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Normalmente, a pessoa desce, passo a passo, a estados mais baixos (mais constritos) da consciência. Cada passo abaixo pode ser precedido de um desmaio desconsciente. Ocasionalmente a descida pode ser súbita, e a pessoa achará a si mesma sacudida de volta a uma visão da realidade que, por contraste das fases precedentes, parece enfadonha, estática, dura, angular, feia e com jeito de marionete. Tais mudanças podem induzir medo e ela pode lutar desesperadamente para retornar à realidade familiar. Ela pode ficar presa a perspectivas irracionais ou mesmo bestiais que então dominam toda a sua consciência. Esses elementos primitivos e tacanhos originam-se de aspectos da sua própria história pessoal que são normalmente reprimidos. A consciência mais esclarecida dos dois primeiros Bardos e os elementos civilizados da vida desperta são postos de lado em favor de poderosos impulsos, obsessivos e primitivos, que são de fato apenas partes instintivas apagadas da personalidade total do viajante. A sugestionabilidade da consciência do Bardo faz com que elas pareçam todo-poderosas e insuportáveis.
Por outro lado, o viajante também pode sentir que possui poderes sobrenormais de percepção e movimento, que pode executar milagres, façanhas extraordinárias de controle corporal etc. O livro tibetano definitivamente atribui faculdades paranormais à consciência do viajante do bardo e as explica como sendo devidas ao fato de a consciência do Bardo abranger elementos futuros assim como passados. Daí a clarividência, telepatia, PES etc. São ditas possíveis. Evidências objetivas não indicam se essa sensação de perceptividade aumentada é real ou ilusória. Portanto, deixamos esta questão em aberto, para ser decidida por evidências empíricas.
Este é o primeiro ponto de reconhecimento do Terceiro bardo. A sensação de percepção e desempenho sobrenormais. Assumindo que isso seja válido, o manual adverte o viajante a não ficar fascinado por seus poderes, e a não exercê-los. Na prática iogue, os mais avançados dos lamas ensinam os discípulos a não buscar poderes psíquicos desta natureza por interesse próprio; pois até que o discípulo seja moralmente capaz de usá-los sabiamente, eles se tornam um impedimento sério ao seu mais alto desenvolvimento espiritual. E até que a natureza egoísta do homem, envolta em jogos, esteja completamente dominada, não é seguro usá-los.
Um segundo sinal da existência do Terceiro bardo são experiências de pânico, tortura e perseguição. Elas distinguem-se das visões coléricas do Segundo bardo no que parecem definitivamente envolver o próprio “ego enclausurado por pela” da pessoa. Pode-se ter alucinações de vultos manipuladores, controladores da mente e demônios de aspecto horrível. A forma que tomam esses demônios torturadores dependerá do background cultural da pessoa. Onde os tibetanos vêem demônios e bestas de grandes presas, um ocidental pode ver maquinário impessoal de trituração, ou aparelhos de despersonalização e controle de diferentes variedades futurísticas. Visões da destruição do mundo, morte ao modo da ficção espacial, e alucinações de ser-se engolfado por poderes destrutivos também virão; e sons do aparato de controle da mente, da “maquina de neblina da debulhadora”[18], dos equipamentos que movem o cenário do show de marionetes, de raivosos mares transbordantes, e de fogo crepitante e ventos ferozes soprando, e de gargalhada jocosa.
Quando esses sons e visões vierem, o primeiro impulso será fugir de medo deles, não importando para onde se vá, desde que vá-se embora. Em experiências de drogas psicodélicas, a pessoa pode nesse momento implorar ou exigir ser trazida “de volta disso” por meio de antídotos e tranqüilizantes. A pessoa pode ver-se prestes a cair em profundos e assustadores precipícios. Eles simbolizam as assim chamadas paixões más que, com drogas narcóticas, escravizam e obrigam a humanidade à existência em redes-de-jogos (sangsara): raiva, luxúria, estupidez, orgulho ou egoísmo, ciúme e poder controlador. Tais experiências, do mesmo modo que as anteriores de poder aumentado, devem ser consideradas fatores de reconhecimento do Terceiro Bardo. Não se pode nem fugir da dor nem perseguir o prazer. Reconhecimento é tudo o que é necessário – e o reconhecimento depende da preparação.
Um terceiro sinal é um tipo de vagar irrequieto e infeliz que pode ser puramente mental ou envolver movimento físico. A pessoa sente-se como que levada por ventos (ventos do carma) ou manobrada mecanicamente. Podem haver breves pausas em certos lugares ou cenários no mundo humano “ordinário”. Como uma pessoa viajando sozinha à noite numa rodovia, tendo sua atenção atraídas por pontos de referência proeminentes, grandes árvores isoladas, casas, postes, templos, barraquinhas de cachorro quente etc., a pessoa no período de reentrada tem experiências similares. Ela pode exigir retornar aos redutos familiares no mundo humano. Mas cada evento exterior é temporário e logo o vagar irrequieto recomeçará. Pode vir um desejo desesperado de telefonar ou contatar de alguma forma a família, o seu médico, os amigos e apelar-lhes que lhe tirem desse estado. Deve-se resistir ao desejo. O guia e os colegas viajantes podem ser a melhor assistência. Não deve-se tentar envolver os outros no seu mundo alucinatório. A tentativa falhará de qualquer modo, uma vez que quem está de fora é geralmente incapaz de entender o que está acontecendo. Novamente, simplesmente reconhecer esses desejos como manifestações do Terceiro Bardo já é o primeiro passo rumo à libertação.
Uma quarta experiência, mais comum, é a seguinte: a pessoa pode sentir-se estúpida e cheia de pensamentos incoerentes, uma vez que todos os demais parecem ser perfeitamente cúmplices e sábios. Isto leva a sentimentos de culpa e inadequação e na forma extrema à Visão do Julgamento, descrita a seguir. Esse sentimento de estupidez é meramente o resultado natural da perspectiva limitada sob a qual a consciência está operando neste Bardo. Aceitação calma e relaxada fará com que o viajante seja capaz de libertar-se neste ponto.
Uma outra experiência, o quinto fator de reconhecimento, que é especialmente impressionante quando ocorre subitamente, é a sensação de estar morto(a), apartado(a) da vida ao redor, e cheio(a) de tristeza. A pessoa pode acordar com uma sacudidela de algum desmaio estuporante e experienciar a si mesma e aos outros como robôs sem vida, fazendo gestos amadeirados sem sentido. Ela pode sentir que nunca voltará e lamentará por seu estado miserável.
Novamente, tais fantasias devem ser reconhecidas como a tentativa do ego de recuperar o controle. No estado verdadeiro de ego-morte, como ocorre no Primeiro ou Segundo Bardos, tais queixas não são feitas jamais.
Sexto, pode-se ter a sensação de estar-se oprimido(a) ou esmagado(a) ou espremido(a) em rachaduras e fendas entre rochas e pedregulhos. Ou a pessoa pode sentir que um tipo de rede metálica ou de gaiola podem prendê-la. Isto simboliza a tentativa prematura de entrar num ego-robô que é inadequado ou não-equipado para interagir com a consciência expandida. Portanto, deve-se relaxar o desejo apavorado de recuperar um ego.
Um sétimo aspecto é um tipo de luz cinza com jeito de crepúsculo banhando tudo, que está em contraste com as luzes e cores brilhantemente radiantes dos estágios anteriores da viagem. Os objetos, ao invés de brilhar, luzindo e vibrando, são agora sombriamente coloridos, surrados e angulares.
As passagens è TERCEIRO BARDO: INSTRUÇÕES PRELIMINARES contêm instruções gerais para o estado do Terceiro Bardo e seus fatores reconhecíveis. Qualquer ma ou todas as passagens podem ser lidas quando o guia sentir que o viajante estiver começando a voltar ao ego.
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