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Religiões como Memeplexos

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Goste ou não, nós estamos rodeados por religiões. As ‘Grandes Fés’ do mundo têm durado milhares de anos e afetam nossos calendários e feriados, nossa educação e criação, nossas crenças e nossa moralidade. Por todo o mundo as pessoas gastam enormes quantidades de tempo e dinheiro cultuando seus deuses e construindo gloriosos monumentos para fazer isso. Nós não podemos nos livrar das religiões, mas usando a memética nós podemos entender por que e como elas têm tal poder.

Todas as grandes religiões do mundo começaram como cultos de pequena escala, normalmente com um líder carismático, e através dos anos poucas delas se espalharam para ter bilhões de pessoas por todo o planeta. Imagine apenas quantos pequenos cultos devem ter existido na história do mundo. A questão é por que esses poucos sobreviveram para se tornar as grandes fés, enquanto a vasta maioria simplesmente morreu com a morte de seu líder ou a dispersão de seus poucos partidários?

Dawkins foi o primeiro a dar respostas meméticas (Dawkins 1986, 1993, 1996), embora suas idéias sobre religião tenham sido freqüentemente criticadas (Bowker 1995; Gatherer 1998). Ele toma o Catolicismo Romano como um exemplo. Os memes do Catolicismo incluem a idéia de um Deus onipotente e onisciente, a crença que Jesus Cristo foi o filho de Deus, nascido da virgem Maria, levantou-se da morte após sua crucificação e agora (e para sempre) é capaz de ouvir nossas preces. Além disso, os Católicos acreditam que seus padres podem absolvê-los de seus pecados após confissão, o Papa literalmente fala a palavra de Deus, e quando os padres administram a missa, o pão e o vinho literalmente mudam para a carne e sangue de Cristo.

Para qualquer um não infectado com qualquer meme Cristão essas idéias devem parecer bizarras ao extremo. Como pode um Deus invisível ser ambos onipotente e onisciente? Porque eu deveria acreditar em uma estória de dois mil anos que uma virgem deu a luz? O que poderia significar dizer que o vinho ‘literalmente’ se torna o sangue de Cristo? Como alguém pode ter morrido por nossos pecados quando ainda não tínhamos nem nascido? Como ele pode se levantar da morte, e onde está ele agora? Como uma prece, dita silenciosamente para você mesmo, realmente funciona?

Existem muitas afirmações da eficácia da prece na cura do doente, e até uma pequena evidência experimental (Benor 1994; Dossey 1993), mas poucos dos experimentos foram controlados adequadamente para efeitos placebo, expectativas, e recuperação espontânea, e alguns mostraram que as pessoas com a maior fé religiosa eram as menos prováveis de se recuperar de doenças agudas (King et al. 1994). Contra as afirmações de milhares de anos de pessoas rezando pela saúde de suas famílias reais ou as cabeças do estado sem nenhum efeito aparente, e a falta de habilidade dos curandeiros religiosos dos dias modernos fazer qualquer diferença nos hospitais. Então existem essas incontáveis guerras na qual ambos os lados rotineiramente rezam para Deus ajudar o seu lado e o mesmo faz o inimigo. Mesmo assim milhões de pessoas por todo o mundo se professam como Católicos e rezam para Jesus, sua mãe Maria, e Deus o Pai. Elas gastam enormes quantidades de seus valiosos tempo e dinheiro suportando e disseminando a fé para outros, e a Igreja Católica está entre as mais ricas instituições no mundo. Dawkins (1993) explica como os memes religiosos, mesmo se eles não são verdadeiros, podem ser bem sucedidos.

O Deus Católico está observando a todas as horas e irá punir as pessoas que desobedecerem Seus mandamentos com as mais terríveis punições – queimando para sempre no inferno, por exemplo. Essas ameaças não podem ser facilmente testadas porque Deus e o inferno são invisíveis, e o medo é inoculado desde o começo da infância. Um amigo meu me mostrou um livro que ele estimava quando criança. Ele tinha pinturas de um garotinho bom e um garotinho mau. Você poderia abrir as abas das folhas e dentro do garoto bom encontrar um coração branco e brilhante, enquanto que o garoto mau tinha um ponto preto para cada pecado que ele tinha cometido. Imagine o poder dessa imagem quando você não pode ver dentro do seu próprio corpo e deve apenas imaginar os pequenos pontos pretos se amontoando e se amontoando – quando você fala na aula ou cola numa prova, quando você toma o brinquedo da sua irmã ou rouba um biscoito de chocolate, quando você pensa um pensamento mau, ou duvida da verdade e bondade de Deus … cada um, um ponto preto.

Tendo despertado esse medo, o Catolicismo o reduz novamente. Se você se virar para Cristo você será perdoado. Se você honestamente se arrepender de seus pecados, criar seus filhos como Católicos, e ir regularmente à missa, então, mesmo sendo você indigno e pecador, Deus irá perdoá-lo. O amor de Deus está sempre disponível mas a um preço, e freqüentemente se faz completa vista grossa a esse preço porque ele é pago com muito bom grado. É o preço de investir enormes quantidades de tempo, energia e dinheiro na sua religião – em outras palavras, trabalhar para os memes. Como Dawkins apontou, os Católicos trabalham duro para disseminar o seu Catolicismo.

Eu previamente descrevi muitos truques dos memes que os memeplexos da Nova Era usam. Todos eles podem ser encontrados nas religiões também. Primeiro, como os memes das abduções alienígenas e das experiências próximas da morte, as religiões servem à uma função real. Elas fornecem respostas para todos os tipos de perguntas antigas humanas tal como: De onde nós viemos? Por que nós estamos aqui? Para onde vamos quando morremos? Por que o mundo está cheio de sofrimento? As respostas religiosas podem ser falsas, mas pelo menos elas são respostas. O compromisso religioso pode dar às pessoas uma sensação de pertencer, e foi mostrado que melhora a integração social na idade adulta (Johnson 1995). As religiões podem também incorporar regras úteis para viver, tal como as leis de dieta do Judaísmo ou as regras sobre limpeza e higiene que podem ter uma vez protegido as pessoas de doenças. Essas funções úteis ajudam a carregar outros memes ao longo.

O truque da verdade é liberadamente usado. Em muitas religiões, Deus e Verdade são virtualmente sinônimos. Rejeitar a fé significa se afastar da Verdade; converter outros significa dar à eles o presente da fé verdadeira. Isso parece esquisito quando tantas afirmações religiosas são claramente falsas, mas existem muitas razões de por quê isso funciona. Por exemplo, pessoas que têm uma profunda experiência em um contexto religioso são inclinadas à tomar os memes dessa religião; pessoas que gostam ou admiram alguém podem acreditar nas suas afirmações de verdade sem questionar. No extremo, as pessoas irão até contar mentiras por Deus e influenciam-se para convencer a si mesmas e à outros que elas o fazem em nome da verdade – tal quando os ‘Cientistas Criacionistas’ proclamam ‘A Verdade’ que a terra tem apenas seis mil anos, e apoiam com negações ao registro fóssil, ou afirmações de que a velocidade da luz diminuiu desde a criação e dá a ilusão de um universo vasto e de um planeta antigo (Plimer 1994).

A beleza inspira os fiéis e os trás para mais perto de Deus. Algumas das mais belas edificações no mundo foram construídas em nome de Buda, Jesus Cristo, ou Muhamed. E então existem belas estátuas e histórias sedutoras no Hinduísmo; vitrais, pinturas inspiradoras, e manuscritos ilustrados; música exaltante cantada por tremulosos garotos de coral e vastos corais, ou tocada em órgãos grandes. Emoções profundas são inspiradas ao ponto de êxtase religioso que então implora por – e recebe – uma explicação. O êxtase é real o suficiente, mas do ponto de vista dos memes, a beleza é outro truque para ajudá-los a se reproduzir.

O truque do altruísmo permeia os ensinamentos religiosos. Muitos crentes são pessoas realmente boas. Em nome de sua fé elas ajudam seus vizinhos, dão dinheiro aos pobres, e tentam viver vidas honestas e morais. Se elas são bem sucedidas então geralmente as pessoas gostam e admiram elas e então são mais inclinadas à imitá-las. Dessa maneira não apenas o comportamento bom e honesto se difunde, mas os memes religiosos que estão ligados a esse comportamento se difundem também. Ao lado disso vêm meramente o semblante do comportamento bom. A hipocrisia pode florescer quando a bondade é definida não apenas como um comportamento gentil e altruísta, mas como aderir às regras e obrigações da fé. Muito do dinheiro doado às igrejas, templos, ou sinagogas não é usado para os pobres ou necessitados, mas para perpetuar os memes das religiões erguendo belas edificações ou pagando ao clero. Atividades que disseminam os memes são também definidas como ‘boas’ mesmo que no entanto seus benefícios sejam questionáveis, tal como dizer preces em horas específicas, dizer graças à cada refeição, e manter um dia da semana como um dia de adoração. Nessa maneira grandes pedaços do tempo de cada crente são devotados de boa vontade para manter e disseminar a fé.

Muitas pessoas pensam em Madre Teresa como uma santa. De fato, ela pode logo ser oficialmente santificada pela Igreja Católica. Ela é a idéia de verdadeira heroína caridosa e altruísta de muitas pessoas. Mas o que ela realmente faz? Alguns dos habitantes de Calcutá a acusam de divergir a atenção de necessidades reais dos pobres da cidade, de dar a Calcutá um nome ruim e de ajudar apenas aqueles que estavam preparados a tomar os ensinamentos Católicos. Certamente, ela foi ferozmente contra o aborto e contra o controle de natalidade. Muitas das pessoas que ela ajudou eram jovens mulheres sem acesso a anticoncepcionais, pouca habilidade para evitarem ser estupradas, e praticamente nenhum acesso à cuidados de saúde se elas ficassem grávidas. Mesmo assim ela firmemente manteve sua oposição Católica à coisa que mais teria ajudado elas sobre suas próprias vidas reprodutivas. O que quer que seja que nós pensemos sobre quão ela realmente ajudou as pessoas famintas de Calcutá não há dúvida que o comportamento dela efetivamente disseminou os memes Católicos ao usar o truque do altruísmo.

Até mesmo a maldade e a crueldade podem ser redefinidas como coisas boas. O Corão declara que é bom dar cem chicotadas em uma adúltera e não ter pena dela. Você pode pensar que uma mulher Muçulmana pode evitar isso ao não cometer o adultério, mas Warraq (1995) explica em detalhes desagradáveis como a vida pode ser em países que aderem estritamente às leis Islâmicas. As mulheres podem não ter poder algum para resistir à abusos sexuais, e mais tarde devem tomar a punição enquanto o homem que abusou delas sai livre. Já que as mulheres são objetos de repugnância, um homem supostamente não deve tocar uma mulher sobre a qual ele não têm direitos. As mulheres são rotineiramente trancadas e, se lhes for permitido, devem andar atrás do homem e estar apropriadamente cobertas – o que em muitos países significa ser coberta da cabeça aos pés em uma sufocante peça de roupa com apenas uma pequena grade para olhar para fora. Obedecer tais regras ao pé da letra faz um Muçulmano ‘bom’, apesar da miséria que elas criam.

Retornando aos usos mais honestos da bondade e do altruísmo, a teoria das ‘normas beneficentes’ de Allison (1992) se aplica especialmente bem às religiões. Uma de suas regras gerais é ‘Seja bom ao seus familiares culturais próximos’; o equivalente memético à seleção por parentesco. Mas como você sabe quem eles são? Essa regra rastreia o parentesco biológico em culturas com transmissão predominantemente vertical, já que nessas culturas você adquire a maioria dos seus memes dos seus familiares biológicos, mas com a transmissão horizontal outras maneiras de reconhecimento são necessárias. Uma é ‘Seja bom com aqueles que agem como você’. Funciona assim. Se você ver alguém que age da mesma forma que você, é provável que vocês dois tenham ancestrais culturais em comum. Se você agora ajudá-lo você torna mais provável que ele seja bem sucedido, e então que ele passará os memes dele, incluindo a regra ‘Seja bom com aqueles que agem como você’. Allison chama isso de um ‘esquema marcador’. Ele dá exemplos de usar um turbante ou abster-se de certas comidas, mas nós podemos acrescentar o ato de suportar o Manchester United ou escutar hip-hop, como também ajoelhar-se ou usar um pequeno retrato do seu guru em volta do seu pescoço. Ele acrescenta que os marcadores que são caros ou difíceis de aprender podem impedir a exploração pelos forasteiros. Linguagens à parte, um bom exemplo são os rituais religiosos. Muitos deles requerem anos para aprender e outros, tais como rituais de circuncisão, são certamente caros para um adulto.

O resultado desse tipo de altruísmo é que as pessoas são gentis e generosas com os de dentro do grupo e não com os forasteiros. Isso estimula o bem-estar dos membros do grupo e portanto os torna mais prováveis de serem imitados, e então passar adiante a fé. Isso é exatamente o que nós vemos em muitas das grandes religiões do mundo. Embora a instrução ‘ame a teu vizinho como a tu mesmo’ seja geralmente tomada significando ‘ame a todos’, no contexto tribal na qual ela foi primeiramente escrita ela deve ter significado isso mais literalmente – em outras palavras sua própria tribo, e sua própria família, mas não todo mundo (Hartung 1995). Mesmo a repreensão não matar pode originalmente ser aplicada apenas aos de dentro do grupo. Hartung aponta que os rabinos do Talmud costumavam sustentar uma culpa Israelita de assassinato se ele intencionalmente matasse outro Israelita, mas matar outra pessoa não contava.

Algumas religiões positivamente encorajam o assassinato e a guerra contra pessoas de outras fés. O Islã têm os fatwas e os jihads para justificar a morte dos descrentes, e especialmente aqueles que machucam ou renunciam a fé. Em fevereiro de 1989, o Ayatollah Khomeini proferiu seu famoso fatwa no autor Salman Rushdie. Isso é um pedido direto para todos os Muçulmanos assassinarem Rushdie por ousar blasfemar contra o sagrado Corão em seu livro Versos Satânicos. Quando a Punição por renunciar ou criticar uma religião é tão severa, os memes estão muito habilmente protegidos.

Hindus, Muçulmanos, e Cristãos igualmente foram à guerra repetidas vezes em nome de Deus. Quando uma centena de Espanhóis assassinaram milhares de Incas, levando à destruição de uma civilização inteira, eles o fizeram pela glória de Deus e a sagrada Fé Católica. Em uma maneira mais sutil os missionários religiosos ainda estão destruindo culturas antigas até mesmo hoje. Pessoas foram torturadas, queimadas vivas, e fuziladas porque elas acreditaram na coisa errada. As religiões ensinam que Deus quer que você dissemine sua compreensão da Verdade para todo o mundo e é portanto bom aleijar, estuprar, pilhar, roubar, e assassinar.

Nós vimos como a teoria da conspiração protege os memes dos OVNIs; mecanismos similares protegem os memes religiosos. Como Dawkins (1993) apontou, Católicos bons têm fé; eles não precisam de provas. De fato, isso é uma medida de quão espiritual e religioso você é que você tem fé suficiente para acreditar em coisas completamente impossíveis sem fazer perguntas, tal como que o vinho é realmente transformado em sangue. Essa afirmação não pode ser testada porque o líquido no copo ainda tem gosto, parece e tem cheiro de vinho – você deve apenas ter fé que ele é realmente o sangue de Cristo. Se você for tentado a duvidar, você deve resistir. Deus não é apenas invisível mas ele ‘se move de maneiras misteriosas’. O mistério é parte do pacote inteiro e é para ser admirado na sua própria forma. Essa intestabilidade protege os memes da rejeição.

Os memes religiosos são armazenados, e então recebem uma longevidade aperfeiçoada, nos grandes textos religiosos. O teólogo Hugh Pyper (1998) descreve a Bíblia como um dos textos mais bem sucedidos já produzido. ‘Se “a sobrevivência do mais adaptado” tem alguma validade como um slogan, então a Bíblia parece um candidato justo para a premiação de o mais adaptado dos textos’ (p. 70). Ela foi traduzida para mais de duzentos idiomas, existem em muitas versões diferentes dentro desses idiomas, e até em países como o Japão, onde apenas um ou dois porcento da população é Cristã, mais de um quarto de todas as famílias possuem uma cópia. Pyper argumenta que a cultura Ocidental é a maneira da Bíblia fazer mais Bíblias. E por que ela é tão bem sucedida? Porque ela altera o seu ambiente de um modo que aumenta as chances dela ser copiada. Ela faz assim, por exemplo, ao incluir em si mesma muitas instruções para passá-la adiante, e ao se descrever como indispensável para as pessoas que a lêem. Ela é extremamente adaptável, e já que muito do seu conteúdo é auto-contraditório ela pode ser usada para justificar mais ou menos qualquer ação ou posição moral.

Quando nós olhamos para as religiões do ponto de vista dos memes nós podemos compreender por que elas tem sido tão bem sucedidas. Esses memes religiosos não começaram com uma intenção de serem bem sucedidos. Eles eram apenas comportamentos, idéias e estórias que foram copiadas de uma pessoa para outra ao longo da história das tentativas humanas de compreender o mundo. Eles foram bem sucedidos porque eles por acaso se juntaram em gangues que se suportam mutuamente e que incluíram todos os truques certos para mantê-los guardados em segurança em milhões de cérebros, livros e edificações, e repetidamente passados adiante para mais. Eles evocaram emoções fortes e experiências estranhas. Eles proveram mitos para responder perguntas reais e os mitos foram protegidos por intestabilidade, ameaças, e promessas. Eles criaram e então reduziram o medo para criar submissão, e eles usaram os truques da beleza, verdade e altruísmo para ajudar a sua disseminação. Esse é o porquê deles ainda estarem conosco, e por quê o comportamento de milhões de pessoas é rotineiramente controlado por idéias que são ou falsas ou completamente intestáveis.

Ninguém projetou essas grandes fés com todos os seus truques engenhosos. Invés disso, elas evoluíram gradualmente pela seleção memética. Mas hoje em dia as pessoas deliberadamente usam truques meméticos para disseminar suas religiões e ganhar dinheiro. Suas técnicas de engenharia memética são derivadas de longa experiência e pesquisa, e são similares àquelas usadas em propaganda e marketing, com rádio, televisão e a Internet, seus memes podem disseminar mais adiante e mais rápido do que nunca. O estilo de tele-evangelismo de Billy Graham é um bom exemplo. Ele começa evocando o medo, lembrando às pessoas todas as terríveis coisas acontecendo no mundo e a impotência delas e sua mortalidade. Ele apresenta a ciência como não tendo respostas e como a causa das desgraças do mundo, e então persuade as pessoas à se render ao todo-poderoso Deus que é sua única esperança de salvação. A experiência de rendição gera emoções poderosas e as pessoas se viram à Deus em números imensos.

Outros evangélicos usam a cura para disseminar a Palavra. Nós temos visto quão perfeitamente processos psicológicos normais podem fazer as pessoas se sentirem melhor, mesmo quando elas não são realmente curadas, e esse incentivo poderoso para tomar os memes de Deus que freqüentemente acompanham a cura. A viagem à Lurdes é cara e difícil. As expectativas são altas. Curandeiros espirituais são gentis e plausíveis, e realmente parecem se importar sobre os seus problemas.

Alguns usam curas falsas. Nos anos 80, Peter Popoff e sua esposa Elizabeth trouxeram milhões de Americanos à Deus, e milhões de dólares para os Popoffs, através das suas missões curativas. Sua audiência imensa cantou e rezou, e observou pessoas seriamente doentes cambalearem no palco, gerando emoções poderosas enquanto os Popoffs apelaram por donativos. Enquanto Peter corretamente diagnosticava a doença e anunciava que os sofredores estavam curados, as pessoas se esqueceram que uma hora antes Elizabeth tinha perambulado através da platéia coletando cartões de prece na qual as pessoas escreveram seus nomes, endereços, doenças e outros fatos cruciais. Ela levou-os para o banco de dados do computador nos bastidores e irradiou a informação para um receptor atrás da orelha esquerda de Peter (Stein 1996).

Milagres de todos os tipos foram usados para converter os descrentes. Jesus andou na água e trouxe um homem morto de volta à vida, médiuns do século dezenove criaram formas espirituais feitas de ‘ectoplasma’, e os praticantes avançados de meditação transcendental afirmam poder levitar. Algumas pessoas efetivamente combinam poderes especiais com o truque do altruísmo, tal como a amada vovó médium Inglesa Doris Stokes que embrulhou sua platéia com clientes a quem ela já conhecia, e enganou milhões (I. Wilson 1987). Muitos de seus clientes foram esposas, maridos ou parentes de recente luto que ganharam conforto das mensagens de Stoke mas que poderiam ter estado mais a altura com suas dores se eles tivessem sido ajudados a aceitar a realidade da morte.

Eu não quero dar a entender, de tudo o que eu disse, que não existem idéias verdadeiras em lugar algum em qualquer religião. Os mecanismos meméticos que eu descrevi iriam permitir que religiões baseadas em falsidades e nada mais florescessem, mas podem haver idéias verdadeiras embutidas nelas também, assim como algumas terapias alternativas prosperam ao incluir alguns tratamentos que funcionam, as religiões podem incluir tanto idéias válidas quanto mitos enganosos.

No coração de muitas religiões estão as tradições místicas, como a encontrada na Nuvem de Desconhecimento do século quatorze ou os ensinamentos de Julian de Norwich no Cristianismo; os ensinamentos Sufi do Islã; ou as estórias de esclarecimento no Budismo. Essas tradições enfatizam a experiência espiritual direta que é freqüentemente indescritível e portanto difíceis de passar adiante. Em experiências místicas espontâneas as pessoas tipicamente sentem-se como se elas tivessem tido um vislumbre de como o mundo realmente é. Elas sentem que o eu e outro se tornaram um, o universo inteiro é como é, ou que tudo é unitário e luz. Essas podem ser idéias luminosas válidas (eu acredito que elas são), mas sozinhas elas não são muito bem sucedidas como memes, e rapidamente são ultrapassadas por todas as poderosas idéias religiosas que eu descrevi acima.

O Budismo proporciona um bom exemplo. Se as estórias são para serem acreditadas, o Buda sentou em baixo de uma árvore, com um desejo fervente de compreender, até que ele finalmente se tornou culto. Ele então ensinou o que ele viu, que tudo é vazio de auto-natureza, que a vida é insatisfatória, que o sofrimento vêm através do desejo ou da afeição, e que a suspensão do desejo leva à libertação do sofrimento. Ele estabeleceu um código ético de comportamento e ensinou seus discípulos para buscarem sua própria salvação com diligência, acalmando a mente e praticando a atenção à cada momento. Nada disso é muito confortante. Basicamente, significa que você está por si mesmo em um mundo fundamentalmente insatisfatório sem ninguém para lhe ajudar. Se você olhar para qualquer coisa para tentar fazê-lo melhor então você é pego desejando e portanto sofrendo. O esclarecimento não é algo para ser alcançado; ele é simplesmente a desistência – bem tudo realmente. Como um dos meus alunos põe ‘Eu não poderia suportar não querer chocolate. Eu não poderia nem mesmo imaginar não desejar chocolate, deixe pra lá não desejar nada.’ Então o que acontece com idéias difíceis como essa? Talvez surpreendentemente elas podem e sobrevivem, freqüentemente sendo passadas em uma corrente não quebrada de professores inspiradores e iluminados para pupilos empenhados. O Budismo Zen adere bem próximo aos ensinamentos mais simples e não inclui nenhuma divindade ou poderes escondidos; nenhum truque de altruísmo ou beleza. É dito para se encontrar a verdade para si mesmo e treinado para simplesmente sentar-se e observar a mente até se tornar claro. Essas idéias difíceis sobreviveram quase morrendo no Oriente e estão agora amplamente se disseminando no Ocidente (Batchelor 1994). Entretanto, outras formas de Budismo são muito mais populares pelo mundo, tal como o Budismo Tibetano, com suas numerosas divindades poderosas, belas edificações e pinturas, estórias de atos religiosos maravilhosos, recitais de sutras, cânticos, e liturgias. Quer existam ou não idéias verdadeiras no coração de qualquer religião, o fato é que memes espertos irão tender a vencê-las na batalha por replicação.

Podemos ver agora como e por que as religiões têm o poder e a persistência que têm. Eu quero agora considerar duas novas questões. Primeiro, eles planejaram alguma parte na coevolução meme-gene? E segundo, como as religiões estão mudando agora que os memes estão sendo disseminados pela tecnologia moderna?

A Coevolução das Religiões e Genes

A pergunta coevolucionária é esta. Os memes religiosos que prosperaram no passado tiveram qualquer efeito no qual os genes foram bem sucedidos? Se sim, este seria outro exemplo de condução memética. Eu devo especular aqui e torcer que algumas das perguntas que eu levanto possam ser respondidas com pesquisas futuras.

Nós sabemos pouco sobre as primeiras religiões. Existem evidências de enterro dos mortos nos Neandertais que viveram de 130.000 a 40.000 anos atrás, mas é provável que eles não tenham sido nossos ancestrais. Acerca de 50.000 anos atrás aconteceu o que é as vezes chamado de ‘Grande Salto Adiante’, caracterizado pelo progresso na construção de ferramentas, o princípio da arte, e a criação de joalharia que algumas vezes foi enterrada com os mortos. Nós podemos apenas conjeturar sobre as crenças religiosas mas os ritos de enterro pelo menos sugerem alguma idéia de um pós-vida. Sociedades modernas de caçadores-coletores possuem crenças religiosas variadas, incluindo adoração à ancestrais, poderes especiais atribuídos ao sacerdote ou shaman, e a crença em um pós-vida. Então nós podemos conjeturar que as primeiras religiões humanas eram algo assim.

Os primeiros humanos viveram em sociedades em bando ou tribais e apenas gradualmente fizeram sociedades com camadas mais complexas evoluíram. Em domínios de chefes ou estados existe divisão de trabalho suficiente para algumas pessoas serem completamente livres da produção de comida; esses são tipicamente soberanos de vários tipos, junto com soldados e sacerdotes. Diamond (1997) argumenta que a função das ideologias e religiões nos domínios de chefes é justificar a redistribuição de riquezas, a autoridade dos soberanos, e o combate. Os chefes tipicamente tomam imensas quantidades de riquezas das pessoas que trabalham e usam um pouco para construir grandes templos ou trabalhos públicos como sinais visíveis de seu poder. As pessoas podem aceitar que suas riquezas sejam tiradas delas, como elas aceitam a taxação nas sociedades modernas, se elas obtém benefícios em troca. Esses benefícios podem incluir a redução da violência dentro da sociedade, proteção de inimigos, ou instalações para uso público. Algumas vezes o soberano e o sacerdote são a mesma pessoa, mas em sociedades maiores sacerdotes separados ficam com as funções religiosas. Os sacerdotes promovem e policiam as crenças religiosas; as crenças são então usadas para justificar a conquista de outras pessoas de quem mais bens e poderes podem ser roubados.

Em termos meméticos o que isso significa é que os memes religiosos são mais prováveis de sobreviver e se replicar do que os memes competidores o são. Por exemplo, religiões que não requeriam padres, que não cobraram taxas, ou que não construíram prédios impressionantes, estariam em desvantagem. Isso quer dizer a proliferação de sociedades altamente organizadas e com camadas e de sacerdotes que ensinaram e mantiveram a religião. Memes religiosos têm portanto representado um papel importante no desenvolvimento das sociedades humanas.

A pergunta coevolucionária é onde eles tem afetado os genes ao longo do caminho. E. O. Wilson (1978) tratou as religiões como um desafio à sua nova ciência da sociobiologia e especulou sobre os meios com os quais as crenças religiosas poderiam proporcionar uma vantagem genética. Por exemplo, as religiões muitas vezes incluem proibições contra comer comidas potencialmente contaminadas, e contra o incesto e outras atividades sexuais de risco, e encorajam os crentes a terem famílias grandes e bem protegidas. Dessa e de outras maneiras as crenças religiosas iriam beneficiar os genes dos crentes e então supostamente continuariam. O psicólogo evolucionário Steven Pinker (1997) argumentou que as crenças religiosas são subprodutos dos módulos do cérebro que foram desenhados para fazer outras coisas; espíritos e deuses são baseados nos nossos conceitos de animais e pessoas; poderes sobrenaturais são inferidos de poderes naturais; a idéia de outros mundos é baseada em sonhos e transes. Como ele põe: ‘crenças religiosas são notáveis por sua falta de imaginação (Deus é um homem ciumento; o céu e o inferno são lugares; almas são pessoas que possuem asas que brotaram)’ (Pinker 1997, p. 557). Esses autores argumentam ou que as religiões proporcionam uma vantagem genética, ou que elas são um subproduto de coisas que uma vez proporcionaram uma vantagem genética. Eles não consideram a possibilidade de vantagem memética, nem de memes conduzindo genes.

Existem vários meios no qual os memes podem ter influenciado os genes. Sacerdotes conseguem poder e status ao predizer (ou parecer predizer) o clima, doenças, ou falhas na colheita; construindo ou sendo associados com templos e outras grandes edificações; vestindo roupas caras e impressionantes; e afirmando ter poderes sobrenaturais. Em muitas culturas os sacerdotes ou soberanos recebem status divino. Nós sabemos que as mulheres preferem se acasalar com homens com status alto, e que esses homens têm mais prole, ou tendo mais esposas ou tendo filhos com mulheres que não são suas esposas. Mesmo em sociedades na qual o sacerdócio é celibatário e não poderiam (ou pelo menos não deveriam) passar adiante seus genes, outras pessoas poderiam adquirir poder por associação. Se esse comportamento religioso ajudasse as pessoas à adquirir mais pares, então quaisquer genes que os inclinassem a ser mais religiosos em primeiro lugar irias também florescer. Dessa forma os genes para comportamento religioso iriam aumentar por causa dos memes religiosos.

A idéia de ‘genes para comportamento religioso’ não é tão implausível – tudo que ela significa é que fazem pessoas mais inclinadas para crenças e comportamentos religiosos. O desenvolvimento do cérebro está sob controle genético e é sabido que alguns cérebros são mais propensos à crenças e experiências religiosas do que outros. Por exemplo, pessoas com lóbulos temporais instáveis são mais suscetíveis a reportar experiências místicas, mediúnicas e religiosas, e acreditar em poderes sobrenaturais, do que aquelas com lóbulos temporais estáveis (Persinger 1983). Como muitas outras variáveis psicobiológicas, a religiosidade é conhecida por ter um componente herdável até mesmo hoje. Por exemplo, gêmeos idênticos são mais similares em religiosidade do que gêmeos não idênticos ou irmãos. No nosso passado deve ter havido tanta variação genética controlada no comportamento religioso do que há agora, ou até mais. Se for assim, dois efeitos são possíveis: Primeiro, o meio ambiente memético pode ter influenciado onde os genes para comportamento religioso foram positivamente selecionados ou não (aumentando ou diminuindo o comportamento religioso em geral). Segundo, a religião do tempo pode ter influenciado os tipos de genes que sobreviveram (i.e. aquelas que produziram o tipo de comportamento religioso melhor adaptado a essa religião). Isso seria condução memética em funcionamento.

Seleção de Grupo

Existe outro jeito no qual os memes religiosos podem concebivelmente conduzir os genes: através da seleção de grupo. Todo o conceito de seleção de grupo tem tido uma história problemática e tem sido assediado pela controvérsia. No começo desse século ele foi invocado para explicar todos os tipos de comportamentos que podem concebivelmente beneficiar grupos ou sociedades, e os biólogos freqüentemente apelaram para ‘adaptações de grupo’ ou ‘o bem da espécie’ sem nenhuma idéia de mecanismos possíveis. O clássico livro Adaptação e Seleção Natural (1966) de William apontou os erros: por exemplo, que indivíduos egoístas poderiam sempre se infiltrar em grupos altruístas e prosperar às custas deles. Além disso os grupos têm um ciclo de vida lento comparado com os indivíduos, e indivíduos podem freqüentemente se mover entre os grupos. Isso significa que as adaptações do indivíduo irão quase sempre predominar sobre as adaptações para o grupo. Portanto, nós não devemos olhar para a seleção de grupo como uma força que pode fazer indivíduos sacrificarem seus próprios interesses genéticos ‘para o bem do grupo’.

A maioria dos biólogos agora consideram que a seleção de grupo é apenas uma força fraca na natureza (Mark Ridley 1996). Entretanto, seleção ao nível do grupo pode ocorrer algumas vezes. A distinção de Dawkins entre o replicador e o veículo é útil aqui. Na maior parte da biologia o replicador (a coisa que é copiada) é o gene, enquanto o veículo é o organismo inteiro. Organismos inteiros; que são gatos, burros, orquídeas ou baratas individuais, vivem ou morrem, e no processo ou passam adiante seus genes ou não. Todos os genes nesse veículo compartilham o mesmo destino. Nesse (o mais comum) caso a seleção está tomando parte no nível do organismo.

Em alguns casos, entretanto, grupos inteiros de organismos vivem ou morrem, e então todos os genes no grupo são mortos de uma só vez. Se isso ocorre então o grupo é o veículo e nós podemos dizer que a seleção está acontecendo no nível do grupo. Isso se aplica, por exemplo, à espécies inteiras que se extinguem, ou à populações isoladas de animais, tais como esses em pequenas ilhas, na qual alguns grupos sobrevivem e outros não. Nesses casos não há conflito entre seleção de indivíduo e de grupo (como havia no argumento sobre comportamento altruísta) mas a seleção agiu no nível do grupo.

Ridley (1996) conclui que a seleção de grupo funciona apenas se a taxa de migração é implausivelmente baixa e a taxa de extinção do grupo implausivelmente alta. Outro jeito de expor isso é que a seleção de grupo é favorecida por mecanismos que reduzem as diferenças de adaptação biológica dentro dos grupos e aumenta as diferenças entre grupos, dessa maneira concentrando a seleção à nível de grupo (D. S. Wilson and Sober 1994).

Os memes podem prover apenas este tipo de mecanismo. De fato Boyd e Richerson (1990) usaram modelos matemáticos para mostrar que a seleção de grupo é particularmente provável de ocorrer quando a variação comportamental é adquirida culturalmente, e que isso pode até ocorrer com grupos grandes e taxas substanciais de migração. O ponto importante é que os memes podem ter precisamente o efeito de diminuir as diferenças dentro do grupo e aumentar as diferenças entre os grupos.

Vamos tomar os hábitos de dieta como um exemplo. Suponha que um grupo de pessoas coma crustáceos como uma parte maior de sua dieta e desenvolvam meios de cozinhar mexilhões e sururus e tirá-los de suas conchas, enquanto outro grupo de pessoas têm um tabu contra comer crustáceos. As pessoas dentro de cada grupo são mais parecidas umas com as outras, e diferentes das pessoas do outro grupo. A migração entre os grupos é dificultada por longos hábitos de gosto, e a dificuldade de aprender como preparar a comida. Em alguns ambientes o primeiro grupo pode se sair melhor porque eles recebem mais proteínas, enquanto em outros ambientes o segundo grupo pode se sair melhor porque eles sobrevivem a doenças letais da comida infectada. Quando a doença ataca ou a fome ameaça são os grupos inteiros que vivem ou morrem. Tabus de comida são uma parte importante de muitas religiões. Judeus ortodoxos não comem crustáceos ou porco e evitam misturar carne com leite. Muitos Budistas e Hindus são vegetarianos porque eles não querem matar animais. As crenças que suportaram esses tabus podem ter levado alguns grupos a sobreviver e outros a se extinguir; e ambos os seus genes e seus memes iriam ter ido com eles.

As religiões também ditam as práticas sexuais, promovem certos tipos de comportamento cooperativo, e regulam a agressão e a violência. Embora muitas pessoas acreditem que as tribos primitivas vivem uma existência encantadora e pacífica, esse mito (como muitos em antropologia) foram explodidos. O antropólogo Napoleon Chagnon (1992) viveu muitos anos com os Yanomami, que vivem na floresta tropical Brasileira caçando e cultivando comida em jardins temporários. Ele descreve uma vida violenta na qual a guerra entre as vilas é comum e os assassinatos são vingados com mais assassinatos. Estórias similares vem de muitas partes do mundo. Na Nova Guiné, um grupo de nômades chamado os Fayu vive em pequenos grupos familiares que apenas raramente conhecem outras famílias por causa dos assassinatos vingativos que se segue quando eles o fazem. Reuniões, por exemplo para trocar noivas, são repletas de perigo. Em muitas sociedades tribais o assassinato é a principal causa de morte (Diamond 1997). Embora muitas pessoas nas cidades modernas acreditem que elas encaram riscos sempre maiores de serem mortas elas estão de fato muito mais a salvo do que elas estariam em um bando ou uma sociedade tribal. A organização que vêm com o governo e a religião portanto diminui esses tipos de violência. Entretanto, ela também provê a justificativa para guerras de larga escala.

A história da guerra é em grande parte uma história de pessoas matando umas às outras por razões religiosas. As religiões são um bom exemplo de um mecanismo que diminui diferenças dentro do grupo, enquanto aumenta diferenças entre os grupos e taxas de extinção de grupo. Em muitas religiões a conformidade é encorajada, comportamentos proibidos são punidos, diferenças entre crentes e descrentes são exageradas, medo ou ódio de pessoas com outras crenças é nutrida, e a migração para uma religião diferente é dificultada ou impossível. Guerras entre grupos religiosos são comuns e em nossa história evolucionária muitos grupos viveram ou morreram por sua religião. Tudo isso torna mais provável que a seleção de grupo tenha ocorrido. Se houve diferenças genéticas entre os grupos que começaram, então a sobrevivência de alguns grupos e extinção de outros iria ter efeitos na piscina de genes. Nesse caso nós poderíamos dizer que os memes religiosos dirigiram os genes.

É provável ser mais interessante se, por exemplo, tiver havido alguma razão genética de por quê um grupo tomou uma religião enquanto um grupo diferente tomou uma religião diferente. Vamos imaginar dois grupos vizinhos de hominídeos antigos no qual, por acaso, um grupo teve mais uma tendência genética a querer enterrar seus mortos de forma elaborada. Isso não é tão difícil de atingir se você lembrar que o comportamento de cavar e enterrar está sob controle genético em muitas espécies, de minhocas e vespas a coelhos e cães. Essa propensão genética então encorajou essas pessoas a desenvolver uma religião baseada na adoração de ancestrais e um pós-vida – nós podemos chamá-las de os ‘Pós-viventes’. Enquanto isso, o outro grupo então desenvolveu uma religião baseada na adoração de espíritos da natureza – nós podemos chamá-los de os ‘Naturalistas’. Os Pós-viventes então desenvolveram um gosto pela guerra, acreditando que os espíritos de seus ancestrais iriam ajudá-los, e que eles iriam individualmente ir para o paraíso se eles matassem um inimigo, ao passo que os Naturalistas apenas seguiram com seus próprios interesses. Em conseqüência, os Pós-viventes ganharam mais as guerras contra os Naturalistas; seus memes disseminaram – e também os seus genes. Genes para o comportamento ritual de enterrar original foram selecionados pela seleção de grupo conduzida pelos memes.

Eu não estou sugerindo que essa precisa série de eventos realmente aconteceu, mas que esse mecanismo geral pode ter moldado a natureza humana e nos dado nossas tendências religiosas. O princípio é geral e pode teoricamente se aplicar a todos os tipos de predisposições genéticas, tal como a conformidade, ter experiências religiosas, gostar de ritual e culto, ou acreditar em vida após a morte. Esse processo pode até ter agido em favor de genes que iriam de outra forma ser prejudiciais para a adaptação, ou exterminar os genes que iriam de outra forma ser aumentadores de adaptação. Então alguns aspectos da natureza humana podem ter sido determinados não para o bem dos genes mas para o bem dos memes. Nossas crenças podem ter moldado a forma que a seleção genética ocorreu. Se isso ocorreu significa que os seres humanos podem agora ser criaturas naturalmente religiosas por causa da nossa longa história memética.

As religiões tiveram um enorme poder por milênios, mas os tempos estão mudando e as religiões com eles. Uma mudança óbvia é que a transmissão vertical está dando espaço para a transmissão horizontal mais rápida. Conforme as pessoas estão cada vez mais expostas à novas idéias na televisão, rádio, jornais e na Internet, elas começam a fazer comparações e fazer perguntas difíceis. Tristemente, então, não é de se surpreender que o movimento Islâmico Taliban do Afeganistão proibiu televisões e rádios, e começou a destruir qualquer um que eles encontrassem, e punir seus donos. Enquanto isso, em países com comunicações crescentes, alguns dos truques que as religiões antigas usam podem não funcionar mais tão bem. Quando as pessoas podem ver filmes, ir à galerias de arte, e escutar qualquer música que gostem, o truque da beleza é menos efetivo. Quando nós somos sujeitos na televisão aos horríveis resultados das guerras religiosas, o truque do altruísmo se desgasta. Quando líderes Cristãos argumentam sobre onde a homossexualidade realmente é um pecado, o truque da verdade começa a enfraquecer seu punho.

No passado, as religiões que promoveram grandes famílias foram bem sucedidas porque elas criaram mais pessoas para adotar a fé de seus pais. Lynch (1996) deu muitos exemplos de religiões, do antigo Islã ao relativamente novo e crescente Mormonismo, que se disseminam ao aumentar o número de sua prole, mas ele não diferencia claramente os efeitos da transmissão vertical e horizontal. Com a moderna transmissão horizontal as pessoas estão menos ligadas às crenças de seus pais; conforme os memes se disseminam cada vez mais rápido a taxa de natalidade se torna cada vez menos significante. Nós devemos portanto esperar religiões proselíticas se darem melhor em sociedades tecnologicamente avançadas. Nós podemos esperar que novas religiões desse tipo, e também que fés antigas que podem adaptar seus memes aos tempos que mudam possam sobreviver enquanto outras irão se extinguir.

Eu duvido que os seres humanos fiquem completamente livres da religião. Se os argumentos acima são certos então as religiões têm duas forças fortes indo com elas. Primeiro, as mentes e os cérebros humanos foram moldados para serem especialmente receptivos às idéias religiosas, e segundo, os memes religiosos podem usar todos os melhores truques meméticos nesse livro para certificar sua própria sobrevivência e reprodução. Isso pode explicar a persistência da religião em sociedades cientificamente cultas e em sociedades no qual o dogma político tentou apagar todos os comportamentos religiosos – e falhou. Talvez nossas mentes e cérebros foram moldados para ser naturalmente religiosos e é realmente difícil usar a lógica e a evidência científica para mudar o modo como pensamos – difícil, mas não impossível.

 

Ciência e Religião

Eu dei a entender que a ciência é, de certo modo, superior à religião, e eu quero defender essa visão. A ciência, como a religião, é uma massa de memeplexos. Existem teorias e hipóteses, metodologias e paradigmas experimentais, tradições intelectuais e dicotomias falsas de muito tempo. A ciência é cheia de idéias que são invenções humanas, têm convenções arbitrárias e peculiaridades históricas incorporadas à ela. A ciência não é ‘A Verdade Final’ mais do que qualquer outro memeplexo. Porém, a memética pode prover um contexto no qual se vê por que a ciência oferece um tipo melhor de verdade do que a religião.

Nós somos desenhados pela seleção natural para sermos criaturas que procuram a verdade. Nossos sistemas percepção evoluíram para construir modelos adequados do mundo e predizer precisamente o que irá acontecer depois. Nossos cérebros são desenhados para resolver problemas efetivamente e para tomar decisões sensatas. É claro, nossa percepção é parcial e nossa tomada-de-decisão é menos do que brilhante – mas é bem melhor do que nada. Se nós não tivéssemos memes, seria assim; nós teríamos a melhor compreensão do mundo que poderia ser adquirida nas circunstâncias. Mas nós temos memes, e com os memes vêm não somente novas maneiras de controlar e predizer o mundo, mas truques meméticos e memes livres-de-peso, memes enganosos e memes falsos.

A ciência é fundamentalmente um processo; um conjunto de métodos para tentar distinguir memes verdadeiros de falsos. No seu coração encontra-se a idéia de construir teorias sobre o mundo e testá-las, muito parecido como fazem os sistemas de percepção. A ciência não é perfeita. Os cientistas ocasionalmente trapaceiam para ganhar poder ou influência, e seus resultados falsos podem sobreviver por décadas, desviando as marcas de futuros cientistas. Teorias falsas prosperam dentro da ciência tal como dentro da religião, e por muitas das mesmas razões. Idéias confortantes são mais prováveis de durar do que as assustadoras; idéias que exaltam seres humanos são mais populares dos que as que não o fazem. A teoria evolucionária encarou uma oposição enorme porque ela proveu uma visão de humanos que muitos humanos não gostam. O mesmo irá provavelmente ser verdade sobre a memética.

Entretanto, no coração da ciência encontra-se o método de demandar testes para qualquer idéia. Os cientistas devem predizer o que irá acontecer se uma teoria particular é válida e então descobrir se ela o é. Isso é precisamente o que eu tentei fazer com a teoria da memética.

Isso não é o que as religiões fazem. As religiões constróem teorias sobre o mundo e então previnem elas de serem testadas. As religiões provêem idéias simpáticas, apelativas e confortantes, e encapam elas em uma máscara de ‘verdade, beleza, e bondade’. As teorias podem então prosperar apesar de serem falsas, feias, ou cruéis.

No final, não existe verdade suprema a ser encontrada e trancada para sempre, mas existem teorias mais ou menos honestas e predições melhores e piores. Eu defendo a idéia que a ciência, no seu âmago, é mais honesta do que a religião.

Susan Blackmore, The Meme Machine


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