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Escrito por Geogia van Raalte
Babalon é tudo. Qualquer outra coisa que digamos sobre ela deve começar por refletir esse conceito fundamental. Babalon é a mãe de todos e a mãe das abominações. Em Sua Taça de Fornicação, que é o Graal, é recolhido o Sangue dos Santos. Babalon é tudo. O que significa que ela está além do bem e do mal, além das distinções entre sujo e limpo. Devemos começar com esta contradição fundamental, e devemos terminar aí também… mas ao longo do caminho há palácios de imagens a explorar, e cada palácio nos aproxima mais da compreensão d’Ela.
Babalon é a Mãe de Todos. Existem muitas Deusas Mães. Babalon é a Mãe das Abominações. Como tal, ela é uma representação divina de todos os aspectos negativos da maternidade. Para mim, em minha prática, vida e devoção, Ela é a forja da transformação derretida que é a maternidade, uma transformação que é tão cruel, implacável e dolorosa quanto cheia de alegria.
Existem muitas deusas benéficas e férteis, mas Babalon é a deusa de todos os aspectos negativos da maternidade. Ela é Tudo: abrangente, ela não esconde o entrelaçamento constante da vida e da morte. Babalon é a Deusa do infanticídio, da morte infantil, do aborto espontâneo e intencional, do natimorto e da prematuridade. Babalon é a Deusa dos seios doloridos e sangrentos e das estranhas confusões de prazeres enredados na lactação, de músculos cortados, pele enrugada e cicatrizes. Babalon é a Deusa a quem recorro quando me irrito com o papel em que me encontro, quando não quero ser mãe, quando me ressinto de meus filhos, da sociedade, do mundo e do vasto acúmulo de signos e significantes. Isso significa que não posso simplesmente fugir. Quando quero reservar um voo para algum lugar impossível, quando quero fingir que o mundo não existe, penso em Babalon.
Penso em Babalon quando penso em criadores e anti-reprodutores, e quando penso em vítimas de estupro e vítimas das circunstâncias. Eu me pergunto quantas mães do mundo quiseram filhos, e quantas mães se arrependem de seus filhos, e penso em Babalon. Penso em Babalon quando penso em trabalho não remunerado e desigualdade no cuidado de crianças, trabalho sexual e trabalho doméstico, e em encaixar minha carreira em cochilos de 30 minutos. Penso em Babalon quando penso em ervas amargas e galhos de olmo e em como agora dependemos tanto do governo. E quando minha primeira menstruação voltou, e meus seios estavam vazando e minhas calcinhas estavam ensanguentadas e o bebê estava chorando no berço e eu não tinha tempo para tomar banho e podia sentir o cheiro, aquele cheiro almiscarado e mineral; quando esvaziei meu copo menstrual no banheiro, pensei nela e em seu sanguinário sacramento.
A maternidade, como a criamos neste deserto nuclear, é um tormento que destrói a alma. Somos como ratos-toupeira agora, dando à luz nossos bebês no subsolo e permanecendo lá com eles, nesses berçários subterrâneos, até que nossos túneis psíquicos não possam fazer nada além de explodir. E quando eu tomo meu café da manhã e viro meu rosto para outro dia sem amigos, sem família, sem anciãos, sem aldeia, sem comunidade, quando eu enfrento outro desses dias intermináveis de mim e este pedacinho de mim, rindo e cagando e se esparramando como uma besta abissal, quando penso na infinidade de mães assim, como uma sanfona de dor em papel, penso em Babalon.
A maternidade costuma ser alegre, mas também costuma ser desagradável. Perdemos nossos deuses da morte e nossos deuses raivosos, nossos deuses da imundície e da fúria. Babalon me lembra que ‘bem’ e ‘mal’ são em grande parte uma questão de perspectiva. Babalon me lembra que não é preciso desfrutar de algo para encontrar divindade naquilo. Esta é a natureza do devocional.
Este assunto é particularmente pessoal para mim, pois foi no contexto dos aspectos negativos da maternidade que vim a conhecer Nossa Senhora. Ela veio a mim pela primeira vez após o nascimento do meu primeiro filho. Eu estava assustada e sozinha e estava com muita, muita raiva. Com a voz dela em meu ouvido, canalizei toda a minha fúria no chicote de Sua vontade e coloquei o rei esculpido de joelhos. Como mães de filhos pequenos, não há tempo para coisas sagradas; mas em seu ventre, em sua taça, tudo se torna sagrado. Dela é o riso e gritos, lamentos, súplicas e orações.
A maternidade é uma Iniciação e, como todas as Iniciações, não é agradável nem fácil. Quando a imagino, vejo-a agachada e, da boca escancarada de sua vagina, ela empurra para fora sua fétida semente. Ela é mãe de milhões e mãe de ninguém, e quando sinto como se tivesse me perdido em um labirinto de brinquedos e acessos de raiva, penso nela, e o labirinto se torna uma mandala quando ela me lembra que é somente quando estamos presas que podemos ser livres.
Tradução: Tamosauskas
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