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Passados os festejos do Samhain, é uma boa hora para fazer uma avaliação daquilo que se atribui as típicas praticantes de bruxaria. Aquelas que não se dobram ao ecletismo pagão da atualidade, e muito menos faz algum esforço para ser aceita, seja qual for o método que ela utiliza para atingir seus objetivos. A bruxa malvada é o significado mais imponente da chamada bruxaria. Desde os artigos comercializados para as festas de 31 de Outubro, ano após ano, ou na literatura com as bruxas de Shakespeare em Macbeth, ou na bruxa do mágico de Oz.
A maioria, se não a totalidade de nós, praticantes de bruxaria, tentamos excluir a imagem da velha bruxa de cara esverdeada, a verruga na ponta do nariz e sua vassoura; numa busca mais “realista” da vida que levamos normalmente. A bruxa malvada é o arquétipo mais poderoso do poder inexplorado da mulher, por vezes renegado instintivamente. Mas isso é o certo a se fazer ? É o que devemos fazer?
Sua imagem não é nada atraente, feia e obscura, independente e solitária que se aproveita do infortúnio alheio. Ela manipula os poderes do lado negro da natureza; é sempre vista no fim das contas, escapando da punição que o ser humano comum sofre, nos abandonando em direção ao seu abençoado abrigo. Ela faz parte daquele grupo de mulheres que a inquisição tanto temia; que era incapaz de perseguí-la. Ela quase não têm preocupações mundanas, nada mais é tão importante quanto devorar criancinhas no jantar ou escravizar os outros.
Examinando velhos tabus: ela é sempre solitária, com que freqüência você um coven de bruxas malvadas? Ela não têm uma melhor amiga para passar o tempo e falar da vida alheia. Ela não têm ninguém que a julgue, muito menos alguém que tenha a liberdade de questioná-la. Ela é sempre será “feia” aos olhos dos outros e sempre suspeita. Nunca estará cercada por luz qualquer. A escuridão foi sua escolha pessoal. Ela escolheu ser feia? Quem se importa? Ela certamente não se importa nem um pouco.
Seu visual e os cosméticos que ela usa não passam do trivial. Ela sempre terá a verruga no nariz, não importa o que ela faça, então porque se importar com uma bobagem dessas ? Esse tipo de preocupação faz parte apenas do dia a dia de quem quer ser aceito e busca ascensão ou aceitação social. A bruxa má nunca precisa disso. Sua consciência é quem diz qual é seu status social e a ela basta aceitar a si mesma.
Ela é sempre auto-suficiente. Se você aparecer em sua porta pedindo um prato de comida, ela perguntará, “O que você veio fazer por mim?” Se você contra-argumentar com conceitos cristãos de bondade e justiça ela revidará da seguinte forma, “Então vá pedir a Jesus um pedaço de pão e quem sabe um pouco de vinho”. Ela já se considera condenada não importa o que ela faça e prefere não dar ouvidos a questões éticas.
Os arquétipos da bruxa má sempre retornam a baila pois em seus olhos; nós sempre enxergamos a mesma pergunta: “O que você realmente quer?” Moralidade e ética a parte, você pode ter o que você quiser ! É bom pensar nisso sempre!
Em algum lugar do fundo de seu caldeirão, há sempre um jeito, uma maneira de se conseguir o que se quer, mas é no estilo de vida humilde e reservado dela é onde encontramos as respostas. É do auto-conhecimento que se descobre a resposta sobre tudo aquilo pelo qual batalhamos mas que por uma razão ou outra, não é exatamente aquilo que temos ou queremos.
É verdade, você têm razão, ela acha graça na desgraça alheia, no tombo do próximo. Ela já desistiu há muito tempo, de tentar compreender a razão dos sentimentos abalados que todos nós temos, quando aquele carro desejado, aquela jóia brilhante, aquela casa mui decorada com toda a prata e porcelana do mundo não vêm.
Ela possui um grande conhecimento a respeito dos animais e espíritos dentro da imensa cadeia negra do ocultismo, seu magnetismo, suas qualidades mágicas, ou onde e como encontrá-los num bosque ou numa floresta noturna. Ervas e plantas venenosas. Gatos pretos e enormes corujas são seus familiares, ela sempre sabe, ela sabe de tudo e sobre todos nós. É uma boa razão para levar o que pensamos sobre ela em consideração.
Você jamais vai encontrá-la faminta, mendigando nada a ninguém; você acha que ela opera suas magias em busca de uma mansão ? Uma guarda roupas cheio de roupas de grife? Ela vai ao médico? Suas preocupações limitam-se ao reino espiritual; muito longe das questões que fazem parte do local e da comunidade onde ela vive.
Ela parece sempre estar acima de tudo e de todos, têm obviamente suas preocupações, seus objetivos e suas metas na vida, mas estes objetivos, estas metas, estão além de nossa vã compreensão. Ele devora criancinhas. Embora compreendido em sentido figurado, não é seu sangue e sua carne que ela devora, mas a inocência e ignorância delas. Elas no caso somos nós; as criancinhas chorosas.
Quando somos criancinhas no sentido real, brincando de esconde-esconde, cantando canções singelas no jardim de infância, partilhando nosso lanche e nossa lancheira. Não há com o que se preocupar; mas então crescemos e então caímos na real, quando enfim, o lanche e a lancheira já não é mais o bastante, precisando de mais, de muito mais. Então viramos alvo da bruxa malvada. Elas estão por todo lugar.
Justiça e certo ou errado são conceitos espirituais. Imaginamos e desejamos ignorantemente que um dia haverá paz no Oriente-Médio, enquanto amaldiçoamos os vizinhos e amigos pelas costas. A bruxa malvada sempre vai jogar em nossa cara que justiça e paz, só existem quando nosso egoísmo está plenamente satisfeito. Ela estoura a bolha imaginária em que vivemos mostrando com requintes de crueldade, quem somos nós; como vivemos e pensamos, mas principalmente como agimos.
Ela escraviza os outros. Suas habilidades em escravizar são suas maiores e mais temíveis habilidades. Tememos essa habilidade pois sabemos que seremos capturados pelas armadilhas da bruxa e que seremos incapazes de escapar dela, uma vez em seu poder. Mas ainda assim, iremos procurar pela bruxa má. Ela nunca vai nos acorrentar, a porta estará aberta para fugirmos quando quisermos, mas quem disse que queremos ou mesmo temos força para isso ?
Nós nunca somos capazes de notar, que a magia e o poder que procuramos tanto, está dentro de nós mesmos, e mestre ou adepto qualquer pode fazer isso por nós, atingir isso por nós. Mas o que faz delas tão malvadas e perigosas, é o fato dela nunca nos alertar sobre isso. Ela deixa que cometemos falhas mortais. Ela não nos alerta sobre o risco de sermos aprisionados por nossa ganância e ignorância.
Na forma de consumismo nas festas de Natal, no rosto sorridente de Ronald McDonald’s, o ungido é ressuscitado anos após ano. Ninguém sabe o nome da bruxa malvada, mas vamos nos sentir melhores imaginando que elas são diferentes, piores do que nós. Só aquele que sente o poder dela nas próprias veias sabem o que elas são. Não nos simpatizamos com elas, mas as vemos como guias, guardiãs, ou mesmo desafiadoras a quem secretamente adoramos.
De certa maneira, começamos a rever os nossos conceitos sobre a bruxa má, desejando seu poder e ser como ela é, e deixando para trás os festejos do Samhain, das fantasias no Halloween, encare o espelho e pergunte: “Você é malvada o suficiente para conseguir o que deseja para sua vida?”
Débora Rodrigues (Zana Ereshkigal), do Jornal “O Bruxo”
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