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Bruxaria e Paganismo

Bruxaria, uma episteme

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Epistemologia é o ramo da filosofia que estuda basicamente os encontros entre crenças e conhecimentos, é também uma forma de esclarecer a “visão de sujeito” que cada vertente de estudo tem do ser humano. Atualmente este tipo de esclarecimento se faz necessário para que se possa estabelecer a bruxaria como religião, tirando o conceito de bruxo do imaginário folclórico do povo  e colocando-o como uma prática séria e rica para a nossa sociedade e comunidade. Para que isso aconteça primeiro os próprios bruxos têm que saber pelo que se nomeiam desta maneira, afinal uma das primeiras prerrogativas da bruxaria é tornar o praticante consciente, desperto, sendo contra qualquer tipo de alienação e isto inclui esclarecer qual é a matriz que confere base a religião de bruxaria.

Primeiramente deve-se dizer que a Bruxaria é uma religião e também uma filosofia, onde a religião se encontra com a filosofia? Não é redundante falar que algo é um e outro? Ou não é blasfêmia relacionar uma prática a outra? Bem, para a última duas perguntas a resposta é não. Para que a primeira pergunta possa ser respondida de maneira clara, é preciso esclarecer os conceitos de religião e filosofia: Religião vem do Latim Religare (com o divino, com a natureza, com ambos, com uma coisa só, consigo mesmo, com os outros, etc.) e se enquadra em um conjunto de sistemas culturais e de crenças, além de visões de mundo, que estabelece os símbolos que relacionam a humanidade com a espiritualidade e os valores morais, já filosofia é o estudo de problemas fundamentais relacionados à existência, ao conhecimento, à verdade, aos valores morais e estéticos, à mente e à linguagem. Bingo! Temos a primeira estrutura básica que define um pouco mais da prática de bruxaria, com estes conceitos descartamos algumas religiões e algumas filosofias, mas isso por si só não define a bruxaria, para uma prática ser considerada bruxaria ela deve seguir alguns outros parâmetros fundamentais.

Primeiramente, o conceito de Divindade e espírito deve ser pluralista e isso não significa politeísta. Significa que o divino é encontrado em muitas formas, de muitas maneiras e com isso reconhecer as polaridades deste divino, algumas vezes (e mais popularmente) estas polaridades se retratam como Feminino e Masculino (Grande Mãe e Grande Pai) outras vezes como várias faces de uma mesma feminilidade ou de uma masculinidade, mas o mais importante é reconhecer a natureza fértil da energia criativa, negativa, passiva e a natureza fértil da energia expressiva, positiva, ativa. Partindo deste pressuposto, para uma prática ser definida como bruxaria ela deve reconhecer a natureza como sagrada, tudo ao redor como uma expressão da criação divina e reconhecer a divindade em cada coisa em separada e em tudo junto, este é o conceito de imanência e como coloca T. Thorn Coyle sobre isto: “Imanente, Ela (a divindade) preenche todos os espaços de nosso ser com mistério e beleza: Está na planta que nasce, se espremendo pelas calçadas rachadas, ou no raio de sol que ilumina o céu. Imanência é a voz da brisa nas folhas das árvores, é a queda d’água em uma cachoeira e no encontro do mar com a areia. Imanência é um beijo, um toque, o fôlego. É o seu corpo no encontro de outro corpo no calor da luxúria e celebração.

O divino no mundo está também em cada um de nós e estabelece a relação com tudo o que nos rodeia. Na natureza nós vivenciamos o plural, o múltiplo: A natureza é o corpo no qual a diferença flui…”

Imanência é um conceito muito importante dentro da prática de bruxaria, pois é através dele que o bruxo direciona suas práticas, reflete sobre as suas ações e baseia suas escolhas, este norteador coloca que ao prestar culto, um buscador pode, pela imanência achar a divindade dentro de si procurando-a. Através da imanência pode-se medir o impacto de seus atos na comunidade e no mundo, o bruxo é parte da natureza, é uma extensão dela e não a domina, se harmoniza com ela, trabalha em conjunto com seus fluxos e reconhece em si os padrões naturais, com isso respeita a diversidade como uma expressão da criatividade divina e por isso não tem a visão de si mesmo como superior frente a outras manifestações naturais, todos nos assemelhamos por sermos diferentes e isso nos torna sagrados. Mas também isso não define uma prática como bruxaria.

Para uma prática ser definida como bruxaria ela deve somar aos conceitos anteriores o conceito de ciclos naturais. A Bruxaria reconhece que todas as criações divinas seguem o mesmo padrão,  e por isso vibram em maior ou menor escalas os mesmos ciclos.Um bruxo pode se colocar (e reconhecer em si mesmo) em harmonia com os ciclos naturais de diversas maneiras e os mais populares são as práticas com os ciclos lunares e solares, mas pode-se alinhar o corpo, mente e espírito com os ciclos das plantações, com as marés, com as temporadas de chuvas e tantas outras formas, o importante é reconhecer em si mesmo o movimento natural externo, e com este reconhecimento expressar um viver saudável, num sentido holístico, amplo. Se alinhando aos ciclos pode-se vivê-los de maneira mais tranqüila e natural, ao identificar cada período de nossa vida podemos descobrir novas ferramentas para tornar a nossa existência mais eficiente e harmonizada com a vida ao redor, naturalmente.

Por fim um bruxo reconhece a existência além da matéria, entende que existem planos além do físico e que estes podem ser acessados e explorados através da orientação apropriada para refletir a harmonia natural em todas as esferas, principalmente a esfera terrestre. Um bruxo realiza um trabalho bem feito pois acredita que tudo é uma expressão do divino interior, trabalha em prol da cura, num sentido mais amplo da palavra e para nutrir a sua comunidade, fazê-la evoluir e aprimorar cada vez mais seus componentes.

A magia é parte integrante das práticas de bruxaria e entende-se por magia “a arte de modificar a realidade através da vontade” como coloca Dion Fortune. Esta afirmação pode ter vários desdobramentos, a interpretação desta citação fica por conta das vertentes de bruxaria e práticas mágicas, mas essencialmente, trabalhar com “magia” é compreender que ao nosso redor tudo é energia e esta energia pode ser sintonizada e bem direcionada através de concentração, visualização, foco e exercícios físicos, é compreender profundamente a natureza da energia e saber com isso quais as conseqüências que cada ação neste manejo irão trazer.

Com estes conceitos básicos (e com certeza existem outros pontos de vista sobre os mesmos) conseguimos criar um esqueleto sobre a prática de bruxaria, o que vai mudar daqui por diante é o que cada tradição, cada escola, cada vertente vai acrescentar e isso estabelece limites claros entre o que é bruxaria, o que é magia cerimonial, thelema, hinduísmo, helenismo e etc. Conceitos reencarnatórios, de pós vida, de natureza e de valores morais variam de acordo com cada forma de pensar de cada grupo teórico. Wicca e suas vertentes mil são formas de bruxaria, a Tradição Feri é uma forma de bruxaria, druidismo, xamanismo e pajelança são as formas mais primárias e cruas da bruxaria moderna, mas não podem ser classificadas como formas de bruxaria pois seguem suas próprias prerrogativas. É claro que a bruxaria evoluiu… não é exatamente o que se era praticado na idade média e muito menos o que se praticava no antigo Egito, Irlanda ou Amazônia, assim como a medicina, a psicologia e a arquitetura, engenharia e etc, as necessidades mudaram e com isso alguns conceitos foram se tornando mais complexos, existindo somente a estruturação básica e o referencial filosófico-religioso-prático de uma expressão cultural humana.

Ser um bruxo atualmente é partir em busca do que Jung nomeou como processo de individuação e de que muitas escolas holísticas nomearam como expressão da totalidade aliado com praticas e referenciais naturais. As conseqüências desta busca é um viver mais consciente, saudável e incentiva o progresso social de maneira sadia e segura pois a pessoa aprende ao longo do caminho e dentro da religião a refletir sobre o impacto de suas ações sobre a vida dos outros e sobre a natureza, além de desvendar os mistérios do próprio corpo, da vida e da morte e dos outros níveis de existência.

Por Pythio


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