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Em 12 Agosto de 1988, foi ao ar pela NBC, maior emissora dos Estados Unidos, um documentário intitulado “Exposing Satan’s Underground“. O programa, veiculado no programa de Geraldo Rivera, teve a maior audiência já registrada da TV norte-americana para um documentário; recorde de audiência que só seria quebrado em 2001 após a exibição de matérias sobre o ataque da Al-Qaeda em Nova York. Mais de 19 milhões de lares no país ficaram sintonizados durante quase duas horas de bizarrices, discursos teológicos e depoimentos para lá de suspeitos, principalmente de mulheres que alegavam ter sofrido abusos em rituais de magia negra. No programa inúmeros depoentes afirmaram ter tido contato dolorosos com satanistas nos últimos dez anos. Não foi surpresa para especialistas, psiquiatras e céticos em geral, que num pais onde o fundamentalismo cristão domina a audiência tenha chegado a 96% dos televisores ligados no programa – já extinto – deste polêmico filho de mexicanos.
Duas semanas depois, a CBS, outra grande emissora de TV americana, exibiu um documentário feito por médicos especialistas em distúrbios mentais, sociólogos e terapeutas especializados em casos de abuso infantil, que rebatiam e desmentiam as informações exibidas no programa da NBC. Menos de 1.6 milhões de lares americanos estavam sintonizados desta vez, mesmo com uma semana de antecedência em chamadas exclusivas para o programa durante a grade normal da emissora.
No começo do milênio ignorando explosão islâmica que estava para acontecer, mais de 80% da população americana, achava que o satanismo havia se tornado um problema tão grande quanto as drogas nas grandes cidades. Reclamavam muito do ceticismo com que a polícia tratava as denúncias feitas. Sandi Bargioni, uma chefe de polícia de São Francisco na Califórnia nos oferece seu veredicto:
“Entre 1982 e 1987 eu investiguei por volta de 350 casos envolvendo denúncias contra satanistas, abusos e rituais em que supostamente, crianças estavam sendo usadas. Nada. Eu posso comparar estas denúncias como aquelas em que mulheres da idade média eram acusadas por outras rivais por práticas de bruxaria. Em Santa Barbara, recebemos por três ou quatro vezes uma denúncia contra uma mulher de 39 anos; que segundo a delatora, havia aberto uma creche apenas para molestar crianças em rituais macabros. Mais tarde, descobriu-se que as duas tinham uma rixa por causa de um diretor de escola primária em que ambas haviam trabalhado”.
Jeffrey Victor, sociólogo na Jamestown Community College em Nova York, lembra que nos anos oitenta, somente em seu estado houve 33 acusações da ação de satanistas na região que deixaram a população em pânico absoluto. Para se ter uma idéia, em um dos exemplos mais graves, corria o boato que nazi-satanistas procuravam por crianças arianas, olhos azuis e louras, para serem sacrificadas em favor de Adolf Hitler. Durante dez dias, todos os pais (mesmo os não arianos) mantiveram seus filhos fora da escola. Foi preciso que o policiamento fosse triplicado para que as coisas voltassem ao normal.
Voltando ao caso californiano, Sandi Bargioni ainda trabalha na polícia de São Francisco, mas há muito tempo desistiu de levantar o traseiro da cadeira para dar ouvidos a essa gente, como ela diz: “Não tenho a menor dúvida de que esse tipo de satanistas não existem. Não no mundo ocidental, isso são apenas memórias distorcidas em relação a abusos sofridos durante a infância”.
A opinião da chefe de polícia é compartilhada pela terapeuta Christine Gourcoux, uma francesa de 42 anos radicada em New Jersey desde os anos oitenta, quando o quadro de denúncias contra satanistas era alarmante. Christine baseou suas pesquisas em dois ramos: o fundamentalismo cristão americano e praticantes de pedofilia, necrofilia e principalmente, mulheres de meia idade que mantinham relações incestuosas.
No primeiro caso, a opinião de Christine não diverge daquela apontada pela maioria dos psiquiatras americanos e europeus que se aprofundaram no caso: “Uma vez que o cristianismo elimine a figura satânica de seus quadros teológicos, estará matando a si próprio. O cristianismo é todo ele baseado no medo; na ameaça de que se a suposta palavra de Deus não for ouvida, mesmo que ela seja vomitada pela boca de um missionário ou pastor corrupto e que não paga seus impostos (algo sagrado para o americano comum) ela será digerida pelos fiéis sem maiores problemas. O cristianismo, assim como o islamismo não pode ser pregado sem a conduta do medo.
No segundo caso, Christine nos relembra o caso de Jacquie Balodis, uma jardineira de 49 anos que afirmava ter sido criada dentro de hordas satânicas. Balodis diz que durante a adolescência, sofreu dois abortos em que os fetos foram utilizados em rituais de magia negra pelo próprio padrasto. Aliás, ela diz que o padrasto havia engravidado-a aos 13 e aos 15 anos de idade. Na cidade de Pueblo, estado do Colorado, Balodis afirma ter vivenciado todo o tipo de abuso e experiências de cunho diabólico: devoção a Satã, sacrifício humano e mesmo canibalismo em que foi obrigada a comer parte do coração de uma criança de 11 anos utilizada em um ritual de vodu em 1982.
As investigações sobre o caso de Balodis foram abertas e o quê descobrimos Primeiramente, ela realmente sofreu diversos abusos do padrasto, um ex-caminhoneiro que vivia as custas do seguro social por ter perdido os movimentos de um dos braços num acidente de trânsito. O acidente não poupou as energias do homem para abusar de sua enteada. Uma “grata” surpresa para a polícia, foi descobrir que Ronald Davids era um assíduo frequentador da igreja batista local. Investigações posteriores foram realizadas com amigos e vizinhos de Balodis que afirmaram categoricamente que, Balodis teve uma educação religiosa muita rígida, e que era frequente ouvir de seus pais, ameaças para com os filhos de que se eles não fizesse isso ou aquilo, o diabo viria buscá-las e levaria todos para o inferno.
Uma pesquisa recente, feita pela Universidade do Texas afiram que, entre os 2.000 americanos ouvidos por ela em Julho do ano de 2005, 56% acreditam que satanistas rondam suas casas em busca de vítimas para oferecer em sacrifício. O número é bem inferior se for comparado com os 88% de texanos que pensavam o mesmo vinte anos atrás, mas ainda é alarmante. Como qualquer outro tipo de levantamento específico, é difícil analisar estes números se tentarmos investigar a realidade brasileira e a influência do neopentecostalismo no país.
Um grupo conhecido como SRA (Satanic Ritual Abuse), formado para investigar denúncias e atender sobreviventes de ataques de satanistas, fechou o ano de 2006 ( tendo sido criado em 1984 ) para balanço com os seguintes números:
Das 17.276 denúncias coletadas pelo grupo, apenas 89 realmente constituíam de fato abuso infantil, necrofilia, matricídio, patricídio, incesto ou pedofila, ligados a reais satanistas. Dentre estas, apenas duas denúncias mostraram-se verdadeiras e isso por si só já mostra que o fato de você ser satanista diminui estatisticamente as chances de você cometer um crime hediondo. Vejamos os dois casos. Paul Ingramm, acusado por seis estupros em Washington em 1989 e condenado a 20 anos de prisão. Na casa de Paul, foram encontrado diversos livros sobre magia negra e seus exames psicológicos não evidenciavam nenhuma disfunção. O outro foi o de Shawn Stewart, um rapaz de Illionois que foi acusado por várias testemunhas de dopar meninas entre 6 e 9 anos de idade e beber o sangue delas. Shaw dizia que mantinha-se com sua aparência extremamente jovem justamente por beber sangue infantil; algo que ele supostamente havia lido no livro de Nod. O rapaz cumpriu 6 anos de detenção e foi solto em Março do ano passado. Qualquer pessoa com o mínimo de conhecimento entende que chamar Ingramm e Stewart de satanistas é o mesmo que chamar uma pessoa parada no palco de cantor.
Para os especialistas, algo bastante curioso deve ser mencionado e estudado com mais atenção. A maioria das supostas vítimas que denunciam esse tipo de caso; têm entre 32 e 58 anos de idade; é viúva, divorciada ou não têm parceiros sexuais regulares. Não no sentido mais comum da palavra. Christine afirma que na maioria dos casos que revisitou – alguns deles às escondidas – foram encontrados evidências de abuso sexual sofrido na infância e que na idade adulta, transformou-se numa queda vertiginosa em direção a um tipo mais comum do que se imagina de relação sexual: o incesto.
Um dos casos da terapeuta fala de Lauren Stratford, uma mulher de 38 anos residente em San Fernando Valley e que afirma ter sido vítima de abusos satânicos por seus pais. Já adulta, Lauren afirma ter desenvolvido um gosto “pornográfico” por rapazes jovens (sem citar é claro a relação com o filho de 16 anos), em 1988 ela se tornou a sensação local quando lançou seu livro intitulado “Satan’s Underground”, em que descreve suas tenebrosas experiências como parideira de filhos para serem utilizados em rituais satanistas. De acordo com Lauren, Satã, sendo pura maldade, prefere o sangue inocente para sacrifícios.
A revista cristã, Cornerstone, entrevistou seus antigos colegas de escola e descobriu que os relatos de Lauren eram puramente uma fantasia mais que macabra. O livro que vendeu 140.000 exemplares, foi retirado das prateleiras pela editora mas pode ser encontrado para download na internet. Lauren confirma toda a história e diz que isso não passa de uma perseguição e inveja de seus ex-colegas pelo sucesso do livro. “É tudo verdade”, conclui ela.
Já Jacquie Balodis, é menos reclusa do que Lauren que se mudou para o Canadá, segundo ela, em busca de paz. Na direção de um grupo chamado “Overcome Victorious”, que segundo ela, ajuda na recuperação de vítimas que sofreram abusos satanistas. A sessão têm 60 minutos semanais de duração e atende atualmente, 45 mulheres em Los Angels e Dallas. Balodis não aceita a visita de intrusos; segundo ela, por três vezes grupos satanistas tentaram se infiltrar no grupo e atrapalhar o trabalho de recuperação psicológica das vítimas.
Para quem possa interessar, Balodis não têm registro no conselho de saúde nem frequentou a faculdade de medicina, mas vende material impresso que ajuda na recuperação destas mulheres. Crentes e céticos concordam em que, a “sobrevivente”, mulher geralmente de meia-idade, durante tratamento psiquiátrico e encontra-se desordenada por múltiplas personalidades (na maioria das vezes inventadas), causada por trauma infantil relacionados a abuso por parentes próximos, quase sempre o pai ou padrasto. Assim que a terapia se aprofunda, a paciente começa a falar de rituais, sacrifício humano ou animal, capuzes negros entre outras coisas. Então… a terapêuta chama a polícia.
“Aqui vamos nós novamente”, diz Kenneth Lenning, chefe do FBI destacado para esse tipo de caso. Lenning assim como muitos do alto escalão das forças armadas norte-americanas sabe que os verdadeiros satanistas não se esgueirando nos quintais, mas sim sentados confortavelmente sem seus escritórios. E quanto a isso ele é enfático: “Os únicos satanistas que conheço estão infiltrados em instituições religiosas de respeito, grandes multinacionais e lideranças populares. Eles estão ocupados demais com política e dinheiro para desperdiçarem seu precioso tempo derramando sangue ou abusando de meninas em tenra idade.”
Paulie Hollefeld
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