrome de abstência, trazendo um verdadeiro martírio. A emoção apresenta-lhe algumas situações positivas e negativas mais intensas, como “uma briga repentina com a (o) namorada (o)”, “um dinheiro alto que acabou de entrar” e estes fatos incrementam a sua vontade de fumar. A mente apresenta propostas alternativas, de quando em quando, de forma a pacificar a situação, de modo a que você volte ao vício sem se sentir um derrotado: “fume só unzinho, na próxima tentativa você pára”; “essa alegria merece uma comemoração”, “este problema é sério, vale um desabafo” etc. É importante notar que o cigarro é apenas matéria. O lógico seria a pessoa dominá-lo, e não ser dominado por ele. Uma pessoa escravizada por algo “sem vida” deveria ser encarado como o pior tipo de escravidão existente, contudo não é assim.
O problema é que o ego se rebela contra qualquer situação nova, para a qual tenha de mudar. O ego defenderá o seu território de todas as maneiras possíveis. Como a pessoa irá lutar contra a imperiosidade do corpo, da mente e da emoção. Parece coisa de três contra um. Haverá infiltração pelos pontos fracos, e você torna a cair.
Voltemos um pouco no tempo. Quando você começa um vício por curtição, surge uma primeira fase saborosa, em que tudo justifica a sua repetição. Fumando, você se sente mais dono de si, conquista aquela (e) gata (o) legal, conversa com pessoas como um verdadeiro adulto, resolve situações de tensão etc. Assemelha-se a um remédio para problemas emocionais e, é importante frisar agora, qualquer vício (não apenas o tabagismo) é apoiado numa forte dependência emocional, como fruto de alguma situação não resolvida, que lhe torna extremamente dependente.
Como pessoa racional, você sabe que o fumo causa câncer, enfizema e outras doenças mortais. Afasta não fumantes da sua presença, relacionando-o como uma pessoa fraca, dependente, doente e porca, já que você deixa os vestígios da sua presença por onde passa, como as cinzas de cigarro não só no cinzeiro, mas pelo chão, nas blusas queimadas, nas unhas e dentes encardidos, no mau hálito, nos ambientes empestados de mau odor etc. Sim, você sabe tudo isto, mas não consegue largar o vício, por quê?
Simplesmente, porque largar qualquer vício simplesmente significa abandonar uma situação mais ou menos cômoda para aceitar um martírio por alguns dias ou meses, dependendo da personalidade da pessoa. Muitas vezes, a pessoa volta a fumar após alguns anos de abstinência, o que significa que nunca deixou de fumar verdadeiramente, apenas fez um jejum prolongado.
O medo da doença ou da morte torna-se abstrato, porque não é uma situação que se apresente totalmente no momento. Há relatos de pessoas que tem um, dois, três enfartos e, ainda assim, mantêm o vício. Tudo se projeta no futuro, a não ser quando a pessoa se apavora realmente e vê que não tem saída alguma, tem de tomar a decisão definitivamente.
Por outro lado, a repressão ou restrição é a pior saída. Na maioria das vezes, foi justamente assim que você começou a fumar ou a beber. Se a pessoa encarasse o fumo como um alimento qualquer, como o arroz, não seria dada tanta importância a ele. Afinal, eliminar apenas um tipo de alimento é fácil para qualquer um. E o fumo não deixa de ser um alimento, um alimento nocivo, mas um alimento. Já imaginou você comendo lingüiça inúmeras vezes por dia, durante anos a fio? É o que você faz com o cigarro, que não passa de uma lingüiça pequena, que expele fumaça.
Ocorre que o álcool e o fumo são vinculados a grandes atos esportivos, decisões inteligentes e conquistas do sexo oposto através dos canais publicitários, levando o parvo inconscientemente a crer que o modelo adapta-se a ele. Enquanto isto, os grandes industriais enriquecem-se à custa da estupidez. Intimamente dão enormes risadas com isto, pois sabem perfeitamente a situação ridícula e infame na qual está envolvida uma massa de escravos.
É possível a mudança de modelo. Encare a compulsão como um alimento físico e/ou psíquico e saiba que é perfeitamente possível substituir um alimento por outro de melhor qualidade. Saiba também que a síndrome de abstinência é passível de ser enfocada como um processo purgatório, em que, pouco a pouco, a pessoa vai cortando os liames antigos e substituindo-os por novos. Em momentos críticos, uma boa caminhada sempre resolve. Não tente resolver em nível de psique, ponha a dor em nível físico e relacione-o com os efeitos de uma gripe, por exemplo. Aos poucos, passe para um alimento mais salutar, como a prática de um esporte.
Discorri principalmente acerca do tabagismo e alcoolismo, mas todos os outros tipos de compulsão seguem a mesma regra, que resumo:
· É necessária a mudança do modelo
· É importante a aceitação da dor, como forma de purgação
· E, principalmente, é imprescindível amar a si mesmo
Alimente sua alma com mais:
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