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Realismo Fantástico

O inexplicável evento de Tunguska

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Semenow tinha um velho hábito: levantar-se de madrugada, preparar-se para as tarefas do dia na fazenda e, por fim, observar o horizonte, à espera do despontar do sol. Naquele dia, Semenow viu surgirem dois sóis no horizonte: Um deles terrivelmente mortal. Não muito longe de sua fazenda; o boiadeiro Luchektan começava a tanger 1 .500 cabeças de gado. Luchektan era de temperamento menos contemplativo , e para ele o sol tinha uma finalidade meramente utilitária: servia para iluminar e aquecer a Terra. Mas um sol era mais do que suficiente; de bom grado teria dispensado o segundo.

Nenhum daqueles dois homens sabia – na verdade, ninguém sabia – que aquele segundo sol era algo tão desconhecido quanto fatal. Tudo aconteceu muito rapidamente , naquela manhã de 30 de junho de 1908, e como o agente causador do fenômeno não deixou qualquer vestígio, até hoje nâo se tem ainda a noção exata do que se passou naquela região da Sibéria, entre os rios Tunguska e Lena.

Na ocasião – e por muito tempo – pensou-se que o local havia sido atingido por um meteoro pesando muitas toneladas. Já na década de 40 e nos anos 60, chegara-se à conclusão de que não era um meteoro, mas também não se tinha qualquer certeza sobre o que teria sido. Fosse o que fosse, ao atingir a Terra liberara energia superior à da mais destruidora bomba de hidrogênio. Atualmente se considera a hipótese de que naquele dia, nosso mundo tenha sido atingido apenas por um grão de poeira cósmica, algo menor que a cabeça de um alfinete, mas de bilhões de toneladas. Acredita-se que o estranho e ínfimo corpúsculo não deixou vestígio porque ao colidir com a Terra à velocidade de 40 mil quilometro horários , ele atravessou o planeta numa fração de tempo e saiu num ponto do Polo Norte rumando novamente espaço afora.

Em termos astronômicos, o fenômeno —- qualquer que tenha sido — foi tão rápido e inconsequente como se não tivesse acontecido . Em termos terrestres e principalmente humano, foi algo tão terrífico que ainda hoje, passado quase setenta anos; continua deixando perplexo os que procuram entender o que aconteceu naquele dia .

Eram 7 horas da manhã , quando o fazendeiro Semenow, que contemplava o nascer do Sol, viu o céu se iluminar com uma luz fantasmagórica. Um calor sufocante o atingiu e ele ainda pôde ver um segundo sol cortando o céu a grande velocidade. 0 estranho astro desapareceu no horizonte e, antes que Semenow pudesse imaginar o que acontecia uma onda de ar quente o envolveu e o arrancou do solo; a sensação, diria ele depois, era de que estava sendo consumido em chamas. Ao cair de novo no chão, perdeu os sentidos. Voltando a si, ainda atordoado e perplexo demais para pensar, olhou ao redor e levou outro susto: sua casa havia sido volatilizado, e toda a paisagem ao redor apresentava o aspecto de terra arrasada.

O boiadeiro Luchektan tocava suas reses em meio da penumbra que se dissipava, para dar lugar ao sol que surgia. Subitamente o céu se iluminou, estranha e rapidamente demais para ser normal. Luchektan sentiu o calor de fornalha e a onda engolfante de ar quente. Antes de desmaiar, ainda viu um homem, seu cavalo, vacas e bezerros sendo arrastados. Depois, só havia devastação: algumas carcaças de gado jaziam entre os restos de vegetação arrancada do solo e nada rnais; nenhum outro sinal de vida.

A 750 quilometros dalí , uma locomotiva pontilhava o ar com golfadas de fumaça e vapor, enquanto arrastava a composição de passageiros, a maioria dos quais ressonando pesadamente depois de uma noite mal dormida. Alguns mais despertos ouviram o rumor longinquo, abafado, indistinto. Notaram que o rumor aumentava rapidamente de intensidade; algo como o ribombar de um trovâo que viesse de encontro ao trem. Inesperadamente, os vidros das janelas quebraram- se, cortinas foram arrancadas dos suportes, a madeira estalou e partiu, o trem inteiro sacudiu, pessoas gritaram.

A onda de ar que arrasara a fazenda de Semenow e matara a boiada de Luchektan continuava se propagando e destruindo, com força ainda para arrancar dos trilhos um trem que trafegava a centenas de quilômetros do local onde surgiria. No caminho, ela foi secando a àgua de rios e riachos, e produziu um abalo subterrâneo que se propagou além dos limites da Sibéria e da Rússia e que foi registrado pelo sismógrafo de um observatório inglês a mais de 8 mil quilometros de distância. Paralelamente, o observatório astronômico de lrkutsk, situado na Sibéria a poucos quilometros da fronteira com a Mongólia, assinalou inexplicável alteração no campo magnético terrestre.

Cientistas se dirigiram ao local do impacto para examinar os destroços daquilo que seria um provável meteoro, e especialmente para examinar o seu núcleo, que – acreditava-se – estaria enterrado muitos metros abaixo da cratera que forçosamente teria se formado no ponto de colisão com a crosta terrestre. Decepção constrangedora: ao redor, num raio de 32 quilometro, a floresta ficara inteiramente calcinada e desaparecera todo e qualquer sinal de vida, mas não havia um único estilhaço de meteoro, e mais surpreendente ainda, não havia nenhuma cratera na área.

À falta de melhor explicação, imaginou-se que o meteoro, ao se aquecer subitamente no atrito com a atmosfera densa,
desintegrara-se antes de atingir o solo razão pela qual não teria ocorrendo a colisão nem se formado a inevitável cratera. Mas outros contestaram esse argumento, afirmando que em tal hipótese, os fragmentos teriam se espalhados nas redondeza e teriam sido localizados, coisa que nâo aconteceu. Afinal, o que teria atingido a Terra naquele dia?

Se fosse um meteoro convencional, que tivesse deixado cratera todos demais vestígios de praxe , o caso teria sido academicamente estudado, catalogado e esquecido. Porém, o mistério que cercou o fenômeno serviu para aguçar a curiosidade dos cientistas, obrigando-os a queimar uma quantidade inusitada de fosfato, na tentativa de solucionar a questão. Se não chegaram a uma conclusão, pelo menos levantaram várias hipóteses e elaboraram muitas teorias a respeito do fenômeno.

Apesar de os indícios nâo ajudarem, no início prevaleceu a idéia que teria sido mesmo um meteoro agente causador dos danos e abalos naquele 30 de junho. Houve mesmo quem calculasse seu peso: 40 mil toneladas, nem um grama a menos Nos anos e décadas seguintes, porém , uma das principais teorias sobre o fenômeno foi a da antimatéria, ou do universo inverso, onde existiriam antiastros, cujos núcleos atômicos seriam idênticos, mas opostos aos das galáxias. Nesse quadro, o que se chocou com o solo siberiano, naquela ocasião, não foi um bólido de estrutura atômica conhecida, mas um pequeno fragmento de antimatéria, possivelmente tamanho de uma bola de pingue-pongue.

0 contato do fragmento de antimatéria com a superfície terrestre teria provocado imensa explosão, que liberou energia superior a qualquer bomba então conhecida. Essa teoria, lançada em meados da década da passada pelos físicos C. Atluri e Clyde Cowan, pareceu fantástica então, mas não tanto quanto à lançada no final de 1976 pelos cientistas soviéticos Vladimir Stulov e Georgi Petrov. Segundo eles, o mistério fenômeno siberiano foi provocado por uma gigantesca bola de neve, remanescente do núcleo de um cometa.

7O bólido de neve, desenvolvendo uma velocidade de 40 mil quilometros horários, penetrou na atmosfera terrestre e, graças à sua baixíssima temperatura, manteve-se incólume até chegar à altitude de 80 quilometros. A partir daí, à medida que o caía, maior se tornou o atrito com as camadas mais densas de ar, produzindo uma coluna incandescente. Por fim, o rápido e intenso aumento de calor provocou a desintegração da esfera de gelo; resultando uma explosão tão potente que arrasou toda a espécie de
vegetação num raio de dezenas de quilometros, produziu danos a centenas de quilometros e foi ouvida em regiões muito distantes.

Mais recente que a teoria da bola de neve a do “buraco negro” , apresentada pelos físicos norte-americanos A. A. Jackson e Michael Ryan Jr., ambos da Universidade do Texas. 0 grande problema dessa tese é que a ciência não sabe o que são os chamados “buracos negros” existentes no céu. Tudo o que existe até agora sobre esse fenômeno sideral são conjecturas.

Explicar o incompreensível por meio de algo desconhecido não faz sentido. Aliás, na própria palavra buraco está implícita a ideia de inexistência. Então, nosso planeta teria sido atingido por algo que não existe? “Buraco negro” é uma região do céu onde aparentemente não existe nada, exceto a tal negritude que lhe dá o nome, mas de onde ; provem poderosas emissões de raios X perfeitamente captáveis na Terra. Várias hipóteses têm sido levantadas na tentativa de explicar o que sejam esses pontos do espaço. Segundo uma delas, os “buracos negros” são astros constituídos por antimatéria de estrutura nuclear inversa à da matéria comum, o que os torna invisíveis aos nossos olhos. Se isso for correto estaria certa a teoria de Atluri e Cowan de que a desintegração de um corpo sideral de antimatéria ocorrida em era remota teria lançado fragmentos por todo o espaço, um dos quais acabou se chocando com a Terra.

De acordo com outra hipótese, os “buracos negros” são corpos celestes formados de uma matéria tão densa e tão
extraordinariamente brilhante que os seus raios estariam situados numa faixa não perceptível aos nossos olhos . Daí a razão pela qual, nos pontos do espaço ocupados por eles; tem a impressão de que há uma espécie de vácuo ou buraco. Impressão falsa, corno o demonstram fortes ondas de rádio procedente desses pontos . Os físicos Jackson e Ryan Jr. inclinam-se por ess teoria ao dizer que o vale entre as bacias do Tunguska e do Lena teria sido atingido por um fragmento de “buraco negro” menor que a cabeça de um
alfinete, mas pesando bilhões de toneladas em virtude de sua densidade.

Esse micrometeoro, ao penetrar na atmosfera terrestre, teria provocado ondas de choque e produzido uma coluna incandescente e azulada extremamente quente, ao se deslocar È velocidade de 40 mil quilômetros por hora. Simples grão de poeira cósmica, penetrou no solo sem deixar vestígio, atravessou o planeta e continuou sua viagem sem rumo e sem fim pelo universo. Segundo os físicos americanos, não foi o impacto com o solo que cau sou o cataclismo e sim a deflagração de ondas de choque decorrentes do aquecimento súbito da atmosfera no ponto em que surgiu a coluna ígnea gerada pelo deslocamento do corpúsculo.

Teoria ousada, sem dúvida, mas não destituída de fundamento Para apoiá-la, os dois cientistas estudaram os depoimentos de testemunhas da época: Velhos moradores de Tunguska recordararn-se de que naquela manhã tiveram sua atenção despertada põr uma sucessão de explosões vindas do céu. Olhando para cima, viram uma longa e fina coluna de fogo azulado riscando o firmamento de alto a baixo, ao mesmo tempo que um trovão intermitente e profundo parecia abalar o próprio mundo. Até que a faixa incandescente atingiu a Terra em algum ponto além do horizonte, deixando atrás de si a terra queimada e arrasada.

Ao lado dessas teorias , todas plausíveis embora discutíveis; há os que veem naquele fenômeno nada mais do que uma explosão nuelear; de potência ignorada, na época como agora. Acontece que a primeira bomba atômica construída pelo Homem explodiu à 16 de julho de I945, ou seja, 37 anos depois e, ainda assim, a energia liberada pelo artefato deflagrado em Alamogordo, nos Estados Unidos, equivalia a 20 mil toneladas de dinamite, bem inferior à explosão ocorrida em Tunguska.

A conclusão é inevitável: se o fenômeno observado naquela regïão siberiana foi o resultado de uma deflagração nuclear, tem-se necessariamente de admitir que esta terá sido provocada por uma inteligência extraterrestre. Mas por quem e por quê? Duas hipóteses procuram explicar o que teria ocorrido. Uma delas, apresentada pelo professor Liapunov, da União Soviética, diz que um aparelho vindo de outro planeta, impulsionado a energia nuclear, teria sofrido uma pane, se desgovernado e precipitado a uma velocidade
vertiginosa, provocando a incandescência da nave pelo atrito com a atmosfera . Não se encontrou nenhum vestígio na área por que o combustível atômico se desintegrou ao explodir ao choque contra o solo, volatilizando aparelho e tripulantes.

A segunda hipótese , recebida com reservas mesmo pelos que defendem a existência de seres extra-terrenos inteligentes, afirma que o estranho objeto que explodiu na Terra foi um míssil disparado de outro planeta, acidental ou propositadamente.

Bomba atômica fabricada na Terra, aparelho acidentado ou míssil extraterrestres , a hipótese de explosão nuclear ganhou certo peso depois que pesquisas realizadas por cientistas norte-americanos , em meados da década passada, revelaram que , após a explosão de 1908 , houve um aumento elevado de radioatividade na atmosfera, conforme análises feitas em amostras vegetais da época. Mas nem isso leva a uma conclusão definitiva.

E a duvida permanece: cometa , meteoro , partícula de anti-matéria, “buraco negro”, disco voador , ou o quê?

Por enquanto, só uma certeza : alguma coisa explodiu na Terra naquela manhã de 1908 e até hoje ninguém sabe o o que foi.


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